A Tutela do Meio Ambiente e a Defesa do Patrimônio Genético Humano

ENVIRONMENTAL PROTECTION AND DEFENSE OF HUMAN GENETIC HERITAGE

Marilene Araujo[1]

Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos[2]

Resumo: Todo comportamento humano pode ser considerado sob perspectivas éticas e jurídicas. Com o espantoso desenvolvimento técnico-científico, notadamente no campo biomédico, cada vez mais e cada vez maiores se apresentam as exigências de proteção e de responsabilidade global sobre o patrimônio genético humano e o meio ambiente. A recente Lei 13.123, de 20.05.2015, regulamenta os incisos II do § 1º e 4º do art. 225 da Constituição Federal, entre outros. Todavia, não menciona em seus dispositivos o patrimônio genético humano. Sua natureza jurídica e tutela serão objeto deste estudo.

Palavras-chave: Meio Ambiente. Princípio da responsabilidade. Patrimônio genético da humanidade. Direitos Humanos.

Abstract: All human behavior can be considered from ethical and legal perspectives. Whit the astounding technical and scientific development, particularly in the biomedical field, more and increasing the protection requirements and global responsibility about the genetic heritage of humanity and the environment. The recent law n. 13.123/ 20 may 2015, regulates article 225, II, § 1º and 4º, among others– Brazilian Constitution and others Brazilian laws. However does not mention in its device the genetic heritage of humanity. Its legal nature and protection will be the subject of this study.

Keywords: Environment. The imperative of responsibility. Genetic heritage of humanity. Human rights.

1 INTRODUÇÃO

O homem do futuro, se se evitar o holocausto nuclear, estará adaptado a hidro carburetos no ar, a detergentes na água, `a crimes nas ruas, a áreas de recreação congestionadas. O bom planejamento torna-se tautologia sem sentido se considerarmos que o homem terá uma nova forma para ajustar-se a qualquer ambiente que crie. A pergunta a longo prazo não é saber que tipo de ambiente desejamos, mas que tipo de homem queremos ter. (ROBERT SOMMER)

A imprescindível tutela do meio ambiente encontra supedâneo jurídico no indicativo constitucional do art. 225, § 3º e no art. 5º, ambos da Constituição Federal brasileira e nas próprias necessidades existenciais do homem. Para assegurar a efetividade desse direito, compete ao Poder Público, entre outros, preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do país e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético (art. 225, § 3º, II).

Antes de enfrentarmos a questão da tutela, a imprecisa univocidade do termo ambiente deve ser ressaltada. Como aponta José Afonso da Silva, a expressão meio ambiente é redundante, pois a palavra ambiente engloba a de meio e indica “a esfera, o círculo, o âmbito que nos cerca, em que vivemos[3].

Ou seja o termo carece de precisão e necessita ser complementado por uma série de outros vocábulos correntemente utilizados: natureza, ecologia, qualidade de vida, patrimônio. Ele é conceituado como a interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas[4].

Por seu lado, o Direito do ambiente é profundamente marcado por uma dependência entre as ciências e a tecnologia, o que leva ao problema de seu campo de aplicação.

A força normativa da ficção povoa a cabeça das pessoas por meio de novos conhecimentos e experiências prometedoras, embora sua viabilidade não esteja garantida pelo progresso real. Exemplo disso é a terapia genética. Inicialmente pensada como sucedâneo para a informação genética nas células, logo se transformou em um sistema de transferência onde por meio de vetores se deveriam introduzir as novas informações e processos modificados em células enfermas. Até agora foram registrados apenas pequenos êxitos nesse terreno.

Também a chamada medicina preditiva a rigor é apenas uma ficção baseada em predisposições que nem sempre são possíveis de se estabelecer. Os investimentos econômicos correm atrás da ficção, gerando possibilidades ilimitadas.

Paralelamente, em cerca de cinquenta anos (1953) da descoberta do DNA[5] e o final do Projeto Genoma (2003)[6] houve um progresso científico impressionante. Conheceu-se o genoma humano, ou seja, a estrutura de identificação de um indivíduo através de seus dados genéticos. Isso revela que o patrimônio genético humano pode ser visto em duas facetas:

  • Como pertencente ao indivíduo, protegido pelo princípio da dignidade humana, pelo direito à vida, a integridade, a intimidade, a não discriminação, por exemplo; e
  • Por outro lado, existe o patrimônio genético humano comum da humanidade como interesses difusos, um bem das futuras gerações.

A Constituição do Brasil atribui ao Poder Público e à coletividade o dever de defender um meio ambiente ecologicamente equilibrado (CFB/88, art. 225, § 1º, III).

O patrimônio genético humano é colocado, dentro do contexto constitucional brasileiro, como direito fundamental (arts. 5º e 225, CF). No sistema internacional de proteção de direitos humanos é considerado direito humano.

As suas características envolvem questões como a dos fundamentos, interesses difusos, o equilíbrio do meio ambiente (o homem é parte do meio ambiente), biotecnologia, saúde. Mas o enfrentamento dessas questões passa por uma multidisciplinariedade de difícil contorno.

A cultura dominante como questão de gerações futuras continua sendo polêmica. A Constituição brasileira é vista como base de nossa cultura guia, mas cada geração deveria esclarecer para si mesma que valores deve preservar.

Afinal como realizar os avanços tecnológicos e preservar a vida e a sadia qualidade de vida? Neste contexto, a responsabilidade passa a ser global, de todos (indivíduo, comunidades, entidades privadas, investidores, Estados e organismos internacionais), porém tal responsabilidade é de difícil mensuração no campo jurídico, dada a dificuldade de estabelecer o nexo entre a previsibilidade das ações e a preservação das gerações futuras.

A responsabilidade crescente frente a rapidez da biotecnologia nos desafia a pontuar neste artigo:

1. O patrimônio genético da humanidade: direito fundamental e direito humano.

2. O patrimônio genético um direito difuso.

3. Os avanços tecnológicos e a problemática na defesa da sadia qualidade de vida.

4. A responsabilidade global e as gerações futuras.

5. Considerações gerais.

6. Referências.

A metodologia empregada é a Tópica. A argumentação tópica é um modo típico de raciocínio jurídico que procede por questionamentos sucessivos. É a técnica de pensar por problemas, ocupando-se das aporias jurídicas. Seria uma ars inveniendi, ou seja, uma arte de descobrir premissas, que irá presidir a solução dos problemas da vida. Tem por função auxiliar no sentido de amoldar o justo e adequar as pautas normativas à realidade fático-social presente. Grande será sua importância face ao tema proposto[7].

2 O PATRIMÔNIO GENÉTICO HUMANO: DIREITO FUNDAMENTAL E DIREITO HUMANO

O patrimônio genético humano é considerado:

o universo de componentes físico, psíquicos e culturais que começam no antepassado remoto, permanecem constantes embora com naturais mutações ao longo das gerações, e que, em conjugação com fatores ambientais e num permanente processo de interação, passam a constituir nossa própria identidade e que, por isso, temos o direito de guardar e defender e depois de transmitir[8].

O termo patrimônio genético humano é de difícil apreensão, mas dentre as suas características, percebe-se que ele se associa a identidade do humano, constituindo assim, um bem a ser tutelado pelo Direito. As duas facetas do patrimônio genético humano (plano individual e plano difuso) adquiriram, na Constituição brasileira de 1988, o status de direito fundamental.

Ferdinand Lassalle, ao discorrer sobre o que é uma Constituição, considerou fundamental aquilo que é básico, fundamento originário e necessário[9]. Os direitos fundamentais são aqueles que o Estado, a partir da positivação no âmbito da Constituição, confere um status especial frente aos outros direitos[10].

A ideia de fundamentalidade[11] de Lassalle norteia a questão. Assim, são direitos positivados básicos à existência humana, necessários e fonte de outros direitos.

Tanto os direitos fundamentais como os direitos humanos são direitos que surgem a partir de questões concretas[12], sendo que os direitos humanos possuem caráter universal e indivisível.

(…) clama pela extensão universal dos direitos humanos sob a crença de que a condição de pessoa é o requisito único para a titularidade de direitos, considerando o ser humano um ser essencialmente moral, dotado de unicidade existencial e dignidade, esta como valor intrínseco à condição humana. Indivisibilidade porque a garantia dos direitos civis e políticos é condição para a observância dos direitos sociais, econômicos e culturais e vice-versa. (PIOVESAN, 2012, p. 169)

Em regra geral, o mesmo direito que se positiva no direito interno, por via da Constituição, como direito fundamental, se positiva, através de Convenções e Pactos internacionais, tratando de uma mesma realidade que mantém um tratamento diferenciado.

No primeiro caso, os direitos fundamentais delimitam um modelo de Estado, por estarem restritos ao direito interno, podendo ser judicializados. Já na segunda hipótese, esses direitos estarão protegidos pelo sistema internacional, sendo, neste caso, o Estado acionado em face dos tribunais internacionais[13].

No plano constitucional brasileiro, o patrimônio genético humano aparece protegido no art. 5º, dentro do âmbito da proteção à vida, a privacidade e a intimidade, a não discriminação. Todos esses direitos orientados sob o prisma do princípio da dignidade humana.

O art. 225 da Constituição brasileira ao determinar que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, sendo este bem, um bem de uso comum e essencial à sadia qualidade de vida, introduz outro ingrediente, à sadia qualidade de vida.

Além da garantia de “não agressão” e de proteção estatal da vida[14], se tem a necessidade de proteção não apenas de um sentido biológico da vida. Mas de outras dimensões como saúde, educação, moradia, cultura, lazer. Entretanto, essas características, que são um conjunto de difícil separação, se apresentam em conjunto a necessidade de um meio ambiente ecologicamente equilibrado. A associação desses vários aspectos conduz a uma sadia qualidade de vida.

A efetividade dos direitos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e a sadia qualidade de vida se dará com a proteção do Estado que deverá preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do Brasil e fiscalizar as entidades que pesquisam e manipulam o material genético. Neste item, há proteção expressa ao patrimônio genético humano.

No plano internacional, alguns documentos merecem destaque como a Declaração Universal do Genoma Humano e dos Direitos Humanos, da UNESCO. Segundo a declaração, o genoma humano é base da unidade fundamental da espécie humana, sendo inerente à sua dignidade e à diversidade. Em sentido simbólico, o genoma humano é o patrimônio da humanidade.

A Declaração Bioética de Gijón considera o genoma humano é patrimônio da humanidade e como tal não é patenteável. A Declaração Universal dos Direitos Humanos das Gerações Futuras garante a proteção do genoma humano, sendo que o progresso científico e tecnológico não pode prejudicar ou comprometer a preservação da espécie humana e de outras espécies.

A Declaração Internacional sobre Dados Genéticos Humanos de 2003 – UNESCO – define os dados genéticos no art. 2º, I:

Dados genéticos são informações relativas às características hereditárias dos indivíduos, obtidas pela análise dos ácidos nucleicos ou por outras análises científicas. (UNESCO, 2004)

Desta forma, não se protege somente a informação obtida através da “quebra” do código genético, mas também aquela que um dia, talvez, possa ser obtida.

Hammerschmidt[15] afirma que, os dados genéticos são únicos, estruturais, probabilísticos e geracionais. Através de sua análise é possível diagnosticar a qual espécie aqueles genes pertencem, a qual indivíduo, se há possibilidade de desenvolver alguma doença, ou se está doente e, qual sua herança genética.

A possibilidade de “predizer o futuro” gera também, informação secundária sobre a família biológica determinando a ascendência pela comparação de perfis genéticos; permite identificar a predisposição a doenças e, a customização de medicamentos pela resposta de um paciente ao medicamento ministrado, por exemplo.

Nesse viés, a Declaração Internacional sobre Dados Genéticos Humanos, em seu art. 3º tutela:

(…) cada indivíduo tem uma constituição genética característica. No entanto, não se pode reduzir a identidade de uma pessoa a características genéticas, uma vez que ela é constituída pela intervenção de complexos factores educativos, ambientais e pessoais, bem como de relações afectivas, sociais, espirituais e culturais com outros indivíduos, e implica um elemento de liberdade. (UNESCO, 2004)

O “saber ou conhecimento genético”, representação científica, preditiva e operativa está associada a determinadas técnicas da informação genética. No presente caso, se trata do conhecimento do genoma humano e de seu polimorfismo.

Tal saber manifesta as diferenças e as desigualdades genéticas das pessoas e pode gerar diferentes formas de discriminação inaceitáveis, com alcance transindividual. Seus usos tecnofísicos ou objetivos podem ser, entre outros, médicos, legais, econômicos-financeiros, sociopolíticos.

A informatização eletrônica dos dados genéticos e o cruzamento dos diferentes bancos de dados internacionais e nacionais e fichas em que conste uma mesma pessoa é um aspecto preocupante que suscita inquietações relativas à vida privada e o acesso aos dados das pessoas envolvidas (o art. 22 exige consentimento destas, mas e quanto às gerações futuras?).

A Resolução 466/2012 do CNS (SAÚDE, 2012), dispõe:

III.2 As pesquisas, em qualquer área do conhecimento envolvendo seres humanos, deverão observar as seguintes exigências:

i) prever procedimentos que assegurem a confidencialidade e a privacidade, a proteção da imagem e a não estigmatização dos participantes da pesquisa, garantindo a não utilização das informações em prejuízo das pessoas e/ou comunidades, inclusive em termos de autoestima, de prestígio e/ou aspectos financeiros.

E também a Resolução 340/2004 (SAÚDE, 2004):

III.4 – Aos sujeitos de pesquisa deve ser oferecida a opção de escolher entre serem informados ou não sobre resultados de seus exames.

(…) III.11. Os dados genéticos resultantes da pesquisa associados a um indivíduo identificável não poderão ser divulgados nem ficar acessíveis a terceiros, notadamente a empregadores, empresas seguradoras e instituições de ensino, e também não devem ser fornecidos para cruzamento com outros dados armazenados para propósitos judiciais ou outros fins, exceto quando for obtido o consentimento do sujeito da pesquisa. (grifo nosso)

O problema é que as informações obtidas podem ser essenciais não só aos interessados, mas também a terceiros como familiares e descendentes.

Contudo, os dados genéticos obtidos do estudo do genoma de uma pessoa a ela pertencem e não a seus familiares. Já o direito de acesso a esses dados e o direito de intimidade não são absolutos.

O direito à intimidade, reserva ou segredo[16], ampliado à intimidade genética nos parece um instrumento adequado para impedir futuras discriminações genéticas (art. 7 da Declaração Internacional sobre Dados Genéticos Humanos de 2003 – UNESCO) e os excessos (Convenção de Oviedo de 1997, art. 12), mas insuficiente como veremos no item 4, deste artigo para responsabilizar a pessoa jurídica, notadamente o Estado.

Quanto à proteção das gerações futuras estabelece o art. 13, da Convenção de Oviedo (convênio Europeu sobre Direitos Humanos e Biomedicina):

Art. 13. Uma intervenção que tenha por objeto modificar o genoma humano não pode ser levada a efeito senão por razões preventivas, de diagnóstico ou terapêuticas e somente se não tiver por finalidade introduzir uma modificação no genoma da descendência.

Todo direito, no entanto, se exerce dentro de um contexto social e reconhece os limites do direito. É possível que existam zonas de colisão ou conflito com outros direitos de personalidade igualmente protegidos como o direito à informação ou publicidade, com a liberdade de expressão, com o direito à livre investigação.

3 O PATRIMÔNIO GENÉTICO: UM DIREITO DIFUSO

Para Héctor Gros Espiell já no século XIX alguns juristas já falavam em patrimônio comum da humanidade. Lapredelle utiliza a expressão patrimônio da Humanidade para tecer comentários sobre o estatuto jurídico do mar. Já Andrés Bello usou o termo patrimônio indivisível da espécie humana para definir bens comuns que apesar de servir a todos não se deterioram[17].

Em instrumentos internacionais com conteúdo jurídico, a humanidade é considerada como uma entidade coletiva, sendo titular de direitos e interesses específicos. Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos, citando Felipe Paolillo, menciona 4 características que estão presentes nesta ideia[18]:

  • Inapropriação pelos Estados;
  • Elaboração e aplicação de um regime internacional de regulação e controle;
  • Usos pacíficos, isto é, proscrição de toda utilização bélica;
  • Utilização em benefício da Humanidade.

A Humanidade possui um caráter abstrato e indivisível, sendo incompleta a ideia de que ela seria apenas de todos os seres que constituem a espécie humana. Essa ideia, tal como no caso do Meio Ambiente, não possui um titular. Mas essa relação não exclui o indivíduo, explica Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos que:

Pelo contrário, o ser humano e suas características culturais e genéticas são um dos elementos integrantes desse patrimônio. Indivíduo e Humanidade se integram em uma relação necessária, mutuamente enriquecedora[19].

O genoma humano é parte constitutiva de todos e cada um dos seres humanos, passados, presentes e futuros. Dizer que o genoma humano é patrimônio comum da Humanidade é reconhecer que a própria Humanidade é titular desse direito.

A positivação do patrimônio genético está associada ao equilíbrio ecológico, ou seja, ao meio ambiente. O meio ambiente é classificado, segundo Paulo Bonavides, como um direito de terceira geração e tem “primeiro por destinatário o gênero humano mesmo, num momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em termos de existencialidade concreta[20].

O patrimônio genético humano constitui, deste modo, um direito difuso, porque pertence a todos. Em termos de temporalidade, o interesse e proteção ultrapassam as gerações presentes que se toram responsáveis para garantir este direito às gerações futuras. As gerações futuras aparecem juntamente com as gerações presentes como titular do genoma humano.

A proteção deste direito difuso ocorre por via da tutela coletiva. No direito brasileiro, há o que se denomina de microssistema processual de proteção dos interesses coletivos e difusos[21] – conjunto de legislações que criam instrumentos processuais para defesa dos interesses difusos.

Os interesses difusos têm como características fundamentais, a indeterminabilidade dos sujeitos, a indivisibilidade do objeto (pertence a todos, mas ao mesmo tempo, não pertence a ninguém), a intensa litigiosidade interna (as situações fáticas ocasionais não possuem vínculo jurídico básico, levando a incertezas) e a transição ou mutação temporal no tempo e espaço (as situações no interesse difuso podem aparecer e desaparecer de forma repentina e modo imprevisível)[22].

A proteção de tais interesses já estava presente entre os romanos que utilizavam da ação popular para tutela das coisas sacras, cultos da divindade. No século XIX, a corte americana, em uma disputa coletiva[23], decidiu que “quando a questão é comum e concerne a muitas pessoas, constituindo uma classe numerosa que torna impraticável a reunião de todos os sujeitos perante a Corte, uma ou mais pessoas pode propor a ação ou se defender, em nome do grupo todo”.

Mas, é no século XX que se inicia uma ampla massificação de bens e consumo, a consolidação da organização de categorias de trabalhadores. Neste período, ocorre também a destruição inconsequente e desacelerada do meio ambiente.

Agregam-se a esses fatos, as novas tecnologias como a biotecnologia. O surgimento de tais interesses não é um fenômeno do Direito, entretanto é um fenômeno em que o Direito processa a partir de seus códigos próprios, visando à estabilidade das relações sociais.

Na temática sobre o patrimônio genético humano constituem questões afetas aos interesses difusos, os chamados princípios:

  • da integridade, que visa proteger o material genético humano de interferência em sua composição;
  • da diversidade da espécie humana;
  • da avaliação prévia e a precaução[24] – avaliação de riscos potenciais antes que sejam realizadas pesquisas, tratamento que envolva o patrimônio genético humano

Ainda, a informação genética utilizada para fins científicos é um bem difuso, porque os benefícios que podem ser alcançados não pertencem apenas um indivíduo ou grupo, mas, pertencem a todos[25].

4 OS AVANÇOS TECNOLÓGICOS E A PROBLEMÁTICA NA DEFESA DA SADIA QUALIDADE DE VIDA

A Constituição Federal brasileira positiva, em seu art. 225, o termo sadia qualidade de vida. Tal positivação traz repercussões ao mundo jurídico, como, a possibilidade de se reivindicar judicialmente tal direito.

A expressão está associada à integridade do meio ambiente natural e cultural como um dos fundamentos da vida saudável, sendo que o meio ambiente ecologicamente equilibrado coloca o homem como parte integrante do sistema ecológico referido.

Ao discorrer sobre o significado da expressão qualidade de vida, Selene C. Herculano recorre a Amartya Sen para explicar que a qualidade de vida se define:

a partir de dois conceitos: capacitação (capability), que representa as possíveis combinações de coisas que uma pessoa está apta a fazer ou ser, e funcionalidades (functionings4[4]), que representa partes do estado de uma pessoa – as várias coisas que ela faz ou é. Assim, a capacitação reflete, em cada pessoa, as combinações alternativas de funcionalidades que esta pessoa pode conseguir. Desta forma, a qualidade de vida pode ser avaliada em termos da capacitação para alcançar funcionalidades, tais como as funcionalidades elementares (nutrir-se adequadamente, ter saúde, abrigo etc.) e as que envolvem auto-respeito e integração social (tomar parte da vida da comunidade)[26].

A saudável qualidade de vida envolve situações econômicas, ambientais, científicas, devendo para tanto haver acessibilidade de bens, serviços, sendo ainda, indispensável, a garantia de direitos como a saúde, educação e comunicação.

Os avanços tecnológicos e as pesquisas que possibilitam a manipulação do genoma humano podem ser um aliado para efetivação da sadia qualidade de vida. Entretanto, tais avanços podem ser um grande inimigo.

O avanço científico e tecnológico trazem as possibilidades e capacidades de identificar e combinar genes (engenharia genética), conhecer e manipular os dados do mapa genético humano e a terapia genética. Ainda a manipulação de mapa genético pode ser utilizada na verificação de condutas humanas, infletindo em questões de ordem ética e moral.

Além disso, as análises genéticas podem possibilitar precisão de diagnósticos e criar mecanismos de precaução de doenças genéticas/hereditárias, manipular medicamentos para melhor atender os pacientes, já que se tem o seu mapa genético.

Mas tais possibilidades podem violar direitos; como o direito à proteção de dados genéticos, o direito à intimidade genética (direito ao acesso à informação para se autodeterminar, para fins de consentimento livre e informado).

Em termos de manipulação de genes, essa pode ser utilizada, por exemplo, o melhoramento de determinada características para fins de saúde ou apenas para uma melhora estética e, até, mesmo, a chamada manipulação genética eugênica, que busca mais inteligência, melhores habilidades e condições corporais.

O amplo conceito de sadia qualidade de vida, que incluir o bem-estar imaterial, pode chegar até mesmo ao conceito de busca da felicidade, coloca o Direito frente às questões como os limites, tais manipulações genéticas e as fronteiras entre o que contribuiu para a sadia qualidade de vida presente e a preservação do meio ambiente para as gerações futuras.

5 LIMITES DO DIREITO NA RESPONSABILIDADE GLOBAL AMBIENTAL E TUTELA DO PATRIMÔNIO GENETICO DAS GERAÇÕES FUTURAS

A questão ambiental assume dimensão transfronteiriça e global. Hoje se define em qualquer lugar o direito subjetivo ao ambiente, o direito das gerações futuras e, sobre as políticas supranacionais para tutela do ambiente.

O Relatório Bruntland (Comissão Mundial para o Meio Ambiente e Desenvolvimento – ONU – 1988) introduziu o conceito global commons, para indicar os bens ambientais que são comuns a todo o globo. Tais bens não são comercializáveis, constituindo um rol primário e inalienável para a salvaguarda dos países. A tutela e salvaguarda do ambiente considerada como tutela da saúde e da qualidade de vida em relação não só com o presente, mas também e sobretudo com as gerações futuras, deve constituir um objetivo primário.

Fala-se de sustentabilidade e responsabilidade ambiental, muitas vezes esquecendo o humano a quem se dirige. Mesmo considerando todas as evoluções positivas, poucos tem o saber necessário para avaliar a sustentabilidade de uma mercadoria ou serviço. Optar por uma maçã orgânica é sedutor, mas isso garantiria um balanço ecológico melhor na preservação humana? Se nós diminuirmos o consumo de energia de nossas casas, por exemplo, num sistema de comércio de certificados, estaríamos contribuindo para que as usinas possam emitir mais poluentes do que já emitem. A razão disso estaria nos complexos sistemas técnico– econômicos que permeiam a boa ação e suas consequências.

Parece-nos que a sustentabilidade é, antes de tudo, uma tarefa de responsabilidade pública, porque atinge o todo e exige uma transformação das condições políticas básicas. Uma bela ideia com um pequeno senão: tudo isso evidentemente só funciona quando todos participam. O que devemos entender por tutela, responsabilidade? Por que a lei não incluiu o Estado e as pessoas jurídicas como responsáveis diretos pelo patrimônio genético humano, em seu elenco de regulamentações? A busca pelas consequências dessa lacuna explicam o presente tópico.

5.1 Responsabilidade e Responsabilidade Jurídica

O termo responsabilidade tem vários sentidos. Herbert Hart[27] ilustrou em relato imaginário quatro sentidos.

Como capitão de um navio, X era responsável pela segurança de seus passageiros e carga. Em sua última viagem, porém, embriagava-se todas as noites e foi responsável pela perda do navio, com tudo que levava. Comentava-se que estava louco, porém, os médicos o acharam responsável por suas ações. Durante a viagem, X, comportou-se muito irresponsavelmente e vários incidentes que teve em sua carreira, demonstraram que não era uma pessoa responsável. O capitão diz que foram as tormentas excepcionais as responsáveis pela perda do barco, no entanto, em um processo judicial que se seguiu foi dado como responsável pela perda de vidas e bens. Todavia vive e é moralmente responsável pela morte de muitas mulheres e crianças.

  • Responsabilidade como obrigação ou derivada de funções ou cargo, papel. Ex.: “o pai é responsável por seus filhos”. Não se diz, porém, que “o porteiro tem responsabilidade de trabalhar a partir das sete horas”, mas se diz que “o porteiro responsável por quem ingressa no edifício”.
  • Responsabilidade no sentido de fator causal. Quando se diz no exemplo dado por Hart, que o capitão foi responsável pela perda do navio, ou que ele sustentava que a tormenta foi a responsável, o termo responsabilidade é usado para indicar meramente que algum ato ou fenômeno é a causa do evento.
  • Responsabilidade como capacidade e como estado mental. Refere-se ao fato de alguém ser mentalmente capaz ou imputável. No caso, a negligência é igualmente imputável.
  • Responsabilidade como moralmente reprovável e como punível. Um indivíduo é responsável quando suscetível de ser sancionado, independentemente de que haja cometido um ilícito, ou não.

A responsabilidade pode ser ambiental, penal, civil, ética, médica, etc. Mas responsável de que? A lei brasileira não a define, a não ser indiretamente indicando as causas de sua exclusão. A noção que une essas acepções é a de consequência

No Direito Romano, os vocábulos latinos respondere – responsa, remetem a sponsio, a instituição que ocupava lugar capital no direito romano arcaico e aspondere (donde sponsus, esposos). O sponsor era um devedor que se compromete a alguma prestação, por exemplo, a desposar. O responsor, era a garantia, aquele que se obrigava a responder. A palavra responder implica, deste modo, a ideia de constituir-se em garantia no curso dos acontecimentos. O jurista romano respondia a quem o consultava, e tais respostas são consideradas fontes do direito. Mas especialmente se responde a uma exigência, a qual fazemos frente a um dever, a uma carga que os incumbe.

Já a palavra responsabilidade, parece faltar no direito romano. Ela só aparece no final do século XVIII nas línguas europeias.

Responsável – responsabilidade, em sua origem não implicava a ideia de falta, tampouco a de sujeição.

A responsabilidade penal no sistema jurídico brasileiro é atribuída às pessoas naturais, todavia a Constituição Federal vigente inova no § 3º, de seu art. 225, ao declarar que as

condutas lesivas ao meio ambiente sujeitarão seus infratores, pessoas físicas ou jurídicas a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar o dano. (grifo nosso)

Conquista lenta, mas decisiva do Estado de Direito, a responsabilidade penal dos entes coletivos é, ela mesma, instrumento de legalidade.

5.2 Estado como Pessoa e como Pessoa Jurídica

Referir-se ao Estado como pessoa jurídica remete-nos a uma questão histórica e cultural: conceber o Estado a imagem de uma pessoa física. Desde o princípio do pensamento político europeu, as comparações e analogias entre a coisa pública (polis, civitas, república) e o ser humano são constantes.

Platão e Aristóteles compararam a ordem política com um ser vivo com alma; Cícero usa persona civitatis para a gestão de magistrados. Na Idade Média se formulam expressões de persona ficta e persona representata para referir-se às corporações, cidades, sendo frequente que se identifique a organização política com um corpus universitatis, corpus moralis et politicum, que correspondia à concepção da humanidade unida na Igreja cristã como corpus mysticum Christi.

Velhos símbolos da vontade e de força designam funções do Estado. Com efeito Rousseau[28] se menciona o corpo político e designa a potestade legislativa como seu coração, enquanto que o Governo é o cérebro. Anos mais tarde, Bonnin polemiza e reduz os símiles antropomórficos ao Poder Legislativo como a vontade e a Administração como a execução dessa vontade. Este modelo do corpo político ou pessoa moral do Estado, não se separou, porém, do Príncipe ou Povo como independente. Dupla personalidade o caracteriza, como personalidade governante que quando se individualiza para possuir e contratar com os particulares, se apresenta como uma personalidade jurídica.

5.2 Objeções à Responsabilização Penal das Pessoas Jurídicas

Contra a responsabilidade das pessoas coletivas no direito penal, apresentam-se duas objeções. A primeira de ordem histórica derivada do antigo ensinamento: societas delinquere non potestest; a segunda lógico-sistemática uma vez que a construção das entidades coletivas como pessoas ser uma ficção.

A objeção mais séria, porém, refere-se à culpabilidade, compreensível nas pessoas físicas, capazes de agir com vontade própria, com dolo e culpa.

5.2.1 Pessoa-conceito

Hans Kelsen, em sua Teoria Pura do Direito[29], ao analisar o conceito de pessoa como a personificação de um complexo de normas jurídicas, afasta todas as objeções levantadas.

A teoria tradicional identifica o conceito de sujeito jurídico com o de pessoa. Eis a sua definição: pessoa é o homem enquanto sujeito de direitos e deveres. Dado que, porém não só o homem mas também outras entidades, tais como certas comunidades como as associações, os Municípios, os Estados, são apresentados como pessoas, define-se o conceito de pessoas como ‘portador’ de direitos e deveres jurídicos.

Pessoa jurídica (pessoa em sentido jurídico) é a unidade de um complexo de deveres jurídicos e direitos subjetivos. (grifo nosso)

O resultado da análise precedente da pessoa jurídica é que esta, tal como a pessoa física, é uma construção da ciência jurídica. Em outras palavras, pessoa é a noção eminentemente jurídica, que não se confunde com homem.

Alguns autores, ao negar a responsabilidade penal da pessoa jurídica, confundem os conceitos de culpabilidade e responsabilidade.

A culpabilidade, após a teoria finalista da ação, elaborada por Welzel, segundo Luiz Vicente Cernicchiaro, granjeou adeptos, entendeu o elemento subjetivo como integrante do tipo. À culpabilidade, separada dos elementos anímicos, restou conceito axiológico negativo, significando a reprovabilidade ou censurabilidade ao autor do delito[30].

Existe, divergência entre responsabilidade (responder por) e culpabilidade. Nada impede que a responsabilidade penal das pessoas jurídicas, exigida constitucionalmente, nos delitos ambientais ocorra.

5.3 Princípio da Responsabilidade

Hans Jonas[31] desenvolveu seu Princípio da Responsabilidade baseado na heurística do medo, formando uma ética que vai além da relação interespécie, entre seres humanos. Ao mesmo tempo em que o devir do progresso humano permite a invenção da novidade, o aumento de conhecimento e o alargamento das possibilidades de um bem-estar maior trazem o risco do imponderável, da agressão à natureza e à própria espécie humana. A tentativa de obter alimentos transgênicos, produzir enzimas e hormônios humanos artificialmente, ressuscitar os mortos, como o desenvolvimento de novos genes nunca antes visto pela natureza, tudo é uma temeridade. E, mais: percebeu-se que ao alterar o meio ambiente, alteramos o humano e as consequências dessas ações acumulam-se com o passar do tempo.

5.4 Modificação do Patrimônio Genético Humano

Pode ocorrer em três níveis:

a) células somáticas;

b) células germinais;

c) nos embriões (durante a primeira fase de desenvolvimento).

De modo que, de as finalidades podem ser:

a) diagnósticas;

b) terapêuticas;

c) produtivas;

d) alterativas;

e) experimentais (destrutivas).

5.5 Tutela Jurídica

  • A Lei de Biossegurança (Lei 11.105/2005), visa principalmente ao estabelecimento de mecanismos de proteção para o uso da biotecnologia moderna. Permitiu em seu Cap. I, 5º, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro, sob certas condições. No art. 6º, proibiu a engenharia genética humana, zigoto humano e embrião humano; clonagem humana; e no Cap. VIII, estabeleceu os crimes e as penas a serem aplicadas em caso de descumprimento da lei.

Não obstante, o referido art. 5º a nosso ver perdeu sua validade e eficácia, uma vez que os embriões ditos inviáveis, do inciso I, podem não ser inviáveis dependendo da compreensão científica do que sejam e os embriões do inciso II, ou foram insuficientes para a realização da pesquisa pretendida, como afirmam os pesquisadores, ou por que descaíram no seu tempo previsto: congelados há 3 anos a partir da data de publicação da Lei de 2005 (Afinal estamos em 2016).

Dado esse fato incontestável, a então permissão temporária e excepcional, do art. 5º e incisos, deixa de valer. Volta-se a nosso ver a ser crime a utilização de embriões humanos, como bem estabelece os arts. 24, 25 e 26 do Cap. VIII do mesmo dispositivo legal.

  • A recente Lei 13.123, de 20 de maio de 2015, ao regulamentar o inciso II do § 1º e o § 4º do art. 225 da Constituição Federal, entre outro, dispõe sobre o acesso ao patrimônio genético, sobre a proteção e o acesso ao conhecimento tradicional, uso sustentável da biodiversidade e nela não menciona o patrimônio genético humano.
  • No art. 2º de suas disposições gerais, considerou além dos conceitos e das definições constantes da Convenção sobre Diversidade Biológica, promulgada pelo Decreto 2.519, de 16.03.1988, para fins desta Lei:

patrimônio genético – informação de origem genética de espécies vegetais, animais, microbianas ou espécies de outra natureza, incluindo substâncias oriundas do metabolismo destes seres vivos”.

E o humano???

No art. 6º, das competências e atribuições institucionais, criou no âmbito do Ministério do Meio Ambiente, o Conselho de Gestão do Patrimônio Genético – CGen.

E no art. 27, Capítulo VI prevê sanções administrativas, sem prejuízo das sanções penais e cíveis cabíveis, tais como advertência; multa; apreensão, gradativamente aplicadas observando-se a gravidade do fato, antecedentes pessoais, reincidência e situação econômica do infrator.

Lamentavelmente, no silêncio da lei, o tema está a exigir novas reflexões e urgente tutela do patrimônio genético da Humanidade constitucionalmente reconhecido.

6 CONSIDERAÇÕES GERAIS

Na atualidade, o principal predador do meio ambiente é o homem. Durante séculos o meio genético foi alvo de exploração sem qualquer critério de proteção, o que acarretou o caos em que se encontra a natureza. A preocupação com a sua tutela e do patrimônio genético humano parece não ter sido posta em evidência, uma vez que pode gerar gradualmente a autodestruição do humano.

Os atuais adventos da Engenharia Genética podem romper as barreiras genéticas que separam os seres vivos e, caso isso ocorra, o genoma da espécie humana poderá ser modificado de forma irreversível. Depreende-se, portanto que há bens jurídico-penais supraindividuais pessoais, como a identidade genética. Afirma-se o genoma humano como pertencente à Humanidade.

Reconhecer o patrimônio genético comum da Humanidade (common heritage) é tutelar o signo distintivo da espécie humana e admitir que deve ser preservado em prol de sua própria sobrevivência humana e das gerações futuras. Este legado genético não degradado deve florescer além da coletividade, do meio ambiente e do Estado.

Assumimos a visão de Paulo Vinicius Sporleder de Souza[32],

(…) consideramos que o laissez-faire biotecnocientífico pode ser desastroso para a Humanidade se não forem impostos alguns limites, inclusive de ordem jurídico-penal. Assim a ’gestão do vivo’ ou a ‘biopolítica ‘merecem uma estratégia coatada com os princípios humanitários que regem a civilização, pois a humanidade atual e futura assim como o meio ambiente estão em jogo, devendo, portanto, serem asseguradas as condições mínimas de sobrevivência no planeta com vistas a isto.

Assim, a humanidade está sendo chamada a administrar responsavelmente o presente e o futuro da sua evolução, nos limites do seu saber e poder, e o progresso alcançado pelas genetecnologias não devem esquecer disso, já que não apenas a natureza (meio ambiente) agora pode ser manipulada, mas também o próprio homem.

7 REFERÊNCIAS

AFONSO da SILVA, José. Direito ambiental constitucional. São Paulo: Malheiros, 1996.

BARBAS, Stela Marcos de Almeida Neves. Direito ao Patrimônio Genético. Lisboa: Almedina, 2006.

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2007.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 4. ed. Coimbra: Almedina, 2000.

CERNICCHIARO, Luiz Vicente. Direito Penal na Constituição. São Paulo: RT, 1990.

DIAFÉRIA, Adriana. Princípios estruturadores do direito à proteção do patrimônio genético humano e as informações genéticas contidas no genoma humano como bens de interesses difusos. In: CARNEIRO, F.; EMERICK (Orgs.). Limite – A Ética e o Debate Jurídico sobre Acesso e Uso de Uso do Genoma Humano. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2000.

FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Argumentar, argumentação II e argumento II. In: Enciclopédia Saraiva de Direito. São Paulo: Saraiva. 1977. v. 7.

_____. O Direito, entre o Futuro e o Passado. São Paulo: Noeses, 2014.

HAMMERSCHMIDT, Denise. Intimidade Genética & Direito da Personalidade. Curitiba: Juruá, 2008.

HART, H. Punishment and responsability. Enssays in the Philosophy of Law. Oxford: Clarendon Press, 1978.

HERCULANO Selene. A Qualidade de Vida e seus Indicadores. In: Qualidade de Vida e Riscos Ambientais. Niterói: Eduff, 2000.

JONAS, Hans. O Princípio da Responsabilidade. Rio de Janeiro: Contraponto; PUC-Rio, 2006.

KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Tradução de João Baptista Machado. 2. ed. Coimbra, 1962.

LASSALLE Ferdinand Que é Uma Constituição? Disponível em: <http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/constituicaol.html>. Acesso em: 28 jun. 2016.

LAVADOS, Manuel. Ética Clínica, Fundamentos y Aplicaciones. Chile: Facultad de Medicina, 1993.

MANCUSO, Rodolfo. Interesses difusos. Conceito e legitimação para agir. 6. ed. São Paulo: RT, 2004.

MARTINS NETO, João dos Passos. Direitos fundamentais: conceito, função e tipos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.

NUNES JUNIOR, Vidal Serrano. A Cidadania Social na Constituição de 1988. Estratégias de Positivação e Exigibilidade Judicial dos Direitos Sociais. São Paulo: Verbatim, 2009.

PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e Justiça Internacional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

ROUSSEAU, Jean Jacques. Contract social. Livro III, Caps. I e II. São Paulo: L&PM, 2007.

SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite. Equilíbrio de um pêndulo: bioética e a lei: implicações médico-legais. São Paulo: Ícone, 1998.

SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 3. ed. rev. atual e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003.

SOUZA, Paulo Vinicius Sporleder de. Bem jurídico penal e engenharia genética humana. São Paulo: RT, 2004.

VIEHWEG, Theodor. Topica y Jurisprudencia. Madri: Taurus, 1964.

Notas de Rodapé

[1] Doutoranda em Filosofia do Direito PUC-SP. Mestra em Direito das Relações Sociais pela PUC-SP. Especialista em Direito Administrativo PUC-SP. Especialista em Processo Civil pela Escola Superior da PGE-SP de São Paulo. Membro do Grupo de Estudos credenciado pela PUC-SP junto ao CAPES: Percepções cognitivas na interpretação da norma. Advogada.

[2] Professora Associada pela USP, Livre Docente em Direito Penal pela USP, Doutora em Filosofia do Direito pela PUC-SP, Coordenadora do Grupo de Estudos credenciado pela PUC-SP junto ao CAPES: Percepções cognitivas na interpretação da norma.

[3] AFONSO da SILVA, José. Direito ambiental constitucional, p. 1.

[4] Op. cit., p. 2.

[5] Watson e Crick anunciaram em 1953 a descoberta do DNA, que é o principal componente do material genético da imensa maioria dos organismos, o elemento químico primário dos cromossomos e o material com o que os genes estão codificados. Os cientistas demonstraram que a molécula de DNA é constituída por duas cadeias ou fitas formadas por elevado número de compostos químicos chamados nucleotídeos e que estas cadeias formam uma espécie de escada retorcida a que denominaram dupla hélice.

[6] Em 1990 o Projeto Genoma Humano teve início oficialmente e, em 2000 suas primeiras fases estavam concluídas. O Projeto consistiu no mapeamento, sequenciamento e descrição do genoma humano.

[7] VIEHWEG, Theodor. Topica y Jurisprudencia. Madri: Taurus, 1964; FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Argumentar, argumentação II e argumento II. In: Enciclopédia Saraiva de Direito, v. 7, p. 449-468.

[8] BARBAS, Stela Marcos de Almeida Neves. Direito ao Patrimônio Genético. Lisboa: Almedina, 2006. p. 17.

[9] 1° – Que a lei fundamental seja uma lei básica, mais do que as outras comuns, como indica seu próprio nome “fundamental”. 2º – Que constitua – pois de outra forma não poderíamos chamá-la de fundamental – o verdadeiro fundamento das outras leis; isto é, a lei fundamental, se realmente pretende ser merecedora desse nome, deverá informar e engendrar as outras leis comuns originárias da mesma. A lei fundamental, para sê-lo, deverá, pois, atuar e irradiar através das leis comuns do país.

3º – Mas, as coisas que têm um fundamento não o são assim por um capricho; existem porque necessariamente devem existir. O fundamento a que respondem não permite serem de outro modo. Somente as coisas que carecem de fundamento, que são as casuais e as fortuitas, podem ser como são ou mesmo de qualquer outra forma; as que possuem um fundamento não, pois aqui rege a lei da necessidade. Os planetas, por exemplo, movem-se de um modo determinado. Este movimento responde a causas, a fundamentos exatos, ou não? Se não existissem tais fundamentos, sua trajetória seria casual e poderia variar a todo momento, quer dizer seria variável. Mas, se de fato responde a um fundamento, se é o resultado como pretendem os cientistas da força de atração do sol, é o bastante isto para que o movimento dos planetas seja regido e governado de tal modo por esse fundamento que não possa ser de outro modo, a não ser tal como de fato é. A ideia de fundamento traz, implicitamente, a noção de uma necessidade ativa, de uma força eficaz que torna por lei da necessidade que o que sobre ela se baseia seja assim e não de outro modo. LASSALLE Ferdinand Que é Uma Constituição? Disponível em: <http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/constituicaol.html>. Acesso em: 28 jun. 2016.

[10] MARTINS NETO, João dos Passos. Direitos fundamentais: conceito, função e tipos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 78.

[11] Atualmente, diante de tantas modificações na estrutura da sociedade, onde se tem uma sociedade de massa e regida pelo mercado de consumo, o essencial, o básico e necessário passam a ter outros parâmetros. Tércio Sampaio Ferraz chama atenção para a questão do inessencial e o impacto de tal realidade nas definições daquilo que é fundamental e como precisar os direitos fundamentais.

[12] SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 3. ed. rev. atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. p. 57.

[13] NUNES JUNIOR, Vidal Serrano. A Cidadania Social na Constituição de 1988. Estratégias de Positivação e Exigibilidade Judicial dos Direitos Sociais. São Paulo: Verbatim, 2009. p. 24.

[14] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 4. ed. Coimbra: Almedina, 2000. p. 526-533-539.

[15] HAMMERSCHMIDT, Denise. Intimidade Genética & Direito da Personalidade. Curitiba: Juruá, 2008.

[16] A maioria dos ordenamentos jurídicos contém disposições para proteger a vida privada das pessoas, a inviolabilidade do lar, da correspondência. Este direito tem sido denominado “direito à intimidade”, “à privacidade”, ao “repouso”, ou à “confidencialidade”. O art. 5º da Constituição de 1988, protege a intimidade com um direito inerente à pessoa. Este direito liga-se ao princípio da dignidade da pessoa humana. O poder de autodeterminação do indivíduo com relação ao controle de dados genéticos e o poder de decisão após sua coleta geram o chamado direito à informação.

LAVADOS, Manuel. Ética Clínica, Fundamentos y Aplicaciones. Chile: Facultad de Medicina, 1993. p. 103 e ss. Os autores Manuel Lavados e Alejandro Serani distinguem três tipos de intimidade: territorial, corporal e psicológica ou espiritual.

[17] SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite dos. Equilíbrio de um pêndulo: bioética e a lei: implicações médico-legais. São Paulo: Ícone, 1998. p. 64.

[18] Op. cit., p. 65.

[19] Op. cit., p. 66.

[20] BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 569.

[21] No direito brasileiro, em 1985, a grande novidade foi a Lei de Ação Civil Pública (LACP – Lei 7.347/1985), que era destinada a tutelar alguns interesses difusos, elencados taxativamente em seu art. 1º. Em 1990, o Código de Defesa do Consumidor modifica a lei de ação civil pública, determinando que tal ação dever ser utilizada para tutela de qualquer outro interesse difuso ou coletivo. O Código de Defesa do Consumidor criou um sistema de trocas entre ele e a Lei de Ação Civil Pública. Assim, cada uma delas aplica-se supletivamente à outra. O art. 21 da Lei 7.347/1985 estabelece: Aplicam-se à defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e individuais, no que cabível, os dispositivos do Título III da Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990, que instituiu o Código de Defesa do Consumidor – CDC. Já o art. 90 do CDC dispõe que: Aplicam-se às ações previstas neste Título as normas do Processo Civil e da Lei 7.347, de 24 de junho de 1985, inclusive no que respeita ao inquérito civil naquilo que não contraria suas disposições. Esses dois artigos (90 do Código de Defesa do Consumidor e o art. 21 da Lei da Ação Civil Pública) se fundiram para a solução e resolução dos problemas referentes aos processos coletivos, o que inclui o interesse difuso, formando um microssistema integrado de normas básicas sobre direto processual coletivo.

[22] MANCUSO, Rodolfo. Interesses difusos – Conceito e legitimação para agir. 6. ed. São Paulo: RT, 2004. p. 150.

[23] Na época pastores da Igreja Metodista resolveram fazer um de fundo de pensão, porém, houve uma divisão na Igreja sobre a questão da escravidão e os administradores do fundo suspenderam as remessas de dinheiro para os sulistas, sendo que os pregadores sulistas adentraram com uma ação coletiva.

[24] Art. 225 da Constituição Federal Brasileira, Declaração Universal do Genoma Humano e dos Direitos do Homem. Declaração lbero-Americana sobre Ética e Genética.

[25] DIAFÉRIA Adriana. Princípios estruturadores do direito à proteção do patrimônio genético humano e as informações genéticas contidas no genoma humano como bens de interesses difusos. In: CARNEIRO, F.; EMERICK (Orgs.). Limite – A Ética e o Debate Jurídico sobre Acesso e Uso de Uso do Genoma Humano. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2000.

[26] A Qualidade de Vida e seus Indicadores. In: HERCULANO, Selene et al. (Org.). Qualidade de Vida e Riscos Ambientais. Niterói: Eduff, 2000.

[27] HART, H. Punishment and responsability. Enssays in the Philosophy of Law. Oxford: Clarendon Press, 1978. p. 211.

[28] ROUSSEAU, Jean Jacques. Contract social. Livro III, Caps. I e II.

[29] KELSEN, Hans. Op. cit., p. 26.

[30] Direito Penal na Constituição, p. 81.

[31] JONAS, Hans. O Princípio da Responsabilidade. Rio de Janeiro: Contraponto; PUC-Rio, 2006.

[32] SOUZA, Paulo Vinicius Sporleder de. Bem jurídico penal e engenharia genética humana. São Paulo: RT, 2004. p. 237-238.