Pena de Morte em Portugal-UE, Brasil, Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo Verde, S. Tomé e Príncipe, Timor Leste, Bem Como China, Japão e Coreia do Sul – Direito Público

DEATH PENALTY IN PORTUGAL-U.E., BRAZIL, ANGOLA, MOZAMBIQUE, GUINEA-BISSAU, CAPE VERDE, S. TOMÉ E PRÍNCIPE, EAST TIMOR, AS WELL AS CHINA, JAPAN AND SOUTH KOREA – PUBLIC LAW

Gonçalo S. de Melo Bandeira[1]

Egas Moniz-Bandeira[2]

Resumo: A questão da pena de morte é tratada de modo muito diverso no mundo. Existem nomeadamente grandes diferenças no que concerne ao Oriente e Ocidente mundiais. Esta pesquisa compara um típico país da União Europeia, Portugal, bem como outros países da lusofonia, Brasil, Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo Verde, S. Tomé e Príncipe e Timor Leste com três exemplos asiáticos: a China, o Japão e a Coréia do Sul. Vê-se que não só as leis são bastante diferentes, mas que o que talvez mais difira a nível mundial seja a sua aplicação prática.

Palavras-chave: Pena de morte. Portugal. União Europeia. Brasil. Angola. Moçambique. Guiné-Bissau. Cabo Verde. S. Tomé e Príncipe. Timor Leste. Japão. China. Coréia do Sul.

Abstract: the issue of death penalty is treated very differently in the world. In particular, there are large differences between the Eastern and the Western hemispheres. This study compares a typical country of the European Union, Portugal, as well as other Lusophone countries, i.e. Brazil, Angola, Mozambique, Guinea-Bissau, Cape Verde, Sao Tome and Principe and East Timor, with three Asian examples: China, Japan and South Korea. It is shown that not only the laws are quite different, but that what possibly differs the most on a global level is their practical application.

Keywords: Death penalty. Portugal. European Union. Brazil. Angola. Mozambique. Guinea-Bissau. Cape Verde. Sao Tome and Principe. East Timor. Japan. China. South Korea.

Objectivos, metodologia e pré-introdução

Os objectivos serão verificar que, de facto, o tratamento das questões aqui em apreço é muito diferente em relação ao Ocidente e ao Oriente do globo ou do mundo. A metodologia passará pela análise de duas perspectivas de estudo: uma ocidental, ligada a um típico país multicultural da UE, Portugal, bem como Brasil, Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo Verde, S. Tomé e Príncipe e Timor Leste; e uma outra, mais sobre os países da China, Japão e Coréia do Sul, a partir dum estudioso especialista em estudos orientais. Como veremos as diferenças são grandes, sobretudo na aplicação prática da legislação em apreço.

Parte I – A Questão da Pena de Morte em Portugal como Membro da União Europeia, assim como nos países lusófonos do Brasil, Angola, Moçambique, Guiné Bissau, Cabo Verde, S. Tomé e Príncipe e Timor Leste

1 O art. 24º da Constituição da República Portuguesa e a Pena de Morte, parte I[3]

É a seguinte a redacção do art. 24º da Constituição da República Portuguesa, o qual tem por epígrafe, “Direito à vida[4]: “1. A vida humana é inviolável”. “§ 2º Em caso algum haverá pena de morte”. Não vamos aqui fazer uma anotação exaustiva destas normas constitucionais, mas apenas chamar a atenção para o que tem de mais relevante, em alguns dos seus aspectos, no que concerne à ligação ao problema da “pena de morte”. Trata-se pois dum direito constitucional fundamental e, portanto também – num raciocínio de lugares inversos dogmáticos, como temos afirmado noutras publicações e aqui reiteramos –, dum dever constitucional fundamental. Neste caso, de modo igual, todas as restrições têm que ter respeito pela proporcionalidade, adequação e necessidade constitucionais.

2 O art. 24º da Constituição da República Portuguesa e a Pena de Morte, parte II

É um dos primeiros direitos fundamentais enunciados na Constituição da República Portuguesa (CRP), porventura mesmo o primeiro em sentido técnico-jurídico duma perspectiva mais restritiva. Não existe um consenso mundial no que concerne à identificação do momento exacto no qual se inicia a vida humana e o momento no qual a mesma vida humana finaliza[5]. Ao protegermos a vida, estamos a proteger pessoas vivas a partir do acto do nascimento[6], ficando de lado, claro está, as pessoas mortas[7]. Estão abrangidas todas as pessoas individuais físicas[8]. São abarcadas pessoas de todas as nacionalidades, etnias[9] e credos.

3 O art. 24º da Constituição da República Portuguesa e a Pena de Morte, parte III

O direito à vida é também um direito à sobrevivência. A vida somente tem sentido se for vivida com dignidade. Sendo certo que não existe um consenso acerca do que é afinal a “dignidade humana?[10]. Há um direito de dispor das condições de subsistência. E aí, fica óbvio, está, p.e., o direito ao trabalho ou, como também é lógico, o direito ao subsídio de desemprego na falta de trabalho[11]. No direito à vida também se inclui um direito à protecção da saúde, bem como inclusive um direito à habitação. O Estado tem um poder-dever constitucional de contribuir para as prestações existenciais que são necessárias à existência duma vida digna. Deste modo, o direito à vida é mesmo considerado como a matriz originária dos principais direitos e deveres económicos, sociais e culturais[12].

4 O art. 24º da Constituição da República Portuguesa e a Pena de Morte, parte IV

Não deixa de ser curioso o “trocadilho” que se poderia fazer com a actual redacção do art. 24º/2 da CRP: “2. Em caso algum haverá pena de morte”. É óbvio que se deve ler aqui “Em nenhum caso haverá pena de morte”. Esta é a interpretação mais correcta[13]. Como deixou para sempre escrito o genial escritor francês Victor Hugo, “Está pois a pena de morte abolida nesse nobre Portugal, pequeno povo que tem uma grande história. (…) Felicito a vossa nação. Portugal dá o exemplo à Europa. Desfrutai de antemão essa imensa glória. A Europa imitará Portugal. Morte à morte! Guerra à guerra! Viva a vida! Ódio ao ódio. A liberdade é uma cidade imensa da qual todos somos concidadãos[14]. Bem, se a nossa pátria e mátria é o português, como diz a poesia lusófona, e esta língua é a 5ª mais falada no mundo, com cerca de 280 milhões de falantes, então este “pequeno” grande povo, dá hoje mais uma lição ao mundo através da sua História. Uma História nem sempre perfeita, é certo. A proibição absoluta da pena de morte é assumida em Portugal na Constituição de 1976, mas este processo teve o seu início no “Acto Adicional de 1852 à Carta Constitucional”, a qual aboliu a pena de morte para os crimes políticos. A Constituição da ditadura salazarista, de 1933, tinha uma clásula expressa que permitia a sua aplicação nos designados “crimes militares”. Trata-se dum princípio muito vincado no Ordenamento Jurídico português e daí a afirmação normativa constitucional de que “Não é admitida a extradição, nem a entrega a qualquer título, por motivos políticos ou por crimes a que corresponda, segundo o direito do Estado requisitante, pena de morte ou outra de que resulte lesão irreversível da integridade física[15]. Assim, Portugal foi um dos primeiros países do mundo que, na História moderna, aboliram a pena de morte, com a pretensão de esse desiderato ser definitivo (embora a História diga que nada é definitivo). Fala-se que isso terá acontecido também na pequena “República Romana” em 1849, assim como já antes em 30.11.1786, o Grão Duque da Toscania, Pedro Leopoldo II de Habsburgo, futuro Imperador, o tinha feito no autónomo Grão Ducado da Toscania. E tinha-o o feito influenciado pela célebre obra prima do Marquês Cesare de Beccaria, “Dei Delitti e Delle Pene”.

5 Brasil e Pena de Morte

Segundo algumas fontes, em 28.04.1876, é mandado executar pela Justiça civil, em Pilar de Alagoas, o escravo Francisco. Nesta época, a escravatura tinha um tratamento diferente, discriminatório, por isso mesmo, por ser escravatura. Já antes em 1861, 30 de outubro, é enforcado um “homem livre”, José Pereira de Sousa, o qual foi condenado pelo júri de Santa Luzia, Goiás. Deste modo, nesta época, não apenas estava em vigor a pena de morte, como a mesma era, em efectivo, aplicada na prática. Portanto, uma certa “coerência” entre, digamos assim, criminologia, política criminal e direito e processo penal. O Imperador do Brasil, Dom Pedro II, acaba, depois, por comutar todas as sentenças capitais, fossem os mesmos “homens livres” ou escravos. O monarca etendeu bem os novos ventos iluministas que sopravam. No que se refere aos crimes comuns, verifica-se uma abolição da pena de morte depois da instauração da República no Brasil. Já em tempo de guerra, para determinados crimes militares, a pena de morte continuou a ser prevista[16]. Em 1937, a Constituição do chamado “Estado Novo” brasileiro aceitou a possibilidade de se aplicar, por via de legislação, a pena de morte para outros crimes, que não apenas os designados “crimes militares” em tempo de guerra. Não é difícil perceber o porquê desta preocupação. Numa ditadura convém silenciar as vozes mais incómodas, a “bem ou mal”. Os Direitos Humanos são algo que passa a ser totalmente secundário. Durante o Séc. XX assiste-se a várias condenações à morte no Brasil, embora a esmagadora maioria não tenha sido concretizada de modo formal. Problema diferente é o facto de existir pena de morte na prática, mesmo que não esteja prevista de modo transparente e legal, como é o caso dos tristemente célebres “esquadrões da morte”, nascidos nos anos 60. Eram afinal grupos paramilitares, muitas vezes patrocinados pelo empresariado, que tinham a função de exterminar criminosos considerados como “demasiado perigosos para a sociedade[17]. Na prática existem indícios de que ainda poderão existir grupos militares que actuam não com tanta sistematicidade, mas sempre que tal é considerado necessário. A pena de morte voltou a ser prevista para crimes políticos, de 1969 até 1978[18]. Ou seja, no Regime Militar que durou, de modo mais preciso, entre 1964 e 1985. Foram condenados à pena de morte várias figuras anti-regime ditatorial, considerados como pertencentes à chamada “esquerda armada”, mas, ao que parece, de modo pelo menos conhecido, não existiu qualquer aplicação prática. É a Constituição Federal Brasileira que, por certo, passa a prever a abolição da pena de morte para todos os crimes não-militares. É importante referir que no momento presente o Brasil ainda prevê a pena de morte no que diz respeito aos crimes militares. A pena de morte é executada por fuzilamento. No art. 5º da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB) é possível observar o seguinte:

Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes”: (…) “XLVII – não haverá penas”: “a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX.

Assim, temos não apenas um Brasil em relação à pena de morte, mas um verdadeiro continente que aborda esta mesma pena dum modo bastante diversificado e em função de tudo aquilo que foi antes referido ao longo da sua História.

6 Angola e Pena de Morte

Depois duma guerra civil fraticida entre, nomeadamente, MPLA e UNITA – guerra durante a qual a pena capital era praticada em abundância –, a pena de morte é abolida (de modo formal) para todos os crimes desde 1992. Tal facto era flagrante desde sobretudo a declaração de independência de Angola, desde a data de 11.11.1975. Segundo o claro art. 59º da Constituição da República de Angola (CRA), 2010, “É probida a pena de morte”. Desde logo, o que está de acordo com o art. 30º (“Direito à vida”) da CRA: “O Estado respeita e protege a vida da pessoa humana, que é inviolável”. Assim, a democracia angolana vai se aperfeiçoando com o passar do tempo, esperando nós todos que por esse caminho evolutivo crescente permaneça. A comparação com Portugal cruza-se, em muitos dos casos, mas diferencia-se também pela dolorosa guerra civil que lhe perpassou, qual espada trespassando o peito das, neste caso, ex-colónias portuguesas. Aliás, o art. 59º da CRA acaba por ser bem mais explícito do que o art. 24º da CRP. O caminho só pode ser o dos Direitos Humanos.

7 Moçambique e Pena de Morte

Entre 1979 e 1990, a pena de morte foi praticada com grande acuidade em Moçambique. É claro que tal facto é fruto duma guerra civil também que se prolongou, como se vê, para além da própria proclamação de independência e tudo o que lhe internamente está associado numa luta pelo poder sem fim. Os custos humanos e patrimoniais foram muito elevados durante estas guerras civis, o que veio destruir praticamente gerações inteiras. Refere o art. 40º da Constituição de Moçambique:

§ (Direito à vida) § 1º Todo o cidadão tem direito à vida e à integridade física e moral e não pode ser sujeito à tortura ou tratamentos cruéis ou desumanos. § 2º Na República de Moçambique não há pena de morte.

8 Guiné Bissau, Cabo Verde, S. Tomé e Príncipe, Timor Leste e Pena de Morte

Na Guiné Bissau livre, cuja independência tanto deve a Amílcar Cabral, assassinado em 1973, e que chegou a ser casado com a engenheira agrónoma portuguesa, de etnia branca, Maria Helena – que tivemos o privilégio de conhecer pessoalmente na Cidade de Braga, onde viveu vários anos e foi casada em segundas núpcias com Henrique Cerqueira, jornalista e escritor, ex-Secretário pessoal do também assassinado General-sem-medo Humberto Delgado, a pena de morte foi abolida para todos os crimes desde 1993. O partido do poder, PAIGC, durante a guerra civil e na sequência da guerra civil praticou também com sistematicidade a execução da pena de morte. Entre a independência e a transferência da independência foram executados uma série considerável de antigos militares africanos afectos às tropas portuguesas. Hoje, infelizmente, a Guiné Bissau tem alguns problemas de estabilidade política e democrática, mas acredita-se que poderá evoluir de modo positivo. Refere o seguinte, o art. 36º da respectiva Constituição:

§ 1º Na República da Guiné-Bissau em caso algum haverá pena de morte. § 2º Haverá pena de prisão perpétua para os crimes a definir por lei.

No que concerne a Cabo Verde, a pena de morte é abolida para todos os crimes desde novembro de 1980. É neste ano que é aprovada a Constituição de Cabo Verde, país já antes independente. Na realidade, a pena de morte nunca existiu neste Estado desde a sua independência, ou seja, 05.07.1975. Refere o seguinte na sua Constituição, art. 27º:

(Direito à vida e à integridade física e moral) § 1º A vida humana e a integridade física e moral das pessoas são invioláveis. § 2º Ninguém pode ser submetido a tortura, penas ou tratamentos cruéis, degradantes ou desumanos, e em caso algum haverá pena de morte.

Em S. Tomé e Príncipe, a pena de morte é abolida para todos os crimes desde 1990. Refere a Constituição:

Art. 21º. Direito à Vida § 1º A vida humana é inviolável. § 2º Em caso algum, haverá pena de morte.

Em Timor Leste, território independente desde 28.11.1975, tudo culmina na actual redacção da respectiva Constituição de 2002:

Art. 29º. Direito à vida § 1º A vida humana é inviolável. § 2º O Estado reconhece e garante o direito à vida. § 3º Na República Democrática de Timor-Leste não há pena de morte”.

Parte II – A pena de morte nos países asiáticos (China, Japão, Coréia do Sul)

1 Introdução

Durante o século XX, muitos países tem abolido a pena de morte ou restrito a sua aplicação. Porém, o seu status varia muito entre as regiões: Enquanto a esse tipo de pena, com pouquíssimas excessões, não é mais utilizado na Europa, na América Latina e na Oceania, é ainda comum em muitos países da África e da Ásia. Na Ásia Oriental, a pena de morte está presente nas leis tanto da China como do Japão e da República da Coréia, embora os sistemas político-legais e a história de cada um desses três países divirjam bastante. Quais são as diferenças e semelhanças no status legal da pena de morte? Quais são as tendências em respeito ao uso da pena capital? O presente artigo pretende responder a essas questões mediante análise do quadro legal e da situação prática da pena de morte nesses três países.

2 China

a) História

A pena de morte existiu durante quase toda a história chinesa[19]. No antigo Estado de Qin, que unificou a China e estabeleceu o Império chinês em 221 a.C., a teoria política dominante era a escola que depois se tornou, um tanto equivocadamente, conhecida pelo nome de “legalista” (fajia)[20]. A administração enfatizava o valor das leis como instrumento de governo. Quem as respeitava, merecia ser recompensado, mas quem as desrespeitava teria que enfrentar duros castigos. Qin, portanto, tornou-se conhecida por suas penas dracônicas. Além de vários tipos de pena de morte para um grande número de delitos, o direito da época conhecia a tatuagem de condenados, a castração e várias outras formas de amputação, além de trabalho forçado.

Se bem que o sistema legal e administrativo da dinastia Qin (221 a.C. – 206 a.C.) profundamente influenciou as subsequentes dinastias, os castigos se tornaram mais brandos depois da sua queda, notavelmente sob a influência de ideias confucianas e, em particular durante a dinastia Tang (618-906), budistas. A ideologia dominante enfatizava a prioridade da ordem moral sobre o direito penal e aplaudia atos de clemência. A dinastia Han (206 a.C. – 220 d.C.) aboliu a tatuagem e as amputações, e o imperador Xuanzong da dinastia Tang (r. 712-756) chegou a abolir a pena de morte nos últimos anos do seu reino, abolição que foi revocada por causa de uma rebelião militar que devastou grande parte da China.

No final de época imperial, o Código da dinastia Qing (1644-1911)[21] conhecia as seguintes cinco penas: o flagelamento leve, o flagelamento pesado, trabalho forçado, exílio e pena de morte. Os métodos de execução eram o estrangulamento, a decapitação e, para crimes especialmente graves, a “morte por mil cortes”, pela qual o condenado era mutilado por uma grande quantidade de cortes de faca.

b) Situação atual

A República Popular da China, fundada em 1949, manteve e tem aplicado a pena de morte em grandes números. A pena de morte é um dos cinco tipos de penas principais definidos pelo Código Penal de 1979, que sofreu a sua última alteração em 2015. A pena de morte está definida em mais detalhes nos arts. 48-51 do Código Penal.

O Código Penal prevê, na sua versão de 2015, a pena de morte para um total de 46 crimes, incluindo vários crimes não violentos, como tráfico de drogas e corrupção. Na prática, a grande maioria das condenações à morte é aplicada a delitos que involvem a morte de alguém[22]. Em alguns casos, a pena de morte é a única consequência jurídica decretada pela norma penal. Mas mesmo nesses casos, o Supremo Tribunal Popular pode mitigar a pena de acordo com o art. 63 do Código Penal Chinês.

A versão do Código Penal de 2015 tornou-se a versão com o número mais restrito de crimes capitais da história da República Popular da China. Em relação à versão anterior, de 2011, o novo Código Penal aboliu formalmente a pena de morte para nove delitos pelos quais ela já não era mais usada na prática, incluindo a falsificação de dinheiro e o contrabando de armas. A versão de 2011, por sua conta, abolira a pena máxima para 13 crimes.

Fora a pena de morte incondicional, existe também uma “pena de morte suspensa condicionalmente por dois anos”, definida no art. 48 e ss. do Código Penal[23]. Se não cometer nenhum crime durante dois anos após a condenação, um réu condenado condicionalmente à morte terá a sua pena automaticamente reduzida a prisão perpétua ou, se ele demonstrar “serviços meritórios”, a prisão de 15-20 anos (art. 50). A pena condicional é, provavelmente, pronunciada mais frequentemente que a pena de morte incondicional e responsável por uma boa parte das condenações “à morte” na China.

O acusado pode apelar a segunda instância. Além disso, desde 2007 todas as condenações incondicionais à morte têm que ser verificadas e aprovadas pelo Supremo Tribunal Popular (Zuigao Renmin Fayuan). Não se trata de um procedimento vazio: em 2011, 7% das penas de morte foram revistas pelo Supremo Tribunal Popular[24]. Uma vez confirmada, a sentença de morte é normalmente executada rapidamente, dado que o Códido de Processo Penal estipula que o réu seja executado dentro de sete dias depois da conclusão do processo de revisão pelo Supremo Tribunal Popular (art. 211). O Código de Processo Penal autoriza execuções por fuzilamento ou injeção letal (art. 252). Enquanto que tradicionalmente o fuzilamento era a forma preferida de execução, a Justiça opta pela injeção letal desde 2010.

Essa revisão faz parte de uma política do governo central de reduzir as condenações à morte, sob os slogans de “matar menos, matar mais cuidadosamente” (shao sha shen sha)[25] e de “equilíbrio entre severidade e leniência” (kuangyan xiang ji)[26]. Em 2007 e 2010, o Supremo Tribunal Popular publicou diretrizes visando a limitar o uso da pena de morte, e uma série de reformas legais e interpretações judiciais tem tido como objetivo melhorar a posição de réus e condenados à morte: condenações têm que ser feitas na presença do réu e da sua defesa legal; novos fatos podem suspender a execução da pena e revisão do caso; a reforma do Código de Processo Penal e 2012, entre outros, ordena que interrogações de suspeitos ameaçados a serem condenados à morte sejam filmadas e gravadas (art. 121).

O número exato de execuções na China não é conhecido, uma vez que o governo não publíca dados oficiais. Embora as novas políticas e as reformas legais, especialmente a revisão obrigatória pelo Supremo Tribunal Popular, tenham reduzido consideravelmente o número de penas de morte[27], estima-se que o número de execuções por ano ainda chegue a 2.400[28], tornando a China no país com o maior número de condenações à morte e execuções no mundo. Porém, deve-se notar que, em relação à população de mais de 1,3 bilhão de pessoas, a China não é o país com o maior número de execuções per capita: por essa medida, a China é superada por diversos países do Próximo e Médio Oriente.

A pena de morte conta com amplo apoio na sociedade chinesa. Uma pesquisa oficial mostrou, em 1995, uma taxa de apoio da ordem de 95%[29]. Outra pesquisa de 2007/2008, financiada pela União Europeia, chegou a números mais baixos, da ordem de 58%-78%, dependendo da questão exata, e com a ressalva de que uma grande parte da população mostra indiferença e ignorância ao tema[30]. A mesma pesquisa também mostrou que a maioria dos chineses (64%) quer que o governo publique estatísticas sobre a pena de morte. Há, porém, muitas dúvidas em relação a todas as pesquisas de opinião sobre esse tema. E, apesar das reformas que limitam o uso da pena de morte, não há nenhum movimento influente na sociedade ou na administração que demande a abolição completa da pena de morte.

Há, no entanto, duas regiões da República Popular da China onde a pena de morte não existe: Nas Regiões Administrativas Especiais (RAE) de Hong Kong e Macau. Em Hong Kong, território que foi devolvido à China pela Grã-Bretanha em 1997, a pena de morte fora formalmente abolida em 1993, ainda sob o domínio inglês. Na verdade, a pena de morte já fora suspensa no final dos anos 60, junto com a metrópole, e a última sentença fora executada em 1966.

Na segunda RAE da China, Macau, território português até 1999, a pena de morte não existe desde a Revolução dos Cravos, dado que art. 24 da Constituição da República Portuguesa de 1976 a proíbe explicitamente. Nas vésperas da entrega de Macau à República Popular da China, houve um certo receio de que a pena de morte fosse reintroduzida durante a transição[31]. Porém, isso não aconteceu: O Código Penal de 1996 não incluiu a pena de morte, e tampouco a Lei Básica de 1999 a ela faz menção. Portanto, Macau continua sendo uma das duas regiões chinesas sem pena de morte.

3 Japão

a) História

A pena de morte também tem uma longa e complexa história no Japão[32]. No século IV, a doutrina jurídica chinesa começou a influenciar o Japão. O Direito penal japonês, como o chinês, também começou a distinguir cinco tipos de penas regulares (flagelamento leve, flagelamento pesado, prisão, exílio e morte). Nas épocas de Nara (710-794) e Heian (794-1195), provavelmente sob influência budista, as penas se tornaram bem mais leves. É dito que o Imperador Shômu (724-749) aboliu a pena de morte, se bem que não haja prova histórica para isso. Mas a pena de morte foi de fato sucessivamente abolida pelo Imperador Saga (809-823) a partir de 818.

A pena de morte ficou abolida por mais de 300 anos, até ser aplicada de novo contra o líder de uma insurreição. As décadas e séculos seguintes foram épocas muito mais violentas e guerreiras, e igualmente as leis penais se tornaram muito mais rigorosas. A pena de morte voltou a ser freqüentemente aplicada. A partir da unificação do país por Tokugawa Ieyasu no início do século XVII, o Japão voltou a viver tempos de prosperidade e paz, e o número de execuções diminuiu. Mesmo assim, a pena de morte continuou a ter uma posição importante no sistema legal.

O Japão introduziu um sistema legal moderno na época Meiji, a partir de 1868. O primeiro Código Penal da nova época, que ainda se assemelhava muito aos seus modelos chineses e às tradições japonesas, entrou em vigor em 1871 e foi inteiramente revisto em 1873. Em 1882, o Japão passou um Código Penal inspirado em modelos ocidentais, especialmente no Código francês. Em 1908, o governo adotou um Código Penal revisto, que é a base do Código válido até hoje. Todos esses códigos mantiveram a pena de morte.

b) Situação atual

O sistema político vigente no Japão atual foi estabelecido com a Constituição de 1947. Essa constituição não menciona diretamente a pena de morte, mas o art. 31 implica a sua existência, declarando que “Nenhuma pessoa deverá ser privada da vida …, exceto de acordo com os procedimentos estabelecidos em lei”. O art. 36 determina que “penas cruéis” são “absolutamente proibidas”.

A pena de morte continua prevista para vários delitos por diversas leis, especialmente pelo Código Penal. Além de homícidio (art. 199 do Código Penal), a pena de morte está prevista para uma série de delitos que resultem em morte, para certos delitos militares (instigação de agressão externa, colaboração com o inimigo, insurreição) e para algumas ações que acarretam perigo de vida para outras pessoas.

Porém, a pena de morte nunca é mandatória, e na prática, a pena é somente aplicada em casos de homícidios com agravantes, nomeadamente homícidios múltiplos. Em 1983, no caso de Norio Nagayama[33]/[34], o Supremo Tribunal do Japão estabeleceu que a pena de morte só poderia ser escolhida em casos extremamente graves, tendo em conta todos os fatores atenuantes, a serem avaliados pelos seguinte nove critérios: 1. A natureza do crime; 2. O motivo; 3. As características do crime, especialmente a tenacidade e crueldade com que ele foi cometido; 4. A gravidade de suas consequências, especialmente o número de vítimas; 5. Os sentimentos das famílias das vítimas; 6. O impacto do crime sobre a sociedade; 7. A idade do autor do crime; 8. Os antecedentes criminais do réu; 9. Razões para leniência após o cometimento do crime.

De acordo com art. 11 do Código Penal do Japão, penas de morte são executadas por enforcamento em uma instituição penal, e o condenado deverá ser detido numa prisão até a sua execução. Não há transparência sobre execuções. As execuções não são anunciadas nem ao condenado nem a sua família: frequentemente, os condenados à morte são detidos por anos, ou mesmo décadas, em prisão solitária sem saber se poderão viver por mais um dia, o que os leva à insanidade[35]. Na média, condenados à morte esperam mais de sete anos até a sua execução[36]. Desde a Restauração Meiji até os anos 90, o número de execuções tinha a tendência a cair: Enquanto que nos cinco anos de 1868-1872, foram executadas 3.975 pessoas, o número caiu para 139 execuções no cinquênio entre 1948 e 1952 e 4 execuções entre 1988 e 1992[37]. Desde então, o número de execuções tem subido de novo, seguindo uma tendência de tornar a justiça penal mais rigorosa. Desde então, o número de execuções por ano tem variado entre 0 (2011)[38] e 15 (2008) [39]. Em 2015, 128 pessoas estavam esperando serem executadas[40].

O governo frequentemente cita uma pesquisa de opinião segundo a qual 85% dos japoneses apoia a pena de morte, sendo que o número tem constantemente subido desde 1975, quando o apoio era de meros 56,9%[41]. Mesmo que esse número seja demasiadamente alto e que a opinião pública seja mais complexa, parece claro que a pena de morte conta com amplo apoio público no Japão. Existem grupos que advogam a sua abolição, incluindo associações de advogados e partidos políticos, e até mesmo alguns ministros da justiça posicionaram-se criticamente em relação à pena de morte. Mas eles são uma minoria, e mesmo ministros opostos à pena de morte costumam assinar ordens de execução. Os períodos onde isso não aconteceu foram sempre breves, o mais longo tendo sido entre 1989 e 1993. Não parece provável que a situação da pena de morte no Japão mude significantemente a curto ou médio prazo.

4 Coréia do Sul

A situação da Coréia do Sul em relação aos outros é especial, uma vez que o último réu foi executado em 1997. Desde a posse do Presidente Kim Dae-Jung[42] em 1998, a pena de morte não é mais aplicada. Não obstante, a pena de morte não foi abolida e nem existe uma moratória formal. Tribunais continuam codenando réus à morte, mas as condenação não são executadas. Em 2014, um réu foi condenado à morte, e no total, aproximadamente 60 pessoas estão na prisão sob pena de morte[43].

A pena de morte é aplicável a um grande número de delitos registrados em diversas leis, incluindo homicídio e vários crimes que resultam em morte. Várias formas de roubo, violação sexual agravada e sequestro também acarretam a pena de morte, bem como certos casos de falsificação de dinheiro e tráfico de drogas. Além disso, sob o pano de fundo do conflito com a Coréia do Norte, a pena de morte existe para um grande número de crimes militares, de traição e de espionagem. De acordo com a Lei, penas de morte por crimes civis são executadas por estrangulamento e, por crimes militares, por fuzilamento.

Houve já várias moções parlamentárias visando à abolição formal e definitiva da pena de morte, mas até agora, tais tentativas não tiveram sucesso. O Tribunal Constitucional decidiu várias vezes que a pena de morte não é inconstitucional, e a maioria do público geral parece apoiar a pena de morte. Após o início da moratória, aproximadamente 60% do público diziam apoiar a pena de morte, embora o número de apoiantes tenha chegado a baixar até menos de 50% em algumas pesquisas de 2006[44]. O nível de apoio chegou a 79% em 2012, mas voltou a baixar a 63% em 2015[45]. Ademais, a maioria dos deputados no Congresso, bem como de certos grupos profissionais (advogados, juízes, jornalistas) é abolicionista[46]. A Presidente Park Chung-Hee, que tomou posse em 2013, declarou ser contra a extinção da pena de morte[47], mas também não terminou a moratória informal.

Parte III – Conclusões

A história da pena de morte no Oriente é complexa: Por um lado, existe uma vertente caracterizada por rigor e severidade; por outro lado, sempre existiram tendências de limitar o uso da pena de morte e até mesmo de aboli-la. A pena de morte não está mais enraizada culturalmente no Oriente do que Ocidente, onde ela foi também extensamente usada durante milênios. Hoje, a pena de morte ainda existe nos três países examinados, mas a sua aplicação varia muito. Na China continental, é uma pena muito comum para um grande número de delitos, embora o governo tenha adotado medidas para restringir o seu uso. No Japão, a pena de morte é limitada a casos de homícidio agravado, mas continua sendo aplicada regularmente. Na Coreia do Sul, a pena de morte tem um status ambíguo, nunca tendo sido abolida, mas não sendo aplicada desde 1997. A manutenção da pena nos países do Extremo Oriente se deve a fatores políticos e sociais. Apesar das tendências de limitar o seu uso, ela ainda continua a ter uma posição forte, e a sua abolição não está iminente.

A História da pena de morte em países lusófonos como Portugal-UE, Brasil, Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo Verde, S. Tomé e Príncipe e Timor Leste, não é uma História perfeita, mas é com certeza uma História com características muito próprias, as quais, pelo seu crescente multiculturalismo de pacificação constituem um exemplo de sã convivência pacífica para o mundo. Um mundo que também é lusófono ou não fosse o português a 5ª língua mais falada no mundo e mesmo a mais falada no hemisfério Sul, precisamente o mais pobre do planeta. Outros casos interessantes seriam os da França, Itália, Reino Unido, Países Nórdicos ou Alemanha, países europeus com uma História a ter em consideração no tratamento da pena de morte. A pena de morte – die Todesstrafe – foi abolida na Alemanha por meio do art. 102º da Constituição alemã, Grundgesetz[48]: “Die Todesstrafe ist abgeschafft”. O Direito deve respeitar a vida, mas também deve assegurar a pretensão do indivíduo de que seja preservada a sua dignidade pessoal. Daí que a própria Constituição alemã preveja a impossibilidade de reintroduzir a pena de morte. Tudo isto, claro é, relaciona-se com as consequências emotivas da História da ditadura nacional-socialista de base germânica. Já para não falarmos nos erros judiciais relacionados com a condenação à morte de inocentes. Erro várias vezes detectado tarde demais. A recente proposta da Turquia em reestabelecer a pena de morte, ainda por cima com supostos efeitos retroactivos, além de violar todas as mais elementares normas internacionais dos Direitos Humanos e da UE, coloca em perigo a própria democracia interna do país[49].

Interessantes são também os dados da Amnistia Internacional referentes a 2015, os quais nos indicam agora que a maioria dos países do mundo aboliu a pena de morte, pelo menos na teoria[50].

Mais interessante ainda, também do ponto de vista jurídico-científico, é a Doutrina da Igreja Católica sobre o 5º Mandamento: “Não matarás” (Ex 20, 13), “Ouvistes o que foi dito aos antigos: Não matarás. Aquele que matar terá de responder em juízo. Eu, porém, digo-vos: Quem se irritar contra o seu irmão, será réu perante o tribunal” (Mt 5, 21-22). Vejamos o comentário oficial:

2267. A doutrina tradicional da Igreja, desde que não haja a mínima dúvida acerca da identidade e da responsabilidade do culpado, não exclui o recurso à pena de morte, se for esta a única solução possível para defender eficazmente vidas humanas de um injusto agressor. § Contudo, se processos não sangrentos bastarem para defender e proteger do agressor a segurança das pessoas, a autoridade deve servir-se somente desses processos, porquanto correspondem melhor às condições concretas do bem comum e são mais consentâneos com a dignidade da pessoa humana. § Na verdade, nos nossos dias, devido às possibilidades de que dispõem os Estados para reprimir eficazmente o crime, tornando inofensivo quem o comete, sem com isso lhe retirar definitivamente a possibilidade de se redimir, os casos em que se torna absolutamente necessário suprimir o réu “são já muito raros, se não mesmo praticamente inexistentes” (42)[51].

Como é óbvio também a Legítima Defesa não merece qualquer reparo. E, diga-se, tem sido praticada recentemente perante a iminência de atentados terroristas por todo o mundo. Mas também como se viu no relatório e estatísticas da Amnistia Internacional, a pena de morte é aplicada por crimes de opinião e políticos, o que constitui uma clara violação dos mais elementares Direitos Humanos, dando a ideia à população de que é possível governar através da violência, já para não falar na tortura, tantas vezes mais indigna do que a própria pena de morte rápida e indolor. A pena de morte deve ser rejeitada assim como a tortura, mas esse caminho não está perto no mundo, embora seja animador que a maioria dos países o aceite. Medidas de segurança, como em Portugal, acabam por se tornar em formas de tratar por exemplo casos em que não chega a prisão temporária com limite de 25 anos de prisão. Já a legítima defesa é um instituto que, reunidos os pressupostos – agressão actual e ilícita – constitui por si só um Direito Humano Fundamental Constitucional.

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Notas de Rodapé

[1] Prof.-Adj. das Ciências Jurídico-Fundamentais na Escola Superior de Gestão do IPCA (Minho, Portugal). Prof.-C. no Mestrado na Universidade do Minho. Investigador do CIJA/CEDU. Doutor e Licenciado pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Mestre pela Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa. gsopasdemelobandeira@hotmail.com https://twitter.com/gsdmelobandeira

[2] Licenciado em Direito pela Universidade de Heidelberg (Alemanha). É doutorando em Estudos Chineses (Sinologia) na Universidade de Heidelberg (Alemanha) e em Direito (História Política) na Universidade Tohoku (Sendai/Japão). Advogado registrado na Alemanha. egas.moniz-bandeira@asia-europe.uni-heidelberg.de

[3] Portugal é um País-membro da União Europeia desde 1986, pelo que é influenciado em profundidade pelo chamado Direito da União Europeia. Cfr. art. 8º da CRP-Constituição da República Portuguesa.

[4] Redacção originária outorgada pela Lei Constitucional 1/82, embora antes fosse o art. 25º. No contexto da Constituição portuguesa-CRP, é indispensável conjugar o arts. 7º, 15º, 24º, 27º/3 c, 161º n, 165º/1 b, 197º/1 i e 288º d; bem como os arts. 27º, 16º, 17º e 18º, todos da CRP.

[5] CANOTILHO, J. J. Gomes; MOREIRA, Vital. In: CRP § Constituição da República Portuguesa § Anotada § Artigos 1 a 107. 4. ed. rev. Coimbra: Coimbra, 2007. v. I, p. 445 e ss.

[6] A questão do aborto não vai ser aqui abordada. Como princípio, salvo casos de força maior, como violação, mal formação do feto e/ou perigo de vida para a mãe, somos contra a prática do aborto como quem troca de camisa. Temos dúvidas, todavia, quanto à sua respectiva criminalização no primeiro terço da gestação, até porque existem outras áreas do Direito que podem tutelar, quiçá com mais eficácia, esta específica área. Sendo também certo que o direito a ter filhos se deve conciliar ab initio com o direito à vida dos filhos. O que implica um apoio muito concreto a nível patrimonial e “moral” por parte do Estado, para bem, aliás, do próprio sector privado, bem como do sector cooperativo e social de estrutura constitucional.

[7] Em Portugal, é adoptado o conceito de morte cerebral, i.e., falência irreversível do funcionamento geral do cérebro. Não obstante, a posição de CANOTILHO; MOREIRA, idem, ibidem, é clara: “… o conceito de morte cerebral terá de considerar-se apenas como o momento temporal da morte de uma vida em ‘processo de falecimento’” (cfr. Lei 144/1999, de 28.08).

[8] Embora seja duvidoso a aplicação às chamadas organizações, “pessoas ou entes colectivos”, cremos que é de recusar – como já dissemos noutros escritos – a chamada “pena de morte da pessoa colectiva”. Recorde-se, contudo, que, se o suicídio da pessoa física individual não é punível por si mesmo do ponto de vista criminal (é punível, isso sim, o “Incitamento ou ajuda ao suicídio”, p. e p. pelo art. 135º do Código Penal português: CP), também o da organização, “pessoa ou entidade colectiva”, o pode não ser. Salvaguardando todos os casos de ilicitude. Aliás, o crime de “Insolvência dolosa”, p. e p. no art. 227º do CP, não pode ser praticado por “pessoas colectivas” de acordo com o art. 11º do CP.

[9] Raça humana só há uma, daí nos podermos reproduzir entre nós, em circunstâncias de regra, pois partilhamos a mesma biologia. Daí preferirmos a palavra “etnia” a “raça”.

[10] Cf. art. 1º da CRP: “República Portuguesa”: “Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária”.

[11] CANOTILHO; MOREIRA, idem ibidem.

[12] Cf. arts. 58º e ss. da CRP. Veja-se o chamado caso do “rendimento mínimo” ou “rendimento social de inserção”: cfr. Ac. do Tribunal Constitucional 569/02.

[13] Cf. art. 9º do Código Civil português (CC). CANOTILHO; MOREIRA, idem ibidem.

[14] Victor Hugo, 1876, a propósito da abolição da pena de morte em Portugal (“o primeiro país europeu a fazê-lo”).

[15] Cf. art. 33º/6 e ss. Da CRP.

[16] CARVALHO FILHO, Luís Francisco. Impunidade no Brasil – Colônia e Império. In: Estudos Avançados. São Paulo, v. 18, n. 51, 2004; RIBEIRO, João Luis, No meio das galinhas as baratas não têm razão – A Lei de 10 de Junho de 1835. Os escravos e a pena de morte no Império do Brasil (1822-1889). Rio de Janeiro: Renovar, 2005; RIBEIRO, João Luis. A Violência Homicida diante do Tribunal do Júri da Corte do Rio de Janeiro. Dissertação de Doutorado, Universidade Federal do Rio Janeiro, 2008. Ver também: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Pena_de_morte#cite_note-12>. Acesso em: 01 jul. 2016.

[17] SILVA, Ana Amélia da; CHAIA, Miguel Wady; JUNQUEIRA, Carmen. Sociedade, cultura e política: ensaios críticos, 2004. p. 625.

[18] Acto Institucional 5, AI-5.

[19] Sobre a pena de morte na história jurídica chinesa, cf. Hu Xingdong 2008. Para exemplos de casos jurídicos do início da dinastia Han (206 a.C. – 220 d.C.), cf. LAU; LÜDKE, 2012.

[20] Sobre a escola “legalista”, cf. CREEL, 1970; GOLDIN, 2011.

[21] TIAN; ZHENG (Ed.)., 1999.

[22] Segundo a Fundação Dui Hua, 85% das condenações à morte são por homicídio. Dui Hua Foundation, 2015, p. 7.

[23] Sobre a história dessa pena, cf. HUANG; HU, 2008; JIN; ZHANG, 2004.

[24] ZHANG, 2012. Em 2007, o número ainda fora de 14%, mas “procedimentos mais rigorosos” nos tribunais de primeira instância teriam feito o número cair.

[25] Van PARYS, 2009, p. 73.

[26] Id., 2009, p. 83.

[27] ZHANG, 2012.

[28] A Fundação Dui Hua, uma organização estadunidense, estima que aproximadamente 2.400 réus tenham sido executados em 2013. Dui Hua Foundation, 2015, p. 7.

[29] OBERWITTLER; Qi, 2009, p. 25.

[30] OBERWITTLER; QI, 2009, p. 26.

[31] Sobre a pena de morte em Macau, cf. CHIO; ZHAO, 1993; GODINHO, 1993, p. 158-164; Há 20 anos: Pena de morte é questão em Macau. Jornal Tribuna de Macau, 20.01.2015.

[32] Sobre a história da pena de morte no Japão, cf. SCHMIDT, 2001, p. 9-34.

[33] Norio Nagayama (1949-1997) assassinou quatro pessoas aos seus 19 anos de idade e tornou-se um célebre escritor na prisão. Entre suas obras estão Lágrimas da ignorância (Muchi no namida, 1971) e Ponte de madeira (Kibashi, 1984).

O processo de Nagayama estendeu-se por mais de uma década: sua primeira condenação à morte em 1979 foi revertida e convertida em prisão perpétua pelo Tribunal Superior de Tóquio em 1981. Em 1983, o Tribunal Superior cassou a decisão de 1981, e Nagayama foi condenado à morte novamente em 1987, pena mantida pelo Supremo Tribunal em 1990. Foi executado em 1997.

[34] 1981(A) N. 1505, KEISHU, v. 37, n. 6, p. 609, Supremo Tribunal do Japão, 1983.

[35] Sobre as condições nas prisões vide KAMIYA, 2007.

[36] KAMIYA, 2007.

[37] SCHMIDT, 2001, p. 37.

[38] Amnistía Internacional, 2012, p. 5.

[39] Amnesty International, 2009, p. 8.

[40] Justice denied: Japanese prisoner dies after 46 years on death row, 04.10.2015.

[41] Shikei seido ni kansuru Naikakufu (Sôrifu) seron chôsa no kekka, p. 1.

[42] Kim Dae-Jung (1925-2009) havia sido preso político condenado à morte em 1980. Foi Presidente da República da Coréia entre 1998 e 2003.

[43] Amnesty International, 2015, p. 38.

[44] JOHNSON; ZIMRING, 2009, p. 180.

[45] Han’guk kaellŏp teilli op’iniŏn, 07-09.07.2015.

[46] Id., ibid.

[47] Debate over death penalty reignited: Slew of shocking crimes has country calling for harsher punishments, 12.09.2012.

[48] JESCHECK, Hans-Heinrich; WEIGEND, Thomas. Lehrbuch des Strafrechts § Allgemeiner Teil § Funfte Auflage, Duncker & Humblot • Berlin, Alemanha, 1996. p. 751 e ss.

[49] <http://www.aljazeera.com/news/2016/07/president-erdogan-ready-reinstate-death-penalty-160719015923935.html>. Acesso em: 19 jul. 2016.

[50] <http://www.amnistia-internacional.pt/index.php?option=com_content&view=article&id=2431:2016-04-04-13-40-53&catid=17:dados-e-numeros&Itemid=75>. Acesso em: 01 jul. 2016: “Pena de morte em 2015 § Pela primeira vez a maioria dos países no mundo é abolicionista § Mais quatro países aboliram a pena de morte em 2015, sendo agora maioritários aqueles que no mundo inteiro já se tornaram abolicionistas da pena capital para todos os crimes, na lei ou na prática. Ainda assim, a Amnistia Internacional registou em 2015 que mais de 20 mil pessoas se encontravam nos corredores da morte, aguardando a punição mais cruel e desumana que existe, e da qual não há retrocesso. § Pelo menos 1.634 pessoas foram executadas em 25 países em 2015. Este número representa um muito significativo aumento no número de execuções em relação ao ano anterior, na ordem que mais de 50%. Em 2014, a Amnistia Internacional registara 1.061 execuções em 22 países no mundo inteiro. § Este é o número mais elevado de execuções registadas em mais de 25 anos (desde 1989). § A maior parte das execuções foram feitas na China, Irão, Paquistão, Arábia Saudita e Estados Unidos – por essa ordem. § A China continua a ser o país maior executor em todo o mundo – mas a verdadeira extensão do uso da pena capital no país é desconhecido uma vez que estes dados são tratados pelas autoridades chinesas como um segredo de Estado. Assim, o número de pelo menos 1.634 execuções feitas em 2015 no mundo exclui os milhares de pessoas que a Amnistia Internacional estima terem sido executadas na China. § Sem contar com a China, quase 90% das execuções foram feitas em apenas três países: Irão, Paquistão e Arábia Saudita. § Em 2015, 25 países – um em cada dez de todos os países do mundo – fizeram execuções, um aumento em relação aos 22 que o fizeram em 2014. Mas é também uma baixa significativa em relação ao que se assinalava há duas décadas (39 países fizeram execuções em 1996). § No total, 140 países em todo o globo – mais de dois terços – aboliram na lei ou na prática a pena capital. § Quatro países – as Fiji, Madagáscar, a República do Congo e o Suriname – aboliram em 2015 a pena de morte para todos os crimes. No total são já 102 os países que o fizeram: a maioria no mundo. E, ainda no ano passado, a Mongólia aprovou um novo Código Penal no qual a pena de morte é abolida e que entrará em vigor durante 2016. § Foram ainda registadas comutações de pena ou perdões de sentenças de morte em 34 países durante 2015. Pelo menos 71 pessoas que tinham sido condenadas à pena capital acabaram por ver aquelas penas exoneradas em seis países: na China (1), no Egito (1), na Nigéria (41), no Paquistão (pelo menos 21), em Taiwan (1) e nos Estados Unidos (6). § Foram proferidas pelo menos 1.998 sentenças de pena de morte em 61 países em 2015, uma baixa das pelo menos 2.466 registadas em 55 países em 2014. § No final do ano de 2015, pelo menos 20.292 pessoas encontravam-se em corredores da morte. § Os métodos de execução usados no mundo: decapitação, enforcamento, injeção letal e fuzilamento. § A Amnistia Internacional colheu indícios de que foram executadas em 2015 pelo menos nove pessoas que eram menores de 18 anos à data do crime pelo qual foram condenados à pena de morte – quatro no Irão e cinco no Paquistão. § Em muitos países onde foram proferidas sentenças de morte ou feitas execuções, os procedimentos judiciais não cumpriram os padrões internacionais de julgamento justo. Em alguns casos, tal inclui a extração de “confissões” sob tortura ou outros maus-tratos, como ocorreu na Arábia Saudita, Bahrein, na China, Coreia do Norte, Irão e Iraque. § Continuaram a ser proferidas sentenças à pena capital ou pessoas a serem executadas por ofensas que não se integram no grupo dos “crimes mais graves” de “morte intencional” como é definido pela lei e padrões internacionais. Aqui se incluíram crimes relacionados com o narcotráfico em pelo menos 12 países da Ásia e do Médio Oriente, assim como “adultério” (nas Maldivas e Arábia Saudita), crimes económicos (China, Coreia do Norte e Vietname), “apostasia” (Arábia Saudita) e “insultos ao profeta do Islão” (Irão). § África subsariana § Foram feitas pelo menos 43 execuções em quatro países. Em 2014 tinham sido registadas 46 execuções em três países. § As sentenças à pena capital diminuíram acentuadamente, de 909 em 2014 para 443 em 2015, sobretudo devido a uma queda na Nigéria. § O Chade, onde não era feita nenhuma execução em mais de uma década, voltou a fazê-lo, tendo executado dez pessoas em 2015. Os outros três países a executar foram a Somália, o Sudão e o Sudão do Sul. § Américas § Pelo sétimo ano consecutivo, os Estados Unidos foram o único país a fazer execuções na região das Américas, tendo sido executadas 28 pessoas em 2015 (sete menos do que em 2014). Este é o número mais baixo de execuções num ano registadas nos Estados Unidos desde 1991. Foram seis os estados norte-americanos onde foram feitas execuções em 2015, uma baixa também em relação aos sete do ano anterior. § O número de sentenças à pena capital nos Estados Unidos diminuiu de pelo menos 72 em 2014 para 52 em 2015, o número mais baixo registado desde 1977. § Trindade e Tobago foi o único outro país na região das Américas a proferir sentenças à pena capital. § Ásia-Pacífico § Foram executadas pelo menos 367 pessoas em 12 países – um aumento enorme em relação às 32 execuções registadas em nove países em 2014, e quase exclusivamente devido à subida muito acentuada no Paquistão. Este número não inclui as execuções feitas na China, onde a pena de morte continua a ser aplicada na ordem dos milhares todos os anos; a verdadeira extensão do recurso à pena capital na China permanece desconhecida uma vez que os dados são tratados como segredo de Estado. § Só no Paquistão foram executadas 326 pessoas em 2015, depois de o país ter posto fim, ainda em dezembro de 2014, a uma moratória à execução de civis que esteve em vigor durante seis anos, na esteira do ataque de taliban a uma escola em Peshawar. Este é o mais elevado número de execuções que a Amnistia Internacional jamais registou no Paquistão. § Na Indonésia foram feitas 14 execuções por crimes relacionados com o narcotráfico, as primeiras registadas desde que Joko Widodo assumiu a presidência do país em 2014. § Foi impossível confirmar o número real de execuções na Coreia do Norte. § Europa e Ásia Central § A Bielorrússia – o único país desta região com pena de morte – não executou ninguém em 2015, mas foram proferidas duas sentenças à pena capital (em 2014 foram executadas três pessoas e não foi emitida nenhuma sentença de morte). § Médio Oriente e Norte de África § Pelo menos 1.196 pessoas foram executadas em oito países do Médio Oriente e Norte de África: este é um aumento de 26% das 945 execuções registadas em oito países em 2014. § Só no Irão, foram feitas 82% das execuções registadas nesta região. § Na Arábia Saudita foram executadas pelo menos 158 pessoas, o que representa um aumento de 76% em relação a 2014 e o número mais elevado registado neste país desde 1995. § A Amnistia Internacional não pode confirmar se foram feitas execuções na Síria”.

[51] <http://www.vatican.va/archive/cathechism_po/index_new/p3s2cap2_2196-2557_po.html>. Acesso em: 30 jul. 2016.