CONSTITUTIONAL REFORM FOR THE RATIFICATION OF INTERNATIONAL HUMAN RIGHTS TREATIES: THE FAILURE OF THE CONSTITUTIONAL AMENDMENT 45/2004

DOI: 10.19135/revista.consinter.00005.22

Eduardo Manuel Val[1]

Paulo José Pereira Carneiro Torres da Silva[2]

Resumo: O presente artigo noticia resultados parciais de uma pesquisa exploratória que vem sendo realizada no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Direito, PPGD-UNESA/RJ dentro do grupo de pesquisa “Observatório do Acesso à Justiça na Ibero América” (OAJI) e tem como objetivo analisar criticamente o procedimento de internalização dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos no ordenamento jurídico-constitucional brasileiro segundo o procedimento estabelecido pela Emenda Constitucional nº 45 particularmente no que tange à sua efetividade na integração destes instrumentos de Direitos Humanos em uma “hierarquia normativa forte” como denominam-se as Emendas Constitucionais. Este trabalho investiga a hipótese que o procedimento da Emenda Constitucional nº 45, parágrafo 3º, tem prejudicado a incorporação dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos e para testar tal proposição vale-se de metodologia qualitativa apoiada na revisão bibliográfica, aliada à análise indutiva, partindo da observação de fatos concretos – tais como o tratamento dado a Convenção para Proteção dos Portadores de Deficiência (2004) e a Convenção interamericana de Proteção dos direitos das Pessoas Idosas (2015) – em direção a reflexões sobre caminhos para uma maior eficácia da proteção de Direitos Humanos protegidos pela ratificação de Tratados Internacionais.

Palavras-chave: Reforma Constitucional; Emenda Constitucional Nº 45/2004; Direitos Humanos; Direito Internacional; Acesso à Justiça.

Abstract: This article reports partial results of an exploratory research carried out within the scope of the UNESA/RJ Law Post Graduation Program within the research group “Justice Access Observatory in Iberoamerica” and aims to critically analyze the procedure of internalization of the International Human Rights Treaties in the Brazilian legal-constitutional system according to the procedure established by Constitutional Amendment Nº. 45, particularly with regard to its effectiveness in integrating these human rights norms into a “strong” constitutional hierarchy. This paper investigates the hypothesis that the procedure of Constitutional Amendment No. 45 has hindering the incorporation of the international human rights treaties and to confirm this proposition the research is based on a qualitative methodology supported by the bibliographic review, combined with the inductive analysis, based on the observation of concrete facts such as the treatment dispensed to the Convention on the Rights of Persons with Disabilities (2004) and to the Inter-American Convention on Protecting the Human Rights of Older Persons in order to seek reflections on ways to increase the effectiveness of the protection of Human Rights protected by the Ratification of International Treaties.

Keywords: Constitutional Reform; Constitutional Amendment Nº 45/2004; Human rights; International right; Justice Access.

1 INTRODUÇÃO

O processo de redemocratização pelo qual transitou o Brasil a partir de 1985, após a ruptura com o regime de exceção até então vivido no país, promoveu uma participação mais intensa nos debates acerca da Proteção Internacional dos Direitos Humanos e especificamente do subsistema regional interamericano, fazendo com que fossem ratificados, em consonância com a nova narrativa constitucional sobre direitos fundamentais presente na Constituição Federal (1988), tratados de grande relevância, como a Convenção Contra a Tortura e Outros Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes, ratificada pelo Brasil em setembro de 1989 e promulgada pelo Decreto 40 de fevereiro de 1991, sendo este o primeiro tratado internacional de Direitos Humanos ratificado na era democrática.

Nesta esteira de internacionalização da proteção dos Direitos Humanos, um debate muito frequente à época, girava em torno da possibilidade de incorporação destes mesmos Tratados Internacionais de Direitos Humanos no plano interno, em nível constitucional ou infraconstitucional.

Neste sentido, diversos foram os posicionamentos acerca da matéria, indo desde posturas mais progressistas, como a sustentada por Celso Duvivier de Albuquerque Mello (1999, p. 25-26), para quem os tratados internalizados possuíam status de norma supraconstitucional, ou mesmo, conforme descrito por Antônio Augusto Cançado Trindade (1998, p. 88-89) e Flávia Piovesan (1996, p. 83), de que tais instrumentos possuiriam hierarquia de norma materialmente constitucional; até mesmo posicionamentos mais conservadores, como a manutenção do entendimento jurisprudencial que precedeu a promulgação da constituição de 1988 de que seriam meras normas infraconstitucionais de equiparáveis à lei federal, como consignado no julgamento do Recurso Extraordinário 80.004/SE, ocorrido em 1º de junho de 1977 ou, o posicionamento do Supremo Tribunal Federal depreendido do voto do Ministro Gilmar Mendes que, em fevereiro de 2007, no julgamento do habeas corpus n. 90.172 atribuiu aos tratados internalizados hierarquia de norma supralegal – embora infraconstitucional.

Na esteira desta discussão, o Poder Constituinte Reformador[3] promulga a Emenda Constitucional 45 de 2004, que, dentre outras disposições, adiciona o § 3º ao art. 5º da CF/88, dispondo que “os tratados e convenções internacionais sobre Direitos Humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais” (BRASIL, 2004).

Após a inclusão do referido parágrafo outras discussões de cunho eminentemente técnico foram suscitadas, como o tratamento a ser dispensado aos tratados de direito internacional anteriormente ratificados, mas que não obedeceram – por razões óbvias – ao rito estabelecido pela Emenda 45/2004, entretanto, para além da ausência de respostas conclusivas a respeito destes questionamentos, o fato é que pouco se debate a respeito da efetividade do procedimento de incorporação dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos ao ordenamento jurídico constitucional, conforme estabelecido pela Emenda 45/2004 em termos de verificar se este dispositivo foi útil na incorporação hierarquizada dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos.

A potencialidade de promover a efetividade dos Direitos Humanos na ordem interna através das contribuições do sistema interamericano de proteção aos Direitos Humanos fica prejudicada quando os Tratados Internacionais não são incorporados com “uma hierarquia constitucional forte”.

De fato, quase treze anos após a aprovação da Emenda Constitucional 45/2004, apenas uma convenção foi incorporada com essa hierarquia, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2007), de maneira que é de suma importância que se desenvolva um profundo debate acerca do procedimento mais adequado para a incorporação de Tratados Internacionais de Direitos Humanos.

Desta feita, a hipótese que se pretende verificar com o presente artigo é que o procedimento da Emenda Constitucional 45/2004 tem prejudicado a incorporação dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos se constituindo em um obstáculo que embarreira a recepção constitucional de um direito internacional dos Direitos Humanos dinâmico e em permanente avanço, tanto na esfera internacional quanto regional, e que a solução para tal problema reside em uma nova reforma constitucional que venha a solucionar o dilema da incorporação dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos com uma nova sistemática de recepção, a exemplo do modelo adotado, por exemplo, pela Argentina no seu art. 75, inc. 22, da Reforma Constitucional de 1994[4].

O objeto central deste artigo, portanto, é a análise crítica da incorporação dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos segundo o procedimento estabelecido pela Emenda Constitucional 45/2004, § 3º, a fim de obter um melhor aproveitamento analítico do panorama jurídico-constitucional, o tratamento da temática será feito em três partes:

No primeiro tópico o presente artigo cuida de explorar as bases teóricas sob as quais se construiu – tanto legislativa quanto jurisprudencialmente – o procedimento de incorporação destes tratados; em ato contínuo será analisada a experiência pretérita da incorporação da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2004), único tratado ratificado desde a promulgação da emenda que foi efetivamente incorporado ao ordenamento jurídico constitucional com natureza de Emenda à Constituição; por fim, para vislumbrar as potencialidades e as vicissitudes do procedimento estabelecido, realizar-se-á, um estudo de caso de uma legislação recém-assinada que versa sobre proteção internacional dos Direitos Humanos – a Convenção Interamericana sobre Proteção dos Direitos Humanos das Pessoas Idosas (2015) – em um exercício ao mesmo tempo crítico e prospectivo do processo como posto.

Trata-se de pesquisa exploratória desenvolvida como parte dos trabalhos realizados no âmbito do PPGD-UNESA/RJ dentro do grupo de pesquisa OAJI, dos quais os autores são, respectivamente, líder e pesquisador, e que tem por objetivo último investigar as condições de acesso real à Justiça na Ibero-América por grupos de alta vulnerabilidade.

Para alcançar os objetivos perseguidos, adota-se o método qualitativo apoiado na revisão bibliográfica, aliado à análise indutiva, partindo da observação de fatos concretos para buscar reflexões sobre caminhos para uma maior eficácia da proteção de Direitos Humanos protegidos pela ratificação de Tratados Internacionais. Ademais, destaca-se que a própria natureza exploratória deste artigo pressupõe conclusões parciais acerca da temática proposta que servirão de substrato para o desenvolvimento de pesquisas progressivamente mais sólidas a respeito da temática.

2 CONSIDERAÇÕES SOBRE A INCORPORAÇÃO DE TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS SOB A ÉGIDE DA EMENDA CONSTITUCIONAL 45/2004

Antes da edição da Emenda Constitucional 45 a Constituição Federal Brasileira de 1988 dispunha – de maneira muito tímida – acerca dos efeitos dos Tratados Internacionais no plano interno, se limitando a esclarecer que os direitos e garantias expressos na Constituição não excluem outros decorrentes dos Tratados Internacionais, sem, no entanto, tecer quaisquer considerações acerca da hierarquia entre estes tratados e as normas de direito interno ou mesmo sobre diferentes hierarquias possíveis para tratados de naturezas diferentes.

Inobstante, diversos tratados foram assinados e ratificados neste período, alguns, inclusive, versando sobre proteção de Direitos Humanos, o que fez com que a doutrina e a jurisprudência precisassem responder questões acerca justamente da hierarquia destes tratados – sobretudo aqueles versando sobre proteção aos Direitos Humanos – no ordenamento jurídico-constitucional.

Assim, tal como destacado na introdução, foram quatro as principais correntes a respeito da temática: os tratados internalizados possuiriam status de norma supraconstitucional; de norma materialmente constitucional; hierarquia de norma supralegal – embora infraconstitucional e; meras normas infraconstitucionais de equiparáveis à lei federal.

Não cabe no escopo do presente trabalho, em especial dadas às limitações de páginas sugeridas pelo edital de convocação, um escorço histórico detalhado acerca dos fundamentos de cada uma das correntes existentes antes da promulgação da Emenda Constitucional nº 45, sobretudo quando o foco é analisar os resultados decorrentes justamente da promulgação da referida emenda, ao contrário, optou-se por conhecer e enunciar a multiplicidade de posicionamentos e afirmar a insegurança jurídica por eles trazida.

A partir de 8 de dezembro de 2004, com a promulgação da emenda que promoveu a chamada “reforma do judiciário”, o art. 5º da Constituição Federal passara a vigorar acrescido de um § 3º que assim dispunha:

Os tratados e convenções internacionais sobre Direitos Humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.

Embora inicialmente possa parecer que o acréscimo do referido parágrafo punha fim à miríade de posicionamentos a respeito da hierarquia dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos no ordenamento jurídico-constitucional interno, o fato é que isso só é verdade para os tratados ratificados a partir da promulgação da Emenda e que respeitem o rito por ela estabelecido. Neste sentido, esclarece Amaral Júnior (2005a.):

Portanto, os tratados ou convenções internacionais sobre Direitos Humanos que sejam – ou melhor, desde que sejam – recepcionados nos termos do processo de aprovação das emendas constitucionais (art. 60 da Constituição de 1988) terão o status das normas constitucionais. Por outro lado, os tratados ou convenções internacionais sobre Direitos Humanos recepcionados segundo o mecanismo usual de recepção – aquele por meio de decreto legislativo – terão, ou melhor, continuarão a ter, induvidosamente, força de lei ordinária.

Contrariando esta linha de pensamento de que apenas os instrumentos jurídicos internacionais aprovados com o mesmo procedimento e quórum qualificado exigido para a aprovação de uma emenda constitucional sustenta Rezek (2008, p. 103):

É sensato crer que ao promulgar esse parágrafo na Emenda constitucional 45, de 8 de dezembro de 2004, sem nenhuma ressalva abjuratória dos tratados sobre Direitos Humanos outrora concluídos mediante processos simples, o Congresso constituinte os elevou à categoria dos tratados de nível constitucional.

Em síntese, o que se percebe a partir da análise fática do cenário legislativo desvelado após a promulgação da Emenda Constitucional 45 é que a natureza do tratado deixa de ser central na determinação de sua hierarquia dentro do ordenamento jurídico constitucional. Tal afirmativa é possível uma vez que inobstante se tratarem de instrumentos jurídicos internacionais que versam eminentemente sobre Direitos Humanos, no presente cenário, o que efetivamente define sua hierarquia é a data de sua ratificação bem como o procedimento adotado para tanto.

Para que possamos ampliar esta discussão, propõem-se quatro diferentes situações envolvendo tratados sobre Direitos Humanos:

Aquele ratificado antes da promulgação da Emenda Constitucional nº 45 gozará da hierarquia a ele atribuída quando de sua internalização[5] (caso já tenha sido apreciada esta questão pelo STF[6], por exemplo); já o que foi ratificado sob a égide da supramencionada emenda e segundo seus preceitos será como se emenda fosse; se, ao contrário, for ratificado após a promulgação da emenda, mas não respeitar o quórum por ela estabelecido será internalizado em nosso ordenamento jurídico, mas não gozará da hierarquia constitucional; por fim, é possível que um tratado assinado venha a ser apreciado pelo Congresso Nacional respeitando todos os ditames do § 3º do art. 5º da Constituição Federal, mas que não venha a ser Ratificado pelo poder Executivo, eis que é deste a competência privativa para fazê-lo, segundo o art. 84 inc. VIII da Constituição Federal. Neste caso, embora o instrumento não se aperfeiçoe no plano internacional, como foram cumpridas todas as etapas previstas no § 3º do art. 5º da Constituição Federal vigerá como norma constitucional a partir da simples promulgação de seu respectivo Decreto Legislativo.

Por esta simples exposição torna-se fácil perceber que a Emenda não teve o condão de simplificar ou mesmo pacificar a recepção de Tratados Internacionais de Direitos Humanos pelo ordenamento jurídico interno, pelo contrário, após sua promulgação tornou-se possível que tratados com essa mesma natureza coexistam no ordenamento jurídico interno em graus de hierarquia absolutamente distintos, ignorando-se o fato de que o fio condutor que sugere a necessidade da recepção sob um estrato hierárquico “forte” não é a forma de recepção da norma, mas sim a sua natureza protetiva dos Direitos Humanos.

Para além destas críticas, é preciso consignar que o procedimento estabelecido como necessário para a integração do Tratado assinado como Emenda Constitucional sujeita a própria ratificação à vontade política do Congresso Nacional, e, conforme demonstrar-se-á ao longo do presente trabalho, a tramitação dos textos convencionais nestas casas nem sempre atende ao melhor interesse da sociedade.

3 O MARCO DA CONVENÇÃO SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA (2004)

Assinada pela República Federativa do Brasil em 30 de março de 2007, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência foi internalizada no ordenamento brasileiro pelo Decreto Legislativo 186/2008, nos termos prescritos pelo art. 5º, § 3º, da Constituição Federal, o que concedeu ao normativo legal força de Emenda Constitucional, adquirida eficácia plena no ano seguinte, com a promulgação do Decreto 6.949/2009, apesar de sua eficácia automática por determinação constitucional (art. 5º, § 1º).

Para que se compreenda a complexidade e o lapso temporal que circunscreve tal tramitação, é preciso analisar minuciosamente o feito em questão, o que se faz a seguir:

Apesar de, conforme narrado, a referida Convenção ter sido assinada pelo Brasil em 30 de março de 2007, o processo de incorporação da norma pelo ordenamento jurídico-constitucional brasileiro teve início com a apresentação, em 02.10.2007, da mensagem MSC 711/2007, na qual o Presidente da República transmitia ao Congresso Nacional os termos da Exposição de Motivos nº 00200 MRE, na qual o Ministro de Estado das Relações Exteriores, Celso Luiz Nunes Amorim, destacava o especial “interesse do Poder Executivo em vê-los [a Convenção e seu Protocolo Facultativo] incorporados ao ordenamento jurídico brasileiro om equivalência a emenda constitucional[7].

Tais recomendações fizeram com que a proposição fosse incluída na pauta da Câmara dos Deputados em regime urgente de tramitação, conforme determinado pelo art. 155 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados:

Art. 155. Poderá ser incluída automaticamente na Ordem do Dia para discussão e votação imediata, ainda que iniciada a sessão em que for apresentada, proposição que verse sobre matéria de relevante e inadiável interesse nacional, a requerimento da maioria absoluta da composição da Câmara, ou de Líderes que representem esse número, aprovado pela maioria absoluta dos Deputados, sem a restrição contida no § 2º do artigo antecedente.

Assim o processo de ratificação por parte do Congresso Nacional somente se iniciou efetivamente em 23.11.2007 com a constituição da Comissão Especial para apreciação do texto da mensagem bem como do teor do texto convencional.

Em 13.05.2008 foi apresentado e aprovado o Projeto de Decreto Legislativo de Acordos, tratados ou atos internacionais 563/2008 elaborado pela Comissão especial que “aprova o texto da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007”, projeto este que foi votado em dois turnos conforme determina a Emenda Constitucional 45 (em 13.05.2008 e 27.05.2008) sendo, em seguida encaminhado ao Senado Federal em 04.06.2008.

No Senado Federal, por sua vez, a matéria foi julgada em primeiro turno em 02.07.2008 e em segundo turno na mesma data, sendo publicado, por fim, o Decreto Legislativo 186/2008 em 10.07.2008 e retificado – em razão de um erro material – em 20.08.2008, adquirida eficácia plena no ano seguinte, com a promulgação do Decreto 6.949/2009 em 25 de agosto de 2009.

É importante salientar que o procedimento analisado teve seu pedido de urgência na tramitação deferido, ainda assim, entre a assinatura do tratado e a promulgação do Decreto Federal, quatro outras emendas constitucionais foram promulgadas (são as emendas: 54, 55, 56 e 57), sendo certo que nenhuma delas versa sobre incremento substantivo ao arcabouço dos Direitos Humanos.

Para efeitos de comparação, a Emenda Constitucional 57, cuja concretização se consubstanciou a partir da PEC 12/2004 de origem no Senado Federal, cujo substitutivo proposto pela Câmara dos Deputados tramitou sob o número PEC 495/2006 apresentada e que tinha como objetivo acrescentar artigo ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias para convalidar os atos de criação, fusão, incorporação e desmembramento de Municípios, se estendeu por quatro anos entre sua propositura inicial e sua efetiva promulgação, portanto, apenas dois anos a mais do que a aprovação do próprio texto convencional em comento.

Também foi incorporado à Constituição Federal o Protocolo Facultativo assinado em conjunto, complementar à Convenção, em que o país reconhece o Comitê sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência como sendo competente para receber e considerar comunicações de pessoas ou grupos de pessoas, ou em nome delas, sujeitos à sua jurisdição, com a alegação de violação das disposições da Convenção por um Estado-Parte (art. 1º, do Protocolo Facultativo):

Art. 1º. Qualquer Estado Parte do presente Protocolo (“Estado Parte”) reconhece a competência do Comitê sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (“Comitê”) para receber e considerar comunicações submetidas por pessoas ou grupos de pessoas, ou em nome deles, sujeitos à sua jurisdição, alegando serem vítimas de violação das disposições da Convenção pelo referido Estado Parte.

A incorporação do protocolo ao ordenamento jurídico constitucional representou, pois, a implementação concreta de um mecanismo de controle contra a violação dos Direitos Humanos das pessoas com deficiência mesmo quando o Estado for o agente violador dos direitos supramencionados. Assim, objetivamente falando, a incorporação do protocolo facultativo ao texto constitucional representou a submissão do Estado à jurisdição internacional, representando substantivo avanço na direção do acesso real à justiça por este grupo de alta vulnerabilidade.

Quando do ingresso da Convenção em no ordenamento jurídico brasileiro, muitas discussões foram travadas, majoritariamente, sobre dois aspetos afetos ao direito constitucional: quanto à posição hierárquica a depender do seu conteúdo e; sobre o enquadramento da sua matéria de fundo do tratado ser classificada como cláusula pétrea.

Com relação à primeira questão, em 03.12.2008, no julgamento do Recurso Extraordinário 466.343-1, com Relatoria do Min. Cesar Peluzo, a questão foi resolvida pelo Supremo Tribunal Federal, que determinou três esferas hierárquicas para os Tratados Internacionais, dentre eles a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que contém essencialmente tema adstrito a Direitos Humanos e passou pelo quórum qualificado de aprovação. Com efeito, a partir desse entendimento, os Tratados podem assumir posição de hierarquia supralegal, constitucional e ordinária ou legal.

Os Tratados Internacionais de hierarquia supralegal são aqueles celebrados pelo Estado, de cunho de Direitos Humanos e incorporados ao nosso ordenamento pelo rito comum de aprovação, e por tal razão, encontram-se acima das leis, porém abaixo das normas constitucionais. Assim, qualquer norma infraconstitucional conflitante não será aplicada ao caso concreto, pela questão da prevalência do Tratado.

Por outro lado, os Tratados Internacionais de matéria versada acerca de Direitos Humanos, celebrados pelo Estado, porém incorporados pelo rito determinado no § 3º, do art. 5º da Constituição Federal, introduzido pela Emenda Constitucional 45/2004, adquirem natureza de Emenda Constitucional e a elas são equiparadas hierarquicamente.

Em seu voto, o então Presidente do órgão, Min. Gilmar Mendes, proferiu voto com entendimento nesse sentido, ao afirmar que

(…) parece que a discussão em torno do status constitucional dos tratados de Direitos Humanos foi, de certa forma, esvaziada pela promulgação da Emenda Constitucional n. 45/2004, a Reforma do Judiciário (oriunda do Projeto de Emenda Constitucional n. 29/2000), a qual trouxe como um de seus estandartes a incorporação do § 3º ao art. 5º. (…) Em termos práticos, trata-se de uma declaração eloquente de que os tratados já ratificados pelo Brasil, anteriormente à mudança constitucional, e não submetidos ao processo legislativo especial de aprovação no Congresso Nacional, não podem ser comparados às normas constitucionais. Não se pode negar, por outro lado, que a reforma também acabou por ressaltar o caráter especial dos tratados de Direitos Humanos em relação aos demais tratados de reciprocidade entre os Estados pactuantes, conferindo-lhes lugar privilegiado no ordenamento jurídico.

E concluiu, como solução para o futuro, que os Tratados de Direitos Humanos que forem aprovados por quorum especial nas duas casas do Congresso Nacional ingressarão com qualidade de Emenda Constitucional, pois “a mudança constitucional ao menos acena para a insuficiência da tese da legalidade ordinária dos tratados e convenções internacionais já ratificados pelo Brasil, a qual tem sido preconizada pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal”.

A outra questão debatida é se a incorporação como Emenda Constitucional de Tratado Internacional que verse sobre a questão de Direitos Humanos confere ao seu objeto condição de cláusula pétrea.

Para Branco (2009, p. 59), a questão não é tão simples, já que a princípio há impossibilidade de se constituir como cláusula pétrea um direito fundamental que não seja instituído pelo Poder Constituinte Originário, pois

a questão que pode ser posta, no entanto, é a de saber se os novos direitos criados serão também eles cláusulas pétreas. Para enfrentá-la é útil ter presente o que se disse sobre a índole geral das cláusulas pétreas. Lembre-se que elas se fundamentam na superioridade do poder constituinte originário sobre o de reforma. Por isso, aquele pode limitar o conteúdo das deliberações deste. Não faz sentido, porém, que o poder constituinte de reforma limite-se a si próprio. Como ele é o mesmo agora ou no futuro, nada impedirá que o que hoje proibiu amanhã permita. Enfim, não é cabível que o poder de reforma crie cláusulas pétreas, apenas o poder constituinte ordinário pode fazê-lo.

Por outro lado, faz um alerta para a questão de que uma Emenda Constitucional “acrescente dispositivos ao catálogo dos Direitos Fundamentais sem que, na realidade, esteja criando direitos novos” (BRANCO, 2009, p. 259). Especificamente nessa situação, os dispositivos acrescentados serão abrangidos pelo efeito da petrificação, o que efetivamente ocorreu no caso da Convenção, em que os Direitos Fundamentais relacionados às pessoas com deficiência já se encontravam previstos na relação apresentada pela Constituição de 1988 e houve, com sua recepção, um alargamento de um tratamento já existente.

Em sentido contrário, Mazzuoli entende que “os direitos inseridos nos Tratados Internacionais de proteção aos Direitos Humanos, passam a ser cláusulas pétreas, não podendo ser suprimidos por Emenda à Constituição, nos termos do § 4º, IV, do art. 60, da Carta de 1988” (2001, p. 59).

Do mesmo entendimento, comunga Sarlet (2002, p. 136), para quem a inovação da Reforma do Judiciário assegurou

hierarquia pelo menos materialmente constitucional jusfundamental a todos os Direitos Fundamentais (já que, uma vez incorporados, os Direitos Humanos passam também – e acima de tudo – a serem todos fundamentais) e também formalmente constituídos aos tratados incorporados pelo rito de emenda constitucional que, de resto, receberiam (de vez que alguma diferenciação nos parece inevitável) um tratamento distinto (no sentido de mais reforçado) quanto ao fato de se integrarem à Constituição textual e enrobustecerem a tese da impossibilidade de uma posterior denúncia do tratado e da responsabilização até mesmo interna se este vier a ocorrer.

O mesmo autor defende, ainda, que caso haja conflito entre o Tratado com força de Emenda e uma disposição Constitucional originária, deverá ter “como norte a solução mais afinada com a máxima salvaguarda da dignidade da pessoa humana” (SARLET, 2002, p. 136), como solução mais benéfica ao próprio ser humano, consagrando assim o princípio pro homine.

Ainda sobre este princípio, nos ensina Luiz Flávio Gomes (2008):

No plano material, quando se analisa o Direito dos Direitos Humanos, os três ordenamentos jurídicos citados (CF, DIDH e legislação ordinária) caracterizam-se por possuir, entre eles, vasos comunicantes (ou seja: eles se retroalimentam e se complementam). Em outras palavras, no plano material não há que se falar (ou melhor: é irrelevante falar) em hierarquia entre as normas de Direitos Humanos. Por quê? Porque por força do princípio ou regra pro homine sempre será aplicável (no caso concreto) a que mais amplia o gozo de um direito ou de uma liberdade ou de uma garantia.

Materialmente falando, portanto, não é o status ou posição hierárquica da norma que vale, sim, o seu conteúdo (porque sempre irá preponderar a que mais assegura o direito.

Não se descuida de que, como destaca o excerto supra, para parte da doutrina aplicabilidade de tal preceito no plano material constitui uma potencial solução para a problemática da posição hierárquica da norma de Direitos Humanos, entretanto, entende-se que a necessidade de aprofundamento teórico acerca de uma solução instrumental/processual para a situação apresentada subsiste.

4 O CASO DA CONVENÇÃO INTERAMERICANA SOBRE PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS DAS PESSOAS IDOSAS: REFLEXÕES PROSPECTIVAS SOBRE A IMPORTÂNCIA DAS NORMAS INTERNACIONAIS DE PROTEÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS (2015)

O processo de internacionalização dos Direitos Humanos dos idosos foi construído gradativamente, sendo pavimentado seu caminho por diversos instrumentos próprios do soft law como a primeira Assembleia Mundial sobre o Envelhecimento, em Viena, em 1982, seguida da Declaração de Princípios das Nações Unidas em favor das Pessoas Idosas (1991) e uma segunda Assembleia Mundial realizada em Madrid, em 2002.

Desta última surgem dois documentos importantes: a Declaração Política, que estabeleceu uma série de compromissos para a luta dos governos contra os desafios decorrentes do envelhecimento e o Plano de Ação Internacional sobre o Envelhecimento, que fixou mais de uma centena de recomendações que constituem uma guia programática que pode se considerar estruturada em três áreas: o idoso e o desenvolvimento, fomento da saúde e bem estar dos idosos e a criação de um ambiente propício e favorável para as pessoas idosas.

No âmbito regional interamericano o Protocolo Adicional à Convenção Interamericana de Direitos Humanos de São José de Costa Rica, conhecido como Protocolo de San Salvador (1988), até então o único documento internacional vinculativo em vigor sobre este tópico, tratou em seu art. 17 da proteção e direitos da pessoa idosa, ainda que de uma forma muito tímida.

Posteriormente como desdobramento da Assembleia de Madrid, ocorreram reuniões de acompanhamento, uma em Santiago de Chile, em 2003, outra em Brasília, em 2007, sendo que desta última surge a Declaração de Brasília, que além de dar conta dos avanços registrados na Estratégia Regional de Implementação para América Latina e o Caribe do Plano de Ação Internacional de Madrid sobre o Envelhecimento (2003), propunha a elaboração de uma Convenção Internacional de Proteção dos Direitos Humanos das Pessoas Idosas.

Por fim, podemos destaca-se mais recentemente, também no âmbito da internacionalização da proteção dos Direitos Humanos dos idosos que na terceira reunião da Conferência Intergovenamental sobre o Envelhecimento na América latina e Caribe, realizada na Costa Rica, fora aprovada a Carta de São José sobre os Direitos das Pessoas Idosas em América Latina e o Caribe (2012).

Conforme destacado, em decorrência da Declaração de Brasília foi possível a criação nas Nações Unidas (ONU) do Grupo de Trabalho de Composição Aberta sobre o Envelhecimento – OEWG (2010), e um ano depois a criação do Grupo de Trabalho sobre Envelhecimento da OEA, este último com o encargo explícito de elaborar um projeto de Convenção que terminou sendo aprovada depois de quatro anos de trabalho, em junho de 2015.

Esta breve contextualização[8] permite observar a complexidade da trama da internacionalização dos direitos do idoso, que inclui níveis de proteção universal e regional. Trama esta da qual o Brasil se esforçou em participar de maneira ativa, sendo signatário de todos os instrumentos acima descritos; inobstante, é preciso consignar que nem a Declaração de Brasília sobre o Envelhecimento, nem a Carta de São José sobre o direito das pessoas idosas e, tampouco, a Convenção Interamericana Sobre a Proteção dos Direitos Humanos dos Idosos, passaram pelos processos de submissão ao Congresso Nacional, ratificação e Promulgação, não se podendo sequer cogitar em constitucionalização das normas convencionais eis que sequer passaram pelos estratos mais basilares inerentes à internalização das normas internacionais.

Tal fato, infelizmente, não chega a ser uma surpresa. Um levantamento realizado em 2014[9] dava conta de que naquela ocasião o Brasil não havia ratificado 313 acordos internacionais assinados, sendo certo que destes apenas 47 haviam sido enviados ao Congresso Nacional.

O fato é que muitos destes tratados assinados possuem disposições de cunho obrigacional de caráter substantivo para os países signatários, e internaliza-los significa que os Estados-partes assumem tais obrigações e se veem obrigados a adotar políticas públicas e legislativas que, por vezes, se mostram custosas ou mesmo pouco populares para determinados setores da sociedade civil, minando, assim, a vontade política necessária para a adequada tramitação no plano interno.

Ao se comparar o processo de recepção da Convenção Interamericana Sobre a Proteção dos Direitos Humanos dos Idosos pelo direito interno brasileiro com o procedimento adotado para a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência percebe-se que enquanto no primeiro instrumento quase dois anos já se passaram entre a assinatura do instrumento e a elaboração do presente artigo sem que se tenha notícias sequer de tramitação em qualquer das casas legislativas, no caso da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência foram necessários pouco mais de dois anos para que todo o processo fosse concretizado.

Obviamente o momento político vivido pelo país no qual os representantes do legislativo federal nacional se mostram mais preocupados com processos de impeachment, acordos de delação premiada e projetos de lei sobre anistia da prática de “caixa 2” em campanhas eleitorais certamente não favorece a inclusão de temas como a Convenção Interamericana Sobre a Proteção dos Direitos Humanos dos Idosos na ordem do dia, mas é preciso refletir se o processo instituído pela Reforma do Judiciário é conveniente para a proteção dos Direitos Humanos especificamente no que tange à questão dos Tratados Internacionais.

A Costa Rica, por exemplo, que em seu texto constitucional confere aos Tratados ratificados hierarquia de norma supralegal independentemente da natureza do tratado celebrado[10], também signatária da Convenção Interamericana Sobre a Proteção dos Direitos Humanos dos Idosos – na mesma data que o Brasil, inclusive – já tramitou toda a questão conforme os ditames de seu direito interno e, em um ano e meio[11] já discutiu, ratificou e realizou o depósito do referido tratado.

Não cabe aqui descer a um patamar micropolítico para realizar a análise detida das relações causa-efeito que interferem diretamente na recepção de Tratados Internacionais de Direitos Humanos no ordenamento jurídico nacional. Tampouco é preciso fazê-lo para concluir que a solução legislativa adotada pela Emenda Constitucional nº 45 não atende a urgência das questões relativas aos Direitos Humanos nem em tempo nem em forma.

5 CONCLUSÃO

Embora já se tenha afirmado de maneira homeopática ao longo do presente trabalho a convicção de que o processo de incorporação dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos decorrente da promulgação da Emenda Constitucional 45 não atende às necessidades decorrentes da própria natureza dos direitos que tutela, é preciso, em sede de conclusão, retomar a hipótese anteriormente formulada e confirmar que os estudos até então realizados demonstram que sim, este processo tem efetivamente prejudicado a incorporação dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos se constituindo em um obstáculo que embarreira a recepção constitucional de um direito internacional dos Direitos Humanos dinâmico e em permanente avanço tanto na esfera internacional quanto regional.

Da mesma maneira, acerca da afirmativa de que a solução para tal problema reside em uma nova reforma constitucional que venha a solucionar o dilema da incorporação dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos com uma nova sistemática de recepção, é possível asseverar que, embora as pesquisas realizadas até a data da submissão do presente trabalho não forneçam substrato material que permita demonstrar que esta é a única solução viável para os entraves apresentados, também não é possível descartar ou mesmo menoscabar tal hipótese, que ao menos no plano especulativo mantém sua validade e integridade.

Por fim, dando conta de pequenos avanços que serão pormenorizados em pesquisas futuras sobre esta mesma temática, é preciso noticiar a tramitação na Câmara dos Deputados da PEC 424/2014, que tem como objetivo acrescentar à Constituição Federal dispositivo que permita a tramitação em regime de urgência dos tratados, acordos e atos internacionais, se requerido pelo Presidente da República ou por deliberação da Casa em que se encontrarem.

Outra proposta com escopo semelhante é o Projeto de Lei do Senado 220, de 2016, que estabelece que as decisões ou sentenças da Comissão Interamericana de Direitos Humanos e as da Corte Interamericana de Direitos Humanos, de natureza cautelar, de mérito, reparação ou solução amistosa, que versem sobre responsabilidade internacional fundada em tratados ratificados, produzam efeitos jurídicos imediatos no âmbito do ordenamento interno brasileiro.

Sem pormenorizar estas propostas, e ainda considerando que estas ainda se encontram em fase de debates e análise e podem sofrer modificações substantivas, a luz dos problemas descritos é possível afirmar que ambos os caminhos constituem soluções válidas para resolver o impasse diagnosticado com o fracasso da Emenda Constitucional 45.

Assim, após realizar uma análise observacional dos treze anos que se seguiram desde a promulgação da Emenda Constitucional nº 45, abordando pormenorizadamente a única oportunidade em que o rito por ela estabelecido para a recepção de Tratados Internacionais de Direitos Humanos foi obedecido, conclui-se que, de fato, o procedimento tal como posto, constitui verdadeiro óbice à concretização da proteção constitucional dos Direitos Humanos no plano interno e desrespeita os avanços alcançados no plano internacional destes mesmos direitos.

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Notas de Rodapé

[1] Doutor e Mestre em Direito Público pela PUC RJ. Coordenador Adjunto e Professor do Programa de Pós-Graduação em Direito – PPGD/UNESA; Professor do PPGDC/UFF. Coordenador e Pesquisador do Observatório do Acesso à Justiça na Ibero América e do Laboratório de Estudos Interdisciplinares em Direito Constitucional Latino-Americano – LEICLA.

eduardval11@hotmail.com.

[2] Doutorando em Direito Público e Evolução Social pela UNESA; Mestre em Direito Constitucional pelo PPGDC/UFF; Especialista em Direito Civil e Processo Civil pela UNESA; Pesquisador do Observatório do Acesso à Justiça na Ibero América – OAJI e do Laboratório de Estudos Interdisciplinares em Direito Constitucional Latino-Americano – LEICLA. pauloj@gmail.com.

[3] Não é o cerne do presente trabalho desenvolver grandes arcabouços categóricos acerca de temas como, por exemplo, o próprio conceito de poder constituinte reformador, entretanto, por ser de relevância central para a temática aqui abordada, destacamos a conceituação desenvolvida por Manoel Gonçalves Ferreira Filho (1974, p. 155-156) que assevera que o Poder Constituinte de Revisão “é aquele poder, inerente à Constituição rígida que se destina a modificar essa Constituição segundo o que a mesma estabelece. Na verdade, o Poder Constituinte de Revisão visa, em ultima análise, permitir a mudança da Constituição, adaptação da Constituição a novas necessidades, a novos impulsos, a novas forças, sem que para tanto seja preciso recorrer à revolução, sem que seja preciso recorrer ao Poder Constituinte Originário”. Frise-se, no entanto, que não desconsideramos posicionamentos que entendem o poder Constituinte Reformador como uma derivação do próprio pacto institucional e, portanto, descarecido de distinção face o próprio Poder constituinte Originário. Neste mesmo sentido sugerimos a leitura do trabalho da Professora Sayonara Grillo Coutinho, Poder Reformador – insuficiência conceitual e experiências constitucionais (1997).

[4] Este modelo prevê a incorporação de uma série de tratados internacionais de Direitos Humanos mencionados explicitamente um a um, sendo recepcionados no ordenamento jurídico interno em uma hierarquia naturalmente forte. Para um maior aprofundamento acerca da experiência internacional de incorporação expressa dos tratados internacionais de direitos humanos como forma de conferir uma hierarquia forte a estes sugerimos o trabalho de Juan Carlos Hitters (2014) e seu conceito de constituição internacionalizada.

[5] Sobre esta hipótese, não se desconsidera as correntes doutrinárias que entendem que é possível que tratados internalizados anteriormente à disciplina do § 3º do art. 5º da Constituição Federal sejam submetidos ao reexame pelo Congresso Nacional a fim de ganhar status de Emenda Constitucional. Neste sentido sustenta Amaral Júnior (2005b) “Por outro lado, nada impede que um tratado já internalizado seja novamente deliberado, agora na forma do parágrafo 3º do art. 5º combinado com o parágrafo 2º do art. 60, ambos da Constituição”.

[6] Sobre o estado da arte da Jurisprudência da Excelsa Corte, sugere-se a leitura detida da ADI 5240, de Relatoria do Ministro Luiz Fux, cujo julgamento, realizado em 20.08.2015 (disponível em http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=10167333) indiscutivelmente aponta para uma nova onda atualizadora do posicionamento até então dominante de supralegalidade destes tratados, sobretudo ao se considerar que naquela ocasião o tribunal acabara de ser renovado com o ingresso do Ministro Luiz Edson Fachin e que, desde então a corte já sofrera mais uma adição com o ingresso do Ministro Alexandre de Moraes, que hoje ocupa a vaga do ministro Teori Zavaski, perfazendo um total de seis novos ministros que passaram a integrar a Corte deste o estabelecimento do paradigma pelo julgamento do habeas corpus 90.172.

[7] O texto completo da mensagem e das exposições de motivos encontra-se disponível em: <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=509453&filename=Tramitacao-MSC+711/2007>. Acesso em: 20 mar. 2017.

[8] Para uma contextualização mais detalhada acerca do tema, sugerimos a leitura do artigo “O Direito dos Idosos na América Latina e o Princípio de Dignidade da Pessoa Humana à Luz da Convenção Interamericana de Proteção das Pessoas Idosas (2015)” (VAL; TORRES DA SILVA, 2016).

[9] Para mais informações sobre o assunto, sugerimos a leitura do texto jornalístico disponível em: <http://www.conjur.com.br/2014-abr-22/brasil-300-acordos-internacionais-pendentes-ratificacao>. Acesso em: 20 mar. 2017.

[10] Neste sentido o art. 7º da Constituição Costarriquenha assim dispõe: “ARTICULO 7º. – Los tratados públicos, los convênios internacionales y los concordatos debidamente aprobados por la Asamblea Legislativa, tendrán desde su promulgación o desde el díaque ellos designen, autoridad superior a las leyes”.

[11] Para verificação das assinaturas, ratificações e depósitos e suas respectivas datas vide o site da Organização dos Estados Americanos em <http://www.oas.org/en/sla/dil/inter_american_treaties_A-70_human_rights_older_persons_signatories.asp>.