O Princípio da Dignidade Humana: a influência de Pico Della Mirandola para a construção de um conceito contemporâneo de dignidade
The Principle of Human Dignity: the influence of Pico Della Mirandola in building a contemporary concept of dignity
DOI: 10.19135/revista.consinter.00018.15
Recebido/Received 26/04/2023 – Aprovado/Approved 01/09/2023
Marco Antonio Marques da Silva[1] – https://orcid.org/0000-0003-2447-6700
Regina Helena Piccolo Cardia[2] – https://orcid.org/0009-0007-8283-340X
Resumo
O artigo ora apresentado pretende analisar a obra de Pico Della Mirandola, Discurso sobre a Dignidade Humana, que estabeleceu um marco no Renascimento, buscando uma conexão entre a concepção teológica e filosófica da dignidade humana. O estudo enseja promover um diálogo entre diversas fontes, como a doutrina e os precedentes do Supremo Tribunal Federal, estabelecendo uma conceituação contemporânea da dignidade humana, a partir de influxos colhidos na obra de Pico Della Mirandola. A metodologia empregada vale-se do método dedutivo, com pesquisa bibliográfica descritiva e comparativa conceitual. O objetivo é delimitar as bases que permitam concluir a influência do autor para a consolidação do conceito contemporâneo de dignidade humana, visando assegurar que a vida seja experimentada em sua dimensão digna, como qualidade inerente à condição humana e em sua dimensão universal.
Palavras-chave: dignidade humana; autonomia; liberdade; universidade; Pico Della Mirandola.
Abstract
The article presented here intends to analyze the work of Pico Della Mirandola, Discourse on Human Dignity, which established a milestone in the Renaissance, seeking a connection between the theological and philosophical conception of human dignity. The study aims to promote a dialogue between different sources, such as the doctrine and precedents of the Federal Supreme Court, establishing a contemporary conceptualization of human dignity, based on inputs collected in the work of Pico Della Mirandola. The methodology employed uses the deductive method, with descriptive bibliographic research and conceptual comparison. The objective is to delimit the bases that allow concluding the author's influence for the consolidation of the contemporary concept of human dignity, aiming to ensure that life is experienced in its dignified dimension, as a quality inherent to the human condition and in its universal dimension.
Keywords: human dignity; autonomy; freedom; universality; Pico Della Mirandola.
Sumário: 1. Considerações iniciais. 2. Discurso sobre a dignidade humana. 3. Tratados internacionais de direitos humanos. 4. Disposições constitucionais. 5. Questões complexas. 6. Conclusão. 7. Referências.
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
O presente artigo tem por objetivo lançar luz sobre um autor pouco citado no estudo contemporâneo da dignidade humana, mas que traz influxos importantes para a compreensão e ampliação da conceituação deste importante princípio fundamental, visando o alcance e a manutenção do bem-viver. A obra de Pico Della Mirandola, Discurso sobre a Dignidade Humana, tornou-se um marco do Renascimento, sob a perspectiva antropocêntrica e humanista, buscando estabelecer um liame entre as concepções teológica e filosófica em uma beleza literária ímpar.
O cotejo da obra do autor com os principais instrumentos normativos da ordem internacional e constitucional busca promover um diálogo entre as fontes, a fim de verificar pontos de concórdia e dissenso. Para complementar essa análise, incorporam-se ao debate o pensamento de diversos autores sobre o tema, as questões complexas advindas com a aplicação do princípio da dignidade humana e, por fim, a visão do Supremo Tribunal Federal acerca da matéria.
A metodologia empregada vale-se do método dedutivo, com pesquisa bibliográfica e instrumentos normativos, nacionais e internacionais, visando descrever e extrair dos conceitos trazidos a influência do autor para a consolidação do conceito contemporâneo de dignidade humana.
Cabe enfatizar que a expressão dignidade humana é notadamente polissêmica, deveras abstrata, porosa e plástica. Já se sustentou, inclusive, a perda da dignidade humana ou mesmo uma gradação. São Tomás de Aquino entendia que o homem, ao delinquir, decaía de sua dignidade, rebaixando-se à condição de besta, legitimando-se, pois, a pena de morte[3]. Outros exemplos, por sua vez, retiraram a condição de dignidade do ser humano, tornando-o juridicamente coisa[4], semovente, apátrida, de qualquer forma um ser descartável[5], endossando práticas escravagistas ou genocidas. Estes pontos reforçam a importância do tema, visando assegurar que a vida seja experimentada em sua dimensão digna, como qualidade inerente à condição humana e em sua dimensão universal.
2 DISCURSO SOBRE A DIGNIDADE HUMANA
A dignidade humana é tema dos mais candentes de todos os tempos e estudado por grandes pensadores de múltiplas áreas do conhecimento. Aqui, destaca-se o italiano Giovanni Pico Della Mirandola (1463-1494), por muitos ainda desconhecido, considerado “o humanista mais sábio, rico, jovem e belo do seu tempo”[6]. Em sua breve passagem pelo Cosmos, Pico Della Mirandola deixou um legado considerável à humanidade.
De filiação nobre, aos catorze anos saiu de Mirandola (Itália) para estudar Direito Canônico, em Bolonha (Itália), desistindo da preparação de jurista para se tornar filósofo. Erudito, estudou latim, grego, hebraico, árabe e sírio, com formação em grandes centros pensantes da época (Bolonha, Ferrara, Pádua, Paris e Florença).
Aos 23 anos, publicou suas novecentas teses, nomeadas Conclusiones philosophicae, calalisticae et theologicae, acreditando ter descoberto as bases fundamentais do conhecimento humano, em que associou ao desenvolvimento das ideias de Platão, de Hermes Trismegisto e da Cabala, além dos conhecimentos em matemática e lógica.
A obra Discurso sobre a Dignidade do Homem (Oratio de hominis dignitate), embora escrita posteriormente, é considerada uma introdução a estas teses, tidas à época como heréticas pela Igreja Católica e que acabou lhe rendendo a censura de suas obras e um convite à retratação, aceito por aquele. Aos 31 anos, morreu sem firmar a batalha de ideias almejada, mas deixando para a posteridade inúmeras contribuições ligadas à compreensão da natureza e da dignidade humana.
Discurso sobre a Dignidade Humana é reconhecidamente um manifesto do Renascimento, inspirada em Platão e Aristóteles, disposto a promover a concórdia entre estes e outros teóricos e teorias. Expressão eloquente do antropocentrismo e do humanismo, apresenta um novo lugar conferido ao homem no universo, precisamente no centro dele[7]. A partir do enaltecimento e da promoção dos valores do homem, com um alcance ontológico, metafísico e ético, aprofunda na antropologia, na religião e na magia, tornando-se reconhecido como um dos criadores da cabala cristã (mística), cujo objetivo era promover uma concórdia entre a ratio philosopica e a ratio theologica[8].
A obra de Pico Della Mirandola defende a filosofia como um investigar das causas dos processos da natureza, da razão do universo e da humanidade, os conselhos de Deus, enfim, os mistérios do céu e da Terra. Ressalta-se que os temas da natureza e da dignidade humana não são exclusivos ou pioneiros dos estudos do autor, mas transversal no Renascimento. Todavia, é neles que a conjugação de traços e de contexto até a formulação da concepção da dignidade humana se encontra em maior evidência[9]. A novidade da obra reside, assim, na conjugação da filosofia clássica com a religião cristã, fixando a dignidade humana a partir da concepção do ser humano como criatura à imagem e semelhança de Deus.
Uma vez concebido o Universo, Deus teria sentido a necessidade de trazer ao mundo uma criatura capaz de compreender, amar e admirar a grandiosidade da obra divina. Por essa razão, Deus cria o ser humano com características totalmente distintas dos demais seres (mundanos ou celestes), dotando-o, pois, de dignidade. O ser humano, portanto, teria natureza indefinida e estaria situado no meio do mundo (antropocentrismo). Essa indeterminação, resiliência ou plasticidade inerentes à condição humana infirmam o seu livre-arbítrio (liberdade), do qual os seres humanos foram dotados, não como prêmio ou superioridade imotivada, mas como um dever de estar à altura da obra divina. Ademais, concebe os seres humanos superiores aos demais animais (bestas), porque estes nascem, vivem e morrem de maneira previsível e determinada, estando, pois, subjugados à decisão humana[10].
O autor esclarece que a natureza humana não reside no fato biológico de termos nascidos seres humanos. O ser humano dispõe de uma dualidade inata, que contém todas as potencialidades – ódio e amor, guerra e paz, céu e inferno – podendo degenerar até as bestas ou regenerar até os seres celestes/superiores, por decisão de seu ânimo. A meta humana é a aproximação aos seres celestes, os quais descreve com as seguintes virtudes correspondentes: Serafim (amor), Querubim (inteligência/razão) e Trono (juízo/justiça). O atingimento desse ideal se dará pelo discernimento, pela reta razão, que une as três potências angélicas (amor, razão, justiça) em um nó. Esse nó distintivo do discernimento é a filosofia, que se destina a levar a humanidade a alcançar a felicidade e a paz. Conforme Eurico Bittencourt Neto, aliás:
O Discurso sobre a dignidade humana é considerado o primeiro autêntico manifesto do Humanismo, marca a concepção antropocêntrica, em que o homem é digno de admiração por ter sido dotado pelo criador do arbítrio e da razão, sendo o mediador dos mundos celeste e terreno, capaz de se autodeterminar (soberano artífice de ti mesmo)[11].
Nesta breve introdução da obra de Pico Della Mirandola, é possível verificar elementos importantes para a conceituação da dignidade humana: condição imanente ao ser humano, criatura ímpar, dualidade (capaz de valores ou potencialidades das mais elevadas e das mais baixas e animalescas) e disposição de livre-arbítrio, vocacionado à felicidade e à paz. Além disso, é possível extrair a formatação de uma base sólida de direitos próprios dos seres humanos (direitos humanos), assentada na autonomia, liberdade e universalidade.
3 TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS
Por séculos foi possível testemunhar uma mudança paulatina no sistema de proteção dos direitos individuais, saindo da dimensão interna dos países para a ordem internacional, ensejando um sistema multinível de proteção que trabalha com três arenas: global, regional e local, permeáveis e abertas a interações mútuas, que tem como vértice a dignidade humana e como consequência o princípio pro persona.
Esse processo de construção histórica é marcado pela internacionalização dos direitos humanos ou humanização do direito internacional, pela internacionalização do direito constitucional ou constitucionalização do direito internacional, deixando assente a substituição do costume internacional pelo direito positivado, como sua fonte primária.
Antes de se analisar os sistemas protetivos contemporâneos, necessário mencionar um grande marco na linha evolutiva dos direitos humanos: a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, redigida por Emmanuel Joseph Sieyès[12], na Revolução Francesa (1789).
Sob influência do liberalismo clássico, a Declaração reconheceu a existência de direitos inatos ao homem, sendo o Estado vocacionado à sua proteção. Recorda-se que, à época, o Estado dividia a sociedade em três estamentos: nobreza, clero e povo e, apesar de o texto mencionar a igualdade entre os homens, na verdade, o sentido do termo estava adstrito ao gênero masculino e à classe dos burgueses (cidadãos). Os direitos básicos inatos ao homem assegurados pela Declaração consubstanciavam-se na liberdade, na propriedade, na segurança e na resistência à opressão, e na participação política, apartada de concepções religiosas, creditando-a ao povo, mas restritivamente àqueles considerados cidadãos[13].
O intento da Declaração, indubitavelmente, foi ampliar direitos e limitar o poder do Estado em todas as suas perspectivas. Foi reconhecida também pelas características de abstração, universalismo[14], intemporalidade, plasticidade do texto, além de reverenciar expressamente os princípios da legalidade, democrático e capacidade contributiva[15] e encampar os ideais revolucionários de liberdade, igualdade e fraternidade[16].
Nessa linha, o filósofo Immanuel Kant publica Fundamentação da Metafísica dos Costumes, obra na qual afirma que o homem é um fim em si mesmo, não podendo servir simplesmente como meio para o uso arbitrário desta ou daquela vontade. Defende também que no mundo finalístico, tudo tem um preço ou uma dignidade; aquilo que tem preço é fungível, enquanto o que não admite equivalente é o que tem uma dignidade, um valor intrínseco. A autonomia é a essência do princípio da dignidade da natureza humana e de toda natureza racional[17].
A acepção kantiana fundamenta toda concepção contemporânea de dignidade humana, com sua linha divisória do que sustenta a dignidade, sua singularidade, infungibilidade, racionalidade, autonomia, humano como valor-finalístico, de maneira que não há como não lembrar de todos os elementos da obra de Pico Della Mirandola.
Alinhado a essa concepção axiológica, Miguel Reale argumenta que a pessoa é o valor-fonte de todos os valores, uma vez que só o homem é capaz de valores. Valor tem significação correlacional, já que
os valores não existem em si e per si, mas em relação à espécie humana, com referência a um sujeito dentro do processo de experiência humana de significação universal [...] O homem é o valor fundamental, algo que vale por si mesmo, identificando-se seu ser com a sua valia[18].
Retornando ao escorço histórico dos instrumentos internacionais, em resposta às atrocidades que marcaram o fim da Segunda Guerra Mundial e do horror nazista, decorrente de uma política eugenista (antissemita) encabeçada por Adolf Hitler que ceifou a vida de milhões de pessoas, foi aprovada a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH)[19], em 1948, pela Organização das Nações Unidas. Após os horrendos acontecimentos, a própria concepção de dignidade humana foi realinhada por um parâmetro ético jurídico consagrado na Declaração Universal dos Direitos Humanos. De acordo com Oscar Vilhena Vieira,
a ideia de dignidade humana está, portanto, vinculada à nossa capacidade de nos conduzirmos pela nossa razão e não nos deixarmos arrastar apenas pelas nossas paixões. Consultada nossa razão, como diria Rousseau, o ser humano pode conceber o que é certo e o que é errado, o que é moral do que é imoral, e seu livre arbítrio o habilitará a seguir um ou outro caminho. A autonomia é um pressuposto da moralidade[20].
Neste sentido, visando corrigir uma série de perspectivas moralmente equivocadas vistas na Declaração Francesa e na ideologia nazista, a Declaração Universal dos Direitos Humanos considera a dignidade condição inerente a todos os integrantes da família humana, gerando direitos iguais e inalienáveis como fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo. Em seu artigo vestibular, pacifica o entendimento de que todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos, são dotados de razão e de consciência, devendo agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade. Novamente nota-se que a Declaração Universal incorpora os conceitos de Pico Della Mirandola no tocante à noção de dignidade humana.
Convém observar que a atribuição axiológica de dignidade, ou o seu desvelar, de fato, é uma construção de natureza moral[21], social, cultural e histórica[22]. Neste diapasão, a Declaração Universal dos Direitos Humanos inaugurou um sistema protetivo no qual a universalidade e a inerência[23] não são mais simbólicas, meramente formais, como nos instrumentos anteriores, abrangendo a proteção de antigos grupos vulneráveis, como a população negra[24], as mulheres, os apátridas, consolidando que todos têm direito a uma ordem social e internacional em que os direitos e liberdades possam ser plenamente realizados.
Todo ser humano, em qualquer lugar do mundo, integrante da sociedade, tem direito à segurança social, à realização, pelo esforço nacional, cooperação internacional e conforme a organização e os recursos de cada Estado, a direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento da sua personalidade (art. 22 da Declaração Universal dos Direitos Humanos)[25].
Para dar maior segurança jurídica e efeito vinculante aos direitos consagrados na DUDH, foram aprovados dois instrumentos, em 1966, que, juntamente com a Declaração Universal, compõem a Carta Internacional de Direitos Humanos: o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (PIDCP) e o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC). Em consonância com as disposições da DUDH, o PIDESC prevê o compromisso de cada Estado Parte em adotar medidas, tanto por esforço próprio como pela assistência e cooperação internacionais, principalmente no plano econômico e técnico, até o máximo de seus recursos disponíveis, visando assegurar progressivamente o pleno exercício dos direitos nele reconhecidos (art. 2º).
Nessa matéria, o sistema protetivo detém regras próprias de hermenêutica, assentando que nenhuma disposição poderá ser interpretada visando a abolir ou impor limitações a direitos. No que tange aos direitos humanos fundamentais, não se admite qualquer restrição ou suspensão, de maneira que as regras a resguardar direitos humanos jamais podem ser interpretadas como anteparo à tese da reserva do possível e demais argumentos de resistência estatal. É nesta medida que Ingo Wolfgang Sarlet, inclusive, concebe a dignidade da pessoa humana:
a qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para um vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos[26].
Na mesma seara, a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, aprovada em 1948, pela Organização dos Estados Americanos (OEA), considera que os povos americanos dignificaram a pessoa humana e que suas Constituições nacionais reconhecem as instituições jurídicas e políticas a reger a vida em sociedade, cuja finalidade principal é a proteção dos direitos essenciais do homem e a criação de circunstâncias que lhe permitam progredir espiritual e materialmente, além de alcançar a felicidade.
A Declaração Interamericana reconhece que os direitos essenciais do homem não derivam do fato de ser ele cidadão de determinado Estado, mas do fato dos direitos terem como base os atributos da pessoa humana. Sob esta perspectiva, conforme o entendimento de Marco Antonio Marques da Silva,
os princípios que cercam os direitos e garantias, numa democracia, são as linhas mestras que norteiam toda a atividade Estatal, reconhecendo-se os ditames da lei como limites, mas que acima delas há um fundamento maior, que é o respeito à dignidade humana. A cidadania e os direitos humanos não são apenas ideias retóricas, mas instrumentos do Estado Democrático de Direito para, através da efetivação da dignidade humana, possibilitar a transformação de um mundo melhor[27].
Do exposto, nota-se dos instrumentos internacionais uma plena assimilação dos elementos da obra de Pico Della Mirandola que, em síntese, assenta a dignidade como característica inata, portanto, igual e inalienável a todo ser humano a partir de seu livre-arbítrio (liberdade) e inspirado nas virtudes celestiais (justiça, razão e amor).
4 DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS
A dignidade humana é encontrada na maioria das Constituições posteriores à Segunda Guerra Mundial, com destaque para o direito constitucional alemão, baseado nas disposições da Lei Fundamental de 1949, que declara a inviolabilidade da dignidade humana e estabelece a sua correlação com o direito ao livre desenvolvimento da personalidade[28].
A Constituição Federal de 1988 estabelece como um de seus princípios fundamentais a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III). Notadamente, com esteio neste parâmetro axiológico, há que se compreender outros elementos fundamentais da ordem nacional a serem assegurados: a soberania, a cidadania, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, o pluralismo político, o sistema representativo, a independência e a harmonia entre os Poderes de Estado (legislativo, executivo e judiciário) e um rol de direitos e garantias fundamentais.
A dignidade humana é preceito orientador dos objetivos fundamentais da nação, assinalando a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, a garantia do desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e da marginalização, a redução das desigualdades sociais e regionais e a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
A Constituição Federal define que as relações internacionais do país serão regidas não só pela independência nacional, mas pela prevalência dos direitos humanos, a autodeterminação dos povos, a não intervenção, a igualdade entre os Estados, a defesa da paz, a solução pacífica dos conflitos, a repúdio ao terrorismo e ao racismo, a cooperação entre os povos para o progresso da humanidade e a concessão de asilo político. Percebe-se uma orientação de integração no âmbito econômico, político, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana que dê corpo à dignidade humana transnacional.
Dessa forma, é mandamento constitucional buscar essa integração cultural com os demais povos da região, abrindo espaço para um Ius Constitucionale Commune Latino-Americano (ICCAL). Segundo Flávia Piovesan, o ICCAL se pauta por um constitucionalismo transformador para concretizar o princípio pro persona, cujo centro é o ser humano, com enfoque no fortalecimento das democracias e no combate às desigualdades sociais e à discriminação histórica em face de grupos vulneráveis[29]. Conforme explica Marco Antonio Marques da Silva,
a dignidade da pessoa humana, elemento inato aos homens e que implica liberdade, igualdade e justiça, constituindo o fundamento da organização sócio-política contemporânea de qualquer Estado que pretenda o status de democrático, torna-se o elo entre globalização, cidadania e direitos humanos, pois, como dito, a proteção à dignidade humana não é dever de uma ou outra nação, mas sim de toda a comunidade internacional, verdadeiro postulado universal, na busca de um mundo melhor[30].
Portanto, não é possível descurar da órbita em que o capítulo constitucional dos direitos e garantias fundamentais assenta as suas bases, notadamente o princípio da igualdade, meio pelo qual se exercita a dignidade humana, em especial na medida em que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, além da integração e a solidariedade com os povos latinos, visando o alcance de uma dignidade humana transnacional.
Diante deste contexto legal protetivo a impor a observância ao princípio da dignidade humana, indispensável haver uma exegese conformadora dos textos normativos nas práticas cotidianas. Nesta seara, a ordem econômica deve assegurar a existência digna de todos, sem olvidar na manutenção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, de maneira que os arts. 170 e 225 da Constituição Federal de 1988 devem ser lidos e interpretados de maneira harmônica e indissociada, concretizando o desenvolvimento sustentável[31].
Outrossim, se a valorização do trabalho humano e a livre iniciativa são fundamentos da ordem econômica, assegurando a todos existência digna, há de ser observado outros imperativos, sem os quais não haverá justiça social (outro elemento curial da dignidade, segundo Pico Della Mirandola), dentre os quais a defesa do meio ambiente e a redução das desigualdades regionais e sociais.
Além disso, é necessário haver uma remuneração suficiente para a (sobre)vivência humana, capaz de promover a saúde, na sua acepção mais abrangente, conforme recomenda a OMS[32], ou seja, não só a ausência de doença, mas o direito à alimentação de qualidade, à cultura e à educação. No que tange à educação, aliás, a Constituição Federal de 1988 confere aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a obrigação de destinar parte dos recursos à manutenção e ao desenvolvimento do ensino na educação básica e à remuneração condigna de seus profissionais (art. 212-A), de maneira que os direitos humanos estão interligados, e possuem como atributos a universalidade, a indivisibilidade e a interdependência.
De outro giro, a base social é formada pela família, detentora de especial proteção do Estado, fundada nos princípios da dignidade da pessoa humana. O planejamento familiar é de livre decisão do casal, competindo ao Estado apenas propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas (art. 226, § 7º, da CF/1988). Há uma corresponsabilidade indissociável entre a família, a sociedade e o Estado para assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvos de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (art. 227 da CF/1988). Igualmente, incumbe amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida (art. 230 da CF/1988).
Conforme rege a Constituição Federal de 1988, a dignidade humana está presente em todos os aspectos da vida, da individualidade às relações entre pessoas, esferas públicas e privadas. Jorge Miranda argumenta que a dignidade é um princípio que abrange todos os outros princípios relacionados aos direitos e deveres das pessoas, a posição do Estado em relação a elas, defendendo, pois, que a dignidade humana é um princípio fundamental e um limite superior do poder constituinte, por isso, um metaprincípio[33].
Portanto, a Constituição Federal de 1988 confere uma gama de garantias para proteger a dignidade humana, primando pela concretização de direitos sociais, econômicos, culturais e ambientais, assegurando a igualdade substantiva dos seres humanos, sem discriminação de qualquer natureza, para atingir os fins coligidos pelo Estado Social Democrático de Direito, forma política que privilegia de maneira solar os elementos trazidos por Pico Della Mirandola.
5 QUESTÕES COMPLEXAS
A obrigação constitucional e internacional atribuída ao Estado de levar a efeito todas as medidas necessárias para se assegurar o pleno exercício dos direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais, implica na disposição do máximo de recursos possíveis e na limitação orçamentária. A multiplicidade de causas que necessitam de saneamento econômico associada à má-gestão governamental, que assola a maioria dos países em desenvolvimento, faz com que proliferem teses jurídicas limitantes aos direitos, sob a alcunha de “reserva do possível”. Entretanto, a resistência a essas teses baseia-se no respeito a patamares elementares e condignos, denominado “mínimo existencial”.
A teoria da reserva do possível surgiu na década de 1970, quando a Corte Constitucional alemã analisava uma questão relacionada à reserva de vagas escolares, de maneira que sua adoção no Brasil se deu totalmente descontextualizada e generalizada. Thiago Matsushita entende que a doutrina e a jurisprudência brasileiras, ao importar dito conceito, o trata como um princípio-dogma, capaz de refrear a garantia da dignidade da pessoa humana ou do mínimo existencial[34]. Ana Carolina Lopes Olsen divide a reserva do possível em: a) o logicamente possível, ou seja, a realidade em si, não se podendo demandar do poder público o absurdo; e b) a disponibilidade de recursos materiais, que pode ser fática ou jurídica[35].
Deste modo, a cláusula da “reserva do possível” excepciona-se na ocorrência de justo motivo, objetivamente aferível, não podendo ser invocada a pretexto de mera exoneração do cumprimento das obrigações estatais, notadamente, quando dessa conduta omissiva resultar diminuição ou aniquilação de direitos fundamentais. Ademais, o Supremo Tribunal Federal já decidiu[36], em várias ocasiões, a obrigatoriedade de cumprimento das disposições constitucionais de maneira efetiva e concreta pelo Estado, como se verifica abaixo:
Se o Estado deixar de adotar as medidas necessárias à realização concreta dos preceitos da Constituição, em ordem a torná-los efetivos, operantes e exeqüíveis, abstendo-se, em conseqüência, de cumprir o dever de prestação que a Constituição lhe impôs, incidirá em violação negativa do texto constitucional. Desse non facere ou non praestare, resultará a inconstitucionalidade por omissão, que pode ser total, quando é nenhuma a providência adotada, ou parcial, quando é insuficiente a medida efetivada pelo Poder Público.
A omissão do Estado – que deixa de cumprir, em maior ou em menor extensão, a imposição ditada pelo texto constitucional – qualifica-se como comportamento revestido da maior gravidade político-jurídica, eis que, mediante inércia, o Poder Público também desrespeita a Constituição, também ofende direitos que nela se fundam e também impede, por ausência de medidas concretizadoras, a própria aplicabilidade dos postulados e princípios da Lei Fundamental (RTJ 185/794-796, Rel. Min. Celso de Mello, Pleno).
Não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado (RTJ 175/1212-1213, Rel. Min. Celso de Mello).
Diante das críticas relativas ao ativismo judicial, a Corte já teve a oportunidade de se posicionar no seguinte sentido:
Essa eminente atribuição conferida ao Supremo Tribunal Federal põe em evidência, de modo particularmente expressivo, a dimensão política da jurisdição constitucional conferida a esta Corte, que não pode demitir-se do gravíssimo encargo de tornar efetivos os direitos econômicos, sociais e culturais – que se identificam, enquanto direitos de segunda geração, com as liberdades positivas, reais ou concretas (RTJ 164/158-161, Rel. Min. CELSO DE MELLO) – sob pena de o Poder Público, por violação positiva ou negativa da Constituição, comprometer, de modo inaceitável, a integridade da própria ordem constitucional[37].
Claro está que a concretização de direitos pertence ao campo das questões complexas, em que duelam situações igualmente importantes, a serem sopesadas e priorizadas, e que passaram a ser denominadas de “escolhas trágicas”, na medida em que a concessão de um direito impacta negativamente em outro, numa dialética de implicação e polaridade[38]. Todavia, percebe-se o uso indiscriminado e banal da reserva do possível, denotando uma postura estatal incompatível com os princípios democráticos e que implica na prevalência de uma ótica desigual e discriminatória na concessão de direitos.
Embora juridicamente possível, o uso amplo e irrestrito de qualquer argumentação jurídica restritiva de direitos e garantias fundamentais deve ser utilizada em situações excepcionalíssimas, como “limite dos limites” ou “restrição das restrições”, uma vez esgotados os critérios de proporcionalidade e seus corolários, isto é, a proibição de excesso, a proibição da proteção insuficiente e a razoabilidade. Em qualquer hipótese, não se admite tergiversação sobre um certo núcleo duro de direitos, promotor da própria manutenção da vida com dignidade, impondo-se a realização pelo Estado de condições basilares, demandando obrigações prestacionais positivas no campo dos direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais.
Conforme observa Marco Antonio Marques da Silva, a análise da dignidade da pessoa humana perpassa pela avaliação de três premissas básicas: o aspecto individual, a implicar no atendimento dos direitos da personalidade; o aspecto social, referente ao atendimento dos direitos de cidadania e desdobramentos; e, por último, a questão econômica, com o atendimento e a promoção dos meios para subsistência Sem a observância destas premissas e de um plano ético que permitam a concretização de um núcleo mínimo de direitos e de garantias individuais, com justiça social, torna-se inócua qualquer tentativa de manutenção da paz, da felicidade e da própria dignidade humana[39].
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A riqueza dos conceitos trazidos por diversos autores pesquisados permitiu aquilatar o conceito de dignidade humana a partir de vários signos: ambiguidade, poroso, polissêmico, aberto, complexo, ontológico, biológico, inerente, intrínseco, condição humana, dádiva ou dom divino, irrenunciável, inalienável, indisponível, inviolável, valor absoluto, autonomia, autodeterminação, liberdade, livre-arbítrio, universal (igualdade), relacional/intersubjetivo, intangível, reciprocidade, relacional-comunicativa, humanidade, cultural, axiológico (valor/princípio), reconhecimento (sujeito/objeto)[40].
Os simbolismos que permeiam a dignidade humana na contemporaneidade não suplantam a beleza do conceito elaborado por Pico Della Mirandola, que carece ainda de pleno desenvolvimento nos instrumentos protetivos, nacionais e internacionais, consubstanciando a dignidade humana como uma garantia de indenidade, ou, como queria o autor, que permitisse o alcance da felicidade e da paz para todos os seres humanos.
Pico Della Mirandola estabeleceu diretrizes assentadas em direitos fundamentais, como a autonomia, liberdade e universalidade, posteriormente, tornaram-se a base normativa dos direitos humanos, conquanto estes mesmos preceitos reforçam a dualidade existente na humanidade[41]. Vale dizer, enquanto os instrumentos protetivos visam assegurar o cumprimento de direitos e garantias, contrapõem-se argumentos com esteio na autonomia e liberdade estatal a demonstrar a complexidade da efetividade desses direitos, embora não se possa abrir mão do mínimo existencial em nome justamente da dignidade humana.
Parafraseando Carmen Lúcia Antunes Rocha, uma vez que todos os contornos da vida se tornaram conteúdo fundamental dos ordenamentos jurídicos, não basta o viver-existir, há que se assegurar que a vida seja experimentada em sua dimensão digna, entendida como qualidade inerente à condição humana em sua aventura universal[42].
A construção de um conceito contemporâneo de dignidade humana implica em permanente estudo das fontes humanistas e do cotejo de autores clássicos, que, como Pico Della Mirandola, dedicaram-se a refletir sobre valores e princípios, que funcionam como freio ético à atuação humana, inclusive no uso de teorias que almejem de qualquer forma limitar direitos e garantias fundamentais.
7 REFERÊNCIAS
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[1] Professor Titular de Direito Processual Penal da PUC-SP. Professor Catedrático da Universidade Europeia – Lisboa (Portugal). Professor Visitante da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Conselheiro do Conselho Nacional de Educação (2018/2022). Coordenador-Geral do Curso de Extensão em Direito Digital e Proteção de Dados da COGEAE/PUC-SP. Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo (aposentado), São Paulo, Brasil, email ezms@uol.com.br, https://orcid.org/0000-0003-2447-6700.
[2] Mestre em Direito Constitucional pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Especialista em Direito Ambiental pela Faculdade de Saúde Pública da USP. MBA em Gestão Empresarial pela Fundação Instituto de Administração (FIA). Membro do Conselho Consultivo do IBAP. Advogada, São Paulo, Brasil, email rhpiccolo@gmail.com, https://orcid.org/0009-0007-8283-340X.
[3] SARLET, Ingo Wolfgang, Dimensões da dignidade: ensaios de filosofia do direito e direito constitucional, Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2005.
[4] QUEIROZ, Suely Robles Reis, Escravidão negra no Brasil, São Paulo, Ática, 1993.
[5] ARENDT, Hannah, Origens do totalitarismo, São Paulo, Companhia das Letras, 1989.
[6] GANHO, Maria de Lourdes, Acerca do pensamento de Giovanni Pico Della Mirandola, in MIRANDOLA, Pico Della, Discurso sobre a dignidade do homem, Lisboa, Edições 70, 2018.
[7] COMPARATO, Fábio Konder, A afirmação histórica dos direitos humanos, São Paulo, Saraiva, 2007, pp. 6-7: “foi exatamente essa concepção do homem – demiurgo de si mesmo e do mundo em torno de si – que um jovem humanista italiano, Giovanni Pico, senhor de Mirandola e Concordia, apresentou em 1486 em famoso discurso acadêmico”.
[8] GANHO, Maria de Lourdes, Acerca do pensamento de Giovanni Pico Della Mirandola, in MIRANDOLA, Pico Della, Discurso sobre a dignidade do homem, Lisboa, Edições 70, 2018.
[9] LOIA, Luís, Estudo pedagógico introdutório, in MIRANDOLA, Pico Della, Discurso sobre a dignidade do homem, Lisboa, Edições 70, 2018.
[10] MIRANDOLA, Pico Della, Discurso sobre a dignidade do homem, Lisboa, Edições 70, 2018, p. 61.
[11] BITENCOURT NETO, Eurico, O direito ao mínimo para uma existência digna, Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2010.
[12] O francês SIEYÈS, Abade, Exposição refletida dos direitos do homem e do cidadão, v. 1, São Paulo, Atlas, 2008, p. 4, formula três questões: “1º O que é o Terceiro Estado (povo)? Tudo. 2º O que ele foi na ordem política até o presente? Nada. 3º O que ele pede? Ser alguma coisa”.
[13] GARCIA, Emerson, Contornos essenciais da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, in SIEYÈS, Abade, Exposição refletida dos direitos do homem e do cidadão, v. 1, São Paulo, Atlas, 2008, p. ix.
[14] Em notável tentativa de atribuir direitos igualmente às mulheres, Olympe de Gouges elaborou um projeto de Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã, em 1791, mas sequer foi discutida e levou a autora à guilhotina.
[15] De acordo com GARCIA, Emerson, Contornos essenciais da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, in SIEYÈS, Abade, Exposição refletida dos direitos do homem e do cidadão, v. 1, São Paulo, Atlas, 2008, pp. 5, 7 e 16), a declaração francesa se incorpora a outros célebres documentos, após a Magna Carta, de 1215, provenientes de proclamações inglesas e norte-americanas (Petition of Rights, de 1628, Habeas Corpus Act, de 1679, Revolução Gloriosa e Bill of Rights, de 1688, Declaração de Independência dos Estados Unidos da América e Bill of Rights da Virgínia, de 1776), que tinham o condão quase exclusivo de limitar o poder público.
[16] Lema da Revolução Francesa inspirada da ordem democrática liberal.
[17] KANT, Immanuel, Fundamentação da metafísica dos costumes, São Paulo, Companhia Editora Nacional, Disponível em: <http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/marcos/hdh_kant_metafisica_costumes.pdf>. Acesso em: 14/11/2022.
[18] REALE, Miguel, Filosofia do direito, 14. Ed., São Paulo, Saraiva, 1991, pp. 208-211.
[19] A correção da discriminação de gênero contida na Declaração Universal de Direitos do Homem foi corrigida pela Resolução n. 548 da Assembleia Geral.
[20] VIEIRA, Oscar Vilhena, Direitos fundamentais: uma leitura da jurisprudência do STF, São Paulo, Malheiros, 2006, p. 65.
[21] De acordo com VIEIRA, Oscar Vilhena, Direitos fundamentais: uma leitura da jurisprudência do STF, São Paulo, Malheiros, 2006, p. 66, “a ideia de que as pessoas têm um valor que lhes é ‘intrínseco’ não é, portanto, natural, mas uma construção de natureza moral. Assim, ninguém nasce com algum valor que lhe seja inerente. Este valor é artificialmente conferido às pessoas. Artificialmente, aqui, no sentido de que é um valor construído socialmente”.
[22] BOBBIO, Norberto, A era dos direitos, Rio de Janeiro, Elsevier, 2004.
[23] RAMOS, André de Carvalho, Curso de direitos humanos, São Paulo, Saraiva, 2019, p. 95.
[24] A obra de JAMES, C. R. L., Os jacobinos negros, Toussaint L'Ouverture e a revolução de São Domingos, São Paulo, Boitempo, 2000, narra os bastidores da Revolução Francesa e as promessas não cumpridas para inclusão dos negros libertos como sujeitos de direitos na Declaração Francesa, acabando por irromper a rebelião da colônia e que culminou na independência de São Domingos.
[25] RAMOS, André de Carvalho, Curso de direitos humanos, São Paulo, Saraiva, 2019, p. 96, na Segunda Conferência Mundial de Direitos Humanos da ONU, em 1993, realizada em Viena, reforçou-se expressamente que “todos os direitos humanos são universais”, marcados pela transnacionalidade dos direitos humanos.
[26] SARLET, Ingo Wolfgang, Dimensões da dignidade: ensaios de filosofia do direito e direito constitucional, Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2005, p. 37.
[27] SILVA, Marco Antonio Marques da, Cidadania e democracia: instrumentos para a efetivação da dignidade humana, in MIRANDA, Jorge, SILVA, Marco Antonio Marques da, coord., Tratado luso-brasileiro da dignidade humana, 2. ed., São Paulo, Quartier Latin, 2009, pp. 223-236.
[28] TIBURCIO, Carmen, BARROSO, Luís Roberto, Direito constitucional internacional, Rio de Janeiro, Renovar, 2013.
[29] PIOVESAN, Flávia, Direitos humanos e o direito constitucional internacional, São Paulo, Saraiva, 2021, p. 399.
[30] SILVA, Marco Antonio Marques da, Dignidade humana e globalização, in SILVA, Marco Antonio Marques da, A efetividade da dignidade humana na sociedade globalizada, São Paulo, Quartier Latin, 2017, p. 101.
[31] O conceito de sustentabilidade é entendido como “princípio constitucional que determina, independentemente de regulamentação legal, com eficácia direta e imediata, a responsabilidade do Estado e da sociedade pela concretização solidária do desenvolvimento material e imaterial, socialmente inclusivo, durável e equânime, ambientalmente limpo, inovador, ético e eficiente, no intuito de assegurar, preferencialmente de modo preventivo e precavido, no presente e no futuro, o direito ao bem-estar físico, psíquico e espiritual, em consonância homeostática com o bem de todos”. FREITAS, Juarez, Sustentabilidade: direito ao futuro, Belo Horizonte, Fórum, 2011, p. 41.
[32] A Organização Mundial de Saúde define saúde como “um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não somente ausência de afecções e enfermidades”.
[33] MIRANDA, Jorge, A dignidade da pessoa humana e a unidade valorativa do sistema de direitos fundamentais, in MIRANDA, Jorge, SILVA, Marco Antonio Marques da, coord, Tratado luso-brasileiro da dignidade humana, 2. ed., São Paulo, Quartier Latin, 2009, pp. 167-176.
[34] MATSUSHITA, Thiago Lopes, Reserva do possível, in CAMPILONGO, Celso Fernandes, GONZAGA, Alvaro de Azevedo, FREIRE, André Luiz, coord, Enciclopédia jurídica da PUC-SP: direitos humanos, São Paulo, PUC-SP, 2017, Disponível em: <https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/508/edicao-1/reserva-do-possivel>, Acesso em: 10/06/2022.
[35] OLSEN, Ana Carolina Lopes, A eficácia dos direitos fundamentais sociais frente à reserva do possível, orientadora Regina Maria Macedo Neri Ferrari, pp. 390, Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2006, pp. 216-217.
[36] BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Monocrática, Medida Cautelar na Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 45/DF, Requerente, Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), Interessado, Presidente da República, Rel. Min. Celso de Mello, 4 maio 2004, Disponível em: <https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/despacho120879/false>, Acesso em: 10/06/2022.
[37] BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Monocrática, Medida Cautelar na Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 45/DF, Requerente, Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), Interessado, Presidente da República, Rel. Min. Celso de Mello, 4 maio 2004, Disponível em: <https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/despacho120879/false>, Acesso em: 10/06/2022.
[38] REALE, Miguel, Filosofia do direito, 14. ed., São Paulo, Saraiva, 1991, p. 64.
[39] SILVA, Marco Antonio Marques da, Cidadania e democracia: instrumentos para a efetivação da dignidade humana, in MIRANDA, Jorge, SILVA, Marco Antonio Marques da, coord, Tratado luso-brasileiro da dignidade humana, 2. ed., São Paulo, Quartier Latin, 2009.
[40] SARLET, Ingo Wolfgang, As dimensões da dignidade da pessoa humana: construindo uma compreensão jurídico-constitucional necessária e possível, in SARLET, Ingo Wolfgang, Dimensões da dignidade: ensaios de filosofia do direito e direito constitucional, Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2005, pp. 13-43.
[41] Pico Della Mirandola reforça a condição mutável, plástica e variável da natureza humana, com base no livre-arbítrio, capaz de conduzir-se próximo aos seres celestes ou descer ao nível das bestas, e indaga: “Quem não admirará este nosso camaleão?”. In: MIRANDOLA, Pico Della, Discurso sobre a dignidade do homem, Lisboa, Edições 70, 2018, p. 59.
[42] ROCHA, Carmen Lúcia Antunes, org, O direito à vida digna, Belo Horizonte, Fórum, 2004.