O Controle Judicial das Políticas Públicas

Fabiane Grando[1]

Resumo: A presente pesquisa tem por objetivo fazer uma análise do controle judicial das políticas públicas por parte do Poder Judiciário. Parte-se da premissa de que as políticas públicas são, tradicionalmente, consubstanciadas em ações estatais (discricionárias), nas quais não caberia ao Judiciário intervir, sob pena de ofensa, inclusive, ao princípio constitucional da separação dos poderes. Ocorre que a tendência contemporânea tem revisto esse entendimento. O estudo proposto tem por referencial teórico os autores clássicos de direito administrativo e sua confrontação com autores do neoconstitucionalismo, a partir dos quais se pretende, por meio de uma revisão bibliográfica, associada a procedimento histórico e comparativo, analisar, também, as possibilidades de atuação do Poder Judiciário (por meio do controle de políticas públicas), valendo-se não apenas de conceitos teóricos, mas também buscando em casos práticos a visualização da realidade em contraste com a norma e postulados escritos. O que se observa é que, por se tratarem de ações estatais por meio das quais são traçadas diretrizes e metas a serem fomentadas pelo Estado, especialmente na implementação dos objetivos e direitos fundamentais dispostos na Constituição, o controle judicial da Administração Pública não se deve restringir simplesmente ao controle estrito da legalidade.

Palavras-chave: políticas públicas, controle judicial, objetivos do Estado e direitos fundamentais.

Abstract: The present research intends to analyze the judicial control of public policies by the Judiciary. It starts with the premise that public policies are traditionally embodied in state actions (discretionary), in which there would be not possible for the judiciary to intervene, under penalty of offense, including the constitutional principle of separation of powers. The fact is that the contemporary trend has revised this understanding. The proposed study has its theoretical referential in classical administrative law authors and its confrontation with neoconstitutionalism’s authors, from which it is intended, through a literature review, combined with historical procedure and comparative, analyze also the possibilities of Judiciary action ( through the control of public policies), taking advantage not only of theoretical concepts, but also looking at practical cases a view of reality in contrast to the standard and written postulates. What is observed is that, since they are state actions through which are drawn guidelines and goals to be promoted by the State, especially in the implementation of the fundamental objectives and rights established in the Constitution, the judicial control of public administration should not be restricted by simply legality control.

Keywords: public policy, judicial control, State goals and fundamental rights.

INTRODUÇÃO

O controle das políticas públicas por parte do Poder Judiciário sempre despertou controvérsias na doutrina e na própria jurisprudência.

Isso decorre, essencialmente, da conhecida teoria dos atos administrativos da doutrina administrativista em que se reconhece o mérito dos atos da Administração Pública (juízo de conveniência e oportunidade) como um verdadeiro território intocável para o Poder Judiciário.

Nessa linha, o presente trabalho trabalha a evolução do papel da atuação estatal, por meio de políticas públicas, assim como a mudança de paradigma no que diz respeito à influência do Poder Judiciário em sua definição.

Inicialmente, será feita uma análise histórico-evolutiva dos modelos de Estado, enfocando o contexto em que as políticas públicas entram em cena.

Na sequência, parte-se para uma abordagem da noção de políticas públicas, visualizando-se os aspectos que deverão nortear os momentos de escolhas e decisões, a partir da análise técnica e do processo político de decisões, que constituem o grande desafio para uma gestão eficiente e a efetividade das políticas públicas.

A parte final do trabalho tem como finalidade aprofundar o tema do controle judicial das políticas públicas, na perspectiva de que, enquanto conjunto de ações estatais, por meio das quais são traçadas as diretrizes e metas a serem fomentadas pelo Estado, o controle judicial da Administração Pública não se deve restringir simplesmente ao controle estrito da legalidade.

1 ANÁLISE HISTÓRICO-EVOLUTIVA DO ESTADO NA PERSPECTIVA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS

Durante um longo período da História, o tema das políticas públicas não foi considerado pelo Direito. É com o surgimento do Estado Social que as políticas públicas entram em cena, sendo concebidas como instrumento para a realização das vontades coletivas.

Nesse sentido, cabe destacar que o início do século XX é marcado pela quebra do projeto liberal, provocada pela insuficiência do capital para manter os investimentos na força produtiva, não se sustentando diante das cíclicas crises econômicas. Torna-se necessária a intervenção do Estado para que promova a correção das distorções do capitalismo liberal e assegure o interesse público, notoriamente abalado no conflito entre capital e trabalho.

Surge, assim, o Estado Interventor, empresário e assistencial, com a incumbência de, ao lado de suas atividades normais, efetivar o desenvolvimento econômico, ordenar a atividade financeira, prestar serviços públicos, conceder incentivos e subsídios à produção e, mesmo que apenas em tese, prestar assistência aos mais necessitados.

A intervenção do Estado, em um modelo inspirado em ideais socializantes, volta-se para as atividades ligadas às políticas sociais de saúde, segurança, habitação, educação, dentre outras voltadas ao coletivo, que assumem a conotação de direitos fundamentais.

Enquanto no Estado Liberal o objetivo central é a segurança dos indivíduos e a justiça social não constitui ponto relevante de preocupação estatal, no Estado Social, a justiça e a participação política dos cidadãos são ponto fundamental e valor predominante, junto com as quais se agrega a manutenção da ordem, que somente é possível desde que atendidas as condições mínimas de existência[2].

Como se percebe, de uma conduta caracterizada apenas pela ausência de qualquer intervenção na esfera da liberdade individual, passa-se a presenciar um Estado mais forte e atuante na proteção dos direitos sociais, a fim de proporcionar condições de vida digna, surgindo desta pretensão a formulação de políticas públicas[3].

Diante desta alteração paradigmática e das novas tendências do Estado na implementação de políticas públicas surge a necessidade do estabelecimento de limites positivos para o agir administrativo, por meio de um controle de resultados efetivos e a responsabilização do agente público por omissão ante os interesses legítimos da sociedade.

Outro ponto fundamental da mudança paradigmática do Estado Social é que sua democracia formal tem por pressuposto a participação popular direta e permanente na formulação das políticas públicas pela Administração[4].

Nessa perspectiva, o que se vê é uma preocupação em se reduzir o âmbito de discricionariedade da Administração Pública, possibilitando a participação popular (direta ou indiretamente) na formulação, execução e controle de políticas públicas[5].

Em tal contexto, não mais se justifica um planejamento impositivo, políticas públicas inflexíveis e extrema burocracia na estrutura estatal, eis que, ao menos nas sociedades ocidentais, começa a se valorizar a participação popular nas questões de seu interesse.

Dessa forma, o Estado Social volta-se para a conciliação dos interesses individuais e sociais. A liberdade deixa de constituir simples autonomia privada na condução de seus próprios interesses e passa a constituir participação na formação da vontade política e no resultado da implementação efetiva das políticas públicas.

A finalidade precípua do Estado Social deve ser o alcance e a efetivação dessas normas sociais[6]. O que se almeja no Estado Social é fazer concretos os ideais tanto de liberdade quanto de igualdade, relevando-os acima da retórica programática (BONAVIDES, 1996, p. 14).

2 POLÍTICAS PÚBLICAS: SIGNIFICADO E ALCANCE

De acordo com Bucci (2006, p. 241), as políticas públicas “são programas de ação governamental visando a coordenar os meios à disposição do Estado e as atividades privadas, para a realização de objetivos socialmente relevantes e politicamente determinados”.

Na mesma linha, Granziera (2007, p. 188) destaca:

A lei que institui uma política pública constitui apenas a base legal, um marco zero, sobre o qual terá início um longo processo de implantação, visando à efetividade da mesma. Para que uma política pública produza resultados, é necessária a implantação das chamadas “medidas de efetividade” da lei. Trata-se de uma série de ações basicamente desenvolvidas pelo Poder Público, com vistas a estruturar a aplicação da norma legal.

Os regulamentos da lei detalham a norma, facilitando sua aplicação, inclusive no que se refere aos procedimentos administrativos a serem cumpridos, indicando o modo de aplicar a norma legal.

Um outro ponto que Granziera (2007, p. 189) enfatiza consiste no fortalecimento institucional dos órgãos e entidades responsáveis pela aplicação das normas legais. É preciso treinar o pessoal, buscando a atualização dos conceitos e das técnicas. A realização de concursos públicos é fundamental para garantir o preenchimento das vagas relativas às funções necessárias à implementação da lei: planejamento, exercício de poder de polícia, assistência social para auxiliar na remoção das pessoas etc., em uma estrutura que não se desmonte com a troca dos governos[7].

Breus (2007, p. 204-205) adverte que visualizar as políticas públicas como apenas mais uma das modalidades de ação do Estado mitiga a importância deste instrumento de realização dos direitos fundamentais. Para ele, ampliando-se as políticas públicas como “mecanismo por excelência de ação estatal, estar-se-á divulgando um discurso jurídico de efetivação das normas constitucionais, em especial dos Direitos Fundamentais sociais, haja vista que eles terão um meio adequado e abrangente para serem realizados”.

Considerando que as ações que resultam em políticas públicas estão envoltas em uma série de aspectos institucionais, procedimentais e políticos, cabe delimitar os aspectos que deverão nortear os momentos de escolhas e decisões nas políticas públicas.

A relação entre a análise técnica, de um lado, e o processo político de decisões, de outro, constitui o grande desafio para uma gestão eficiente e a efetividade das políticas públicas. São duas lógicas a serem confrontadas: a racionalidade técnica e a lógica política. Enquanto o trabalho técnico oportuniza o acesso a informações e oferece o suporte racional e analítico aos atores políticos para que eles possam escolher de forma mais apropriada as alternativas, não se pode olvidar que as decisões são políticas, correndo-se o risco de prevalecerem interesses inconsistentes.

No que diz respeito à racionalidade técnica, importante considerar que as políticas públicas são voltadas para temáticas específicas, como saúde, educação, incentivo à cultura, proteção ambiental, urbanísticas, e se exteriorizam, essencialmente, por ações dos Poderes Legislativo e Executivo[8]. Logo, antes de transformar importantes decisões em diplomas legais ou atos administrativos, existe um momento de fundamental importância nas políticas públicas, que é a coleta de informações e a definição de prioridades.

Na lição de Bucci (2006, p. 249):

Quanto mais se conhece o objeto da política pública, maior é a possibilidade de efetividade de um programa de ação governamental; a eficácia de políticas públicas consistentes depende diretamente do grau de articulação entre os poderes e os agentes públicos envolvidos. Isso é verdadeiro especialmente no campo dos direitos sociais, como saúde, educação e previdência, em que as prestações do Estado resultam da operação de um sistema extremamente complexo de estruturas organizacionais, recursos financeiros, figuras jurídicas, cuja apreensão é a chave de uma política pública efetiva e bem-sucedida.

É essencial uma análise prévia das carências que se almejam suprir, que região ou setor específico se pretende atingir, as necessidades e possibilidades técnicas da Administração, a aptidão financeira para a realização de investimentos públicos, quando será necessária uma ação articulada com a iniciativa privada, bem como a interlocução com os envolvidos e beneficiados.

Contudo, deve-se advertir que as demandas sociais não podem ser tratadas como questões exclusivamente técnicas; é necessário considerar que se está muito mais em um plano de escolhas políticas do que de aplicação de métodos de gestão.

Nesse sentido, Bucci (2006, p. 244) destaca que o problema jurídico-administrativo do Brasil, embora tenha elementos gerenciais, não é exclusivamente de gestão; é primordialmente um problema político: “As soluções exclusivamente técnicas, centradas no aspecto da gestão, que não contemplem os problemas da dominação política em sua magnitude real – os quais nunca deixaram de pesar sobre a organização e funcionamento do aparelho administrativo do Estado – serão necessariamente insatisfatórias”.

Passa-se então à análise do processo político de formação de decisões.

Novamente, recorremos à Bucci (2006, p. 241) para elucidar a questão, quando analisa que a ideia de política deve ser tomada em um sentido amplo, como atividade de conhecimento e organização do poder:

Adotar a concepção das políticas públicas em direito consiste em aceitar um grau maior de interpenetração entre as esferas jurídica e política ou, em outras palavras, assumir a comunicação que há entre os dois subsistemas, reconhecendo e tornando públicos os processos dessa comunicação na estrutura burocrática do poder, Estado e Administração Pública.

Mencionar o processo político de tomada de decisões, para fins deste estudo, diz respeito à constatação de que, embora se estabeleçam balizas jurídicas para a ação dos Poderes Públicos, existe um espaço de discricionariedade, tanto para os legisladores quanto para os agentes da Administração Pública na tomada de decisão e na triagem das opções relativas aos conteúdos de normas e atos que comporão as políticas públicas.

O aspecto político, nessa linha, volta-se para a ideia de gestão democrática, como lugar, por excelência, do debate. Assim, a partir do momento em que se abre o espaço estatal para o debate público, seja entre os próprios agentes da Administração Pública, seja entre representantes do Poder Legislativo e até mesmo pela atuação direta dos cidadãos por meio de suas associações ou outras entidades, deve-se reconhecer que não se está mais em uma estrita esfera de ação jurídica, mas em um espaço político.

Outrossim, nessa proposta de análise do significado e alcance das políticas públicas, cabe, ainda, posicionar o tema a partir da compreensão do Estado contemporâneo (Democrático de Direito), tendo por referencial a Constituição, que lhe atribuiu papel principal no desenvolvimento das políticas públicas.

Deve-se ter em conta que, independentemente do adjetivo atribuído ao Estado, existe uma ordem constitucional, fonte de princípios, como diretriz a orientar a atuação estatal. A Constituição Federal de 1988, denominada Constituição Cidadã, consagra direitos que refletem inúmeras demandas sociais e que devem estar acompanhados de práticas democráticas[9].

No texto da Constituição de 1988 estão inseridos os fundamentos do Estado Democrático de Direito (artigo 1º), os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil (artigo 3º) e os direitos e garantias fundamentais de caráter individual ou coletivo (Título II e outros dispositivos), que deverão permear todo o processo decisório das políticas públicas.

De fato, as políticas públicas são tratadas como um mecanismo de efetivação das garantias constitucionais. Levando-se em consideração a adequação da Constituição Federal de 1988 à realidade, o constituinte originário trouxe ao texto constitucional a importância da concretização dos direitos fundamentais por meio de políticas públicas.

Assim, o significado e alcance das políticas públicas configura-se, na realidade, em um modo possível de pensar os valores inseridos no ordenamento jurídico pátrio, os quais devem ser efetivados pelos Poderes Públicos diante das situações concretas. Portanto, as ações governamentais devem considerar os direitos fundamentais como substrato e fim das políticas públicas.

3 O PODER JUDICIÁRIO E O CONTROLE DAS POLÍTICAS PÚBLICAS

O controle das políticas públicas por parte do Poder Judiciário sempre despertou controvérsias na doutrina e na própria jurisprudência. A explicação para esse fato reside na conhecida teoria dos atos administrativos da doutrina administrativista em que se reconhece o mérito dos atos da Administração Pública (juízo de conveniência e oportunidade)[10] como um verdadeiro território intocável para o Poder Judiciário[11].

Assim, as políticas públicas foram tradicionalmente consubstanciadas em ações estatais (discricionárias)[12], nas quais não caberia ao Judiciário intervir, sob pena de se ofender até mesmo o princípio constitucional da separação dos poderes. Contudo, a tendência mais contemporânea tem revisto esse entendimento.

O exame do controle judicial das políticas públicas proposto neste trabalho será feito, inicialmente, com amparo nas noções do direito administrativo de elementos dos atos administrativos, quais sejam: competência, forma, objeto, motivo e finalidade.

Para tanto, também teremos por referência o artigo 2º da Lei 4.717/65 (Lei de Ação Popular) que apresenta os cinco elementos do ato administrativo e as causas em tese de nulidade[13], que poderiam ser reconhecidas pelo próprio Executivo ou pelo Judiciário, nos termos da Súmula 473 do Supremo Tribunal Federal[14]. Observe-se que as cinco alíneas do referido dispositivo – que trata de atos administrativos lesivos ao patrimônio público – apresentam correlação com o tema das políticas públicas que se pode conduzir à apreciação do Poder Judiciário. Na análise de cada elemento do ato administrativo – atrelado a um respectivo inciso – busca-se um exemplo, a fim de melhor elucidar as observações.

Nessa linha, percebe-se que é possível encontrar políticas públicas implementadas por agentes públicos que não detenham competência legal nesse sentido. Uma hipótese seria uma lei de iniciativa do Poder Executivo Estadual limitar o zoneamento urbano de certos Municípios. Tal medida estaria sujeita a controle por parte do Judiciário, verificando tratar-se de incompetência para referido ato administrativo.

A respeito de vícios de forma nas políticas públicas, pode-se cogitar da implementação de medidas restritivas por meio de decreto em casos que demandam expressamente lei em sentido formal, como a formalização de IPTU progressivo no tempo sem a devida previsão legal anterior, tratando-se de majoração da carga tributária.

Passando a situações de eventual desvio de finalidade de atos administrativos sujeitos à apreciação do Poder Judiciário, um exemplo possível seria a construção de um parque municipal voltado não para o bem-estar da população, mas sim para a valorização imobiliária de uma determinada área urbana, contrariando, portanto, o interesse público.

Mais delicado para grande parte da doutrina e jurisprudência, contudo, é pensar na intervenção do Judiciário em relação ao conteúdo e motivos dos atos administrativos, que representam o mérito administrativo, o qual está sujeito à discricionariedade dos administradores. De toda forma, importante compreender que certas políticas públicas podem apresentar, efetivamente, ilegalidade do objeto ou inexistência de motivos adequados, que podem e devem ser combatidos judicialmente.

No que diz respeito à ilegalidade do objeto, nos termos do artigo 2º da Lei 4.717/65, isso ocorre quando o resultado do ato importa em violação de lei, regulamento ou ato normativo. Nesse sentido, pode-se imaginar uma situação em que Município concede licença ambiental, autorizando o desmatamento de extensa mata nativa para instalação de empreendimento, com amparo em decreto municipal, que limita sua competência a espécies nativas isoladas ou a arboredos. Há, inclusive, precedente jurisprudencial nesse sentido[15].

Finalmente, quanto aos motivos do ato administrativo, também é possível verificar-se situações em que matéria de fato ou de direito que fundamenta certas políticas públicas pode se apresentar materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido. Trata-se de um preceito bastante amplo e indeterminado, mas que guarda correlação com situações bastante práticas. Ora, cabe ressaltar que todo ato deve apresentar dimensão fática e legal que o fundamenta – como determinação normativa para que seja feita a coleta seletiva de lixo hospitalar e a ausência de serviço público nesse sentido –; dimensões que representariam vício no motivo de certas políticas públicas em caso de inexistência material (como a falta da obrigação legal de coleta seletiva) ou impropriedade com o resultado obtido (como obrigar cada ente de serviço hospitalar a criar sua estrutura própria de coleta, tratamento e destinação dos resíduos, ao invés de se formatar uma sistemática unificada)[16].

Feita a análise da intervenção do Poder Judiciário a partir dos cinco elementos do ato administrativo em temáticas afetas ao campo de incidência das políticas públicas, cabe impor uma ressalva quanto ao juízo de validade da política pública enquanto conjunto de ações estatais voltadas a uma determinada finalidade e o juízo de validade das normas e atos que a compõem.

Conforme Comparato (2001, p. 18-19), uma lei

(…) editada no quadro de determinada política pública, por exemplo, pode ser inconstitucional, sem que esta última o seja. Inversamente, determinada política governamental, em razão da finalidade por ela perseguida, pode ser julgada incompatível com os objetivos constitucionais que vinculam a ação do Estado, sem que nenhum dos atos administrativos, ou nenhuma das normas que a regem, sejam, em si mesmos, inconstitucionais.

Considerando as políticas públicas como o conjunto de ações estatais, por meio das quais são traçadas as diretrizes e metas a serem fomentadas pelo Estado, sobretudo na implementação dos objetivos e direitos fundamentais dispostos na Constituição, o controle judicial da Administração Pública não se deve restringir simplesmente ao controle estrito da legalidade. Os atos normativos e administrativos vinculadores de políticas públicas devem observar os princípios constitucionais e os pressupostos do Estado Democrático de Direito como um todo.

Dessa forma, amplia-se a atuação do Judiciário no controle do ato administrativo. Aquilo que outrora se restringia à legalidade e de maneira mecânica afastava a apreciação do núcleo do ato, passa agora a demandar a aferição da compatibilidade do mérito do ato administrativo com os princípios constitucionais.

Ainda dentro dessa perspectiva de análise, é essencial reconhecer que existe uma efetiva separação entre as funções estatais que deve ser mantida, mas ela está condicionada aos objetivos e direitos fundamentais que orientam a Constituição, os quais gozam de plena força normativa[17], vinculando todos os poderes constituídos. Portanto, o controle judicial das políticas públicas encontra seu refúgio fundamental na Constituição de 1988. A omissão ou inadimplência dos Poderes Legislativo e Executivo na implementação de políticas públicas realizadoras de direitos fundamentais passa a ser uma questão constitucional.

Aith, citado por Fernandes (2010), sustenta que, na verdade, “é o Estado, através de seus poderes constituídos, que tem a competência constitucional para dar o impulso oficial do que se convencionou chamar de políticas públicas”. É a partir desse entendimento de que cabe ao Estado, e não somente a determinados órgãos do poder estatal (em regra Legislativo e Executivo), a competência constitucional de realização – elaboração, planejamento e execução – das políticas públicas, que se retira fundamento para o controle jurídico dessas ações.

Prossegue o autor:

Regra geral, as políticas públicas são discutidas e realizadas no âmbito de atuação encadeada dos Poderes Executivo e Legislativo. São eles os responsáveis pela definição do que será implementado ou não em relação à infinidade de necessidades e direitos. Contudo, faz parte da própria função típica do Poder Judiciário o diálogo institucional com os demais poderes, bem como o controle de suas atividades por meio da atividade jurisdicional. Muitas vezes os órgãos jurisdicionais são chamados a resolver conflitos entre os demais Poderes ou entre os entes políticos integrantes da federação nacional ou ainda entre uma associação de defesa do meio ambiente e uma empresa poluidora. Essa é a função típica do Judiciário. (FERNANDES, 2010, p. 8)

Ele ainda sustenta que a invasão de um Poder no campo de atribuições dos demais é inconstitucional. Todavia, destaca que o que começa a ser discutido é, com base na democracia material ou em face da natureza pós-positivista da Constituição, uma interação maior do Poder Judiciário com os demais poderes no que se refere às decisões políticas, especialmente no que diz respeito aos direitos fundamentais. E conclui que “o Poder Judiciário está inserido constitucionalmente na atuação do poder público na promoção e proteção dos direitos fundamentais, o que legitima a participação deste Poder ante as ações ou omissão dos demais” (FERNANDES, 2010, p. 9-12).

Portanto, se, por um lado, não cabe ao Judiciário a formulação de políticas públicas, mas sim aos representantes do povo, isto é, aos Poderes Legislativo e Executivo, por outro, cabe o controle judicial de omissões destes poderes na implantação de referidas políticas públicas. Na verdade, o Judiciário impõe a execução das políticas públicas que já foram estabelecidas, seja na Constituição, seja na atuação do próprio Estado, na forma de leis ou outras espécies legislativas.

Enfim, para a consolidação dos direitos fundamentais, necessária se faz a consolidação de um ativismo judicial responsável e consciente do lugar de destaque que o Poder Judiciário ocupa na ordem constitucional.

Conforme análise de Barroso (2009), “a ideia de ativismo judicial está associada a uma participação mais ampla e intensa do Judiciário na concretização dos valores e fins constitucionais, com maior interferência no espaço de atuação dos outros dois Poderes”.

Segundo ele, três seriam as causas de judicialização das políticas públicas: a redemocratização do país simbolizada pela maior autonomia do Ministério Público e consciência dos direitos pela população; a “constituição abrangente, que trouxe para a Constituição inúmeras matérias que antes eram deixadas para o progresso político majoritário e para a legislação ordinária” (BARROSO, 2009); e a grande amplitude do sistema de controle de constitucionalidade no Brasil, o que permite que “quase qualquer questão política ou moralmente relevante pode ser alçada ao STF” (BARROSO, 2009).

3.1 Os Fundamentos de Legitimidade do Controle Judicial

A partir de tudo o que já se expôs, importante observar, ainda, que a análise do controle judicial das políticas públicas deve voltar-se para o aspecto da legitimidade de tal intervenção, uma vez que se está a cogitar da possibilidade de intervenção do Poder Judiciário em um campo de atuação tradicionalmente afeto aos Poderes Legislativo e Executivo.

Inicialmente, cabe ponderar a compatibilidade deste controle com o modelo democrático e de tripartição de poderes vigente no nosso país, tendo em conta, conforme já mencionado, que a formulação e implementação de políticas públicas decorrem precipuamente de opções políticas discricionárias dos Poderes Executivo e Legislativo, cujos membros receberam, por voto popular, as atribuições de realização de medidas voltadas à satisfação das necessidades da sociedade que os elegeu como representantes.

Dentre os aspectos apontados para a suposta falta de legitimidade do Judiciário em matéria de controle de políticas públicas, dois recebem especial atenção por parte da doutrina e da jurisprudência: a alegação de usurpação de competência reservada a outros poderes estatais e consequente entrave democrático na atuação dos juízes em matéria de controle de políticas públicas, bem como a chamada reserva do possível.

3.1.1 A atuação judicial à luz do princípio da separação dos poderes

Com o intuito de analisar a aparente violação da cláusula pétrea de separação dos poderes nas hipóteses de intervenção judicial em relação aos demais poderes dotados de competência originária para a formulação e execução de políticas públicas, passa-se a abordar a questão da separação dos poderes a partir do modelo de Estado Democrático de Direito consagrado pela Constituição Federal de 1988.

Tendo em conta que a base política do modelo estatal brasileiro funda-se no respeito e promoção dos direitos fundamentais, a Constituição Federal de 1988 consagrou o compromisso com a concretização destes direitos pelo Estado em todas as esferas de poder – Executivo, Legislativo e Judiciário.

Verifica-se, nesta perspectiva, a importância de um Poder Judiciário mais atuante, com a ampliação do mecanismo de controle sobre atuações estatais que eventualmente venham a se distanciar da aplicação das leis segundo os fins sociais:

É, portanto, no Estado Democrático de Direito que o Estado-jurisdição assume novo papel. Comprometido constitucionalmente com a problemática social, o Judiciário passa a ser Poder transformador da realidade social ao não poder criar obstáculos a realização de direitos fundamentais. (ALMEIDA, 2003, p. 59)

Destarte, neste contexto de Estado Democrático e Social de Direito cuja diretriz se baseia na promoção de direitos fundamentais e estabelece programas a serem seguidos pelo Estado a fim de efetivá-los, vale destacar o novo papel do Poder Judiciário.

A inserção de normas programáticas no bojo do texto constitucional brasileiro convocou o Poder Judiciário a decidir a respeito da compatibilidade dos atos comissivos e omissivos das demais formas de expressão do poder estatal, o que envolve, em muitas das vezes, o exame dos critérios de escolha do administrador em cotejo com a finalidade do ato administrativo (CANELA JÚNIOR, 2011, p. 79-80).

Contudo, não há que se falar na concessão de um poder ilimitado aos juízes ao examinar as políticas públicas; o que se pretende, na verdade, é a efetivação dos direitos fundamentais mediante a atuação de um Poder Judiciário que conduza os demais poderes à autoridade da jurisdição constitucional.

Assim, a atividade jurisdicional que anula leis e atos ofensivos a princípios e direitos fundamentais constitucionalmente consagrados representa a maior fonte de legitimidade da atuação jurisdicional para o controle de políticas públicas.

Outra questão a ser considerada quanto à análise da legitimidade da atuação do Judiciário em termos de políticas públicas é princípio da inafastabilidade da jurisdição, o qual, nos termos do disposto no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal de 1988, estabelece que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.

Para Canela Júnior (2011, p. 136), em matéria de direitos fundamentais e políticas públicas, o postulado da inafastabilidade da jurisdição ganha um novo alcance interpretativo, dele decorrendo o princípio da proibição da resistência instrumental dos direitos fundamentais:

Segundo o princípio da proibição de resistência instrumental aos direitos fundamentais, nenhuma política pública, oriunda do Poder Legislativo ou do Poder Executivo, poderá se converter, comissiva ou omissivamente, em instrumento de resistência à efetivação dos direitos fundamentais. Logo, não somente os atos administrativos e de governo poderão ser examinados pelo Poder Judiciário sob este prisma, como também as normas subconstitucionais, as quais constituem o produto de uma política pública mais ampla daqueles poderes.

Por fim, cabe ponderar que o Poder Judiciário não deve ser posicionado acima dos demais poderes em matérias de políticas públicas. Pelo contrário, mantém-se a ideia de que, em regra, compete ao Executivo e Legislativo efetivarem a Constituição, e apenas na hipótese de descumprimento por desvios de finalidades legais e constitucionais ou de forma arbitrária, o Poder Judiciário deve intervir.

Considerando, portanto, que o princípio da separação dos poderes deve servir para dar efetividade ao texto constitucional, fica superado o argumento de se tratar de obstáculo ao controle judicial de políticas públicas[18].

3.1.2 A reserva do possível

A expressão traduz a ideia de limitação dos recursos orçamentários disponíveis para fazer frente a uma ilimitada demanda social a ser por eles suprida.

Tal restrição financeira justificaria, em certos casos, a não efetivação dos direitos previstos em lei por parte do Estado:

A expressão reserva do possível procura identificar o fenômeno econômico de limitação dos recursos disponíveis diante das necessidades quase sempre infinitas a serem por eles supridas. (…) A reserva do possível significa que, para além das discussões jurídicas sobre o que se pode exigir judicialmente do Estado – e em última análise da sociedade, já que é esta que o sustenta –, é importante lembrar que há um limite de possibilidades materiais para estes direitos. (BARCELLOS, 2002, p. 236)

Para Fonte (2009, p. 28-29) é possível diferenciar dois aspectos da reserva do possível: jurídico e fático:

Diz-se reserva do possível jurídica a ideia de que o Estado não pode violar regras e princípios de direito orçamentário para efetivar direitos sociais, ainda que tenha direito suficiente para fazê-lo. Assim, se as tutelas judiciais em matéria de saúde, por exemplo, ultrapassarem a dotação orçamentária, o administrador terá que fazer despesa além do que está autorizado, sujeitando-se à responsabilidade política, nos termos do art. 85 da Constituição, e até mesmo penal, por improbidade administrativa.

O autor ainda analisa que, em que pese ser evidente a necessidade de normas rígidas em termos de direito orçamentário, não se pode olvidar que o Estado está prioritariamente voltado à satisfação de direitos fundamentais; o conflito entre princípios e regras de direito orçamentário e princípios e regras de direitos fundamentais deve ser resolvido por ponderação de princípios[19].

A reserva do possível fática, por sua vez, tem o sentido de ausência total de recursos públicos para prestar o serviço pleiteado, conduzindo para a tese de solidariedade entre todos os entes federados. Segundo o autor, “para mínimo existencial não pode haver reserva do possível, isto porque se o Estado não garante um conteúdo básico de direitos prestacionais necessários à efetividade do núcleo do princípio da dignidade da pessoa humana, ele perde a sua própria razão de existir” (FONTE, 2009, p. 30).

Nessa linha, em relação ao aspecto jurídico da reserva do possível, argumenta-se a necessidade de prévia dotação orçamentária como limite ao cumprimento imediato da decisão judicial que determina a implementação de uma política pública.

Contudo, mais do que uma questão jurídica, trata-se de questionar acerca da possibilidade material do Estado de atender em sua plenitude todas as necessidades da população, em contraposição a um orçamento que nem sempre oferecerá totais condições de satisfação das demandas coletivas.

Ainda assim, a alegação de insuficiência de fundos não pode ser genérica, devendo ser detalhadamente demonstrada pelo ente público.

Com efeito, para concretizar os programas estatais estipulados como deveres para efetivar direitos e políticas previstos constitucionalmente, a Administração Pública faz uso de ações positivas, prestações materiais que necessitam de recursos orçamentários para serem concretizadas; limitação financeira esta que não poderia o Judiciário simplesmente ignorar no momento de determinar que o administrador público adote certa medida.

De toda forma, conforme já destacado, todas as formas de expressão da vontade estatal encontram-se constitucionalmente vinculadas ao compromisso de efetivação de direitos fundamentais, de modo que a mera e simples alegação de falta de recursos deve ser analisada cautelosamente quando arguida.

Novamente cabe lembrar-se do princípio da inafastabilidade da jurisdição, previsto em nossa Constituição Federal, de modo que não poderá o Poder Judiciário afastar a tutela jurisdicional pleiteada por fundamentos externos ao direito, sob a invocação de um fator econômico:

Constata-se que o fenômeno econômico tem sido invocado para impedir a concessão de direitos fundamentais sociais pelo Poder Judiciário. Alega-se, em geral, que o Poder Judiciário não pode conceder direitos cuja satisfação demandará receitas não disponíveis pelo Estado. Tal fundamento, contudo, traz em si a desconsideração de que o Estado brasileiro possui objetivos a serem efetivamente atendidos, de tal forma que o orçamento há de servir como instrumento para a respectiva realização, e não como óbice. (CANELA JÚNIOR, 2011, p. 102)

Assim, comprovada a lesão a direito fundamental a ser suprida mediante a execução de políticas públicas, deverá o juiz exarar sentença de mérito a respeito da matéria.

Todavia, se nas circunstâncias fáticas o poder público não possuir recursos financeiros bastantes para execução da decisão, esta sentença servirá para determinar a inclusão de dotação orçamentária específica para o exercício financeiro seguinte. Trata-se de posicionamento que melhor se coaduna com o princípio da dignidade da pessoa humana e da máxima efetividade dos direitos fundamentais.

Não se pretende, com este posicionamento, menosprezar a importância das regras orçamentárias e do direito financeiro, mas é preciso analisar detalhadamente a escassez de recursos em cada concreto, com o propósito de apurar até que ponto empecilhos formais e econômicos podem afastar a materialização da essência da Constituição.

Ao final, nota-se que a reserva do possível é um argumento que deve ser sopesado segundo as circunstâncias peculiares do caso concreto submetido à apreciação jurisdicional, sem perder de vista conceitos importantes como mérito do ato administrativo discricionário, seus limites e possibilidades do mesmo ser sopesado pelo Poder Judiciário em caso de não atendimento do interesse público, violação dos princípios constitucionais e direito fundamentais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O surgimento do Estado Social fez com que as políticas públicas passassem a ser consideradas pelo Direito, sendo idealizadas como instrumento para a realização das vontades coletivas.

Assim, da postura liberal, caracterizada pela ausência de intervenção na esfera da liberdade individual, passa-se a presenciar um Estado mais forte e atuante na proteção dos direitos sociais, a fim de proporcionar condições de vida digna, surgindo desta pretensão a formulação de políticas públicas.

De toda forma, considerando que as ações que resultam em políticas públicas estão envoltas em uma série de aspectos institucionais, procedimentais e políticos, também foram abordados os aspectos que deverão nortear os momentos de escolhas e decisões nas políticas públicas, com destaque para a relação entre a análise técnica e o processo político de decisões, que desponta como o grande desafio para uma gestão eficiente e a efetividade das políticas públicas.

Do confronto entre esses dois aspectos percebe-se que o trabalho técnico oportuniza o acesso a informações e oferece o suporte racional e analítico das escolhas, mas, paralelamente, deve-se ter em conta que as decisões são políticas, o que ressalta a importância de seu controle.

Nesse sentido, considerando que as políticas públicas correspondem ao conjunto de ações estatais, por meio das quais são traçadas as diretrizes e metas a serem fomentadas pelo Estado, sobretudo na implementação dos objetivos e direitos fundamentais dispostos na Constituição, o controle judicial da Administração Pública não se deve restringir simplesmente ao controle estrito da legalidade.

Portanto, alarga-se a atuação do Judiciário no controle do ato administrativo. A análise que antes se restringia à legalidade e de maneira mecânica afastava a apreciação do núcleo do ato, passa agora a demandar a aferição da compatibilidade do mérito do ato administrativo com os princípios constitucionais.

É importante ressalvar que não se pretende conceder um poder ilimitado aos juízes ao examinar a execução de políticas públicas, as quais são de competência originária dos agentes públicos eleitos pelo povo.

O que se buscou fundamentar foi a importância da atuação do Poder Judiciário quando o comportamento dos agentes públicos competentes se revestir de um grave desvio de finalidade ou uma inaceitável passividade diante do comando constitucional de concretização dos direitos fundamentais.

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MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2003.

Notas de Rodapé

[1] Advogada (inscrita na OAB/PR sob o n. 41.408) e professora da Universidade Estadual do Oeste do Paraná e da Faculdade Sul Brasil. Formada em Direito pela Universidade Federal e em Letras Português-Inglês pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná; mestra em Direito do Estado pela Universidade Federal do Paraná.

[2]As demandas de segurança estão inextricavelmente relacionadas: uma conduz a outra e vice-versa”. (FREITAS, 2002, p. 64)

[3] Para Bucci (1997, p. 90), o fundamento mediato das políticas públicas, o que justifica seu aparecimento, é a própria existência dos direitos sociais, que se concretizam por meio de prestações positivas do Estado.

[4] Em relação a essa redefinição do papel do Estado, Estorninho (1990, p. 60) destaca que a perspectiva atual da Administração Pública é antes do particular como parceiro da política pública do que como mero destinatário que se subordina a sua decisão.

[5] A respeito do tema, confira-se a obra de Breus, 2007.

[6] Tais direitos sociais, ao invés de ensejarem a inércia ou abstenção estatal, impõem uma ação positiva do Estado na fixação e no desenvolvimento de políticas públicas nas áreas da saúde, educação, trabalho e previdência social (COMPARATO, 2001, p. 200).

[7] Ainda nesse sentido, cabe transcrever a crítica de Bucci (2006, p. 271): “Os objetivos de interesse público não podem ser sacrificados pela alternância no poder, essencial à democracia”.

[8] Nessa linha, consoante Bucci (2006, p. 249), “compete aos representantes do povo, isto é, ao Poder Legislativo e à direção política do governo a decisão sobre políticas públicas”. O Poder Executivo (por meio de seus dirigentes superiores), juntamente com o Legislativo, formulam as políticas públicas, cabendo àquele, por seus órgãos administrativos, sua aplicação em concreto, concedendo à população as utilidades necessárias. As políticas públicas agregam ações legislativas, normativas, reguladoras, executivas e de fomento.

[9] Neste sentido, Breus (2007, p. 206) sustenta que, para a operacionalização do Estado Constitucional, “é necessária a formação de uma estrutura capaz de efetivamente concretizar essa nova ordem. E essa estrutura deve englobar uma atuação do Estado e uma plena e conjugada participação da sociedade civil”.

[10] Para Mello (2003, p. 823-824), “Mérito do ato é o campo de liberdade suposto na lei e que efetivamente venha a remanescer no caso concreto, para que o administrador, segundo critérios de conveniência e oportunidade, decida-se entre duas ou mais soluções admissíveis perante a situação vertente, tendo em vista o exato atendimento da finalidade legal, ante a impossibilidade de ser objetivamente identificada qual delas seria a única adequada”.

[11] Há grande controvérsia no que se refere ao alcance do controle do Judiciário sobre os atos administrativos e aos limites impostos a esse controle. Grande parte da doutrina administrativista entende que o controle judicial dos atos da Administração, ainda que deva examinar a discricionariedade administrativa, não pode adentrar no mérito administrativo. O mérito do ato administrativo, segundo entendimento majoritário, constitui-se em faixa da discricionariedade administrativa onde fica vedada a apreciação jurisdicional. Tais considerações podem ser encontradas, a título de exemplo, em: Fagundes (1979, p. 147); Gasparini (2005, p. 96); Meirelles (2008, p. 158).

[12] Importante reiterar a noção que subjaz ao conceito de política pública enquanto conjunto organizado de normas e atos tendentes à realização de um objetivo determinando, ou seja, a política não é uma norma nem um ato jurídico; no entanto, as normas e atos jurídicos são componentes da mesma. As normas, decisões e atos que integram a política pública têm na finalidade da política seus parâmetros de unidade. Isoladamente, as decisões ou normas que a compõem são de natureza heterogênea e submetem-se a um regime jurídico próprio. (COMPARATO, 2001, p. 18).

[13]Art. 2º. São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo anterior, nos casos de: a) incompetência; b) vício de forma; c) ilegalidade do objeto; d) inexistência dos motivos; e) desvio de finalidade.

Parágrafo único. Para a conceituação dos casos de nulidade observar-se-ão as seguintes normas: a) a incompetência fica caracterizada quando o ato não se incluir nas atribuições legais do agente que o praticou; b) o vício de forma consiste na omissão ou na observância incompleta ou irregular de formalidades indispensáveis à existência ou seriedade do ato; c) a ilegalidade do objeto ocorre quando o resultado do ato importa em violação de lei, regulamento ou outro ato normativo; d) a inexistência dos motivos se verifica quando a matéria de fato ou de direito, em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido; e) o desvio de finalidade se verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência”.

[14]STF, Súmula 473. A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial”.

[15]Administrativo. Licença ambiental. Competência concorrente. Limites. (…) 2. Na distribuição da competência material concorrente de licenciar o corte de vegetação nativa (art. 23, VI e VII, da CF/88), situada no período urbano, há que se levar em conta o princípio da predominância do interesse, visando à maior efetividade do interesse comum de preservar o meio ambiente (Celso Antonio Pacheco Fiorillo), motivo por que só cabe ao município, nos termos do art. 14 do Dec. 38.355/98-RS, autorizar o corte de espécies isoladas e de arboredos, representando excesso, portanto, a autorização para o corte de área extensa e de vegetação densa. Não cabe, a pretexto de suscitar questões de direito, ampliar a causa de pedir originária (CPC, art. 264). 3. Apelação desprovida”. (Apelação 70011337763 TJ/RS – 4ª Quarta Câmara Cível – Rel. Araken de Assis – j.em 24.08.2005 – DJ 08.09.2005)

[16] Advirta-se que se trata de exemplo em tese, eis que, atualmente, a Lei 12.305/10, que trata da política nacional de resíduos sólidos, disciplina que cabe a quem produz o lixo criar um plano de gerenciamento específico e lhe dar destinação adequada. Importante advertir, contudo, houve proposta de alteração da redação de referida lei (PLS 229/10, de autoria do Senador Jorge Yanai – DEM/MT), pretendendo manter a obrigação de hospitais, clínicas e consultórios quanto aos procedimentos de separação e acondicionamento de seus resíduos, para facilitar a coleta seletiva, mas passando aos municípios a responsabilidade pela coleta e destinação final do lixo hospitalar, eis que se trata de questão de saúde pública, porém tal projeto de lei foi arquivado em dezembro/2014.

[17] A respeito da noção de força normativa da Constituição, confira-se a obra de Hesse (1991, p. 19).

[18] Para Fonte (2009, p. 15): “Dentro da concepção jurídica em vigor, em que se assumiu a centralidade do texto constitucional, que por sua vez está impregnado de valores, o princípio da separação dos poderes nada mais é que um instrumento em defesa dos próprios direitos fundamentais. Quando o princípio é invocado para impedir a concretização de tais direitos, sua utilização é contrária à sua finalidade intrínseca”.

[19] Barcellos, citada por Fonte (2009, p. 29), sugere como parâmetro abstrato para a ponderação a precedência das normas que realizam direitos fundamentais sobre as que não realizam.