Os dados pessoais inseridos no celular e a sua proteção constitucional: as lições trazidas pela Suprema Corte norte-americana

The personal data inserted into cell phone and their constitucional protection: lessons brought by the United States Supreme Court

DOI: 10.19135/revista.consinter.00017.07

Recebido/Received 03/10/2023 – Aprovado/Approved 20/11/2023

Gianpaolo Poggio Smanio[1] – https://orcid.org/0000-0002-5835-4392

Orly Kibrit[2] – https://orcid.org/0000-0002-3688-5942

Eduardo Manhoso[3] – https://orcid.org/0000-0003-0580-9370

Resumo

O presente artigo trata da possibilidade de acesso aos dados encontrados no cellular do cidadão após apreensão em busca pessoal. A pesquisa adotou o método hipotético-dedutivo, pretendendo testar as hipóteses apresentadas, utilizando-se das técnicas de pesquisa bibliográfica e jurisprudencial. Nesse passo, inicia-se com a análise acerca da cidadania e da proteção da intimidade da Era da Informação, seguindo-se com uma excplicação acerca da influência dessa proteção nas investigações penais na atualidade, como limite à atuação estatal, ainda que no combate ao crime. Isto posto, passa-se a uma análise do entendimento do Superior Tribunal de Justiça, do Supremo Tribunal Federal e da Suprema Corte dos Estados Unidos, a fim de se ponderar como a questão tem sido tratada por tais tribunais. Objetiva-se, com isso, verificar se há, ou não, necessidade, em respeito à privacidade do cidadão, de prévia autorização judicial para tal acesso. A conclusão é de que o acesso aos dados pessoais – tais como agenda, ligações telefônicas, fotos – somente é válida se há prévia autorização judicial, ante a garantia da privacidade.

Palavras-chave: dados pessoais; privacidade; proteção constitucional.

Abstract

This article deals with the possibility of accessing the data found on the citizen's cell phone after seizure in a personal search. The research adopts the hypothetical-deductive method, intending to test the presented hypotheses, using bibliographic and jurisprudential research techniques. In this step, it begins with an analysis of citizenship and the protection of intimacy in the Information Age, followed by an explanation of the influence of this protection in criminal investigations today, as a limit to state action, even in the fight against crime. That said, an analysis of the understanding of the Superior Court of Justice, the Federal Supreme Court and the Supreme Court of the United States is now carried out, in order to consider how the issue has been dealt by these courts. The objective is, with this, to verify if there is, or not, need, in respect to the citizen's privacy, of previous judicial authorization for such access. The conclusion is that access to personal data – such as calendar, phone calls, photos – is only valid if there is prior judicial authorization, in view of the guarantee of privacy.

Keywords: personal data; privacy; constitutional protection.

Sumário: Introdução; 1. Os direitos da cidadania na “era da informação”; 2. Investigação penal na “era da informação” e a proteção à privacidade; 3. A agenda e registros telefônicos com albergue constitucional; 4. O panorama jurisprudencial: o que podemos aprender com a suprema corte norte-americana?; 4.1. Superior Tribunal de Justiça; 4.2. Supremo Tribunal Federal; 4.3. Suprema Corte Norte-Americana; Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃO

Todas as esferas das relações sociais foram influenciadas pelo advento da Era da Informação, em que os dados pessoais e informações em geral são acessados com facilidade, circulam com velocidade e podem ser compartilhados mundialmente. Diante dessa realidade, passa a ser papel do Estado não mais abster-se quanto à intimidade e à privacidade do cidadão, mas, sim, atuar positivamente para a sua proteção, evitando a sua indevida devassa.

No campo de sua atuação penal, o Estado sempre teve de lidar com o embate entre a eficiência e a proteção à esfera de direitos do cidadão. Hoje, as investigações criminais demandam a utilização das inúmeras e mais diversificadas tecnologias existentes, pois a sua defasagem quanto às ações criminosas, que igualmente restaram afetadas pela Era da Informação, pode levar a sua ineficiência.

Destaca-se, para o intuito desta pesquisa, a busca por elementos de prova no celular do investigado, por parte dos policiais que participaram da busca pessoal. Pretende-se estudar se os dados dali decorrentes tem alcance constitucional, porque, se positiva a resposta, estaríamos diante de inevitável reserva de jurisdição. Portanto, de maneira imperativa, seria necessária autorização judicial prévia para tanto.

Para tanto, no primeiro capítulo, abordaremos a mutação pela qual o Estado passou, especificamente quanto aos direitos de cidadania, na chamada Era da Informação. Em seguida, passaremos à análise da investigação criminal neste novo período tecnológico, de forma a analisar de qual forma o Estado poderia continuar a investigar – e punir – criminosos, ante os diversos novos mecanismos tecnológicos, os quais, de um lado, devem alcançar finalidade probatória demandada e, de outro, evidentemente, respeitar as garantias do investigado, sob pena de invalidade.

Após, é necessária a exposição sobre os dados encontrados no celular – diversos daqueles que se classificam como “comunicações de dados” (artigo 5º, inciso XII, Constituição Federal –, como agenda telefônica, ligações realizadas, vídeos, fotos etc. e se, de alguma forma, a privacidade quanto a tais elementos encontra amparo constitucional ou se o Estado pode acessá-los, mais especificamente para fins de investigação, sem autorização judicial, no que diz respeito ao objeto do presente artigo.

Por fim, com intuito de verificar como vêm se posicionando os Tribunais, serão analisadas as compreensões do Superior Tribunal de Justiça, Supremo Tribunal Federal e da Suprema Corte Norte-Americana, colocando-as em contraste para checar o alinhamento ou eventual descompasso entre elas.

1  Os direitos da cidadania na “Era da Informação”

As Constituições modernas, visando a preservar os direitos fundamentais dos indivíduos em face do poder estatal, contêm regras que impõem ao Estado o respeito aos direitos individuais, razão pela qual são chamadas de “Constituições Garantistas” (VIEIRA, 2008, p. 37). Nesse passo, os direitos fundamentais que integram a cidadania constituem paradigma da legitimação estatal, de maneira que, “quanto mais um Estado os consagra e procura torná-los eficazes, mais legitimidade adquire perante a comunidade internacional”; por outro lado, “será considerado menos democrático e menos legítimo o regime político que desrespeita e propicia a agressão a esses direitos” (FARIAS, 2000, p. 82).

No contexto brasileiro, a cidadania é um dos fundamentos de nosso Estado (artigo 1º, inciso II, da Constituição Federal), mostrando-se imprescindível que a atuação estatal seja pautada pela observância da cidadania em todas as suas dimensões.

Nesse sentido, ressalta-se que

Os valores fundamentais adotados pela Constituição Federal transformam-se em princípios gerais de direito e passam a ser a base racional-filosófica para qualquer exercício dos poderes constituídos do Estado. A cidadania, considerada em todas as suas dimensões, é um desses valores, refletida em princípio geral de direito para a atuação do Estado Democrático e Social de Direito. (SMANIO, 2013, p. 13)

Isto posto, é preciso entender, então, como a cidadania deve ser interpretada e como limita e determina a atuação do Estado brasileiro.

A concepção liberal da cidadania, em que o Estado não promovia efetivamente e de forma igualitária os direitos de seus cidadãos, operando de forma distante e abstencionista, não satisfazia materialmente a exigência de liberdade e igualdade reais. Havia, de fato, igualdade jurídica, mas, de outro lado, essa inércia do Estado gerava desigualdade social e econômica, inibindo-se o reconhecimento e a efetivação da justiça social (PEREZ LUÑO , 2003, p. 223).

No século XX, essa concepção de cidadania liberal foi superada e o instituto passou a ser classicamente entendido como um conjunto de direito civis, políticos e sociais, destacando-se, nesse sentido, a obra de Marshall.

Segundo o sociólogo,

O elemento civil é composto dos direitos necessários à liberdade individual – liberdade de ir e vir, liberdade de imprensa, pensamento e fé, o direito à propriedade e de concluir contratos válidos e o direito à justiça. Este último difere dos outros porque é o direito de defender e afirmar todos os direitos em têrmos de igualdade com os outros e pelo devido encaminhamento processual. Isto nos mostra que as instituições mais intimamente associadas com os direitos civis são os tribunais de justiça. Por elemento político se deve entender o direito de participar no exercício do poder político, como um membro de um organismo investido da autoridade política ou como um eleitor dos membros de tal organismo. As instituições correspondentes são o parlamento e conselhos do Govêrno local. O elemento social se refere a tudo o que vai desde o direito a um mínimo de bem-estar econômico e segurança ao direito de participar, por completo, na herança social e levar a vida de um ser civilizado de acôrdo com os padrões que prevalecem na sociedade. As instituições mais intimamente ligadas com êle são o sistema educacional e os serviços sociais. (MARSHALL, 1967, p. 63-64)

A importância dessa visão social da cidadania justifica-se diante da constatação de que o individualismo e a neutralidade do Estado Liberal não eram suficientes para satisfazer as exigências de liberdade e igualdade reais. Isso porque, de fato, “o reconhecimento dos direitos fundamentais implicava, na realidade, uma reforma econômico-social e um maior intervencionismo do Estado, que tornasse os homens capazes de exercê-los” (GRINOVER, 1982, p. 8).

Marshall destaca que “o status uniforme da cidadania ofereceu o fundamento da igualdade sobre a qual a estrutura da desigualdade foi edificada”, concluindo que “as desigualdades não decorriam de falhas nos direitos civis, mas sim da falta de direitos sociais” (MARSHALL, 1967, p. 63-64).

Com a passagem do Estado Liberal para o Estado Social, no século XX, incluindo-se também a dimensão social no conceito de cidadania, restou superado o formalismo positivista, impondo-se ao Estado a realização de fins materiais para uma reforma social e econômica.

Segundo Perez Luño (2003, p. 224), o Estado social

responsabiliza à Administração a tarefa de proporcionar à generalidade dos cidadãos as prestações necessárias e os serviços públicos adequados para o pleno desenvolvimento de sua personalidade, reconhecida não só através das liberdades tradicionais, senão também a partir da consagração constitucional dos direitos fundamentais de caráter econômico, social e cultural.[4]

Atualmente, na chamada Era da Informação, surge um novo desafio quanto à proteção da cidadania.

Uma vez consolidada a necessidade de proteção à cidadania nos moldes acima expostos[5], torna-se de grande relevância, agora, a questão da proteção à privacidade dos cidadãos, pois os dados privados passaram a ser amplamente difundidos e utilizados para fins diversos, já que os dados digitais “possuem amplo espectro e atingem ainda mais severamente a intimidade e a privacidade” (VAZ, 2012, p. 127). Assim, cabe ao Estado controlar tal utilização, a fim de que a intimidade do cidadão não seja indevidamente devassada.

Nessa linha, como destaca Eric Hilgendorf, “os novos desenvolvimentos tecnológicos tornam possível observar e compreender indivíduos de maneira muito mais abrangente e refinada do que era possível em épocas anteriores” (HILGENDORF, 2020, p. 158).

A respeito do tema, Byung-Chul Han assevera que “a esfera pública pressupõe, entre outras coisas, um não olhar para a vida privada”, de modo que “a tomada de distância é constitutiva para o espaço público”, mas, “hoje, em contrapartida, domina uma falta total de distância, na qual a intimidade é exposta publicamente e o privado se torna público” (HAN, 2018, p. 12).

Ademais, “hoje em dia, aqueles que tomam parte na comunicação não consomem simplesmente a informação passivamente, mas sim a geram eles mesmos ativamente”, verificando-se que “nenhuma hierarquia clara separa o remetente do destinatário” e “todos são simultaneamente remetentes e destinatários, consumidores e produtores” (HAN, 2013, p. 15-16)

E, em um Estado Democrático de Direito, há “o dever de subordinação à Constituição implica dever de conformação da atividade administrativa – e jurisdicional – pelos preceitos e princípios constitucionais” (PRADO, 2006, p. 23), de modo que essa realidade da Era da Informação deve ser encarada de acordo com os ditames da cidadania e da proteção aos direitos individuais. De fato, na Era da Informação, ao mesmo tempo em que a esfera privada torna-se mais rica, torna-se mais frágil e exposta a ameaças, do que deriva o surgimento de uma necessidade de contínuo fortalecimento da proteção jurídica e das próprias fronteiras da privacidade (STEFANO, 2008. p. 95).

No Brasil, a privacidade é tutelada pela Constituição Federal, que, em seu artigo 5º, inciso X, prevê que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.

A tutela constitucional da privacidade ainda pode ser extraída do artigo 5º, inciso XII, segundo o qual “é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal”.

No contexto de uma proteção unitária dos direitos da cidadania[6], e considerando-se que o Brasil integra o Sistema Interamericano de Direitos Humanos, é pertinente observar, também, a tutela da privacidade na Convenção Americana de Direitos Humanos, que, em seu artigo 11, itens 2 e 3, prevê que “ninguém pode ser objeto de ingerências arbitrárias ou abusivas em sua vida privada, na de sua família, em seu domicílio ou em sua correspondência”, consignando que “toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais ingerências”.

Inicialmente, a proteção da privacidade, consistia, basicamente, na proibição de invasão dessa privacidade, exigindo-se do Estado uma abstenção de atuação nessa esfera. Assim como a liberdade, era puramente negativa e, por isso, a única obrigação que lhe correspondia era a de respeitar, pela abstenção (GRINOVER, 1982, p. 06).

Todavia, atualmente, como já enfatizado, essa tutela da privacidade possui formulação positiva, exigindo a efetiva atuação do Estado, já que, na “Era da Informação”, a intimidade dos cidadãos é facilmente devassada, cabendo ao Estado, então, agir para obstar a violação a esse direito individual, protegendo-o de forma efetiva.

Como bem pondera Ada Pellegrini Grinover, “hoje mais do que nunca, coloca-se o problema de tutelar o indivíduo contra a invasão do próximo, bem como das autoridades” (1982, p. 68), ou seja, não basta tutelar a privacidade apenas no âmbito privado, mas, também, contra a atuação do próprio Estado.

Na Era da Informação, então, é imperioso que o Estado não somente abstenha-se quanto à intimidade do cidadão, mas que atue para a sua efetiva proteção, inclusive, por meio da regulamentação a respeito do tratamento dos dados pessoais dos cidadãos e a partir da promoção do direito à autodeterminação informacional[7].

2  Investigação penal na “Era da Informação” e a proteção à privacidade

Ao exercer a tutela penal, o Estado, inevitavelmente, acaba por invadir a esfera de direitos reservada aos indivíduos, tendo em vista que a necessidade de preservação da ordem social requer certa limitação do âmbito individual. E “o direito à intimidade é também limitado pelo interesse na persecução criminal, para a qual a informação a respeito de dados pessoais é essencial” (RODRIGUEZ, 2008, p. 50-51).

Como nos ensina Paulo José da Costa Jr., a persecução penal possui legitimidade para a “redução, diminuição da intimidade e não sua eliminação total. Porque o interesse público haverá que se deter diante daquela esfera mais íntima da vida privada que, como tal, é inviolável” (COSTA JR., 1995, p. 45). Inclusive, vale destacar que “o processo penal não pode ser entendido, apenas, como instrumento de persecução do réu”, pois “o processo penal se faz também – e até primacialmente – para a garantia do acusado” (GRINOVER, 1982, p. 20).

Realmente, não obstante seja certo que “hipóteses se configuram em que o interesse do indivíduo é superado pelo interesse público, justificando-se o sacrifício da intimidade” (COSTA JR., 1995, p. 45), esse sacrifício, como restrição a direito fundamental que é, não pode ser ilimitado (ALEXY, 2008, p. 276). Inclusive, se o Estado desrespeitar o direito à intimidade, a prova será considerada ilícita e não poderá ser utilizada, de modo que a efetividade da investigação criminal restará comprometida (GRINOVER; FERNANDES; GOMES FILHO, 2007, p. 159).

Nesse passo, é importante frisar que

se, de fato, não é lícito desnudar a vida particular ou familiar de um indivíduo, seus hábitos e vícios, suas aventuras e preferências, nulla necessitate iubente, a contrario sensu, será legítimo desvendá-la, presentes determinadas justificativas.

Não pode o princípio la vie privée doit être murée ser interpretado como se, em torno da esfera privada a ser protegida, devesse ser erguida verdadeira muralha. Pelo contrário, os limites da proteção legal deverão dispor de suficiente elasticidade. O homem, enquanto indivíduo que integra a coletividade, precisa aceitar as delimitações que lhe são impostas pelas exigências da vida em comum. E as delimitações de sua esfera privada deverão ser toleradas tanto pelas necessidades impostas pelo Estado, quanto pelas esferas pessoais dos demais concidadãos, que poderão perfeitamente conflitar ou penetrar por ela.

Hipóteses se configuram em que o interesse do indivíduo é superado pelo interesse público, justificando-se o sacrifício da intimidade.

(...)

Dissemos sacrifício. Vale dizer, redução, diminuição da intimidade e não sua eliminação total. Porque o interesse público haverá que se deter diante daquela esfera mais íntima da vida privada que, como tal, é inviolável. A intromissão, ali, do interesse público não encontraria justificação, degradando-se este a mera curiosidade. (COSTA JR., 1995, p. 44-46)

Especificamente quanto à restrição do direito à intimidade pela atividade estatal de persecução penal, oportuno citar o seguinte trecho dos ensinamentos de Vania S. Aieta (1999, p. 189-190):

(...) na persecução dos fins punitivos, o Estado exerce atividades investigatórias, a intromissão na esfera da intimidade dos indivíduos se faz inevitável.

Embora a sociedade busque, cada vez mais, a consagração do direito à intimidade, como uma proteção frente às invasões alheias da privacidade, vale ressaltar a necessidade de se considerar o binômio “interesse social” e “liberdade individual”, com fim de alicerçar o entendimento de que as liberdades públicas não podem ser entendidas de forma absoluta, “em face da natural restrição resultante do princípio da convivência das liberdades, pelo que não se permite que qualquer delas seja exercida de modo danoso à ordem pública e às alheias”.

Assim sendo, as demandas do processo penal, concernentes ao exercício da autoridade pública, tanto no campo do poder de polícia, como no da atividade judiciária, constituem uma das modalidades de limitação do direito à intimidade.

Isto não quer dizer que as atividades estatais também não encontrem seus limites.

De fato, assim como ocorre com qualquer direito fundamental, o direito à intimidade não pode ser considerado de maneira absoluta e pode, sim, ser limitado, mas, por outro lado, o impasse resta configurado na medida em que sua restrição igualmente não é ilimitada.

Nesse sentido,

devemos interpretar com cautela o dispositivo constitucional para não incorrer no grave erro de acreditar que a inviolabilidade possa servir de escudo ao infrator da lei penal. Não se pode cogitar que a Lei Maior agasalhe a impunidade. Alerta-se para o fato de que tal direito constitucional não é absoluto e que o mesmo deve ser sopesado no plano do interesse público, do interesse da justiça e do interesse social.

Admite-se, para efeito de investigação criminal, que a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem do suspeito da autoria ou de ter participado de um crime não podem ser considerados direitos intocáveis, sob pena de reduzir ao pó toda a estrutura de persecução penal adotada pelo sistema investigativo brasileiro.

Reitere-se, como de hábito, que as autoridades devem agir em consonância com o estrito cumprimento do dever legal e respeitar os limites ditados pela necessidade e adequação dos atos, pois a mitigação de tais valores não se opera por mero arbítrio do agente investigador, senão pelas regras de Direito que disciplinam a execução do jus puniendi. (BARROS, 2010, p. 182)

Desse modo, “não é lícito permitir ao infrator da lei penal delas (garantias fundamentais) se utilizar como escudo protetor e fugidio da Justiça” (BARROS, 2010, p. 216). Diante desse quadro, “não se ignora que o contexto mundial e nacional coopera para que exista uma compressão do direito à intimidade em face da necessidade de segurança” (RODRIGUEZ, 2008, p. 55).

Nesse contexto, se, de um lado, deve-se evitar uma excessiva restrição dos direitos fundamentais, de outro, também é conveniente evitar uma excessiva expansão dos direitos fundamentais, o que geraria a jusfundamentação de todo o direito, criando uma espécie de “ditadura do Poder Judiciário” (VIEIRA, 2008, p. 55).

Diante disso, o balizamento entre a limitação do Estado pela intimidade e, no caminho oposto, da intimidade pelo Estado, mostra-se imperioso, sendo de rigor analisar essa limitação à atuação estatal decorrente da proteção constitucional à privacidade, para fins de investigação penal, considerando-se a necessidade de uma tutela penal efetiva e, ao mesmo tempo, legítima, especialmente na “Era da Informação”.

3 A agenda e registros telefônicos com albergue constitucional

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, enumera as diversas garantias fundamentais. Destaca-se, para o fim destinado por esta pesquisa, o direito à privacidade, previsto no inciso X: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. André Ramos Tavares, ao explicar o direito à privacidade, indica que ele engloba todo conjunto de dados, informações, manifestações e referências individuais:

Pelo direito à privacidade, apenas ao titular compete a escolha de divulgar ou não seu conjunto de dados, informações manifestações e referências individuais, e, no caso de divulgação, decidir quando, como, onde e a quem. Esses elementos são todos aqueles que decorrentes da vida familiar ou particular do cidadão, envolvendo fatos, atos, hábitos, pensamentos, segredos, atitudes e projetos de vida. (TAVARES, 2020, p. 551)

A tutela da privacidade, de índole constitucional, portanto, engloba todas aquelas informações ou manifestações que dizem respeito intimamente ao indivíduo e que, se divulgadas, o afetarão. Em suma, a proteção alcança escritos ou qualquer outra produção do intelecto ou dos sentimentos (WARREN; BRANDEIS, 1890, p. 218)

E, nesses termos, para além de discussões de índole processual penal – que serão enfrentadas neste artigo -, tem-se que a violação da garantia de privacidade, como aponta a tradicional doutrina, acarreta o ressarcimento material (WARREN; BRANDEIS, 1890, p. 218) – o que endossa a importância do direito à privacidade dentro do ordenamento -, exatamente como dispõe a Constituição Federal ao indicar o direito à indenização pelo dano moral ou material sofrido e o Código Civil, em seu artigo 186: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”. Também nesse sentido – de maneira mais próxima à presente pesquisa -, incide o artigo 7º, inciso I, do Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/14), que foi considerado como uma alteração legislativa promissora no âmbito dos dados armazenados em dispositivos móveis (ANTONIALLI; ABREU; MASSARO; LUCIANO, 2019, p. 16).

Por outro lado, tem-se a garantia ao sigilo de dados, expressamente prevista no artigo 5º, inciso XII, da Constituição Federal, segundo o qual: “é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;”

Alexandre de Moraes explica que o princípio torna inviolável as correspondências e comunicações em geral e que se trata de corolário das inviolabilidades trazidas pela Constituição Federal. Conclui que o “o preceito que garante o sigilo de dados engloba o uso de informações decorrentes da informática” (MORAES, 2020, e-book). Aliás, o autor, citando o entendimento do Supremo Tribunal Federal, exarado no mandado de segurança nº 21.726 DF, alça o sigilo de dados ao postulado de cláusula pétrea (MORAES, 2020, e-book).

Mendes e Gonet sustentam que “dados”, mencionados no dispositivo constitucional, devem ser interpretados não apenas como as “comunicações”, mas qualquer dado armazenado pelo interessado:

Entende-se por “dados” quaisquer informações armazenadas, tanto pelo próprio investigado quanto por terceiros. Aí estão incluídos dados cadastrais, dados de transação, dados bancários, dados fiscais, dados informáticos e quaisquer outras informações armazenadas.  (MENDES; BRANCO, 2018, p. 602).

Entretanto, parece-nos que a leitura trazida pela Constituição Federal não permite tal interpretação. Diz o dispositivo que a proteção se daria das “comunicações de dados”, assim entendidos como mensagens, áudios, ligações, e não dados armazenados, como fotos, vídeos ou anotações. Portanto, a tutela constitucional é das comunicações de dados e não dos dados, propriamente ditos. Sobre a questão, Tércio Sampaio Ferraz Júnior:

Se estes dados, armazenados eletronicamente, são transmitidos, privadamente, a um parceiro, em relações mercadológicas, para defesa do mercado, também não está havendo quebra de sigilo. Mas, se alguém entra nesta transmissão como um terceiro que nada tem a ver com a relação comunicativa, ou por ato próprio ou porque uma das partes lhe cede o acesso indevidamente, estará violado o sigilo de dados. A distinção é decisiva: o objeto protegido no direito à inviolabilidade do sigilo não são os dados em si, mas a sua comunicação restringida (liberdade de negação). A troca de informações (comunicação) privativa é que não pode ser violada por sujeito estranho à comunicação. (FERRAZ JÚNIOR, 1993, p. 446-447)

Entretanto, sem prejuízo deste encaminhamento, embora o artigo 5º, inciso XII, da Constituição Federal, não faça referência aos dados armazenados, como fotos, vídeos, agendas telefônicas, registros de ligações, aplicativos, anotações, tem-se que sua tutela encontra albergue na garantia de privacidade do indivíduo (artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal).

Todos estes dados indicados – galeria de fotos, vídeos, anotações, registros de ligações e agenda telefônica – dizem respeito à intimidade e vida privada do sujeito, de forma que integram a privacidade. Hoje, mais do que nunca, o celular carrega consigo inúmeras informações eminentemente pessoais e, por isso, todas informações ali inseridas formam a intimidade do sujeito. Para além disso, os instrumentos portáteis permitem a navegação pela rede mundial de computadores, assim como o histórico ali acesso, viabilizando que se aufira as preferências do usuário (ZILLI, 2018, p. 86).

Em vista disso, são invioláveis os dados inseridos no dispositivo eletrônico, ante a garantia de privacidade. Evidentemente, em se tratando de garantias fundamentais, embora de relevantíssimas importâncias, não detém caráter absoluto no ordenamento jurídico. Isto porque, em ponderação com outros valores de índole constitucional, podem ser limitadas (MENDES; BRANCO, 2018, p. 143). Tal hipótese ocorre, claro de maneira excepcional, quando as “liberdades públicas estiverem sendo utilizadas como instrumento de salvaguarda de práticas ilícitas.” (MORAES, 2020, p. 64). Exemplo é a possibilidade de interceptação das comunicações telefônicas, ante a regência da Lei nº 9.296/96, e das correspondências (MORAES, 2020, p. 64).

De todo modo, tem-se que, pela leitura trazida do artigo 7º, inciso I, do Marco Civil da Internet, os dispositivos celulares encontram amparo naquela lei, de forma que só poderão ser acessados mediante ordem judicial emanada do Juízo competente (ANTONIALLI; ABREU; MASSARO; LUCIANO, 2019, p. 16).

Portanto, de maneira absolutamente excepcional, podem ser os dados acessados, desde que haja decisão judicial, devidamente fundamentada, à luz das garantias fundamentais em análise, delimitando, inclusive, a abrangência da medida que será implementada. Qualquer avanço no acesso, sem a devida deliberação, viola liberdades individuais e, daí, a reserva de jurisdição, que pode ser assim definida:

A idéia de reserva de jurisdição implica a reserva de juiz relativamente a determinados assuntos. Em sentido rigoroso, reserva de juiz significa que em determinadas matérias cabe ao juiz não apenas a última palavra mas também a primeira palavra. É o que se passa, desde logo, no domínio tradicional das penas restritivas da liberdade e das penas de natureza criminal na sua globalidade. Os tribunais são os guardiões da liberdade e das penas de natureza criminal (...) (CANOTILHO, 2003, p. 664)

O panorama doutrinário, portanto, sugere que as informações que se encontrem dentro do telefone celular ganham corpo constitucional, especificamente pela garantia da privacidade, de forma que, em atenção à reserva de jurisdição, a decisão judicial autorizadora constitui condição de validade à atividade probatória e, além disso, fixa limites mínimos, intrínsecos ao Estado de Direito (WANDERLEY, 2019, p. 128). A partir das luzes trazidas pela doutrina, é importante ver seu impacto prático, por meio de sua implementação nas decisões oriundas pelo Superior Tribunal de Justiça, Supremo Tribunal Federal e a Suprema Corte Norte-Americana.

4  O panorama jurisprudencial: o que podemos aprender com a Suprema Corte Norte-Americana?

Neste tópico, serão analisadas as posições exaradas, em torno do tema pesquisado, pelo Superior Tribunal de Justiça, pelo Supremo Tribunal Federal e, sobretudo, pela Suprema Corte Norte-Americana.

4.1  Superior Tribunal de Justiça

O Superior Tribunal de Justiça, enfrentando a matéria por duas oportunidades, entendeu que a agenda telefônica, por não integrar os dados pessoais, não se encontra sob reserva de jurisdição e, por isso, não demanda autorização judicial para seu acesso. Daí, mesmo que sem deferimento judicial, seria válido o acesso.

Este entendimento foi exarado pela Quinta Turma quando do julgamento do recurso especial nº 1.782.386-RJ, de relatoria do Ministro Joel Ilan Paciornik. Em suma, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro compreendeu que a agenda telefônica integrava a intimidade do indivíduo e, por tal razão, demandava autorização judicial. Contra tal acórdão, o Ministério Público interpôs recurso especial, o qual restou provido pelo Superior Tribunal de Justiça. Vale a transcrição de parte da ementa:

3. O inciso XII do art. 5º da Constituição veda o acesso a dados decorrentes de interceptação telefônica ou telemática, ainda que armazenados no aparelho celular, sem a correspondente autorização judicial.

4. No caso, como autorizado pelo Código de Processo Penal – CPP foi apreendido o telefone celular de um acusado e analisados os dados constantes da sua agenda telefônica, a qual não tem a garantia de proteção do sigilo telefônico ou de dados telemáticos, pois a agenda é uma das facilidades oferecidas pelos modernos aparelhos de smartphones a seus usuários.

Ainda, no caso examinado, há expressa menção à desnecessidade de autorização judicial, no caso de flagrante delito, para análise do registro de chamadas do preso (fls. 12), que, tal como a agenda telefônica, não seriam abarcados pela reserva de jurisdição. O recurso especial, à unanimidade, foi provido para reconhecer a validade da prova produzida.

E também foi assim que a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça entendeu quando julgou o agravo regimental no recurso especial nº 1.853.702-RS, cuja relatoria foi do Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, e assentou-se que:

No entanto, no presente caso, a Corte local informou ter havido acesso aos registros telefônicos e à agenda do aparelho celular apreendido com um dos envolvidos, dados esses não abarcados pela reserva de jurisdição prevista no art. 5º, XII, da Constituição Federal, não podendo se falar em ilegalidade da referida prova.

Em outro caso, o agravo regimental no recurso especial nº 1.760.815-PR, relatoria da Ministra Laurita Vaz, perante a Sexta Turma, entendeu-se que relações de dados de chamadas, além de outros dados relacionados, são informes externos à comunicação telemática, sem necessidade de que haja autorização judicial:

Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a quebra do sigilo dos dados cadastrais do [sic] usuários, relações de números de chamadas, horário, duração, dentre outros registros similares, que são informes externos à comunicação telemática, não se submetem a disciplina da Lei n.º 9.296/96, que trata da interceptação do que é transmitido pelo interlocutor ou do teor da comunicação telefônica.

Portanto, a compreensão exarada pelo Superior Tribunal de Justiça, com precedentes de seus dois órgãos fracionários para julgamento de demandas penais, é de que a agenda telefônica, assim como registro de ligações, não se encontra abarcados pelo sigilo de dados. Chama atenção, entretanto, que, embora efetivamente o tema tenha sido abordado, não foi realizada a análise se tais seriam integrantes da privacidade, garantia de estatura constitucional (artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal) e que, além disso, no primeiro precedente mencionado, foi um dos fundamentos do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro para reconhecer a ilicitude das provas colhidas.

4.2  Supremo Tribunal Federal

O primeiro precedente que enfrenta a matéria nos remete a 2012, quando se apreciou o habeas corpus nº 91.867-PA, de relatoria do Ministro Gilmar Mendes, julgado em 24 de abril de 2012, perante a Segunda Turma, em que se assentou que não haveria ilegalidade quando os policiais, após a prisão em flagrante, mesmo sem ordem judicial, checar os registros telefônicos. Para tanto, consignou o relator que há diferença entre “comunicação telefônica” e “registros telefônicos”, sendo que o último não encontraria proteção constitucional:

2.1 Suposta ilegalidade decorrente do fato de os policiais, após a prisão em flagrante do corréu, terem realizado a análise dos últimos registros telefônicos dos dois aparelhos celulares apreendidos. Não ocorrência. 2.2 Não se confundem comunicação telefônica e registros telefônicos, que recebem, inclusive, proteção jurídica distinta. Não se pode interpretar a cláusula do artigo 5º, XII, da CF, no sentido de proteção aos dados enquanto registro, depósito registral. A proteção constitucional é da comunicação de dados e não dos dados.

Em síntese, sustenta o acórdão que o albergue constitucional se daria a “comunicação de dados” e não dos dados, o que afastaria que um registro telefônico demande reserva de jurisdição.

A temática, certo período depois, foi novamente submetida à Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, sob relatoria do Ministro Gilmar Mendes, no habeas corpus nº 168.052 SP. E, embora a prova enfrentada tenha sido exclusivamente conversas do whatsapp – o que, evidentemente, encontra-se constitucionalmente amparado pela “comunicação de dados” –, fato é que o voto do Ministro Gilmar Mendes sustenta a existência de mutação constitucional, já que o cenário fático e jurídico se alterou com “significativo desenvolvimento das tecnologias da comunicação, do tráfego de dados e dos aparelhos smart phones”. Daí porque, na compreensão exarada pela Segunda Turma:

Portanto, entendo ser possível o acesso aos dados contidos em aparelhos celulares, uma vez que não há uma norma absoluta de proibição da visualização do seu conteúdo, conforme se poderia extrair a partir de uma interpretação literal da norma contida no art. 5º, XII, da Constituição da República.

Não obstante, a proteção à intimidade e à vida privada contida no art. 5º, X, da CF/88, e a exigência da observância ao princípio da proporcionalidade nas intervenções estatais nesses direitos, impõem a revisão de meu posicionamento anterior, para que o acesso seja condicionado à prévia decisão judicial.

As normas do art. 3º, II, III; 7º, I, II, III, VII; 10 e 11 da Lei 12.965/2014 e as significativas alterações no contexto fático subjacente evidenciam se tratar de verdadeiro caso de mutação constitucional na interpretação do âmbito de proteção dos direitos estabelecidos no art. 5º, X e XII, da CF.

Aliás, expressamente o acórdão indica as informações (fls. 08) que podem ser registradas pelo aparelho celular e, portanto, vinculam-se com o sigilo constitucional de dados, como agenda telefônica, localização pelo GPS ou estação rádio base, chamadas realizadas e recebidas, informações armazenadas em nuvem, além de outros.

Não obstante, o tema foi submetido ao Plenário do Supremo Tribunal Federal, por meio do agravo em recurso extraordinário nº 1.042.075-RJ, com repercussão geral reconhecida, ainda sem definição. O Relator, Ministro Dias Toffoli, entendeu pela validade do acesso, sem autorização judicial, pela autoridade policial aos registros telefônicos e agenda de contatos e propôs a fixação da seguinte tese:

É lícita a prova obtida pela autoridade policial, sem autorização judicial, mediante acesso a registro telefônico ou agenda de contatos de celular apreendido ato contínuo no local do crime atribuído ao acusado, não configurando esse acesso ofensa ao sigilo das comunicações, à intimidade ou à privacidade do indivíduo (CF, art. 5º, incisos X e XII)"

Divergiram do Relator os Ministros Edson Fachin e Gilmar Mendes, para os quais é necessária autorização judicial que demonstre a necessidade de adequação da medida implementada, ante a necessidade de resguardo da intimidade, privacidade, sigilo das comunicações e dados dos indivíduos. Propuseram a fixação da seguinte tese:

O acesso a registro telefônico, agenda de contatos e demais dados contidos em aparelhos celulares apreendidos no local do crime atribuído ao acusado depende de prévia decisão judicial que justifique, com base em elementos concretos, a necessidade e a adequação da medida e delimite a sua abrangência à luz dos direitos fundamentais à intimidade, à privacidade e ao sigilo das comunicações e dados dos indivíduos (CF, art. 5º, X e XX)

Atualmente, o julgamento está suspenso por pedido de vistas do Ministro Alexandre de Moraes, sem previsão de retorno.

Logo, o Supremo Tribunal Federal mostra certa instabilidade na jurisprudência, de forma que o acórdão mais recente, oriundo da Segunda Turma, diverge da compreensão exarada de maneira pacífica pelo Superior Tribunal de Justiça. Também, como visto, não há posição firmada por seu Plenário, já que o julgamento pende de finalização. Daí a incerteza, pelo menos no panorama jurisprudencial brasileiro, da incidência dos postulados constitucionais ao caso examinado.

4.3  Suprema Corte Norte-Americana

Ao contrário do que acontece no Brasil, talvez nos sirva de lição, os Estados Unidos da América, por meio de sua Suprema Corte, pacificaram a questão, inclusive corroborando com as lições da doutrina aqui trazidas. Embora ainda seja possível que o Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do recuso extraordinário mencionado, entenda que há violação ao princípio da privacidade, fato é que, por ora, o que se tem é um panorama, para dizer o mínimo, instável, o que recomenda nos socorrermos da jurisprudência norte-americana, especificamente do caso Riley vs. California.

Riley foi parado por possível infração de trânsito, o que levou à sua prisão por porte de arma. Na busca, um celular foi encontrado no bolso de Riley, no que foi acessado pelo policial, que constatou o uso repetido de um termo relacionado a uma gangue de rua. Cerca de duas horas depois, já no distrito policial, o detetive especializado em gangues verificou o conteúdo do celular e, com base em fotos e vídeos, a vinculou a um tiroteio ocorrido semanas antes. Perante o Tribunal local e o Tribunal de Apelação da Califonia, manteve-se a condenação.

Apresentou recurso perante a Suprema Corte dos Estados Unidos, a qual reconheceu a violação à privacidade do indivíduo. Para a Suprema Corte dos Estados Unidos, a apreensão do celular, para que se possa checar o conteúdo, é necessário que haja um mandado expedido pelo Juiz.

Lembrou, em primeiro momento, o acórdão que, atualmente, os celulares são minicomputadores, os quais carregam inúmeras funções. E, ainda, sublinhou que possível invasão na privacidade em um celular, não é tão limitada, já que poderiam carregar milhões de páginas de textos, fotos e muitos vídeos. Daí que, pela compreensão exarada, a capacidade de armazenamento de celulares tem consequências para o direito à privacidade.

Um dos argumentos, trazidos oralmente pelo Estado da California – com intuito de manter a validade das provas colhidas – foi de que se, antes da era digital, entendia-se válido que o policial abrisse o diário de bolso para copiar o endereço do dono, deveria ser legítimo que os policiais pudessem vascular o celular. Todavia, de maneira acertada, a Suprema Corte Norte-Americana refutou a tese, lembrando que:

Mas o fato de que na era pré-digital eles poderiam ter detectado uma ou duas fotos em uma carteira, não autoriza a busca por milhares de fotos em uma galeria digital. O fato de que alguém poderia ter colocado um extrato bancário em um bolso, não autoriza a busca por todos extratos bancários dos últimos cinco anos[8].

Ao final, a Suprema Corte Norte-Americana entendeu que a polícia não pode, antes da obtenção do mandado, realizar a devassa no celular, ante a inúmera quantidade de dados pessoais ali trazidos:

O fato de que a tecnologia agora admite que uma pessoa carregue essas informações na sua mão não torna essa informação menos digna de proteção pela qual os fundadores lutaram. Nossa resposta para a questão de o que a polícia deve fazer antes de realizar a busca em um celular apreendido incidente para uma prisão é, consequentemente, simples – obter um mandad.[9].

A Suprema Corte Norte-Americana traz luzes que devem seguir de bússola ao Plenário do Supremo Tribunal Federal. A garantia da privacidade engloba todas informações pessoais do sujeito, seja lá onde estiverem. Assim, todas informações que se encontrarem dentro do telefone celular encontram amparo na Constituição Federal. Por isso, a imprescindibilidade na decisão judicial autorizadora da medida. Em outras palavras, acertada a posição da Suprema Corte dos Estados Unidos, a qual entendeu que, diante da apreensão de um celular, deve-se, antes de realizar a busca, obter um mandado judicial.

CONCLUSÃO

A privacidade, tutela que ganhou corpo constitucional e incorporação à inúmeras leis promulgadas, tal como o Marco Civil da Internet e a Lei Geral de Proteção de Dados, revela-se como imprescindível à formação da cidadania do sujeito e restou profundamente alterada com o advento da Era da Informação, em que todos os dados e informações pessoais passaram a circular com facilidade por todo o globo.

Nesse contexto, tem-se que a evolução dos meios tecnológicos trouxe novas dinâmicas às relações investigativas e, portanto, ao próprio Estado de Direito. Hoje, celulares são máquinas que controlam a vida do sujeito. Ali, pode-se carregar todos dados que entender necessário. Desde anotações rotineiras, fotos, até senha do banco. Daí a importância do estudo trazido.

Com efeito, o Estado deve valer-se de meios líticos, éticos e válidos para o controle da segurança pública, sendo que, caso viole garantias constitucionais, ainda que com a finalidade de combate à criminalidade, sua atuação será inválida, já que os fins não justificam os meios, principalmente no âmbito de um Estado Democrático de Direito.

E, nesses termos, os dados inseridos em celulares encontram proteção constitucional. No caso de “comunicações de dados”, é explícita a sua tutela no artigo 5º, inciso XII, da Constituição Federal. Sobre isso, não há discussão, principalmente ante a clareza do texto constitucional.

Em relação aos demais dados encontrados no celular, tais como vídeos, agenda telefônica, relação de chamadas, fotos, não nos parece que estejam abrangidas pelo artigo 5, inciso XII, porquanto se tratam de “dados” e não “comunicação de dados”. Entretanto, e isso ficou evidente, todos esses elementos, por se tratarem de informações íntimas do indivíduo, encontram-se dentro de seu direito à privacidade, também com estatura constitucional (art. 5º, inciso X, da Constituição Federal).

Esta íntima relação, no âmbito da Suprema Corte Norte-Americana, ficou evidenciada no julgamento do caso Riley v. California, no que se reconheceu que os dados inseridos no celular fazem parte da intimidade. Logo, para acessá-los, de maneira obviamente excepcional, à vista da reserva de jurisdição, é necessária prévia decisão judicial, devidamente fundamentada, prolatada por Juízo competente, que demonstre a necessidade e adequação da medida, sob pena de invalidade.

Aqui no Brasil, embora o Superior Tribunal de Justiça tenha tranquila compreensão pela prescindibilidade de decisão autorizadora nesses casos, o Supremo Tribunal Federal ainda não finalizou o julgamento com repercussão geral reconhecida, ante pedido de vista do Ministro Alexandre de Moraes. Há esperança, com base nessa pesquisa, que o Supremo Tribunal Federal acompanhe o posicionamento já externado pelos Ministros Gilmar Mendes e Edson Fachin, que deixaram claro que o acesso deve ser precedido de decisão judicial fundamentada que demonstre a necessidade e adequação da medida, à luz das garantias fundamentais.

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Notas de Rodapé

[1]     Doutor em direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e diretor da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, Brasil. E-mail: gianpaolosmanio@mackenzie.br. https://orcid.org/0000-0002-5835-4392

[2]     Doutora em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e professora da Faculdade de Direito na mesma instituição, São Paulo, Brasil, E-mail: orly.kibrit@mackenzie.br. https://orcid.org/0000-0002-3688-5942

[3]     Mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, Brasil.E-mail: eduardomanhoso@gmail.com. https://orcid.org/0000-0003-0580-9370

[4]     Tradução livre. No texto original: “responsabiliza a la Administración de la tarea de proporcionar a la generalidad de los ciudadanos las prestaciones necesarias y los servicios públicos adequados para el pleno dessarrollo de su personalidad reconocida no sólo a través de las libertades tradicionales, sino también a partir de la consegración constitucional de los derechos fundamentales de carácter económico, social y cultural”.

[5]     A esse respeito, como ensina Norberto Bobbio, “o problema fundamental em relação aos direitos do homem, hoje, não é tanto o de justificá-los, mas o de protegê-los. Trata-se de um problema não filosófico, mas político” (2004, p.23)

[6]     A respeito do tema, vale conferir a doutrina de Kibrit (2018)

[7]     A respeito do tema: SMANIO, Gianpaolo Poggio; KIBRIT, Orly. Cidadania e persecução penal na Era da Informação. São Paulo: Editora Mackenzie, 2022.

[8]     Tradução livre. No texto original (fls. 28): “But the fact that a search in the pre-digital era could have turned up a photograph or two in a wallet does not justify a search of thousands of photos in a digital gallery. The fact that someone could have tucked a paper bank statement in a pocket does not justify a search of every bank statement from the last five years.”

[9]     Tradução livre. No texto original (fls. 32): “The fact that technology now allows an individual to carry such information in his hand does not make the information any less worthy of the protection for which the Founders fought. Our answer to the question of what police must do before searching a cell phone seized incident to an arrest is accordingly simple— get a warrant.”