Autonomia da Vontade das Partes no Plano Internacional: Novo Paradigma do Processo Civil Internacional Brasileiro

Valesca Raizer Borges Moschen[1]

Marcel Magalhães e Guerra[2]

Resumo: Breve exposição sobre autonomia da vontade privada no plano internacional e o novo paradigma do Processo Civil Internacional Brasileiro. Análise das alterações introduzidas no ordenamento jurídico brasileiro pelo novo Código de Processo Civil Brasileiro (NCPC), Lei 13.105 de 16 de março de 2015, que inova no cenário nacional e recepciona a cláusula de eleição de foro, mudança esta que traz a premente necessidade de o Poder Judiciário brasileiro revisitar alguns posicionamentos anteriormente firmados, no sentido de respeitar a liberdade individual na escolha do foro competente, com a consequente revisitação da noção de jurisdição como atributo da soberania estatal. Ao fim, apresenta-se alguns enunciados interpretativos sobre o novo paradigma do Processo Civil Internacional Brasileiro.

Palavras-chave: Processo Civil Internacional; Direito Internacional Privado; Autonomia da Vontade.

Abstract: Brief presentation on private autonomy at international level, and the new paradigm of the International Civil Procedure Brazilian. Analysis of changes in the Brazilian legal system by the new Brazilian Code of Civil Procedure (NCPC), Law 13105 of March 16, 2015, that innovates on the national scene and welcomes the forum selection clause, a change that brings the urgent need to the Brazilian Judiciary revisit some positions previously signed, to respect individual freedom in the choice of jurisdiction, with the consequent revisiting the jurisdiction notion of state sovereignty as attribute. At the end, we present some interpretative statements about the new paradigm of the International Civil Procedure Brazilian.

Keywords: Brazilian International Civil Procedure; Private International Law; Private Autonomy.

1 INTRODUÇÃO

Desde o Tratado de Westfália o Direito Internacional vem evoluindo, em especial após Segunda Guerra Mundial, com a humanização dos direitos e surgimento de organizações internacionais intergovernamentais. Nessa tendência, percebeu-se um crescimento do número de Cortes e Tribunais internacionais, fenômeno conhecido por jurisdicionalização, além de uma consequente codificação do Direito Internacional, na busca por uma uniformização das relações internacionais.

O Brasil apesar de importantes participações no cenário mundial, ainda caminha a passos lentos no desenvolvimento do Direito Internacional. Nesse sentido, a Lei 13.105, de 2015 (doravante referida pela sigla NCPC – Novo Código de Processo Civil) [3] traz importantes alterações, com forte carga axiológica, seguindo linhas ideológicas da Constituição da República de 1988.

Em busca de adequações necessárias às tendências da Jurisdição Internacional, o Brasil traz mudanças importantes com a Lei 13.015, NCPC. Em primeiro, a manifestação expressa da superioridade dos dispositivos previstos em tratados ou convenções internacionais. Refere-se ao art. 13 do NCPC que dispõe: “A jurisdição civil será regida pelas normas processuais brasileiras, ressalvadas as disposições específicas previstas em tratados, convenções ou acordos internacionais de que o Brasil seja parte”.

Trata-se de clara indicação de que as Normas de Direito Internacional devem prevalecer sobre normas internas, ainda que de natureza processual. Dispositivo necessário e progressivo, na esteira da nova tendência constitucional contemporânea, que impõe ao operador de direito o estudo e conhecimento desses tratados, acordos e convenções[4].

Outra alteração importante, que será objeto do presente paper, é o reconhecimento da cláusula de eleição de foro estrangeiro como hipótese de derrogação de foro nacional, enunciado previsto no art. 25 do NCPC (Art. 25. Não compete à autoridade judiciária brasileira o processamento e o julgamento da ação quando houver cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro em contrato internacional, arguida pelo réu na contestação.).

Analisar-se-á as remissões previstas nos parágrafos do artigo 25, remissões a dispositivos que tratam de competência interna, sujeitas a outro espectro normativo, de jurisdição nacional, indiferente à dinâmica das relações internacionais. O que demanda uma adequação interpretativa de tais dispositivos a fim de efetivar a intenção do legislador de desenvolver o Direito Internacional, seguindo tendência global, aos auspícios da Constituição da República. O que se fará através de cinco enunciados, ao final.

A possibilidade de eleição de foro estrangeiro em contrato internacional em hipótese prevista como de competência de jurisdição nacional é uma das questões mais controvertidas no Direito Processual Internacional Brasileiro. A jurisprudência dos Tribunais Superiores é oscilante, prevalecendo entendimento de que às partes não caberia dispor sobre normas de competência internacional, uma vez que de natureza processual de ordem pública.

Tal entendimento funda-se na ideia de que jurisdição é atributo da soberania estatal, em que eventual negativa de jurisdição confunde-se com menoscabo do exercício da soberania, o que levou à jurisprudência nacional afastar a possibilidade de que a vontade das partes pudesse declinar o exercício da jurisdição brasileira. De modo que é comum o afastamento de cláusula de eleição de foro estrangeiro em contratos internacionais por juízes brasileiros, sob a justificativa de que não seriam normas dispositivas.

Ante a inovação no cenário nacional, ao recepcionar a cláusula de eleição de foro estrangeira, impõe-se a premente necessidade de o Poder Judiciário brasileiro revisitar alguns posicionamentos anteriormente firmados, no sentido de respeitar a liberdade individual na escolha do foro competente, com a consequente revisitação da noção de jurisdição como atributo da soberania estatal e seus reflexos.

Essa parece ter sido a intenção do legislador ao promover uma equiparação da autonomia da vontade já existente para a cláusula arbitral, estendendo-a para a cláusula de eleição de foro. Nesse sentido, o novo CPC pode ser considerado um avanço, vez que segue a linha dos princípios internacionais de contratos e resolução de conflitos, desenvolvidos por organismos especializados.

Internamente, parcela respeitável da doutrina perfilha entendimento de que não seria possível derrogar jurisdição, pois normas processuais que preveem hipóteses de competência concorrente internacional seriam de ordem pública, portanto, indisponíveis às partes. De modo que eventual cláusula de eleição de foro exclusivo internacional em hipóteses de competência concorrente internacional não deveria ser efetivada, não podendo o magistrado deixar de exercer jurisdição[5].

O novo CPC acolheu acertadamente doutrina contrária, no sentido de que normas públicas podem ser disponíveis, não devendo se confundir com normas de ordem pública. Para melhor análise dos contornos das alterações legais, introduzidas pelo novo CPC, passa-se a abordar alguns pontos relevantes, premissas para instrumentalização das conclusões.

2 AUTONOMIA DA VONTADE NA ESCOLHA DE FORO E SEUS REFLEXOS

O pactum de foro prorrogando refere-se à convenção firmada entre partes de uma relação comercial oriunda de contrato internacional, em que conferem competência à jurisdição de determinado Estado para solucionar disputas futuras entre elas.

Trata-se de ato extraprocessual de disposição expressa no contrato firmado entre partes, mas destinado a produzir efeitos exclusivamente no processo judicial, momento em que for proposta ação jurisdicional, de modo a conceder competência ao Estado escolhido pelos contraentes. Autonomia da vontade na ordem internacional significa a liberdade das partes em optar por outro sistema legal para regular o contrato ou resolver seus litígios.

A eleição de foro estrangeiro encontra-se intimamente ligada aos conceitos de jurisdição ou competência internacional[6], na medida em que implica a definição de um limite estabelecido pelo próprio Estado soberano a respeito de quais controvérsias lhe interessam julgar, de acordo com a política que o próprio ordenamento se predispôs a perseguir, nas palavras de LUPOI, são normas de autoisolamento de um ordenamento[7].

Cada Estado possui a faculdade de livremente delimitar o exercício de sua jurisdição, em um aparente isolamento, o que acaba, por vezes, gerando conflito ou sobreposição de jurisdições. O exercício da jurisdição de vários países sobre um mesmo litígio pode causar conflitos e injustiças. Não é incomum que cada um busque o tribunal que mais lhe beneficie, tendo em vista a possibilidade de jurisdições concorrentes (forum shopping).

Ressalte-se, contudo, que esse conflito é mais semântico do que real e sua eventual resolução competirá ao Estado acionado, levando-se em conta as diretrizes axiológicas internacionais e a lex fori[8].

A escolha do foro garante previsibilidade e estabilidade às partes não apenas com relação ao tribunal a ser acionado, mas também quanto à observância da lei selecionada. Não se deve confundir a cláusula de eleição de lei aplicável[9] e a cláusula de eleição de foro. A primeira determina a lei que irá reger o contrato; consiste em uma regra de conflito de leis, atuando como elemento de conexão em contratos internacionais, disciplina do Direito Internacional Privado. Já a cláusula de eleição de foro determina o tribunal que irá decidir eventuais discórdias contratuais. Trata-se de uma regra de fixação da jurisdição que irá julgar o caso, disciplina do Processo Civil Internacional[10].

A lei do foro irá determinar se a escolha das partes acerca da lei aplicável ao contrato será ou não observada, bem como irá fixar seus limites. Se, por hipótese, o foro acionado não admitir a autonomia na escolha da lei, não terá eficácia alguma a convenção feita pelos contratantes acerca da lei aplicável. De igual modo, se a lei escolhida atentar contra norma de ordem pública de caráter internacional do foro, não será aplicada pelo tribunal.

Apesar de institutos distintos e autônomos, é comum utilizar a cláusula de eleição de foro (e também a convenção de arbitragem) [11] como um dos indicadores da intenção das partes pela aplicação da lei do foro (ou sede arbitral) na resolução material. A eleição da lei, nessas hipóteses, teria ocorrido de forma implícita. Seria uma forte evidência da intenção das partes de aplicar a lei da sede da arbitragem ou do foro eleito. Regra hermenêutica aplicável quando as partes não manifestarem expressamente a legislação aplicável na solução da controvérsia[12]/[13]/[14].

É a partir da análise da lei do foro (lex fori) que será possível determinar se a escolha das partes sobre a lei aplicável e sobre o foro será ou não observada. Enquanto o foro não for acionado, fica incerto às partes se a lei e o foro eleitos serão observados quando da solução do conflito. Portanto, em teoria, a escolha do foro deve preceder a escolha da lei aplicável.

Outro ponto relevante é que a cláusula de eleição de foro é autônoma em relação ao contrato principal, eventual nulidade do contrato principal não contamina a disposição contratual que elegeu o foro. É a aplicação do princípio da severability, separability, independence ou detachment da cláusula compromissória, perfeitamente aplicável a cláusula de eleição de foro em contrato internacional.

Ainda que as partes estabeleçam lei específica para regular as condições do contrato ao qual a cláusula de eleição de foro está ligada, não se pode afirmar que a mesma norma de direito irá reger a validade, o conteúdo e os efeitos da convenção. Trata-se de disposição autônoma em relação ao contrato em que estiver inserta e, dessa forma, não deverá ser contagiada por vícios de nulidade, por invalidade ou mesmo inexistência do próprio contrato[15]/[16].

É comum questionar a redação da cláusula de eleição de foro, que nem sempre indica claramente se o tribunal escolhido terá jurisdição exclusiva para decidir a causa. Pode ocorrer que a cláusula seja interpretada como uma escolha não exclusiva, incapaz de afastar a atividade jurisdicional de outros Estados.

As seguintes cláusulas já foram interpretadas como sendo indicativas de escolha de jurisdição não exclusiva: “jurisdiction for all and any disputes arising out of or in connection with this agreement is Munich”; “parties submit to the jurisdiction of the courts of New York”; “shall have jurisdiction”. Por outro lado, as seguintes cláusulas foram interpretadas como indicadoras de jurisdição exclusiva: “submit to the jurisdiction of” e “jurisdiction and venue shall be in[17].

Os tribunais ingleses, por sua vez, entendem que a interpretação acerca da exclusividade ou não de uma cláusula de eleição de foro deve ser feita com base na lei que rege o contrato. Se as partes houverem acordado que o contrato é governado pela lei inglesa, e ainda preveem que o acordo submete-se “under the jurisdiction of the English court” ou “the courts of law in England shall have jurisdiction to entertain any action in respect hereof”, a Inglaterra terá jurisdição exclusiva sobre a causa[18].

Nesse sentido, fundamental destacar a importante Convenção Internacional sobre Eleição de Foro, de 2005, sob a égide da Conferência de Haia de Direito Internacional Privado; o art. 3º da Convenção da Haia sobre a Escolha do Foro de 2005 indica que o foro eleito pelos contratantes será considerado exclusivo, a menos que as partes expressamente disponham em sentido contrário[19].

Perfilha-se deste entendimento, de que a cláusula de eleição de foro estrangeiro prevista para resolução de conflitos entre as partes em contratos internacionais deve ser interpretada como exclusiva, salvo disposição expressa em contrário, na esteira da doutrina internacional especializada.

Portanto, a autonomia da vontade para escolha do foro poderá repercutir na escolha da legislação aplicável ao contrato; na legislação aplicável para averiguação da validade/eficácia da cláusula e na exclusividade do foro eleito[20].

3 EFEITOS POSITIVOS E NEGATIVOS DA ELEIÇÃO DE FORO

A vontade das partes com relação à eleição do foro pode atuar no sentido positivo, inserindo hipótese não prevista na norma interna sobre o exercício da função jurisdicional (prorrogatio fori) ou no sentido negativo, afastando a jurisdição do Estado (Derrogatio fori). Os casos que versam sobre a derrogação de jurisdição são, em regra, admitidos com maiores ressalvas[21].

O efeito positivo verifica-se quando as partes conferem à Justiça de um Estado, competência para apreciar uma causa à jurisdição nacional, incluindo, por conseguinte, hipótese de competência internacional mediante acordo de vontade. O efeito negativo, por sua vez, ocorre quando a eleição de foro estrangeiro importa na subtração de competência internacional de um Estado, sendo afastada a atividade jurisdicional mesmo diante da verificação de situação prevista na legislação interna como apta a ensejar o exercício da jurisdição.

Quanto ao efeito positivo, pode-se afirmar que é possível a atuação do Judiciário nacional ainda que a causa não apresente qualquer vínculo com o ordenamento pátrio, à luz dos elementos constantes nos Arts. 21 a 25 do NCPC (efeito positivo). Em especial, em razão do novo art. 22, III do NCPC[22].

Alteração que vai ao encontro dos anseios da comunidade internacional e em conformidade com as necessárias transformações processuais decorrentes do mundo globalizado e de uma economia transnacional.

Traz maior segurança e certeza para os contratos internacionais, além de eliminar a jurisprudência inconstante dos Tribunais Superiores brasileiros sobre o assunto.

A eleição de foro brasileiro passa a ser expressamente considerada como um elemento fixador de jurisdição, sem necessidade de qualquer conexão razoável com a jurisdição nacional.

Nesse diapasão, Gaetano Morelli, defende que como o fundamento das normas sobre jurisdição internacional repousa em uma valoração que o Estado faz de seus fins e interesses, não teriam as partes a possibilidade de realizar uma valoração em qualquer outra direção, apenas para atender a uma vontade particular. Assim, seria inadmissível que a manifestação das partes atuasse no sentido de determinar o exercício de atividades públicas consideradas estranhas ao Estado italiano. Para verificação dos efeitos do pacto atributivo de jurisdição em outros Estados, Morelli, não obstante, afirma que se deve analisar o que informa o ordenamento jurídico interno a respeito[23].

Por razões de interesse e conveniência, foram fixadas em lei situações que justificam a movimentação do judiciário, sendo essas matérias caracterizadoras da competência internacional dos tribunais brasileiros. A questão que se coloca é saber se nas hipóteses não elencadas de competência internacional brasileira (arts. 88 e 89 do CPC e arts. 21 a 25 do NCPC), teria o juiz nacional competência para decidir o litígio.

Parte da doutrina nacional e dos Tribunais entende que inexiste qualquer outro dispositivo legal estabelecendo mais casos de competência do juiz brasileiro, sendo inviável os litígios que não se enquadrassem no elenco dos arts. 88 e 89 do CPC serem aqui processados. Nesse sentido, Enrico Tullio Liebmann pugnava que os limites da jurisdição não poderiam ser alterados pelas partes, quer seja no sentido positivo ou negativo[24].

Na mesma linha, Athos Gusmão Carneiro para quem as normas definidoras da competência internacional concorrente da Justiça brasileira são de direito público e delas não poderiam os interessados previamente abdicar. A disponibilidade da jurisdição constituiria, assim, manifestação inerente à soberania estatal. Entendimento reproduzido majoritariamente pelos Tribunais superiores nacionais[25].

É incontroverso que as normas processuais são de direito público, ocorre que isso não significa que todas elas sejam de ordem pública[26]. Os art. 22, III e o 25 ambos do NCPC põem fim à celeuma, uma vez que permitem que a relação entre as partes crie um elemento de conexão com a jurisdição nacional, ainda que tal relação não possua qualquer outro vínculo com o ordenamento brasileiro à luz dos elementos previstos nos Artigos 21 a 24 do NCPC. Permite-se também às partes, ainda que a situação conflituosa se enquadre em uma das hipóteses legais de jurisdição concorrente (art. 21 e 22 do NCPC), a derrogação da jurisdição nacional.

Entende-se, todavia, que caso não haja eleição de foro ou qualquer elemento de conexão com as hipóteses legais, e as partes não aceitem tacitamente o foro, deve o magistrado extinguir o processo sem julgamento de mérito por ausência de interesse jurisdicional.

O que significa que as normas definidoras de jurisdição podem ser disponíveis pela vontade das partes (parcialmente, já que as do art. 23 do NCPC são exclusivas), não se exigindo qualquer regra de conexão razoável, seja para prorrogar (efeito positivo), seja para derrogar (efeito negativo) jurisdição, ressalvados tratados, convenções ou acordos internacionais (art. 13 do NCPC)[27].

O que ocorre é que nas hipóteses de jurisdição concorrente, presume-se que há um interesse do País na prestação da jurisdição. Sendo a competência concorrente, essa presunção é relativa, podendo ser alterada mediante vontade das partes. Já nas hipóteses de jurisdição exclusiva, em que a atividade jurisdicional é exercida de forma peremptória, as partes não podem afastar sua aplicação (presunção absoluta)[28].

Nesta lógica, segue-se a premissa de que o rol de competência internacional concorrente é exemplificativo, devendo-se considerar outros princípios fundamentais quando da fixação da competência internacional brasileira diante de um caso concreto, como os princípios que impedem a denegação do acesso à justiça (forum necessitatis[29] e forum non conveniens).

Entende-se que a doutrina do forum non conveniens pode ser aplicada, excepcionalmente, para permitir a Corte nacional derrogar jurisdição em favor de outra estrangeira, em hipóteses de jurisdição concorrente, quando verificar abuso, ônus desproporcional a uma das partes, a caracterizar patente obstrução ao acesso à justiça.

Interessante que a Convenção de Haia nega a possibilidade de utilização do forum non conveniens quando houver escolha do foro livremente pactuada pelas partes. Ocorre que o art. 25 c.c. § 3º do art. 63 do NCPC possibilita ao juiz nacional declarar, de ofício, ineficácia de cláusula de eleição estrangeiro ou nacional que repute abusiva.

Portanto, na excepcionalidade de verificar um ônus desproporcional a uma das partes, passível de obstruir o pleno acesso à justiça, poderá extinguir o processo sem julgamento de mérito, ante a eleição abusiva do foro, vez que a jurisdição exorbitante e abusivamente exercida pelos tribunais de um país compromete sua responsabilidade internacional e afeta os valores constitucionais, o acesso à justiça e a ampla defesa[30].

Conclui-se que será possível ao magistrado analisar o interesse da jurisdição nacional em conhecer de determinada demanda, ante a não taxatividade do rol legal de jurisdição nacional, seja para prorrogar jurisdição (v.g. forum necessitatis), seja para derrogá-la (v.g. fórum non conveniens), tendo como referencial os princípios fundamentais.

Se uma parte alegar em Corte nacional abuso de cláusula de eleição de foro estrangeiro ou nacional, em razão de lhe ter sido negado o acesso a justiça, lembrando que o foro nacional não precisa ter relação com contrato ou partes nas relações internacionais, o juiz verificando violação a ordem pública ou abuso, poderá tornar sem efeito a disposição contratual para prorrogar ou derrogar jurisdição nacional.

Caso, após anular a cláusula de eleição de foro nacional ou estrangeira, verificar que não há qualquer outro elemento que se relacione com a jurisdição nacional, deverá extinguir o processo sem julgamento de mérito, a não ser que observe uma das hipóteses de jurisdição concorrente, quando manterá a jurisdição nacional sob outro fundamento.

4 LIMITES AO RECONHECIMENTO DA ELEIÇÃO DE FORO

A escolha do foro, tal como qualquer outra obrigação, deve corresponder a uma manifestação de vontade livremente assumida, e que não seja viciada por erro, dolo, coação, estado de perigo, ou lesão. Ou seja, não deve violar preceitos fundamentais.

Desse modo, a fim de sistematizar a análise, a partir do NCPC, pode-se elencar três requisitos de validade/eficácia da cláusula: 1. Não seja abusiva[31], entendida como aquela que não viole a ordem pública interna ou internacional; 2. Seja por escrito; 3. Não seja hipótese de jurisdição exclusiva.

Observe que o NCPC é mais brando quanto aos requisitos para reconhecimento de uma cláusula de eleição de foro, quando comparado a tratados internacionais, pois só exige que seja por escrito, e não abusiva, mas não exige que tenha, por exemplo, conexão com o foro escolhido, como exige o protocolo de Buenos Aires[32].

A vontade das partes já pode determinar jurisdição (nacional ou internacional) sem qualquer vínculo ou relação com as hipóteses previstas no Código de Processo Civil para competência internacional concorrente. Na verdade, o limite da autonomia da vontade está nas hipóteses de competência internacional exclusiva e na eventual abusividade.

No que concerne ao aspecto da livre manifestação de vontade, merece especial atenção situações em que uma das partes é considerada mais frágil na relação assumida, merecendo, por essa razão, singular proteção jurídica. É o caso das contratações envolvendo trabalhadores e consumidores, em que se questiona se o foro eventualmente eleito deveria prevalecer.

Nos casos de contratos internacionais de consumo, os de adesão, ou de trabalho, em que há presumida hipossuficiência de uma das partes contratantes presume-se que a cláusula de eleição de foro não poderá derrogar ou prorrogar a jurisdição de modo a prejudicar o hipossuficiente, vez que não há ambiente de ampla capacidade técnica das partes contratantes, sem revelar descompasso no equilíbrio de poder que pudesse refletir mácula na livre manifestação da vontade, o mesmo se afirma quando existe vício de vontade, pois a escolha não foi feita de forma livre, voluntária e inequívoca[33]/[34]/[35].

5 O § 3º DO ARTIGO 63 DO NCPC E SUA APLICAÇÃO A CONTRATOS INTERNACIONAIS

O novo CPC estabelece que “não compete à autoridade judiciária brasileira o processamento e o julgamento da ação quando houver cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro em contrato internacional, arguida pelo réu na contestação” (art. 25 do NCPC). Portanto, jurisdição nacional prorrogável, caso não haja impugnação pelo réu.

O parágrafo terceiro do art.63 do NCPC dispõe que: “Antes da citação, a cláusula de eleição de foro, se abusiva, pode ser reputada ineficaz de ofício pelo juiz, que determinará a remessa dos autos ao juízo do foro de domicílio do réu”, dispositivo aplicável a casos de conflito de jurisdições, por força do § 2º do art. 25 do NCPC[36]. Assim, o magistrado ao receber a petição inicial já pode analisar eventual abusividade da cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro, de ofício, sem contraditório.

Em verdadeira exceção ao que dispõe o art. 10 do NCPC: “o juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício”.

O referido parágrafo 3º do art. 63 do NCPC requer maior adequação para sua aplicação em Processo Civil Internacional. Não há como aplicar a parte final que determina a remessa dos autos ao juízo do foro de domicílio do réu, pois extrapolaria os limites da jurisdição nacional. Em conflito de jurisdições concorrentes, caso decida-se pela incompetência jurisdicional, deverá o juiz extinguir o processo sem julgamento de mérito, ante a delimitação legal da jurisdição nacional.

Nesse caminho, a parte inicial do

§ 3º Antes da citação, a cláusula de eleição de foro, se abusiva, pode ser reputada ineficaz de ofício pelo juiz – manifesta a possibilidade de o magistrado de ofício, sem contraditório, tornar ineficaz cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro, quando esta for abusiva.

Para ilustrar a solução apresentada pelo NCPC, analisa-se duas situações hipotéticas possíveis de ocorrer na aplicação do § 3º do art. 63 ao Processo Civil Internacional.

Situação 1. A parte requerente, domiciliada no Brasil, ajuíza demanda comercial no País nacional alegando que a cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro é abusiva e viola a ordem pública.

Situação 2. A parte requerida se defende em ação ajuizada no Brasil, alegando em preliminar de contestação, exceção de jurisdição, em razão de cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro.

Deve-se ter em mente que a exceção de jurisdição é matéria preliminar de defesa disponível, podendo a jurisdição ser prorrogável caso haja renúncia ao foro estrangeiro eleito, anuência material ou tácita da jurisdição nacional. O art. 25, caput, determina o momento processual adequado para alegação dessa defesa (contestação) e seu § 2º remete-nos ao § 4º do art. 63, todos do NCPC, a revelar o efeito processual do descumprimento deste ônus pela parte, qual seja, a preclusão temporal.

Observe a natureza potestativa da alegação, não sendo, portanto, uma sanção, mas apenas efeito de definitividade da matéria (conflito de competência ou jurisdições) na relação jurídica processual. Nesse sentido, o NCPC em seu art. 337, § 6o dispõe: “A ausência de alegação da existência de convenção de arbitragem, na forma prevista neste Capítulo, implica aceitação da jurisdição estatal e renúncia ao juízo arbitral”.

Pode-se afirmar ainda que o legislador expressamente quis permitir ao magistrado a possibilidade de análise de eventual abusividade da cláusula de eleição de foro (nacional ou estrangeiro), podendo fazê-lo de ofício, sem provocação das partes, exegese literal e gramatical do § 3º do art. 63 e § 2º do art. 25 ambos do NCPC.

Fixado essas premissas, às situações hipotéticas.

Na situação 1, ação ajuizada no Brasil, não obstante cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro, caso o magistrado verifique a abusividade desta cláusula, deverá em decisão fundamentada, determinar a citação do réu para que apresente defesa. Citado, caso o réu pretenda discutir a abusividade da cláusula, deverá fazê-lo pelo recurso agravo de instrumento (art. 1.015, III do NCPC. “Caberá agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: (…) III. rejeição da alegação de convenção de arbitragem”).

Na situação 2, cláusula de eleição de foro estrangeiro como defesa, deverá o magistrado analisar eventual abusividade da cláusula, caso a verifique deverá decidir de forma fundamentada, prorrogando a jurisdição nacional. Decisão também agravável. Não verificando qualquer abuso ou violação a ordem pública, deverá extinguir o processo sem julgamento do mérito (art. 485, X c.c. o 25 do NCPC), nesse caso, decisão sujeita à apelação.

CONCLUSÃO

No cenário atual, o novo Código de Processo Civil é elemento fundamental para que o instituto de foro estrangeiro seja de fato reconhecido e respeitado pela jurisprudência brasileira, a fim de que o Poder Judiciário não se imiscua em demandas, quando houver eleição de foro estrangeiro para solução de conflitos de jurisdições.

A inserção notória do Estado brasileiro nos processos de internacionalização e a consequente integração de seu território à mobilidade das relações jurídicas internacionais e regionais serão fortalecidas por esse novo sistema de regras definidoras de competência internacional, inaugurado pelo NCPC. Coaduna-se com as tendências contemporâneas relativas à matéria.

Nesse sentido, impera mudança de postura da jurisprudência nacional sobre a temática, uma vez que, embora em crescimento, as decisões que discutem a competência brasileira em causas pluriconectadas vêm sendo pouco flexíveis à derrogação de jurisdição.

De modo que, sob os auspícios do novo Direito Processual Civil Internacional Brasileiro sistematiza-se, em forma de enunciados, algumas ilações sobre a temática.

  1. É livre a convenção entre as partes para determinar qual jurisdição decidirá eventual conflito, em contratos (civis e comerciais) internacionais;
  2. É possível declinar jurisdição nacional através de eleição de foro estrangeiro, ainda que nas hipóteses legais de jurisdição nacional concorrente (arts. 21 e 22 do NCPC);
  3. A cláusula de eleição de foro deverá ser escrita, não poderá violar a ordem pública (interna e internacional); não poderá ser abusiva e nem versar sobre hipóteses de jurisdição exclusiva;
  4. Em caso de abusividade ou violação de ordem pública (§ 3º do art. 63 do NCPC) poderá o magistrado de ofício, declará-la, caso que poderá prorrogar ou derrogar jurisdição;
  5. A decisão que decide sobre eventual abusividade ou violação a ordem pública deve ser fundamentada e será passível de recurso no NCPC.

O intuito de tais enunciados é incitar o debate e estudo sobre os novos dispositivos de Processo Civil Internacional Brasileiro, que inauguram novo paradigma, de supremacia das normas internacionais e do princípio da autonomia da vontade nas relações civis e comerciais internacionais.

O novo Código de Processo Civil traz fôlego novo ao permitir a aproximação do ordenamento jurídico brasileiro às realidades e às necessidades das relações jurídicas contemporâneas e do desenvolvimento do comércio internacional. É preciso buscar, ao máximo, a uniformização de tratamento, levando em consideração os trabalhos internacionais, a fim de encurtar distâncias e permitir uma evolução e maior protagonismo do Brasil nas relações globais.

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Notas de Rodapé

[1] Doutora pela Universidade de Barcelona. Professora Coordenadora do Programa de Pós-Graduação stricto sensu da Universidade Federal do Espírito Santo. E-mail: Valesca.Raizer@ufes.br

[2] Mestre pela Universidade Federal do Espírito Santo. Professor adjunto da Universidade de Vila Velha. Defensor Público do Espírito Santo. E-mail: Marcel.guerra@uvv.br

[3] Refere-se ao novo Código de Processo Civil Brasileiro (NCPC), Lei 13.105 de 16 de março de 2015, em prazo de vacância, vigência prevista para 18.03.2016.

[4] A Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados (1969), promulgada pelo Decreto 7.030/09, já havia consagrado a supremacia do Direito Internacional sobre o interno ao prever que nenhum Estado poderá invocar disposições de seu direito interno para justificar o inadimplemento de um tratado (art. 27).

[5] MESQUITA, José Ignácio Botelho de. Da competência internacional e dos princípios que a informam. Revista de Processo. São Paulo: Saraiva, 1988. n. 50, p. 51-71.

[6] O uso da palavra jurisdição é impreciso; às vezes indica o tribunal que tem a competência de julgar; ora se utiliza para referir-se aos limites territoriais do poder do tribunal. Por isso é frequente não fazer distinção entre ambos termos e, assim, o artigo 5 de ambos os tratados de direito processual internacional de Montevidéu de 1889 e 1940 usam a palavra “competência” quando se refere a jurisdição internacional. STRENGER, Irineu. Direito Processual Civil Internacional. São Paulo: LTr, 2003. P. 21. Apesar da tentativa de tornar mais técnica a nomenclatura no NCPC, o uso promíscuo foi mantido, portanto, para evitar dúvidas, utilizar-se-á jurisdição e competência internacional como sinônimos.

[7] LUPOI, Michele Angelo. Confliti transnazionali di giurisdizioni. Policies, metodi, criteri di collegamento. Milano, 2002. t. I, p. 4.

[8] A expressão conflito de jurisdições pode levar a confusão de se entender que há conflito entre as jurisdições dos vários Estados, o que não ocorre, sendo apenas a resolução de qual jurisdição competente julgará o caso concreto envolvendo as partes privadas litigantes.

[9] No Brasil, parcela respeitável da doutrina entende que não há previsão que autorize a autonomia da vontade para escolha da legislação aplicável. A discussão gravita em torno da redação do art. 9º da LICC, segundo o qual: “Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem”. A questão é saber se é possível uma leitura teleológica do dispositivo, vislumbrando-se uma regra não expressamente escrita. Nesse sentido, Jacob Dolinger: “Considerando que nosso comércio internacional é voltado principalmente para a Europa e os Estados Unidos, e que em ambos estes mercados, tanto por força de leis internas como pelas convenções internacionais, a liberdade de escolha da lei aplicável é princípio consolidado, cabe à doutrina brasileira proclamar alto e bom som que não será a lentidão burocrática em remeter ao Congresso para aprovação a Convenção do México por nós assinada, nem o desinteresse do Congresso em aprovar uma nova lei sobre o Direito Internacional Privado que irão manter-nos em posição diametralmente oposta a todo o mundo civilizado, mormente quando a lei que temos, de 1942, em seu art. 9º, já foi interpretada favoravelmente à autonomia da vontade por aquele a quem o Brasil mais deve no campo do Direito Internacional Privado. Outrossim, o direito brasileiro sempre admitiu a interpretação teleológica da lei, e segundo esta, é indubitável que, considerada a realidade das relações jurídicas internacionais da atualidade, considerado o panorama do Direito Internacional Privado Contemporâneo, considerados os interesses da economia brasileira, em crescente internacionalização, que o art. 9º da LICC não impõe qualquer óbice à escolha de outra lei que a lex contractus” (DOLINGER, Jacob. A livre escolha pelas partes da lei aplicável nos contratos internacionais. Revista de Direito do Estado. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. n. 2, p. 243). Igualmente: DOLINGER, Jacob. Direito internacional privado (parte especial) – contratos e obrigações no direito internacional privado. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. p. 450-461, esp. 457-458. Os professores Nadia de Araujo e Lauro Gama, analisando os Princípios de Haia, afirmam que seria possível aos tribunais nacionais aplicação de princípios que não integrem o direito interno, citando como exemplo as Incoterms. “Deve-se notar, no entanto, que os tribunais estatais estão aptos a interpretar e complementar um conjunto de princípios contratuais do mesmo modo como o fazem com a lei doméstica ou a lei estrangeira, indicada por seu sistema de DIPr. Por exemplo, a aplicação e a interpretação dos Incoterms, elaborados pela CCI e muito utilizados no comércio internacional, não parecem problemáticas para os tribunais (inclusive os brasileiros). Por isso, é lícito afirmar ser, pelo menos, possível aos tribunais nacionais manejar um instrumento internacional que envolva princípios e não integre o direito interno”. Não havendo portanto, incompatibilidade com os Princípios da Haia que reconhecem a ampla liberdade de escolha da lei, não se exigindo conexão entre a lei escolhida e as transações comerciais ou as partes, afastando-se a teoria da localização, a exigir uma conexão com o foro escolhido, sob pena de fraude a lei.

ARAÚJO, Nadia de. VARGAS, Daniela. A Conferência de Haia de Direito Internacional Privado: Reaproximação do Brasil e Análise das Convenções Processuais. Revista de Arbitragem e Mediação, v. 35/12, p. 189, Out/2012, DTR2012451121. Na mesma linha, a da ampla autonomia, o NCPC ao permitir ampla liberdade na escolha do foro, sem necessidade de conexão (art. 22, III e 25 do NCPC).

[10] O Direito Processual Internacional se singulariza por seu caráter evidentemente público, pois tem um predomínio extraordinário da lei territorial, acima de qualquer outra; processualmente adota o nome de lex fori. Esse predomínio não equivale a excluir outra lei ou um tratado. TENÓRIO, Oscar. Direito Internacional Privado. 7. ed. Rio de Janeiro, 1965. v. II, p. 14.Não confundir com Direito Processual Civil Transnacional, destinada às normas que regulam a relação jurídica processual em Tribunais Internacionais, compreendendo aqueles que transcendem fronteiras nacionais, disciplina de Direito Internacional Público.

[11] A lei de arbitragem prevê a autonomia da vontade para escolha da lei aplicável, contudo, parcela da doutrina entende que tal disposição não se estende a eleição de foro. Nesse sentido, Paulo Borba Casella, em artigo sobre a autonomia da vontade na arbitragem comercial internacional, afirma que a Lei 9.307/96 conferiu à autonomia da vontade das partes, em matéria arbitral, extensão irrestrita, diversamente do que ocorre quando as partes optam por cláusula judicial de eleição de foro: “Instaurou-se, desse modo, situação curiosa, em nosso ordenamento, no qual se passou da restrição à autonomia da vontade das partes contratantes na escolha da lei aplicável, para quadro no qual, no regime da nova lei, combinam-se a liberdade total e a diversidade de regime, conforme se trate, em cada configuração contratual, de cláusula de eleição judicial de foro – em que estarão as partes adstritas à observância do regime do art. 9º da Lei de Introdução ao Código Civil brasileiro – enquanto a opção pela cláusula arbitral, comporta a opção de escolha seja de lei estrangeira, de eqüidade, ou com base nos princípios gerais do direito, dos usos e costumes e das regras internacionais do comércio”. (CASELLA, Paulo Borba. Autonomia da vontade, arbitragem comercial internacional e Direito Brasileiro. In: TIBURCIO, Carmen; BARROSO, Luís Roberto (Orgs.). O direito internacional contemporâneo – Estudos em homenagem ao Professor Jacob Dolinger. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 737-750, esp. p. 742-743)

[12] Apesar de intimamente relacionados, a escolha da lei material aplicável ao caso concreto não determina o foro competente, e vice-versa. A lei aplicável e o eventual conflito de leis possui implicações de direito material, enquanto o foro de eleição e o consequente conflito de jurisdição implicações de direito processual.

[13] Tratando de cada conceito separadamente, tem-se que a primeira diferenciação a ser estabelecida é que escolha do foro tem implicação exclusivamente processual, enquanto que a cláusula de lei aplicável é de direito material. É assim que estão separados também o conflito de jurisdição e o conflito de leis, e se afirma que a problemática da eleição de foro antecede e modifica a escolha da lei aplicável. FAWCETT, James J.; TORREMANS, Paul. Intellectual. Property and Private International Law. 2. ed. Oxford: Oxford University Press, 2011. p. 3-6. “The court will have to find the proper law and also the proper rule for determining the validity of the choice-of-law clause”. (LANDO, Ole. The conflict of laws of contracts: general principles. Recueil des Cours, vol. 189 (1984-VI) pp. 285-286).

[14] No § 12 do preâmbulo ao Regulamento Roma I, consta que: “O fato de as partes terem convencionado que um ou vários órgãos jurisdicionais de um Estado-Membro têm competência exclusiva para decidir de quaisquer litígios decorrentes do contrato deverá ser um dos fatores a ter em conta para determinar se a escolha da lei resulta de forma clara”.

[15] A própria Lei da Arbitragem, no capítulo dedicado ao Reconhecimento e Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras, estabelece que o exame de validade da convenção de arbitragem, para fins de homologação pelo STJ, passará pelo crivo da “lei à qual as partes a submeteram, ou, na falta de indicação, em virtude da lei do país onde a sentença arbitral foi proferida” (art. 38, II), portanto da lex fori.

[16] Um enunciado da década de 60 da súmula do STF (Súmula 335), já reconhecia a possibilidade de eleição de foro em contratos em processos oriundos do contrato e sempre é citada para justificar a autonomia da cláusula. A súmula decorre de decisão proferida em um caso puramente interno, o Recurso Extraordinário 34.791. À época, o Código de Processo Civil em vigor, de 1939, não continha menção à possibilidade de escolha do foro pelas partes, diferentemente do que ocorria anteriormente, quando as legislações estaduais admitiam a escolha do foro, pelo preceito contido no Regulamento 737, art. 62. A questão era saber se poderia admitir-se a escolha com base no Art. 42 do Código Civil de 1916, que admitia no conceito de domicílio o foro contratual. “Art. 42. Nos contratos escritos poderão os contraentes especificar domicílio onde se exercitem e cumpram os direitos e obrigações deles resultantes”.

[17] Julgados citados: K & V Scientific Co., Inc. v. Bayerische Motoren Werke Aktiengesellschaft (BMW), 314 F.3d. 494 (10th Cir, 2002); Keaty v. Freeport Indonesia, Inc., 503 F.2d. 955 (5th Cir. 1974); Hunt Wesson Foods, Inc. v. Supreme Oil. Co., 817 F.2d., 75 (9th Cir. 1987); Furry v. First Nat’l Monetary Corp., 602 F. Supp. 6 (W.D.Okla., 1984); ASM Communications, Inc. v. Allen, 656 F. Supp. 838 (S.D.N.Y., 1987). SPITZ, Lidia. “Eleição de Foro Estrangeiro: o princípio da autonomia da vontade e seu reconhecimento no direito convencional, regional e brasileiro”. Dissertação de Mestrado em Direito Internacional pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: UERJ, 2010.

[18] BEAUMONT, Paul. Great Britain. In: Declining jurisdiction in private international law. Oxford: Clarendon Press, 1995. p. 223-227.

[19] No original: “Article 3 Exclusive choice of court agreements (…) (b) a choice of court agreement which designates the courts of one Contracting State or one or more specific courts of one Contracting State shall be deemed to be exclusive unless the parties have expressly provided otherwise”.

[20] No Brasil, temos o Protocolo de Buenos Aires sobre Jurisdição Internacional em matéria contratual que reconheceu o princípio da autonomia da vontade das partes, acolhendo o acordo sobre jurisdição no Mercado Comum do Sul – MERCOSUL. Interessante que o Tratado criou uma exigência – que o NCPC não prevê – que é a existência de uma conexão razoável com a jurisdição eleita. Protocolo de Buenos Aires sobre Jurisdição Internacional em Matéria Contratual, concluído em Buenos Aires, em 05.08.1994, promulgado pelo Dec. 2.095, de 17.12.1996. Texto: “Eleição de Jurisdição. Art. 4º. 1. Nos conflitos que decorram dos contratos internacionais em matéria civil ou comercial serão competentes os tribunais do Estado-Parte em cuja jurisdição os contratantes tenham acordado submeter-se por escrito, sempre que tal ajuste não tenha sido obtido de forma abusiva. 2. Pode-se acordar, igualmente, a eleição de tribunais arbitrais. Art. 5º. 1. O acordo de eleição de jurisdição pode realizar-se no momento da celebração do contrato, durante sua vigência ou uma vez suscitado o litígio. 2. A validade e os efeitos de eleição de foro serão regidos pelo direito dos Estados-Partes que teriam jurisdição de conformidade com o estabelecido no presente Protocolo. 3. Em todo caso, será aplicado o direito mais favorável de validade do acordo”.

[21] Derrogatio fori é expressão latina que significa a possibilidade das partes, através do exercício da autonomia da vontade, afastarem a jurisdição de um Estado. Por sua vez, prorrogatio fori é expressão latina conceituada como a inserção de hipótese não prevista no ordenamento nacional sobre a jurisdição indicada resolver determinada e eventual lide. Sobre essa abordagem, v. TIBURCIO, Carmen. Comentários ao Recurso Especial 251.438: três temas de processo internacional. In: Temas de direito internacional. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 83-121, esp. p. 86-87.

[22]Art. 22. Compete, ainda, à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações:(…) III. em que as partes, expressa ou tacitamente, se submeterem à jurisdição nacional”.

[23] MORELLI, Gaetano. Derecho procesal civil internacional. Tradução de Santiago Sentis Melendo. Buenos Aires: E.J.E.A., 1953. p. 202-203).

[24]A exclusão ou inclusão de uma causa em dada jurisdição é feita pelas razões mencionadas há pouco, e, por isso, os seus limites não podem ser alterados pelas partes nem em sentido positivo nem em sentido negativo, isto é, nem para distendê-la nem para restringi-la. O fato de certa causa ser estranha à jurisdição do Estado, não é a rigor caso de incompetência (essa consiste, no fundo, na negação da ação), e, talvez, só por analogia se lhe possa aplicar a regra da incompetência ratione materiae”. (LIEBMANN, Enrico Tullio. Os limites da jurisdição brasileira. Revista Forense. Rio de Janeiro: Forense, 1942. v. 92. p. 650)

[25] CARNEIRO, Athos Gusmão. Competência internacional concorrente. Artigo 88 do CPC e o foro de eleição. Revista Forense. Rio de Janeiro: Forense, 2001. v. 352. p. 48.

[26] Conforme esclarece Cândido Rangel Dinamarco “são de ordem pública todas as normas (processuais ou substanciais) referentes a relações que transcendam a esfera de interesses dos sujeitos privados, disciplinando relações que os envolvam mas fazendo-o com atenção ao interesse das sociedade como um todo, ou ao interesse público. Existem normas processuais de ordem pública e outras, também processuais, que não o são” (DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. Item 20, v. I, p. 71). No mesmo sentido, ver ALMEIDA, Ricardo Ramalho. Breves reflexões sobre eleição de foro estrangeiro e a competência concorrente do Judiciário brasileiro. In: RODAS, João Grandino (Coord.). Contratos internacionais. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 312.

[27] O novo CPC regulou expressamente no art. 13. “A jurisdição civil será regida pelas normas processuais brasileiras, ressalvadas as disposições específicas previstas em tratados, convenções ou acordos internacionais de que o Brasil seja parte”. E no art. 24: “A ação proposta perante tribunal estrangeiro não induz litispendência e não obsta a que a autoridade judiciária brasileira conheça da mesma causa e das que lhe são conexas, ressalvadas as disposições em contrário de tratados internacionais e acordos bilaterais em vigor no Brasil”. De modo que as disposições processuais previstas em tratados internacionais, vigentes, prevalecem sobre normas processuais brasileiras. Essa é a regra. A Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados (1969) consagrou em seu art. 27 (Direito interno e observância de tratados) que um Estado não pode invocar as disposições de seu direito interno para justificar o inadimplemento de um tratado, ratificado em 25.09.09 e promulgado pelo Decreto 7.030/09. A demonstrar uma superioridade do Direito Internacional frente ao Direito Interno dos Estados, a garantir o progresso e desenvolvimento do Direito Internacional, em detrimento de concepções nacionalistas ou isoladas, na esteira da nova tendência constitucional contemporânea, bem como a prática internacional.

[28] TIBURCIO, Carmen. Comentários ao Recurso Especial 251.438: três temas de processo internacional. In: Temas de direito internacional. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 86-87.

[29] Forum necessitatis – O princípio do forum necessitatis está relacionado com a necessidade de se garantir uma tutela jurisdicional, evitando-se uma denegação internacional de justiça, a permitir o acesso aos tribunais inicialmente incompetentes. Baseado no direito de acesso à justiça que permite outorgar jurisdição internacional a juizes que, a princípio, carecem de tal potestade para conhecer e decidir em determinado caso concreto. Por exemplo, quando o foro estrangeiro eleito tenha negado validade à cláusula. Basicamente pode-se elencar dois requisitos para a aplicação do princípio do fórum de necessidade: 1°) O litígio deve estar claramente conectado com o local do foro; 2°) Recorrer a tribunal estrangeiro deve ser impossível ou excessivamente oneroso. CARAVACA, Alfonso Luis Calvo; GONZÁLEZ, Javier Carrascosa. Competência judicial internacional: régimen de producción interna en Derecho internacional privado español. Revista Decita. Fundação Boiteux, 2005. n. 04, p. 519-542.

[30] VESCOVI, Eduardo. Derecho Procesal Civil Internacional. Montevidéu: Idea, 2000. p. 07.

[31] Entende-se o abuso todo elemento que viole a ordem pública interna, organização política, social e econômica do País e ou internacional, comprometendo os preceitos fundamentais de nosso ordenamento ou do direito internacional. O abuso deve ser grave, passível de aferição de ofício e sem provocação das partes.

[32] Haia e Mercosul, reside especialmente nas regras de desconexão previstas nos dois instrumentos. Haia exige, para a sua aplicação, a residência das partes no Estado contratante e o Protocolo de Buenos Aires, por seu turno, permite dupla conexão: a residência de uma das partes e/ou a indicação do foro em um dos Estados-membros do Mercosul. O Código Bustamante, por outro lado, admite a possibilidade de Eleição do foro pelas partes, desde que ao menos uma delas seja nacional ou domiciliada no Estado contratante a que pertença o juízo escolhido. Ou seja, é necessária uma vinculação das partes com o foro escolhido (vinculação subjetiva).

[33] DE NARDI, Marcelo. Eleição de foro em contratos internacionais: uma visão brasileira. In: RODAS, João Grandino (Coord.). Contratos Internacionais. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 146.

[34] Confira-se TRT – Processo 20050644089 – 2ª Região – Rel. Sérgio Pinto Martins – j. em 14.09.2005, ementa: “Competência em razão do lugar. Foro de eleição. No processo do trabalho, não se admite o foro de eleição, pois caso assim se procedesse haveria impossibilidade de o empregado locomover-se para Manaus, onde teria sido eleito o foro de eleição, inviabilizando o direito de ação do obreiro. É portanto, uma medida de proteção ao operário. É considerada não escrita a cláusula no contrato de trabalho que estabeleça foro de eleição. A regra a respeito da competência no processo do trabalho é a estabelecida no art. 651 da CLT e seus parágrafos, inexistindo foro de eleição. Não há omissão na CLT para se aplicar o CPC. O art. 651 da CLT é, portanto, uma norma de ordem pública” e TRT – Processo 037713/2000 – 15ª Região – Rel. Levi Ceregato – j. em 03.10.2000, ementa: “Foro de eleição – Justiça do Trabalho – Incompatibilidade – Conquanto não haja vedação expressa no Texto Celetizado, a eleição de foro revela-se incompatível com o processo trabalhista, na medida em que a orientação é facilitar o acesso do trabalhador ao órgão jurisdicional, considerando a sua hipossuficiência econômica – Inteligência do artigo 651 da CLT e seus parágrafos – Preliminar que ora se rejeita”.

[35] O STJ analisando nulidade de cláusula de eleição de foro sob a égide da Lei 11.280/06, que inseriu o parágrafo único ao art. 114, CPC/73, permitiu a declaração de nulidade de cláusula de eleição, de ofício, em contrato de adesão, desde que: i) a parte não dispusesse, no momento de celebração do contrato, de intelecção suficiente para compreender o sentido e as consequências da estipulação contratual; ii) tal estipulação resultasse inviabilidade ou especial dificuldade de acesso ao judiciário; iii) se tratasse de contrato de obrigatória adesão, assim entendido o que tenha por objeto produto ou serviço fornecido com exclusividade por determinada empresa. REsp. 58.138/SP – 4ª T. – Rel. Min. Sálvio de Figueiredo – DJ 22.05.1995. Portanto, pautado pelo princípio do acesso à justiça, deverá afastar a cláusula, ante seu caráter abusivo e, portanto, violador da ordem pública..

[36]NCPC, art. 25. Não compete à autoridade judiciária brasileira o processamento e o julgamento da ação quando houver cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro em contrato internacional, arguida pelo réu na contestação. § 1o Não se aplica o disposto no caput às hipóteses de competência internacional exclusiva previstas neste Capítulo. § 2o Aplica-se à hipótese do caput o art. 63, §§ 1o a 4o”.