Mínimo existencial e transformações sociais: A relevância dos direitos fundamentais em tempos de crise

Minimum existence and social transformations: the relevance os fundamental rights in times os crisis

DOI: 10.19135/revista.consinter.00018.11

Recebido/Received 26/05/2023 – Aprovado/Approved 13/09/2023

Marcus Vinicius Rodrigues Lima[1] – https://orcid.org/0000-0001-7284-6716

Resumo

Este artigo objetiva analisar contemporaneamente os aspectos jurídicos da existência de um conteúdo essencial dos direitos fundamentais que possa caracterizar uma estrutura normativa suficiente e adequada a tutelar valores inegociáveis do bem-estar e da dignidade humana, ao ponto de se poder falar em um mínimo existencial. Para tanto, são objetos de análise os requisitos e elementos configuradores dos direitos fundamentais e estruturalmente do próprio mínimo existencial, no tocante à necessária simbiose entre a sua justificação e os seus limites e contornos. Nesse contexto, a metodologia bibliográfica aplicada considera a base constitucional e as fontes normativas que tutelam valores e direitos fundamentais, inclusive impactados pela realidade econômica e financeira de Estados, ciclicamente afetados por crises. Constata-se a incidência de inevitáveis mecanismos de ponderação e balanceamento, para obtenção e configuração da delimitação do direito ao mínimo existencial.

Palavras-chave: Mínimo existencial; Direitos fundamentais; Crise orçamentária; Proporcionalidade.

Abstract

This article aims to analyze contemporaneously the legal aspects of the existence of an essential content of fundamental rights that can characterize a sufficient and adequate normative structure to protect non-negotiable values of well-being and human dignity, to the point of being able to speak of an existential minimum. To this end, the requirements and elements that configure fundamental rights and structurally of the existential minimum will be analyzed, regarding the necessary symbiosis between their justification and their limits and contours. In this context, considering the constitutional basis and the normative sources that protect fundamental values and rights, including those impacted by the economic and financial reality of States, cyclically affected by crises, the incidence of inevitable weighting and balancing mechanisms is observed, in order to obtain and configure the delimitation of the right to the existential minimum.

Keywords: Existential minimum; Fundamental rights; Budget crisis.

Sumário: Introdução; 1. A noção de mínimo existencial; 2. O conteúdo essencial dos direitos fundamentais e sua simbiose com o mínimo existencial; 3. O custo dos direitos e a chamada jurisprudência de crise; 4. A dimensão fática da reserva do possível e sua equalização; 5. A proporcionalidade como critério de harmonização do sistema jurídico; 6. A relevância contemporânea do mínimo existencial diante de momentos de crise; 7. Considerações finais; 8. Referências.

Introdução

A previsão constitucional de inúmeros direitos e garantias que buscam tutelar o bem-estar e a própria dignidade da pessoa humana, fundada em um sistema jurídico que ressalta a existência de direitos fundamentais e sociais, potencializados inclusive pelo amparo de cláusulas pétreas, não reina completamente imune às intempéries da pressão da realidade social e geracional, dos valores econômicos e da própria capacidade financeira do Estado.

O direito, apesar de munido de certo dinamismo de uma ciência biunívoca e sensível à dialética social, não consegue alcançar a mesma velocidade com a qual as transformações sociais impactam a vida das pessoas e demandam tutelas adequadas à vulnerabilidade dos bens expostos.

Em outras palavras, em razão dos impactos potenciais das recentes crises, identificam-se inúmeras ofensas a direitos, que comprometem direitos fundamentais e prestacionais, aos quais o ordenamento jurídico não apresenta uma pronta resposta e uma tutela adequada e proporcional ao imediatismo das próprias ocorrências, sendo representativo do que se convencionou chamar de crise de jurisdição.

Entretanto, ao se avaliar não apenas a extensão das lesões e ofensas, mas também a profundidade e a intensidade da ruptura dos direitos fundamentais, adentra-se ao necessário estudo da existência de um direito ao mínimo existencial.

Nesse ponto, inúmeras teorias se destacam a justificar inicialmente o conceito e a estrutura normativa. A natureza jurídica afeta a essência de um conteúdo mínimo dos direitos fundamentais e sociais, ao ponto de, sem desconsiderar argumentos relativos à realidade econômico-financeira do Estado, ser possível encontrar um balanceamento frente à inevitável colisão de direitos fundamentais, e no resultado dessa composição proporcional, apresentar um mínimo existencial que reflita a manutenção de uma ordem jurídica justa.

Ao se analisar a estrutura do direito ao mínimo existencial, incluso em um sistema jurídico que apresenta objetivos de efetivação de uma justiça social e intergeracional, destaca-se a contemporaneidade dos efeitos da existência desse direito, que está na base de várias políticas públicas desenvolvidas em contexto pós-pandêmico e de conflitos armados e, necessariamente, absorve novos contornos e valores que definem e delimitam a sua própria existência.

Nesse contexto, ganha destaque o mínimo vital, como baliza a evitar políticas públicas que venham promover regresso social, ainda que flexibilizado ou balanceado pela dimensão fática da reserva do possível ou pela chamada jurisprudência de crise, no contexto de uma análise econômica do direito.

Portanto, para que esse mecanismo de proteção ao um direito mínimo à vida digna seja efetivo, questiona-se: o que hoje poderia ser considerado como mínimo existencial frente à imposição de uma realidade de crise? Quais valores permeiam o conteúdo essencial dos direitos fundamentais, ao ponto de serem objeto das trágicas escolhas assecuratórias de sua efetividade?

Em face desse cenário, o presente artigo tem por objetivo trazer uma reflexão sobre novos contornos acerca do direito ao mínimo existencial, por meio de uma revisão bibliográfica e documental sobre o tema, tendo em vista a utilização de livros e artigos de especialistas acerca dos assuntos desenvolvidos e contextualizados em uma perspectiva dos custos dos direitos. 

1 A noção de mínimo existencial

Num primeiro momento, a ideia de um mínimo para se viver dignamente, como um direito que decore de um conjunto de prestações a cargo do Estado, historicamente remonta à noção de caridade e assistência aos desamparados, mas com ela não se cofunde, pois o que se constata é um contínuo e crescente reconhecimento “de que a pobreza e a exclusão social são assuntos de algum modo afetos ao Estado”[2].

No âmbito do direito internacional, surge um escopo do mínimo existencial na redação do artigo 25º, da Declaração da Organização das Nações Unidas – ONU, de 1948, que atribui que “todo ser humano tem um direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde, bem-estar indispensáveis e direito à segurança em caso de desemprego, doença invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência [...]”[3].

Outros textos internacionais seguiram nessa linha de reconhecimento, ligando os direitos sociais e o direito a um mínimo existencial, mas o que sempre se destaca, além da associação à dignidade humana, é a inafastável preocupação com a sustentabilidade, em face do confronto com valores econômicos que impactam a efetividade dos direitos fundamentais e prestacionais, oriundos de um Estado Social.

Nessa linha evolutiva, a menção de um direito subjetivo que garantisse recursos mínimos para uma existência digna, surgiu no início da década de 1950, com o jurista Otto Bachof, que defendeu um mínimo de segurança social, como direito decorrente do princípio da dignidade da pessoa humana[4].

O conceito de mínimo existencial (existenzminimum) como direito fundamental a um mínimo para a vida digna passível de tutela, sem afrontar o Estado Democrático de Direito e a separação dos poderes, surgiu na Alemanha em 1953, em uma decisão do Tribunal Federal Administrativo (Bundesverwaltungsgericht)[5].

Na referida decisão, foi reconhecido o direito subjetivo do indivíduo carente de auxílio material pelo Estado, com fundamento no princípio da dignidade da pessoa humana, no direito de liberdade e à vida, que conferem ao indivíduo qualidade de pessoa autônoma, reconhecida como titular de direitos e obrigações, ao ponto de se garantir as suas condições de existência minimamente digna, por parte do Estado[6].

Na perspectiva inicial do direito ao mínimo existencial, a proteção, apesar de atrelada a um padrão de vida digna, representava um direito defensivo de liberdade frente ao próprio Estado, inclusive com vedação à caracterização de exação confiscatória, em face da eventual iniciativa predatória que ofendesse a dignidade humana, ou seja, somente mediante a evolução do direito ao mínimo existencial, passou-se a ter uma tutela afeta a prestações do Estado, que repercutissem a tutela dos direitos sociais.

O direito ao mínimo existencial pode ser apresentado tanto como direito subjetivo quanto como norma jurídica. No primeiro aspecto subjetivo, mune o cidadão da faculdade de fazer valer, por meio do exercício de garantias processuais e institucionais, os seus direitos mínimos. Enquanto, no aspecto objetivo, apresenta-se como norma jurídica declaratória de direitos fundamentais com caraterísticas de generalidade e abstração para a maior afetação possível da tutela da própria cidadania[7].

Na conceituação de Paulo Caliendo[8], o mínimo existencial relaciona-se com a ideia de um núcleo essencial de um direito fundamental, representando um conjunto mínimo de significações semânticas e normativas para a afirmação de determinados direitos, sendo o núcleo de proteção o patamar inderrogável de proteção, funcionando como verdadeira cláusula de barreira, contra qualquer ação ou omissão estatal, que impeça a adequada concretização ou efetivação do conteúdo mínimo dos direitos fundamentais.

Nesse contexto, a garantia do mínimo existencial é um direito fundamental, considerado como uma dimensão da dignidade da pessoa humana, que deve ser respeitada e protegida, como bem destaca Ricardo Lobo Torres:

Os mínimos sociais, expressão escolhida pela Lei no 8.742/93, ou mínimo social (social minimum), da preferência de John Rawls, entre outros, ou mínimo existencial, de larga tradição no direito brasileiro e no alemão (Existenzminimum), ou direitos constitucionais mínimos, como dizem a doutrina e a jurisprudência americanas, integram também o conceito de direitos fundamentais[9].

Na Alemanha, o rol de direitos sociais não é extenso, como o da Constituição Federal de 1988, por isso, justifica-se falar do mínimo existencial na perspectiva de sua extensão, “A Corte Constitucional da Alemanha define o mínimo existencial como o que ‘é necessário à existência digna’ (ein menschenwürdiges Dasein notwendig sei)”[10].

No Brasil, embora a Constituição consagre um extenso rol de direitos sociais, a ideia do mínimo existencial faz sentido por ser utilizada com a finalidade de conferir maior efetividade a determinados direitos sociais, indispensáveis a uma vida humana digna. Delimita um subgrupo menor de direitos sociais para que tenha uma efetividade objetivamente assegurada.

Assim, não é todo e qualquer direito mínimo que pode ser considerado mínimo existencial, pois apenas aqueles direitos vinculados a situações existenciais dignas[11], sem as quais a própria existência humana e a sobrevivência não estariam presentes, compõem o mínimo existencial, ou seja, “o objeto e conteúdo do mínimo existencial, compreendido também como direito e garantia fundamentais, haverá de guardar sintonia com uma compreensão constitucionalmente adequada do direito à vida e da dignidade da pessoa humana como princípio constitucional”[12].

Nesse ponto, é esclarecedor abordar a distinção feita por Sarlet[13], relativamente à terminologia de mínimo vital e mínimo existencial[14], em que o primeiro representaria a garantia de existência física do indivíduo, corolário do seu direito à vida – alimentação, atendimento médico de urgência, assistência social; ao passo que o último, mais abrangente, abarcaria, além do mínimo vital, um padrão de inclusão social, cultural e político mínimo, extraído de um Estado Social.

Como referido, o mínimo existencial tem robusto aporte normativo[15] e sua proteção respeita o princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º III, da CRFB/88), concretizando objetivos fundamentais da República, afetos a “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais regionais”[16], bem como concretizar a finalidade da ordem constitucional econômica ao “assegurar a todos existência digna”[17].

2 O conteúdo essencial dos direitos fundamentais e sua simbiose com o mínimo existencial

Os direitos fundamentais e os direitos humanos têm como ponto em comum o fato de protegerem e promoverem a dignidade, a liberdade e a igualdade. Enquanto os direitos fundamentais são consagrados no plano interno (Constituição), os direitos humanos são consagrados no plano internacional (tratados e convenções internacionais).

Dito isso e tendo por foco a análise dos direitos fundamentais enquanto mínimo existencial, percebe-se que esse direito constitui o conteúdo essencial de outros direitos que tutelam valores essenciais à dignidade humana, como a liberdade, a vida dentre outros. Registra Ricardo Lobo Torres[18] que “o direito às condições mínimas de existência digna constitui o conteúdo essencial dos direitos da liberdade, ou direitos humanos, ou direitos individuais, ou direitos naturais, formas diferentes de expressar a mesma realidade”.

Os direitos sociais estão atrelados à ideia de uma condicionante de atuação estatal, um agir sem o qual a própria existência do direito social estaria comprometida, o que promove uma inevitável interseção entre as esferas políticas e econômicas, pois a sua outrora absoluta separação dá lugar a contornos imprecisos.

Os direitos sociais prescindem de lei para sua exequibilidade: Na maioria das Constituições, verifica-se que estes direitos sociais possuem, amiúde, contornos imprecisos, não estando plasmados em normas diretamente aplicáveis. Por conseguinte, a sua aplicabilidade direta carecerá de prévia intervenção legislativa[19].

O que se observa é que os direitos sociais, ainda que se considere a dimensão negativa ou de “defesa” de tais direitos, em razão da forte atuação prestacional do Estado, são mais afetados pela dinâmica da realidade econômica, das crises políticas, financeiras e orçamentárias.

Não se desconsidera aqui que mesmo os direitos de primeira geração[20], também, acarretam gastos para o Estado, ao montar um aparato e mecanismos que tutelem a eficácia e a garantia de tais direitos; entretanto, é no necessário atuar do Estado para a implementação de direitos sociais que repousa a divergência doutrinária e jurisprudencial; daí a necessidade de se discutir, para além da defesa inflexível da vedação de um regresso social, o mínimo existencial, sem o qual se afasta de uma ordem jurídica justa[21].

Relativamente aos mínimos sociais e às discriminações positivas, há questionamentos latentes relativos a consumos mínimos, socialmente estabelecidos, bem como à implementação de prestações atreladas a princípios de igualdade material e focadas no combate à vulnerabilidade como forma de implementação de justiça social.

Tratar-se-ão por iguais os que estão em situação análoga e diversamente os que estão em situação diferente, e a regra universal de formação da pensão para os que identicamente contribuíram ao longo das suas vidas pode conviver eticamente com as diferenciações positivas dos <<diferentes>> (categoria de pessoas mais vulneráveis) porque legitimada no plano processual[22].

Ao associar sistematicamente os direitos fundamentais ou mesmo os direitos sociais efetivamente implementados, segundo o princípio da vedação ao retrocesso social, não seria mais possível extinguir esses direitos já incorporados ao campo da dignidade humana dos beneficiários, pois, ao assim proceder, restaria configurado verdadeiro retrocesso ou limitação tamanha que atingiria o núcleo essencial desses mesmos direitos.

3 O custo dos direitos e a chamada jurisprudência de crise

A questão dos custos é abordada por Holmes e Sunstein[23], a partir da ideia de que toda e qualquer escolha dentre as possíveis apresenta um custo de escolha em relação às opções preteridas, em outras palavras, efetivar qualquer direito apresenta uma relação de escolhas custosas, frente à impossibilidade de realizar todas as alternativas possíveis de escolha.

Novamente o elemento escassez de recursos se apresenta como condicionante e indutor das trágicas escolhas que o Estado tem de realizar e implementar, dentro de preferências constitucionalmente aceitáveis, sob pena da legitimidade da judicialização das escolhas em face das preterições[24].

Para além da dogmática e da análise estanque dos direitos e na busca de se conferir plena efetividade a valores atrelados a objetivos fundamentais de um Estado Democrático, ou mesmo orientar a hermenêutica para standards oriundos de normas programáticas, é salutar na aplicação do Direito não desconsiderar a realidade social a qual ele constantemente procura regular[25].

Ao se considerar a influência dos aspectos econômicos sobre a efetivação dos direitos fundamentais e, principalmente, os direitos sociais tidos como prestacionais, a questão da escassez de recursos, as persistentes e sucessivas crises pelas quais passa o Estado de Bem-Estar Social e geram o divórcio entre o poder e a política[26], a “globalização que ameaça a sociedade civil”[27] e a análise econômica do direito imprimem fundamento para interpretações restritivas e reducionistas dos direitos sociais.

Dito isso, toma-se por parâmetro a realidade econômica vivenciada por Portugal em 2008, nos anos da troika, como assim ficou conhecido o período da implementação de medidas de austeridade, impostas pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) e a própria União Europeia, para o aporte de 78 bilhões de euros na economia portuguesa.

Em 2011, à beira da falência, o governo português solicitou um pacote de resgate no valor de 78 bilhões de euros à União Europeia e ao Fundo Monetário Internacional (FMI). O desembolso foi autorizado, sob a condição de que o país implementasse medidas de austeridade. Foram os anos da "troika", como são popularmente conhecidas as imposições da Comissão Europeia, do Banco Central Europeu (BCE) e do FMI.

O período foi caracterizado por um corte significativo das despesas públicas – o que afetou principalmente os salários dos funcionários públicos e as aposentadorias. Já os impostos foram aumentados. Mas o desemprego não parou de aumentar — atingiu a cifra recorde de 17,7% em 2013 — nem a pobreza e o descontentamento social. Por outro lado, o consumo e a moral dos portugueses despencaram[28].

A embasar esse período de aumento de desemprego e da pobreza, desvalorização imobiliária, aumento de tributos e impacto sobre salários e aposentadorias, desenvolveu-se no Tribunal Constitucional Português a chamada jurisprudência de crise.

A jurisprudência de crise gerou um paradigma de constitucionalidade atemporal, com a preponderância do status dominante sobre a vontade da Constituição (Wille zur Verfassung), que não encontrava lastro apenas no texto e na força normativa da constituição[29], mas acima de tudo no contexto, pois “a evolução da jurisprudência constitucional caminhou no sentido da diluição do peso dogmático do eixo de interesse público/transitoriedade das medidas/excepcionalidade”[30].

4 A dimensão fática da reserva do possível e sua equalização

Ao se pretender atingir a efetividade dos direitos sociais como resultado de uma equação, cujo problema configura a obtenção de uma ordem jurídica justa, destaca-se o elemento reserva do possível, “conceituada como o conjunto de fatores (monetários, de pessoal, equipamentos, demanda, prioridades) que propicia ou guia a atividade estatal”[31].

O condicionamento da efetividade dos direitos sociais às reais capacidades financeiras do Estado teve sua origem na Alemanha, na década de 1970, quando se adotou a tese, num caso paradigma acerca do acesso a vagas à Universidade, pois, apesar da educação não ser um direito previsto constitucionalmente, “a liberdade profissional demandava, em alguma medida, o acesso ao ensino superior”[32]. No entanto, o aumento de vagas para contemplar pretensões excedentes deveria considerar os custos e os limites materiais e jurídicos da implementação.

Como desdobramento dessa construção teórica, Ingo Sarlet[33] dividiu didaticamente a reserva do possível em três dimensões, contemplando, a) a disponibilidade de fato dos recursos necessários à efetivação dos direitos fundamentais; b) a disponibilidade jurídica de recursos materiais e humanos, ou seja, viabilidade orçamentária, administrativa e legislativa; c) a proporcionalidade e a razoabilidade da prestação exigida.

A delimitação da ideia de reserva do possível e os aspectos de sua dimensão fática demandam a análise da desigualdade social, que impacta desproporcionalmente a relação entre os interesses e os bens existentes, de modo a configurar o problema da escassez como central para o estudo da tutela de um conteúdo essencial dos direitos fundamentais, atrelado ao mínimo existencial exequível, independentemente de eventuais discricionariedades políticas ou posicionamentos contramajoritários.

Percebe-se que a reserva do possível não é argumento suficiente a suplantar a efetividade do direito ao mínimo existencial, corolário do conteúdo essencial de um direito fundamental, que não se restringe ao mínimo vital da sobrevivência, pois se expande para mínimos relacionados à inserção de uma vida social. 

Portanto, considerando que diversos direitos elencados como fundamentais projetam seus conteúdos sobre valores (justiça, dignidade humana, liberdade, educação etc.) e tais direitos, extraídos os conteúdos afetos ao mínimo existencial, são passíveis de um máximo escalonamento da sua própria tutela, surge um campo instrumental de prestação jurisdicional não afeto a um ativismo judicial, mas sim à tutela jurídica social adequada da vulnerabilidade.

Não pode o administrador, apesar do princípio majoritário, promover políticas de Governo que não priorizem direitos essenciais, pois ao afetar o mínimo existencial de direitos fundamentais o faz com sacrifício das bases do próprio Estado Democrático, motivo pelo qual não é oponível à reserva do possível, como justificativa a não intervenção do Poder Judiciário, frente a motivos que fomentam uma existência minimamente decente.

Delineados os conceitos de mínimo existencial e reserva do possível, importante projetar o elemento instrumental assecuratório da própria tutela jurídica adequada desse mínimo existencial, que pode ser entendido na vertente do acesso à justiça para evitar ou reparar lesões a direitos fundamentais, por afronta a esse mínimo, que não poderia ter sido violado, caracteriza-se a vulnerabilidade exacerbada.

O conceito de vulnerabilidade agravada ou “hipervulnerabilidade” ainda apresenta incipiente normatividade, sendo mais presente no âmbito de regulamentos e resoluções das Defensorias Públicas, como no caso de proposta de resolução do Conselho Superior da Defensoria Pública do Rio Grande do Sul, que em seu artigo 2º assim dispõe:

Para efeitos desta Resolução considera-se que as situações de vulnerabilidade organizacional e hipossuficiência organizacional — e “hipervulnerabilidade” — derivam de especiais dificuldades dos indivíduos e grupos sociais em exercitar com plenitude os direitos reconhecidos pelo ordenamento jurídico perante o sistema de justiça, o que deriva, dentre outras, de razões relativas à idade, ao gênero, à capacidade física ou mental, e a circunstâncias sociais, econômicas, étnicas e culturais[34].

Com referência ao emprego da terminologia hipervulnerabilidade, registra-se sua associação com a vulnerabilidade agravada, principalmente quando decorrente de relações de consumo, que exacerbam a fragilidade de pessoas integrantes de determinados grupos, como idosos, crianças e deficientes, conforme já acentuado no Recurso Especial nº 586.316/MG de relatoria do Ministro Antônio Herman Benjamin.

Ao apontar questões de grupos vulneráveis e a tutela dos direitos das minorias, destacando inclusive o ápice da lesão ou redução de direitos afetos ao mínimo existencial e eventualmente configuradores da referida hipervulnerabilidade, não significa dizer que os mínimos existenciais se restringem ou são exclusivamente pertencentes às pessoas mais vulneráveis. Se assim fosse, estar-se-ia reduzindo o próprio mínimo existencial a uma política social para combater a pobreza, dentro de uma perspectiva assistencialista, como bem destaca Rodrigo Monteiro Pessoa[35]:

É claro que toda a preocupação com o mínimo veio a favor das pessoas mais vulneráveis, mas isso não significa que o mínimo vital deva ser resguardado apenas para elas. As discussões começam a partir daí, mas não é o ponto de chegada. O mínimo vital é devido a todos e sua tutela inclui todas as pessoas sob proteção do Estado[36]. (tradução livre)

5 A proporcionalidade como critério de harmonização do sistema jurídico

No tocante à natureza jurídica do mínimo existencial, Ricardo Lobo Torres[37] defende que “o mínimo existencial é regra, porque se aplica por subsunção, constitui direitos definitivos e não se sujeita à ponderação”, complementa ainda que “não é um valor nem um princípio, mas conteúdo essencial dos direitos fundamentais”[38].

Para Ana Paula G. de Barcellos[39], o mínimo existencial estaria umbilicalmente ligado à noção de dignidade da pessoa humana e a aspectos socioculturais, pois exigiria o desenvolvimento de direitos sociais, econômicos e culturais para a plena realização da pessoa; portanto, representaria um núcleo irredutível da dignidade da pessoa humana, representado por aspectos materiais e instrumental, refletindo a natureza de regra jurídica, e não comportando qualquer ponderação em face da reserva do possível. Frisa a autora que:

[...] o mínimo existencial que ora se concebe é composto de quatro elementos, três materiais e um instrumental, a saber: a educação fundamental, a saúde básica, a assistência aos desamparados e o acesso à justiça. Repita-se, ainda uma vez, que esses quatro pontos correspondem ao núcleo da dignidade da pessoa humana a que se reconhece eficácia jurídica positiva e, a fortiori, o status de direitos subjetivo exigível diante do poder judiciário[40].

Já na visão de Ingo Sarlet[41], o mínimo existencial não se submete à reserva do possível. Ele interpreta o mínimo existencial como uma regra, como algo que não vai ser ponderado e aplicado diretamente à situação.

Entretanto, Daniel Sarmento[42] interpreta o mínimo existencial como estrutura de um princípio e não de uma regra. O mínimo existencial deve ter um peso maior na ponderação do que aquele normalmente atribuído aos direitos sociais, ou seja, o ônus argumentativo para afastar um direito que compõe o mínimo existencial será maior do que o exigido para os demais direitos (sociais). Todavia, observa o referido autor que não teria como afastar completamente a reserva do possível, pois, em determinados casos, a reserva do possível deverá ser levada em consideração, desde que a destinação do direito ao mínimo existencial seja preponderantemente destinada à tutela da vulnerabilidade social.

Ao se extrair o conteúdo essencial de um direito fundamental, direito constitucional social, ou mesmo dos direitos essencialmente vinculados ao exercício da cidadania, todos atrelados à ideia da manutenção da vida digna, encontra-se o direito ao mínimo existencial, se tal conteúdo encontrar identidade com o mínimo para uma vida social digna.

No entanto, o processo para tal configuração desse direito ao mínimo existencial se encontra apartado do uso de mecanismos de balanceamento e de aplicação do princípio da proporcionalidade, na lógica de teorias absolutas ou mistas do conteúdo intransponível dos direitos fundamentais[43].

Em eventual colisão de princípios de natureza constitucional ou direitos fundamentais de mesma equivalência de valores tutelados, o que se percebe é que a ponderação não propõe a eliminação completa de um dos valores em jogo, pois, independentemente de quais dos valores prepondere, o outro jamais deixará de existir no caso concreto, em razão da preservação também do seu mínimo[44].

O conteúdo essencial do direito fundamental que represente o mínimo existencial jamais será passível de ponderação, pois este, a partir do momento de sua configuração, é irredutível, ou seja, o mínimo existencial não é o objeto do sopesamento, mas o seu resultado.

a destrinça poderá revelar ‘no sopesar da proporcionalidade quando estamos em conflito real entre um direito fundamental e uma garantia institucional, ou entre esta e valores ou interesses constitucionalmente protegidos [...] a figura das garantias institucionais, na Constituição portuguesa, socorremo-nos do princípio da autonomia privadas em confronto com o princípio da igualdade remuneratória. Aceita-se hoje com naturalidade que o princípio da igualdade não se deve impor e sobrepor quae tale ao princípio da autonomia privada, limitando-o ou cerceando a liberdade da pessoa humana[45].

Dessa maneira, o que se defende é que o princípio da proporcionalidade seja o instrumento ou mecanismo capaz e suficiente para, dentro de uma análise sistêmica, permitir ao ordenamento jurídico angariar a adjetivação de ser justo, na medida em que pode adequadamente tutelar a contemporaneidade dos conflitos sociais com a dinamismo temporal, que uma sociedade desejante exige.

6 A relevância contemporânea do mínimo existencial diante de momentos de crise

Na contemporaneidade, as sociedades se singularizam com ideia de serem sociedades da informação em que os acontecimentos e as informações são registrados quase instantaneamente. Esse fluxo de informações, somado à Internet de alta velocidade – 5G, à realidade aumentada e à realidade virtual, tem caracterizado uma verdadeira Revolução 4.0, com reflexos nas relações de trabalho, sociais, consumo e na vida de todos[46].

Além de todas as transformações sociais oriundas de uma ordem cronológica ordinária, hoje, vivenciam-se os efeitos potencializados de fenômenos extraordinários na linha do tempo, o que promove um acelerar das projeções de décadas. Nesse contexto, singelamente estão: a pandemia da Covid-19, os efeitos do aquecimento global e as mudanças climáticas; o aumento do número de refugiados ambientais e dos deslocamentos internos; os reflexos econômicos, políticos e humanitários de conflitos armados no mundo.

Ciente de tais acontecimentos, como identificar nas sociedades contemporâneas o conteúdo essencial dos direitos fundamentais que estejam afetos a uma vida socialmente digna? Haveria uma mutação do conteúdo do mínimo existencial frente a novas realidades sociais afetas a uma sociedade plural e complexa? Qual seria o mínimo existencial frente a um tecido social, em que as essencialidades da vida passam a estar ligadas a um latente metaverso?

O conceito de metaverso pode ser entendido como uma conjugação dessa Internet banda larga, agregada a mecanismos de realidade virtual e aumentada, e tem gerado o chamado “terceiro lugar”[47], em uma sociedade de consumo que se retroalimenta e rotula como bem da vida e desejo que satisfaz esse ambiente virtual de interação social, ao qual se destina parcela de tempo de lazer.

Antes de ter todas as respostas para as questões apresentadas, é intensão do presente artigo borbulhar as ideias que podem justificar as alterações da tutela de uma nova realidade social. Assim, o que se almeja é a sensibilidade de “afastar a herança da exclusão social, buscando a valorização da vida, do homem e da pessoa humana”[48].

Nessa perspectiva, busca-se contextualizar o direito a um mínimo existencial frente à contemporaneidade e à dinâmica de uma sociedade que absorve a incerteza e lida com a complexidade das suas próprias relações, além de caminhar em direção a crescentes processos de avanço tecnológico, para então perceber a fluidez e a essencialidade do que pode ser hoje considerado mínimo para uma vida digna.

A lógica da movimentação dos contornos do que seja o mínimo existencial tem um paralelo com a própria ideia do que seja justiça e com os valores que passam ou deixam de ser foco de tutela em razão da evolução social, “justiça não é mais, se alguma vez o foi, estável e determinada, mas sim fluída, em movimento e instável”[49].

A definição dos limites atuais do que seja o mínimo existencial ganha ainda mais relevância em momentos de crise, pois a escassez de recursos exige eficiência das trágicas escolhas, de modo a salvaguardar o conteúdo essencial dos direitos fundamentais que encontrem similitude com o mínimo existencial, em outras palavras, o emprego dos recursos deve focar na tutela dos direitos que representem o mínimo essencial, o qual, efetivamente, preserve a vida digna, como reflexo do princípio da dignidade da pessoa humana.

O Supremo Tribunal Federal – STF, ao julgar a ADPF nº 45/DF, da relatoria do Ministro Celso de Melo (MELLO, Informativo/STF nº 345/2004), aborda a questão das trágicas escolhas num contexto de colisão de direitos fundamentais que enseja um estado de tensão dialética, entre a necessidade estatal de preservar a integridade e a intangibilidade do núcleo essencial do mínimo existencial, e, de outro ponto, a alocação de recursos financeiramente escassos na perspectiva da discricionariedade política.

As trágicas escolhas representam um campo de decisão política, um espaço simbólico de representatividade dos interesses e das expressões individuais de desejos, que nem sempre refletem ou repercutem adequadamente a tutela de interesses sociais, pois preponderar interesses de poder ou de mercado, como elemento decisivo da alocação de escassos recursos, só ocorre em detrimento do igualitarismo e com a criação de processos de exclusão social[50]:

O mercado puro tenta resolver conflitos em situações trágicas, dando preeminência às expressões individuais de desejos. Ela falha porque a soma de tais expressões falha em acomodar objetivos sociais e falha até mesmo em representar o que os indivíduos desejam. Seu funcionamento contraria algumas concepções importantes de igualitarismo e precifica com demasiada clareza aquilo a que gostaríamos de atribuir valor infinito. Um processo político responsável não é bem-sucedido porque não pode prontamente dar efeito aos desejos individuais. Também é falho, pois envolve diretamente toda a sociedade, o Estado, na preferência de alguns indivíduos a outros e na escolha de descartar o que idealmente afirmaríamos ser inalienável[51]. (Tradução livre)

Uma primeira abordagem acerca da ideia de escolhas trágicas reside no pensamento de que a implementação dos direitos está atrelada a um custo de oportunidade e, apesar de insuficiente, deve focar objetivamente em relações de custo-benefício[52], entretanto, é na análise da redução dos danos[53] das consequências das decisões políticas ou administrativas que se consolida a escolha da melhor opção.

Percebe-se que intuitivamente a análise poderia focar, a título de tradicional exemplo, a questão do aumento do número de famílias vivendo em situação de rua[54], ou mesmo os reflexos da insegurança alimentar crescente, registrados no recente inquérito nacional de insegurança alimentar no contexto da pandemia Covid-19 no Brasil[55], o que em vários aspectos também contemplaria a ofensa ao mínimo existencial, em uma perspectiva material.

Entretanto, busca-se neste artigo pontuar questões instrumentais[56] do mínimo existencial, as quais potencializam a vulnerabilidade de qualquer grupo social afetado em seu mínimo existencial, permitindo a busca por uma tutela jurídica justa e adequada à ofensa constatada.

O mínimo existencial não tem conteúdo meramente econômico (pecuniário), não podendo ser reduzido, por exemplo, ao dever de prestação material do Estado (renda mínima, benefícios previdenciários). Há outras dimensões consideráveis, que consistem na obrigação de prestação de serviços públicos essenciais, na garantia de acesso universal a tais serviços e a disponibilização dos meios de tornar efetivos estes direitos (ex. acesso à justiça)[57].

Inclusive, os mecanismos ofertados pelo Estado para viabilizar o caráter instrumental do direito a ter direitos, por si só, segundo precedentes do Supremo Tribunal Federal, são objeto de tutela quanto ao mínimo existencial, elidindo argumentos da fórmula da reserva do possível, para que não se configurem situações constitucionalmente intoleráveis[58].

Na mesma linha da instrumentalidade do mínimo existencial, não é crível considerar que uma pessoa consiga aferir plenamente o exercício de seus direitos, da sua cidadania, em todos os seus aspectos, estando privada, por exemplo, do acesso à Internet. Seria então a Internet um mínimo existencial afeto ao conteúdo essencial de direitos fundamentais à liberdade, à saúde e à previdência social?

Acredita-se que sim e cada vez mais, considerando a sociedade em que o exercício de direitos só se efetiva por intermédio de cadastros, registros, consultas e solicitações, em meios virtuais e aplicativos de celular, a saber: requerimento de auxílio emergencial, auxílio Brasil, meu INSS, Conecte SUS etc.

Nesse ponto, é importante ressalvar o racional questionamento de se comparar a abordagem do mínimo existencial à Internet com outros mínimos existenciais, afetos a relevantes valores fundamentais e a vulnerabilidades agravadas. No entanto. é pertinente ressaltar que a vulnerabilidade é apenas o ponto de partida, mas não seu ponto de chegada[59], pois o mínimo para uma vida digna é devido a todas as pessoas que estão sob o manto da proteção estatal[60].

Ao se analisar a questão de uma Internet economicamente viável, é necessário averiguar a proporção entre a renda do usuário e o valor pago para o uso do serviço, esse critério representaria um prévio balanceamento a configurar a existência de um direito mínimo que viabilize a inclusão digital.

A aferição dessa proporcionalidade seria um nítido exemplo da obtenção do mínimo existencial após a ponderação de valores, pois como revela Sônia Jorge, diretora executiva da A4AI, “20% das pessoas mais pobres no Brasil precisariam usar 8% de sua renda mensal para comprar apensas 1GB de dados”[61].

A referida exclusão digital impacta no exercício de diversos outros direitos, tendo inclusive sido objeto de resolução da ONU, que apontou o direito ao acesso à Internet, como um direito humano fundamental[62].

Num relatório, a Organização das Nações Unidas, afirma que o acesso à internet é um direito humano e exorta os governos a outorgarem esse direito às populações. O relatório critica países como a França e Reino Unido que aprovaram leis para limitarem o acesso à rede de certas pessoas que não cumprem acordos de direitos de autor na web, e também países que impedem o acesso às redes sociais para reduzir protestos da população contra os governos. A ONU incentiva todos os países a manter e a promover este direito, mesmo durante períodos de instabilidade política e pede que abandonem a tendência legislativa de direitos de propriedade intelectual como pretexto para excluir e banir os internautas. O documento é revelado no mesmo dia em que uma empresa de vigilância da internet informou que dois terços do acesso à internet na Síria desapareceram o que terá sido uma decisão do governo do país para pôr fim às manifestações da população[63].

No Brasil, há inclusive proposta de emenda constitucional nº 185/15, que acrescenta o inciso LXXIX ao art. 5º da CRFB/88, para assegurar a todos o acesso universal à Internet entre os direitos fundamentais do cidadão, cujo relatório da (CCJC)[64] destaca que muitos direitos dos cidadãos são cada vez mais dependentes das tecnologias de informação e comunicação.

Portanto, a lógica protetiva da dimensão instrumental do mínimo existencial, atrelada ao fornecimento de um acesso à Internet gratuita, tem por finalidade assegurar “um padrão mínimo social” para uma sobrevivência digna[65], bem como não permitir que parcela significativa da população adentre em processo de exclusão de direitos, pois esses mesmos direitos “são construções e conquistas de cunho histórico e devem corresponder às novas necessidades e realidades que surgem nas sociedades hodiernas, em constante e profundo processo de transformação”[66].

7  Considerações Finais

A considerar todas as análises jurídicas possíveis relativas à efetividade dos direitos, sempre se encontram o relevante papel e a titularidade do Estado na implementação, salvaguarda e proteção do mínimo existencial, como conteúdo de direitos fundamentais e sociais, ainda que decorrentes de direitos prestacionais efetivamente implementados.

Por mais que se priorize a maximização da interpretação acerca do conteúdo e do limite do que seja mínimo existencial, não se defende utopicamente uma valoração que desconsidere o necessário e prévio balanceamento entre valores inegociáveis, de modo a permitir se extrair o resultado de um mínimo existencial adequado, como resultado de um inevitável balanceamento.

Desta forma, mecanismos de balanceamento para equalização do mínimo existencial, somados a fenômenos sociais de uma realidade em constante movimento, permitem tanto a delimitação do mínimo existencial, como também sua adequada adaptação para a tutela de uma realidade em intensa transformação.

Desse modo, para além da exemplificativa defesa da tutela jurídica de um mínimo existencial do “acesso à Internet”, como um novo elemento que permeia condicionalmente a valoração da essência de direitos fundamentais, o que, verdadeiramente, desejou-se demonstrar é a existência de mecanismos adequados e suficiência para a tutela dos mínimos existenciais de uma sociedade em acelerado processo de transformações sociais.  

Portanto, o desdobramento de tal raciocínio jurídico exige que haja um direcionamento de políticas públicas que assegurem um padrão de proteção social mínimo, que reflita instrumental e adequadamente a equivalência da alocação de recursos públicos e a proporcional efetividade dos direitos.

8  REFERÊNCIAS

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Notas de Rodapé

[1]     Pós-doutorando em Direito pela UNIFESP, Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), São Paulo, Brasil. Mestre em Direito pela Faculdade Autônoma de Direito (FADISP). Professor de Direito da Seguridade Social da UNIVAP. Defensor Público Federal. E-mail: marcusvrlima@gmail.com. ORCID http://rcid.org/0000-0001-7284-6716.

[2]     Sarlet, Ingo Wolfgang, Zockun, Carolina Zancaner, “Notas sobre o mínimo existencial e sua interpretação pelo STF no âmbito do controle judicial das políticas públicas com base nos direitos sociais”, Revista de Investigações Constitucionais, Curitiba, vol. 3, n. 2, pp. 115-141, maio/ago. 2016, p. 117. DOI: http://dx.doi.org/10.5380/rinc.v3i2.46594.

[3]     Onu, Organização das Nações Unidas, Declaração Universal dos Direitos Humanos, disponível em: https://brasil.un.org/pt-br/91601-declara%C3%A7%C3%A3o-universal-dos-direitos-humanos acessado em: 10 br. 2023.

[4]     Petry, Alexandre Torres, “Mínimo existencial e sua relação com o consumidor”, Revista Da Faculdade De Direito De São Bernardo Do Campo, v. 19, 2014.

[5]     Sarlet, Ingo Wolfgang, Kronbauer, Eduardo Luís, “Mínimo existencial, assistência social e Estado de Direito – análise de decisão proferida pelo Tribunal Constitucional Federal da Alemanha”, Revista de Direito, Santa Cruz do Sul, nº 63, pp. 02-25, jan. 2021, pp. 6-12.

[6]     Sarlet, Ingo Wolfgang, Zockun, Carolina Zancaner, “Notas sobre o mínimo existencial e sua interpretação pelo STF no âmbito do controle judicial das políticas públicas com base nos direitos sociais”, Revista de Investigações Constitucionais, Curitiba, vol. 3, n. 2, pp. 115-141, maio/ago. 2016, p. 120. DOI: http://dx.doi.org/10.5380/rinc.v3i2.46594.

[7]     Torres, Ricardo Lobo, O direito ao mínimo existencial, Imprensa, Rio de Janeiro, Renovar, 2009, p. 37.

[8]     Caliendo, Paulo Antônio, Direito tributário e análise econômica do direito, Rio de Janeiro, Elsevier, 2009, p. 201.

[9]     Torres, Ricardo Lobo, O direito ao mínimo existencial, Imprensa, Rio de Janeiro, Renovar, 2009, p. 35.

[10]    Torres, Ricardo Lobo, O direito ao mínimo existencial, Imprensa, Rio de Janeiro, Renovar, 2009, p. 37.

[11]    Torres, Ricardo Lobo, “O mínimo existencial como conteúdo essencial dos direitos fundamentais”, Revista Fórum de Direito Financeiro e Econômico – RFDFE, Belo Horizonte, ano 1, n. 1, pp. 147-173, mar/ago. 2012, p 148.

[12]    Sarlet, Ingo Wolfgang, “Direitos fundamentais sociais, mínimo existencial e direito privado”, Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, v. 61, pp. 90-125, jan.-mar. 2007, p. 90.

[13]    Sarlet, Ingo Wolfgang et. al., Direitos Fundamentais: orçamento e “reservado possível”, 2ª ed., Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2013, p. 251.

[14]    Considerando a amplitude do conceito de mínimo existencial, que inclusive abarca o conceito de mínimo vital, para o presente artigo, adotou-se a aquela terminologia que melhor tutela os direitos sociais na amplitude dos direitos, até porque “nem só de pão vivem o homem”.

[15]    Cabe aqui relatar a introdução normativa do elemento mínimo existencial incluso na Lei nº 14.181/21, que disciplina a tutela, prevenção e tratamento dos superendividados.

[16]    Art. 3º, III, da CRFB/88.

[17]    Art. 170 da CRFB/88.

[18]    Torres, Ricardo Lobo, O direito ao mínimo existencial, Imprensa, Rio de Janeiro, Renovar, 2009, p. 39.

[19]    Botelho, Catarina Santos, Os direitos Sociais em tempo de Crise, Edições Almedina S/A, agosto de 2017, p. 116.

[20]    Essa geração tem como objeto principal a clássica ideia de liberdade individual, centrada nos direitos civis e políticos, que são absorvidos e conquistados mediante uma abstenção do controle do Estado.

[21]    Watanabe, Kazuo, Acesso à ordem jurídica justa: conceito atualizado de acesso à justiça, processos coletivos e outros estudos, Belo Horizonte, Del Rey, 2019, p. 219.

[22]    Mendes, Fernando Ribeiro, Segurança Social: o futuro hipotecado, Editora Fundação Francisco Manuel dos Santos e Fernando Ribeiro Mendes, janeiro de 2011, pp. 114-115.

[23]    Holmes, Stephen; Sunstein, Cass Robert, The cost of Rights: Why libert depends on taxes, New York City, W. W., Norton & Company, 2000.

[24]    Wang, Daniel Wei Liang, “Escassez de recursos, custos dos direitos e reserva do possível na jurisprudência do STF”, Revista Direito GV – São Paulo, 4(2), pp. 539-568, jul – dez 2008, p. 540.

[25]    Espinoza, Danielle Sales Echaiz, “A doutrina do mínimo existencial”, Interfaces Científicas – Humanas e Sociais, Aracaju, V. 6, N. 1, p. 101-112, jun. 2017, p. 101.

[26]    bauman, Zigmunt.; bordoni, Carlos, Estado de Crise. 1ª ed., Rio de Janeiro, Zahar, 2016. Tradução Renato Aguiar, p. 22.

[27] Horvath Jr., Miguel, “Teorias disruptivas uma contextualização previdenciária-laboral”, in Almeida, Tatiana Conceição Fiore de, Uma crise além dos direitos sociais, Campinas, SP, Lacier Editora, 2021, p. 133.

[28]    Pichel, Mar, “Capitalismo da Sardinha: como Portugal foi de país falido a exemplo na Europa”, BBC News Mundo, 2021, disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/internacional-58896600>, acessado em: 25 maio 2022.

[29]    Hesse, Konrad, A força normativa da Constituição (Die normative kraft der verfassung), Porto Alegre, Sergio Antonio Fabris Editor, 1991. Tradução: Gilmar Ferreira Mendes, p. 29.

[30]    Pinheiro, Alexandre Souza, “A jurisprudência da crise: Tribunal Constitucional português (2011-2013)”. Observatório da Jurisdição Constitucional, Brasília: IDP, ano 7, n. 1, jan/jun. 2014, p. 187.

[31]    Oliveira, Fábio Corrêa Souza de, Morte & vida da Constituição Dirigente, Rio de Janeiro, Lúmen Júris, 2010, p. 385.

[32]    Sarmento, Daniel, “O mínimo existencial”, Revista de Direito da Cidade, v. 08, n. 4, p. 1671, 2016.

[33]    Sarlet, Ingo Wolfgang. Timm, Luciano Benetti, Direitos Fundamentais: orçamento e “reservado possível”, 2. ed., Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2013, p. 30.

[34]    Schwartz, Fabio, “A Defensoria Pública e a proteção dos (hiper)vulneráveis no mercado de consumo”, Conjur, 2016, disponível em: <https://www.conjur.com.br/2016-jul-19/protecao-hipervulneraveis-mercado-consumo>, acessado em: 17 mar. 2022.

[35]    Pessoa, Rodrigo Monteiro, El mínimo vital en Chile, Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2020, p. 97.

[36] Es claro que toda la preocupación con los mínimos vino a favor de las personas más vulnerables, pero esto no significa que el mínimo vital deba ser tutelado solamente para ellos. Las discusiones parten de ahí, pero no es su punto de llegada. El mínimo vital es debido a todos y su tutela comprende todas las personas bajo la protección estatal.

[37]    Torres, Ricardo Lobo, O direito ao mínimo existencial, Imprensa, Rio de Janeiro, Renovar, 2009, p. 84.

[38]    Torres, Ricardo Lobo, “O mínimo existencial como conteúdo essencial dos direitos fundamentais”, Revista Fórum de Direito Financeiro e Econômico – RFDFE, Belo Horizonte, a. 1, n. 1, p. 150, mar/ago. 2012.

[39]    Barcellos, Ana Paula de, A eficácia jurídica dos princípios constitucionais: o princípio da dignidade da pessoa humana, 3. ed., Rio de Janeiro, Renovar, 2002, p. 14.

[40]    Barcellos, Ana Paula de, A eficácia jurídica dos princípios constitucionais: o princípio da dignidade da pessoa humana, 3. ed., Rio de Janeiro, Renovar, 2002, p. 259.

[41]    Sarlet, Ingo Wolfgang, Kronbauer, Eduardo Luís, “Mínimo existencial, assistência social e Estado de Direito – análise de decisão proferida pelo Tribunal Constitucional Federal da Alemanha”, Revista de Direito, Santa Cruz do Sul, n. 63, p. 02-25, jan. 2021.

[42]    Sarmento, Daniel, “O mínimo existencial”, Revista de Direito da Cidade, v. 08, n. 4, p. 1644-1689, 2016.

[43]    Torres, Ricardo Lobo, “O mínimo existencial como conteúdo essencial dos direitos fundamentais”, Revista Fórum de Direito Financeiro e Econômico – RFDFE, Belo Horizonte, ano 1, n. 1, p. 155, mar/ago. 2012.

[44]    Alexy, Robert, Teoria dos direitos fundamentais, São Paulo, Malheiros, 2008. Trad. Virgílio Afonso da Silva, p. 512.

[45]    Botelho, Catarina Santos, Os direitos Sociais em tempo de Crise, Edições Almedina S/A, agosto de 2017, p. 141.

[46]    Horvath Jr., Miguel, “A Sociedade de Informação e a Tributação de Robôs”, in Almeida, Tatiana Conceição Fiore de, Novas tecnologias e interações entre o direito, a saúde e sociedade, Campinas SP, Lacier Editora, 2022, p. 15.

[47]    O termo foi cunhado pelo sociólogo Ray Oldenburg e se refere a lugares onde as pessoas passam o tempo entre a casa (“primeiro” lugar) e o trabalho (“segundo” lugar). São espaços onde as pessoas trocam ideias, se divertem e estabelecem relacionamentos. Igrejas, cafés e parques são exemplos de “Terceiro Lugar”. Ter um terceiro lugar para socializar fora de casa e do trabalho é crucial para o bem-estar, pois traz um sentimento de conexão e pertencimento. E os videogames são cada vez mais um “Terceiro Lugar”. Historicamente, as atividades e o desenvolvimento da comunidade eram offline, mas graças aos avanços da tecnologia os videogames se tornaram sociais. (Ravache, Guilherme, “Metaverso pode ser nova Internet e vira prioridade das Big Techs”, MIT Tecnology Review, Publicado em 10 setembro de 2021, disponível em: <https://mittechreview.com.br/metaverso-pode-ser-nova-internet-e-vira-prioridade-das-big-techs/>, acessado em: 18 mar. 2022).

[48] Horvath Jr., Miguel; Silva, Roberta Soares da, “Direitos Humanos e pessoa com deficiência: visão integrativa”, in Costa-Corrêa, André L. e outros organizadores, Direitos e garantias fundamentais: novas perspectivas, 1. ed. Birigui, SP, Boreal Editora, 2015, p. 215.

[49] Galanter, Marc, “O acesso à justiça em um mundo em capacidade social em expansão”, Revista Brasileira de Sociologia do Direito, Porto Alegre, ABraSD, v. 2, n. 1, p. 37, jan./jun., 2015.

[50]    Calabresi, Guido, Bobbitt, Philip Chase, Tragic Choices, W. W. Norton &Company, 1978, p. 49-50.

[51]    The pure market attempts to resolve conflicts in tragic situations by according pre -eminence to individual expressions of wants. It falis because the summing up of such experssions fails to accommodate social goals and fails even to represent what individuals want. Its operation runs counter to some important concepcions of egalitarianism and it too clearly prices that to which we shoul like to ascribe infinite value. An accountable political process does not succeed because it cannot readily give effect to indivisual desires. It is also flawed, as it straightforwardly involves the whole society, the state, in preferring some individuals to others and in choosing to discard qhat ideally we would assert to be inalienable. (Calabresi, Guido, Bobbitt, Philip Chase, Tragic Choices, W. W. Norton &Company, 1978, pp. 49-50).

[52]    Nussbaum, Martha C, “The cost of tragedy: some moral limits of cost-benefit analysis”, in Adler, Matthew D, Posner, Eric A. et al., Cost-Benefit Analysis: Economic, Philosophical, and Legal Perspectives, Chigago, University of Chicago Press Journals, 2001, p. 169.

[53]    Nesse sentido, A Lei nº 13.655/2018, que alterou a Lei de Introdução ao Código Civil, prevê, em seu artigo 20, novos critérios que vinculam a tomada de decisões a escolhas que analisem as consequências do caso concreto, em razão da motivação que reporte à necessidade e adequação na própria escolha.

[54]    O cenário se repete em inúmeras cidades brasileiras, sobretudo nas capitais: são centenas de barracas, enfileiradas em largas avenidas, debaixo de marquises, túneis, viadutos. Famílias inteiras, com crianças, estão vivendo nas ruas. A população em situação de rua no Brasil não apenas cresceu em ritmo avassalador com a crise econômica e social do país em meio à pandemia, nos últimos dois anos, mas também mudou drasticamente de perfil. De acordo com pesquisas acadêmicas recentes e informações do Movimento Nacional da População de Rua (MNPR), as mulheres, e consequentemente crianças, passaram a ser um contingente bastante expressivo dessa população. O único dado oficial mais recente, mas que ainda se trata de uma projeção, foi divulgado em março de 2020 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea): 221.869 brasileiros viviam nas ruas naquele ano, o equivalente a cerca de 0,1% da população total do país. Para o MNPR, cerca de meio milhão de brasileiros podem estar morando nas ruas hoje, especialmente por falta de condições financeiras para pagar moradia. (Delgado, Malu, “Brasil tem “boom’ de população de rua, que segue invisível”, DW, 2012, disponível em: <https://www.dw.com/pt-br/brasil-tem-boom-de-popula%C3%A7%C3%A3o-de-rua-que-segue-invis%C3%ADvel-para-o-poder-p%C3%BAblico/a-61135058>, acessado em: 20 mar. 2022).

[55]    Rede Pensssan. II Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da COVID-19 no Brasil [livro eletrônico], in II VIGISAN: relatório final/Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar – PENSSAN, São Paulo, SP, Fundação Friedrich Ebert, Rede PENSSAN, 2022, (Análise; 1) PDF, disponível em: <https://olheparaafome.com.br/wp-content/uploads/2022/06/Relatorio-II-VIGISAN-2022.pdf>, acessado em: 10 jun. 2022.

[56]    Propositalmente, o enfoque instrumental da referência ao mínimo existencial não apresentará como objeto principal de análise e aprofundamento a questão do acesso à justiça, pois esse recorte, com inovação, será objeto de tese a ser desenvolvida como conclusão do Doutorado da PUC-SP.

[57]    Medici, Fernando Herique, Horvath Jr., Miguel, “Direitos Previdenciários e o Princípio da Justiça Intergeracional”, in Fernandes, Ana Paula e outros, Nova perspectiva do direito previdenciário, 1ª ed. Belo Horizonte, Editora IEPREV, 2021, p. 93.

[58]    Supremo Tribunal Federal, STF, RE 769667/ AgR/CE – CEARÁ, Relator Min. Celso de Melo, Julgamento 22/10/2013, Publicado em 13/12/2013, disponível em: <https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur251525/false>, acessado em: 20 mar. 2022.

[59]    Es claro que toda la preocupación con los mínimos vino a favor de las personas más vulnerables, pero esto no significa que el mínimo vital deba ser tutelado solamente para ellos. Estado social – que promueve el bien común y los derechos fundamentales en todas sus generaciones – existe un deber del ente público de tutelar lo que es considerado como esencial para la vida digna de todos bajo su protección. (Pessoa, Rodrigo Monteiro, El mínimo vital en Chile, Editora Lumen Juris, Rio de Janeiro, 2020, p. 97).

[60]    Pessoa, Rodrigo Monteiro, El mínimo vital en Chile, Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2020, p. 97.

[61]    Mari, Angelica, “Conectividade para quem? Custo de internet é alto demais para 60% dos brasileiros”, Fobes Tech, 2020, disponível em: <https://forbes.com.br/forbes-tech/2020/12/conectividade-para-quem-custo-de-internet-e-alto-demais-para-60-dos-brasileiros/>, acessado em: 22 mar. 2022.

[62]    Uneca, Abel Akara Ticha, “Cerca de 2,9 bilhões de pessoas nunca usaram a internet por falta de acesso”, ONU News, disponível em: <https://news.un.org/pt/story/2021/12/1772182%20>, acessado em: 19 maio 2022.

[63]    Euronews, Acesso à internet é um direito humano diz ONU, publicado em 05/07/2016, disponível em: <https://pt.euronews.com/2016/07/05/acesso-a-internet-e-um-direito-humano-diz-onu>, acessado em: 20 mar. 2022.

[64]    Câmara dos Deputados, PEC 185/2015, Proposta de Emenda à Constituição, disponível em: <https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2075915>, acessado em: 20 mar. 2022.

[65]    HORVATH JÚNIOR, Miguel; SANTOS, Aline Fagundes dos. “O sistema de seguridade social no Brasil como importante alicerce para a efetivação dos direitos sociais”, disponível em: <https://www.revistaconsinter.com/index.php/ojs/article/view/365/711>, acessado em 31 ago. 2023.

[66]    Câmara dos Deputados, PEC 185/2015, Proposta de Emenda à Constituição, disponível em: <https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2075915>, acessado em: 20 mar. 2022.