Considerações Acerca da Efetivação dos Direitos Fundamentais pela Via do Controle de Constitucionalidade das Leis

CONSIDERATIONS ON THE EFFECTIVENESS OF FUNDAMENTAL RIGHTS THROUGH THE CONTROL OF THE CONSTITUTIONALITY OF LAWS

Érica Maia Campelo Arruda[1]

Demetrius dos Santos Ramos[2]

Edna Raquel R. S. Hogemann[3]

Resumo: O artigo discute a efetivação dos direitos fundamentais através da atuação do Poder Judiciário em sede de controle de constitucionalidade das leis, concretizado pela interferência dos membros da Corte Constitucional nas políticas públicas de Estado. Será feito um contraponto entre a clássica Teoria de Separação de Poderes de Montesquieu e seu desenho atual, especialmente em países da América Latina em razão da semelhança na estrutura de seus textos constitucionais. Também serão discutidas as circunstâncias favoráveis à “judicialização da política” na América Latina e no Brasil, assim como argumentos de ordem político-institucional contrários à excessiva atuação do Poder Judiciário no controle das políticas públicas. Por fim serão apresentados dados sobre o sistema concentrado de controle de constitucionalidade no Brasil, realizado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), tal como hoje é desenhado. Busca-se, por meio de uma pesquisa de caráter qualitativo, pela utilização do método dialético, aferir quais os caminhos institucionais a serem trilhados a fim de que seja possível efetivar os direitos fundamentais constitucionalmente previstos, pela necessidade de superação da atual prática judicial no exercício da jurisdição constitucional, especialmente nos países da América Latina.

Palavras-chave: Direitos Fundamentais. Políticas públicas. Poder Judiciário.

Abstract: The article discusses the realization of fundamental rights through the judiciary role in the law’s constitutionality control headquarters, realized by the interference of the members of the Constitutional Court in the public state policies. There will be a contrast between the classical theory of Montesquieu’s separation of powers and its current design, especially in Latin America because of the similarity in the structure of their constitutional texts. Conditions favorable to the “legalization of politics” in Latin America and Brazil, as well as arguments of political and institutional order against the excessive role of the judiciary in control of public policies will also be discussed. Finally, are presented data on the concentrated judicial review system in Brazil, held by the Federal Supreme Court (STF), as today is drawn. Seeks, through a qualitative research, the use of the dialectical method, assess which institutional ways to go in order to make it possible to enforce the constitutionally provided for fundamental rights, by the need to overcome the current judicial practice in the exercise of constitutional jurisdiction, especially in Latin America.

Keywords: Fundamental rights. Public policy. Judicial power.

1 INTRODUÇÃO

O moderno Estado de Direito trouxe questões desafiadoras para a Teoria Constitucional, a clássica separação de poderes proposta por Montesquieu já não consegue responder aos anseios de realização dos inúmeros direitos fundamentais colocados à disposição dos cidadãos.

Sob o argumento da urgência na efetivação dos direitos fundamentais, o Poder Judiciário vem assumindo um protagonismo na concretização de tais direitos através de provimentos judiciais no controle de políticas públicas, produzindo os fenômenos da “judicialização da política” e “ativismo judicial”.

No contexto deste trabalho, política pública será conceituada apenas juridicamente, na concepção adotada por Maria Paula Dallari Bucci, em sua obra O conceito de política pública em direito (BUCCI, 2006, p. 02, p. 37 e 39), de acordo com uma ótica normativa e instrumental, como programa de ação governamental destinado a realizar direitos e/ou objetivos determinados.

A tese defendida neste artigo é da inadequação da jurisdição constitucional em sede de controle de constitucionalidade das leis com o objetivo de efetivação dos direitos fundamentais através da interferência nas políticas públicas de Estado, considerando que parte do problema é a falta de atuação conjunta entre os poderes de Estado.

2 AS CIRCUNSTÂNCIAS HISTÓRICAS FAVORÁVEIS

1. No Brasil, a década de 1980 se destacou como período de articulações dos movimentos sociais em torno do tema dos direitos humanos, que ganharam uma força nunca antes vista na história do Brasil, estimulados pela conquista pelos movimentos sociais e populares da abertura política e pelas articulações em torno da Constituição de 1988.

2. A Assembleia Nacional Constituinte de 1987 se reuniu naquele momento histórico com a pretensão de contemplar o maior número possível de demandas e apelos sociais no seu texto, mas o que resultou ao final foi um corpo normativo permeado por contradições, especialmente por pretender contemplar uma proteção universal de direitos humanos para toda a sociedade brasileira. Essa também foi a percepção de Arato (1997, p. 8-11), destacando os exemplos históricos em torno da dificuldade em se organizar procedimentos consensuais de redação e processos de participação pública na construção constitucional. E complementa, afirmando que no caso de um público mobilizado, os redatores da Constituição encontram sérias dificuldades para integrar opiniões derrotadas ou minoritárias em um consenso que reflete, na sua avaliação, desejos e interesses de partes não mobilizadas e minoritárias da população. E da mesma forma, afirma que se os procedimentos se abrem inteiramente ao público, ocorre algo difícil de evitar, as Assembleias Constituintes podem ter dificuldade em respeitar o princípio da coerência, imprescindível para uma Constituição, fenômeno pelo qual presume passou a Constituição de 1988.

3. Na mesma linha argumentam Lunardi e Dimoulis (2013, p. 17), defendendo a tese de que a Constituição de 1988 é resultado de um processo político fragmentário, no qual foi maximizada a proteção aos interesses dos mais diversos setores presentes no processo constituinte.

4. Bucci (2006, p. 04 e 11) justifica a escolha do Constituinte, argumentando que a Constituição de 1988 foi carregada de direitos com a tarefa de redemocratização do país, além de ter sido sobrecarregada com aspirações de reduzir as profundas desigualdades sociais produzidas ao longo da história. Mas critica a opção adotada, entendendo que há um excesso de direitos na Constituição de 1988, e que correspondem a aspirações sociais cuja satisfação depende da macroeconomia, da organização dos setores produtivos, da inserção do Estado na economia mundial, na verdade por variáveis estranhas ao Direito.

5. Lunardi e Dimoulis (2013, p. 16) ao classificarem as Constituições, apontam para a aproximação da Constituição de 1988 com o modelo de Constituição Ubíqua, delineada por Daniel Sarmento, no que se convencionou chamar de “panconstitucionalização”, em razão do caráter detalhista da Constituição, que incorporou uma infinidade de valores substanciais, princípios abstratos e normas concretas em seu programa normativo. Os autores descrevem esse modelo como exemplo de “panconstitucionalização”, mas que é vista com ressalvas em razão dos seus riscos, uma vez que há grande poder discricionário dos tribunais e que podem facilmente abusar de sua posição.

6. A Constituição de 1988 se enquadra também como um típico modelo de Constituição latino-americana, apontando Gargarella (2015) que essas Constituições se caracterizam por acumular pretensões opostas da sociedade através da positivação de uma grande gama de direitos, que pretende fazer a representação de toda a diversidade social existente, o que gera, na sua visão, muitas promessas de efetivação, instabilidades e incertezas jurídicas futuras, propiciando a excessiva interferência do Poder Judiciário nas políticas públicas. Outro ponto apresentado por Gargarella (2015) na famosa Aula Magna proferida na Cidade do México, é que a organização de poderes nos países latino-americanos apresenta um sistema concentrado no Poder Executivo, desequilibrando a clássica Teoria de Separação de Poderes de Montesquieu. Ao final da Conferência Magna, o professor argentino sugere uma mudança institucional que efetive os direitos humanos, já que um Poder Executivo muito forte desequilibra o sistema de freios e contrapesos, na sua visão.

3 UMA NECESSÁRIA ABORDAGEM SOBRE A TEORIA CLÁSSICA DA SEPARAÇÃO DE PODERES

Toda essa discussão é, em parte, decorrência das grandes mudanças na organização política dos Estados ocorridas nas últimas décadas, especialmente em relação ao papel que o Poder Judiciário vem desenvolvendo na efetivação das políticas públicas próprias de governo.

Para melhor entendimento desse processo, far-se-á a análise da evolução da atuação do Poder Judiciário tendo como referencial a teoria da separação de poderes de Montesquieu[4], na obra O Espírito das Leis (MONTESQUIEU, 2000, Livro XI, caps. 1 a 6), especialmente quanto ao exercício da jurisdição constitucional para a efetivação dos direitos fundamentais através da fiscalização das políticas públicas governamentais.

O debate começa com as ideias de Montesquieu, que ao construir seu modelo político objetivou evitar a concentração de poderes em um único órgão estatal. Tendo por base a Constituição da Inglaterra, Montesquieu definiu a estrutura do seu sistema, em que o governo deveria ser moderado, os poderes divididos e definidas as atribuições de cada um deles, cada um controlando o outro para que não houvesse abusos. A teoria original afirmava que a liberdade política não estaria presente quando os poderes estivessem fundidos, o que ocasionaria abusos por parte daquele que o concentra.

Em verdade os fundamentos da separação de poderes e das ideias montesquianas surgiram em Locke (2006), destacando-se o Poder Legislativo como poder supremo e hierarquicamente superior, por isso competente para elaboração das leis que regulam as relações da sociedade e assim devendo ser respeitadas por todos já que dele decorre a vontade popular, a não ser excepcionalmente quando não se coaduna com o bem-estar social. A esse respeito, Locke (2006, p. 328), afirma:

Esse poder legislativo não é somente o poder supremo da comunidade, mas sagrado e inalterável nas mãos em que a comunidade uma vez colocou; nem pode qualquer feito de quem quer que seja, concebido por qualquer maneira ou apoiado por qualquer poder que seja, ter força e a obrigação da lei se não tiver a sanção do legislativo escolhido e nomeado pelo público; porque sem isto a lei não teria o que é absolutamente necessário à sua natureza de lei: o consentimento da sociedade sobre a qual ninguém tem o poder de fazer leis senão por seu próprio consentimento e pela autoridade recebida. (LOCKE, 2006)

Já o Poder Judiciário em Montesquieu apresentava funções muito diferentes das contemporâneas, a falta de Constituição escrita torna distante dos dias atuais a noção da época de juiz e Judiciário. Para ele, o Poder Judiciário deveria ser nulo pois não poderia influenciar o corpo político em suas decisões de governo.

A mola mestra base da separação de poderes de Montesquieu é a lei, por isso as funções dos poderes giram em torno da confecção, execução e interpretação da lei; o que nos permite afirmar estarmos diante de uma “teoria jurisdicista”. Para o autor, a necessidade da separação de poderes se traduz na necessidade de dividir o exercício dos poderes de governo entre as classes sociais da sua época, povo, nobres e realeza; e assim fazer leis que conjugassem os interesses de todas as classes sociais envolvidas na sua produção.

O regime ou governo ideal na visão de Montesquieu seria aquele em que o poder das forças sociais contrariasse e moderasse o poder das demais, de forma que arranjos institucionais fossem desenvolvidos para impedir que alguma força política prevalecesse sobre as demais. Um olhar crítico sobre a obra de Montesquieu traz a visão da doutrina liberal de que o governo ideal é aquele com poucas leis para comandar a vida dos cidadãos, e isso só seria conseguido através do impasse entre os poderes e as classes sociais que os formam em fazê-la. O impasse gerado por ideais e interesses opostos é o cerne da teoria de Montesquieu, e os sistemas de governo que se seguiram tentaram resolver a questão posteriormente, o parlamentarismo e o presidencialismo, cada um a sua maneira.

4 O PODER JUDICIÁRIO E O CONTROLE DA CONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS

O Poder Judiciário na ordem política contemporânea assumiu um papel bem diferente daquele idealizado por Montesquieu e pelos autores de O Federalista[5], especialmente com relação ao controle de constitucionalidade das leis.

O Brasil adotou o sistema híbrido ou eclético de controle de constitucionalidade, em que convivem o controle concentrado feito por um único órgão jurisdicional e o controle difuso exercido por todos os membros do Poder Judiciário.

Comparando o Poder Judiciário de hoje com o de Montesquieu, observa-se que na origem da sua teoria tratava-se de um poder nulo, só que hoje a função judiciária ganhou maior alcance por não existir na teoria originária um fiscal que controlasse a atividade governamental, mas o que se vê, no caso brasileiro, especialmente por parte do Supremo Tribunal Federal (STF), é que o controle de constitucionalidade das leis por parte do Judiciário está indo muito além da simples fiscalização.

4.1 Judicialização da Política

É possível afirmar que a denominada “judicialização da política” surge quando se fala em exercício da jurisdição constitucional, tema hoje bastante discutido pelos estudiosos do direito e das ciências sociais? A jurisdição constitucional nasceu na pioneira decisão Marbury x Madison proferida em 1803, pela Suprema Corte Norte-americana. Em verdade a possibilidade de seu exercício não estava expresso ou de qualquer outra forma era autorizada pela Constituição americana, e como não havia regra impeditiva, a Suprema Corte se auto-atribui a função de judicial review ou de controle de constitucionalidade das leis.

O pesquisador norte-americano Neal Tate (1995, p. 27-36) afirma haver um fator preponderante que leva à “judicialização da política”, é a delegação de decisões do Poder Legislativo ao Poder Judiciário, também entende o autor norte-americano que existem questões onde o custo político de uma decisão é muito alto e por isso estas decisões acabam nos tribunais ao invés de serem tomadas pelos verdadeiros legitimados, os parlamentares e administradores públicos.

Moro (2004, p. 155-204) ao defender a autocontenção dos juízes no controle de constitucionalidade das leis conclui afirmando que os juízes constitucionais precisam compreender seu papel secundário no regime democrático, embora relevante. Em suas palavras:

Cabe aos representantes eleitos pelo povo a primazia na formulação das políticas públicas, o que fazem principalmente através do processo legislativo. (…) Os encarregados da formulação das políticas públicas são o Legislativo e o Executivo, não devendo o Judiciário pretender substituí-los nessa função. (MORO, 2004)

A doutrina que defende a politização das decisões do Poder Judiciário, especialmente em sede de jurisdição constitucional, reconhece que um de seus fundamentos é a má atuação dos demais poderes, ou por inércia legislativa ou por inação por parte do Executivo, sendo o fundamento último de tal atuação a necessidade de efetivação e concretização dos direitos fundamentais.

5 EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

O exercício da jurisdição constitucional passou por mudanças e evoluiu na medida em que o Welfare State passou a demandar uma maior atuação estatal; o cidadão precisava, a partir daquele momento, ter atendidas suas necessidades e efetivar a grande gama de direitos ditos fundamentais, na medida em que se referem à situação dos cidadãos perante o Estado, especialmente os direitos sociais, previstos nas Constituições modernas, sendo a Constituição de 1988 um importante exemplo dessa mudança.

Perez Luño (2001, p. 31) entende que os direitos fundamentais justificam o Estado na medida que reconhecem e respeitam sua essência. Para ele está claro que a função dos direitos fundamentais é principalmente de limitação do poder político, participação social e justificação do próprio Estado, para colocar à prova a estrutura e funcionamento do Estado aparato, e evidenciando a liberdade e democraticidade do Estado comunidade.

Bucci (2008, p. 10) observa que a realização dos direitos fundamentais está condicionada a um papel ativo do poder público, destacando o papel fundamental do Poder Executivo na concretização constitucional e na aplicação das normas constitucionais. Mas a autora reconhece a dificuldade na construção de um novo paradigma de concretização da disposição constitucional, especialmente quando se fala no crivo de outras esferas de hermenêutica dessa forma de reenvio às normas, legislativas e administrativas, como o Poder Judiciário, conforme se segue:

O controle dos tribunais e as iniciativas de interpretação que possam ser tomadas para a execução pronta dos valores humanos e sociais consagrados na Constituição foram e são fundamentais para uma cultura de responsabilidade constitucional, isto é, de atribuição de efeitos ao descumprimento das disposições da Constituição. (…) Entretanto, talvez por força do histórico autoritário, que gera uma desconfiança em relação ao Poder Executivo, tem sido relegada a segundo plano, na pauta acadêmica, a importância desse Poder para a efetivação das disposições constitucionais, especialmente em matéria de direitos sociais e econômicos. (BUCCI, 2008)

Já Perez Luño (1995, p. 19) analisa os direitos fundamentais face às normas constitucionais programáticas, normas que levam o legislador a concretizar em um futuro próximo suas disposições. Na sua visão, há o problema da demora excessiva no cumprimento dos direitos inseridos em normas programáticas no plano político, causando desencanto de amplos setores sociais, especialmente os mais interessados na sua efetivação. Para ele, as normas programáticas de direitos e liberdades básicas contêm pouco valor jurídico pois são meras enunciações normativas, mas possuem valor político pois significam um compromisso que vincula toda a orientação política estatal. O autor entende que os direitos fundamentais têm a função e aparecem como princípios organizadores na medida em que colocam limites aos Poderes Executivo e Legislativo.

Da mesma forma pensa Mendes (2007, p. 13-45), que afirma existir uma vinculação dos direitos fundamentais aos poderes estatais. Na sua visão, o legislador não está apenas autorizado a fixar limites para determinados direitos individuais, mas obrigado a observar rigorosamente os limites estabelecidos na Constituição para a imposição de restrições ou limitações. Para ele, outra consequência da vinculação da atividade legislativa aos direitos fundamentais, é a obrigação do legislador em editar normas indispensáveis à concretização de tais direitos fundamentais, especialmente para aqueles com conteúdo estritamente normativo e que se relacionam com o direito de igualdade. O dever do legislador em atuar no sentido de concretizar os direitos fundamentais também nas relações privadas traz o reconhecimento de que os direitos fundamentais têm um significado especial para a ordem jurídica objetiva e que traz como consequência um dever de proteção desses direitos. Mendes, Coelho e Branco (2007, p. 240) também entendem que há uma vinculação do Poder Executivo e do Poder Judiciário aos direitos fundamentais, devendo o Poder Judiciário assegurar sua efetiva aplicação e o Poder Executivo tomar providências necessárias para sua realização ou concretização.

Já Hesse (1998, p. 285) afirma que não deve o Poder Judiciário corrigir as decisões e ponderações do legislador em intervenções sobre direitos fundamentais ou com apoio em suas próprias ponderações. Mas se o legislador deixa a legislação impregnada de conceitos indeterminados e cláusulas gerais, então os direitos fundamentais na sua interpretação podem tornar-se significativos, pois se falta concretização legal é a tarefa do juiz fazê-lo. Em termos constitucionais o mesmo princípio deve ser aplicado, uma vez que para a efetivação dos direitos expressos na Constituição deve o Poder Judiciário se manifestar, desde que não ultrapasse as atribuições e objetivos da jurisdição constitucional.

6 LIMITAÇÕES AO CONTROLE JUDICIAL

Neste artigo defende-se a tese de que não é pela via do Poder Judiciário, em sede de controle de constitucionalidade das leis, que os direitos fundamentais devem ser efetivados, por isso apresentar-se-á argumentos contrários ao controle das políticas públicas para essa finalidade especificamente.

Bucci (2009) apresenta argumentos de ordem político-institucional para a limitação da atuação jurisdicional em tema de efetivação de direitos fundamentais em políticas públicas. Os argumentos são a separação de poderes prevista no art. 2º da Constituição Federal, o déficit democrático do Poder Judiciário e as limitações técnicas do Poder Judiciário para a apreciação das políticas públicas.

Destacar-se-á o argumento do déficit democrático do Poder Judiciário, que indica a falta de legitimidade do Poder Judiciário para o exercício das funções próprias dos Poderes Legislativo e Executivo, cujos titulares neles foram investidos por força do voto. A autora esclarece que na verdade o Poder Judiciário poderá atuar como instância judicial revisora e limitada dos atos dos outros poderes.

A falta de legitimidade do Poder Judiciário, para Bucci (2009), ocorre pela não responsabilização política do juiz pelo teor da decisão, no sentido de sua não exposição à fonte de legitimação do poder pelo exercício do voto.

A autora marca em sua argumentação a diferença entre a lógica da decisão judicial e das políticas públicas, sendo a última parte de uma lógica aglutinadora de perspectivas e informações, que ao final se enfeixam na estratégia de decisão e implementação finalmente adotada.

Para Cristina Queiroz[6] (2009, p. 185-187, 192-193), apud (LESSA, 2016), os direitos sociais garantidos diretamente pela Constituição são normas de escalão constitucional e, por isso, dispõem de vinculação geral em relação a todos os poderes, não constituindo mero apelo ao legislador, mas sim deveres de proteção e de ação (imperativo constitucional). Por esta razão, constituem direitos públicos subjetivos exigíveis do Estado e configuram uma imposição constitucional legitimadora de transformações sociais e econômicas necessárias para sua efetivação, ainda que dentro de uma reserva do possível. Implicam também em uma interpretação das normas legais conforme a Constituição social, econômica e cultural, e a inércia do Estado quanto à efetiva realização desses direitos constitui inconstitucionalidade por omissão.

Para a autora,

é certo que a implementação de políticas públicas direcionadas à promoção dos direitos sociais, econômicos e sociais gera custos, de modo que estes direitos só podem ser garantidos na medida do possível, ou seja, de modo proporcional ao seu desenvolvimento e ao progresso econômico e social. Este condicionamento e dependência conjuntural estão ligados aos recursos disponíveis, o que gera um grave problema de “execução efetiva”. No entanto, embora a dependência aos recursos disponíveis seja um reconhecimento de que a inexistência de recursos financeiros enseja a menor efetividade dos direitos sociais, a reserva do possível não é princípio absoluto e não exclui a garantia constitucional de um “mínimo social”, garantia esta que decorre diretamente do princípio da dignidade da pessoa humana.

Tal garantia é definida como uma “forma de liberdade” por Queiroz (2009), de mesma natureza de um direito de defesa, ainda que traduzida por um direito a prestação positiva por parte do Estado. Por isso, o mínimo existencial prevalece sobre a reserva do possível.

Desta forma, para Queiroz (2009):

Em outros termos, o legislador tem a primazia na concretização da Constituição, uma vez que é responsável pela determinação dos meios orçamentários e financeiros necessários para a realização dos objetivos constitucionais, dentro de sua competência constitucional, e, portanto, possui margem de ação para determinar as “prioridades políticas”. Entretanto, a previsão expressa na Constituição de políticas públicas diminui a margem de ponderação do legislador. As escolhas devem ser feitas consoante os fins, as metas e os objetivos traçados pela Constituição, sob pena de inconstitucionalidade por omissão. Ademais, a não realização ou a realização deficiente destes direitos pode conduzir a uma quebra ou violação do princípio da confiança que está na base da formação do contrato social, ou seja, da própria sociedade.

A primazia da Constituição e seu caráter vinculante são pressupostos da função constitucional como ordem jurídica fundamental da comunidade. Assim, como menciona Hesse (2013): “Daí que o Direito Constitucional não possa ser derrogado nem reformado por leis ordinárias; nenhuma disposição do ordenamento jurídico nem ato estatal pode contradizê-lo; todos os poderes públicos, inclusive o legislativo, acham-se vinculados pela Constituição” (HESSE, 2013, p. 8-9 apud LESSA, 2016).

7 DADOS DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS PRATICADO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF)

A efetivação dos direitos fundamentais por meio da atuação do Poder Judiciário vem ganhando bastante destaque, especialmente entre os teóricos do Direito. “Ativismo judicial”, “litígio estratégico”, “politização da justiça”, “judicialização da política”, são muitas das facetas de um fenômeno festejado e que a cada dia ganha mais adeptos, especialmente no Brasil.

Costa e Zaiden (2014, p. 1-82) se debruçaram sobre a produção de dados sobre o sistema concentrado de controle de constitucionalidade no Brasil, tal como hoje desenhado, e a proteção dos direitos e garantias fundamentais. Os autores realizaram pesquisa empírica no Supremo Tribunal Federal (STF), analisando aproximadamente 94% dos processos ajuizados no tribunal em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) em uma atuação ao longo de 24 anos. Os resultados apontam que o perfil geral das decisões e dos atores das ações, combinados com o perfil político dos legitimados com a jurisprudência restritiva do STF em termos de legitimidade, conduziu a um modelo de controle concentrado que privilegia a garantia dos interesses institucionais ou corporativos, e que apesar dos discursos de legitimação do controle concentrado normalmente se justificarem na necessidade de oferecerem proteção adequada aos direitos dos cidadãos, o que se observa na prática é uma garantia efetiva dos interesses corporativos e não do interesse público. Os autores concluem sua pesquisa com a afirmação de que muito mais do que defender os direitos e garantias fundamentais, o controle concentrado de constitucionalidade é um grande instrumento para a defesa de interesses corporativos, explicitando-se, assim, uma clara dissonância entre discurso doutrinário e prática judicial.

Na mesma linha, ao refletir sobre a atuação do Supremo Tribunal Federal (STF) em sede de controle de constitucionalidade das leis, Valle (2014) afirma que não há a definição de uma zona discricionária reservada à Administração Pública, ou algum tipo de deferência que deve ser atribuído às escolhas administrativas. Como resultado, o chamado controle das políticas públicas em direitos, no caso do seu estudo, voltado para o direito à moradia, não é instrutivo, mas apenas por censura, é uma relação não dialógica entre o Tribunal e a Administração. Da mesma forma argumenta Rodriguéz-Garavito (2011, p. 1669-1698) ao se referir à realidade brasileira, reconhecendo que a interferência do Poder Judiciário no Brasil é muito grande, a ponto de que no país as Cortes decisivamente formatarem a prestação de serviços sociais fundamentais, tais como a saúde.

8 CONCLUSÃO

As reflexões trazidas corroboram para a necessidade de superação da atual prática judicial no exercício da jurisdição constitucional, especialmente nos países da América Latina. Nesse sentido, a atuação do Poder Judiciário que vise substituir os Poderes Legislativo e Executivo na implementação e execução de políticas públicas sob o argumento de efetivação de direitos fundamentais, só causa a desorganização do Estado. Na verdade, uma política pública é construída por arranjos institucionais complexos para a realização de objetivos socialmente relevantes e politicamente determinados, e dessa forma o poder público pode determinar quais as áreas e setores prioritários para investimento naquele momento específico.

Gargarella (2015) ao discorrer sobre a crescente atuação do Poder Judiciário na conformação das políticas públicas, defende que se deve em grande parte pelas recentes reformas constitucionais pela qual passaram as Constituições dos países da América Latina, que incluíram amplos direitos sociais e coincidiram com programas de ajuste econômico, o que resultou, destaca, um momento de crise na efetivação de direitos humanos.

O Poder Judiciário no exercício da jurisdição constitucional e do controle de constitucionalidade das leis não possui a visão sistêmica do administrador, Bucci (2009) afirma que o juiz não conhece os ônus subjacentes a cada escolha que resultou naquele arranjo complexo, nem a composição de interesses que sustenta a decisão política, nem tampouco assumirá as consequências pela interferência sobre a estratégia que orientou a adoção de um ato ou outro. O provimento jurisdicional se caracteriza por ser individualizado já que o magistrado se atém apenas ao caso concreto a ser julgado, não percebendo que a ação governamental que envolve as políticas públicas se constitui de um ciclo com elementos próprios para sua conformação[7]. A urgência no provimento jurisdicional para a efetivação dos direitos fundamentais levados à jurisdição constitucional, podem fazer com que o Poder Judiciário, muitas vezes, cause a desorganização de políticas públicas já existentes ou a retirada de recursos de outra ação em andamento ou planejada, e o que é mais grave, a seleção de direitos pelo critério do filtro já que os recursos são limitados e os direitos constitucionais à disposição do cidadão são muitos, tornando financeiramente impossível para o Estado de um país em desenvolvimento como o Brasil a realização de todos esses direitos na mesma proporção.

Dessa forma, está claro que a efetivação dos direitos fundamentais é tarefa e atribuição constitucional dos Poderes Legislativo na sua formulação, e do Executivo na execução de tais planos, e que a atividade jurisdicional, segundo Bucci (2009) deve compreender o processo de formação e execução das políticas públicas na dinâmica própria da atividade política.

Pensando nas propostas apresentadas, entende-se a necessidade de uma maior articulação entre as esferas institucionais para que ocorra realmente a efetivação de direitos fundamentais, sugerimos um novo desenho da prática institucional entre os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário; para uma verdadeira atuação conjunta e harmoniosa entre os três poderes de Estado.

Assim, o desafio maior para o Brasil, país que se insere na tradição constitucional da América Latina, é construir arranjos institucionais compatíveis com sociedades caracterizadas pelas heterogeneidades estruturais com pobreza e desigualdade social acentuada.

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Notas de Rodapé

[1] Doutoranda em Direito e Evolução Social pela Universidade Estácio de Sá (PPGD/UNESA); Mestra em Direito e Políticas Públicas pelo Centro Universitário de Brasília (UNICEUB), Advogada, Assessora de Regulação da Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos do Estado do Rio de Janeiro (SEASDH/RJ).

[2] Mestrando em Direito Público e Evolução Social pela Universidade Estácio de Sá (PPGD/UNESA); Especialista em Direito Empresarial, Imobiliário e Tributário.

[3] Pós-Doutora em Direito (UNESA), Doutora e Mestra em Direito (UGF). Professora Titular Permanente do no PPGD/UNESA. Membro da Law & Society Association e da SBPC.

[4] Charles-Louis de Secondat, barão de Montesquieu: Escritor e filósofo francês, célebre pela sua teoria da separação dos poderes. Nasceu no Palacete de la Brède, perto de Bordéus, em 18.01.1689; morreu em Paris, em 10.02.1755. Filho de um oficial da guarda do rei de França, neto e sobrinho de um Presidente do Parlamento de Bordéus, ficou órfão de mãe aos 11 anos de idade. Em 1716, por ocasião da morte de seu tio, tornou-se barão de Montesquieu e presidente no Parlamento de Bordéus. Em 1721 publicou as Cartas Persas, obra que lhe granjeou um enorme sucesso, e onde, aproveitando o gosto da época pelas coisas orientais, analisou de uma maneira satírica as instituições, usos e costumes da sociedade francesa e europeia, criticando veementemente a religião católica, naquela que foi a primeira grande crítica à igreja no século XVIII. O Espírito das Leis foi publicado em 1748, em dois volumes, em Genebra, para evitar a censura, tornando-se um imenso sucesso. Os tempos que se seguiram estiveram longe de serem sossegados, sendo as suas teorias atacadas tanto pelos jansenistas como pelos católicos ortodoxos, como os jesuítas, mas também pela Universidade de Paris, a célebre Sorbonne. Defendeu-se das críticas publicando em 1755 a Defesa do Espírito das Leis.

[5] Em 1787 reuniu-se na Filadélfia a Convenção Federal que elaborou uma nova Constituição para os Estados Unidos, propondo que esta substituísse os Artigos da Confederação, firmados em 1781, logo após a independência. O Federalista é resultado da reunião de uma série de ensaios publicados na imprensa de Nova York em 1788, com o objetivo de contribuir para a ratificação da Constituição Federal pelos Estados. Trata-se de obra conjunta de três autores: James Madison (1751-1836), Alexander Hamilton (1755-1804) e John Jay (1745-1829). James Madison (1751-1836), considerado o “pai” da Constituição dos Estados Unidos, nasceu na Virgínia, em uma antiga e influente família. Completou seus estudos no College of New Jersey, atual Universidade de Princeton, sendo eleito para o Congresso em 1780. Teve participação decisiva na Convenção Constitucional e em negociações internacionais do novo país, incluindo-se a compra da Louisiana aos franceses e o acordo com a Espanha sobre a livre navegação do Mississipi. Foi secretário de Estado durante o governo de Thomas Jefferson, junto com quem criou o Partido Republicano. Exerceu a Presidência dos EUA por dois mandatos. Alexander Hamilton (1757-1804) nasceu nas Antilhas e foi para a América com dezesseis anos de idade. Durante a Guerra da Independência, emergiu do anonimato como capitão de artilharia, depois tenente-coronel e, finalmente, ajudante-de-campo de George Washington, comandante-em-chefe do Exército rebelde. Depois da guerra, estudou Direito e exerceu a profissão em Nova York. Em 1782, entrou para o Congresso. Na Convenção Constitucional, liderou a facção favorável a um governo central forte, em detrimento do poder dos Estados. Depois da aprovação da Constituição, foi nomeado para o primeiro gabinete de Washington como secretário do Tesouro, criando então a infraestrutura financeira do Estado americano. John Jay (1745-1829), filho de um abastado comerciante de Nova York, estudou na Universidade de Columbia. Jurista e diplomata, estabeleceu sólida reputação intelectual ainda durante a dominação inglesa. Foi autor da Constituição de seu Estado natal, promulgada em 1777 e importante fonte de ideias para a Constituição Federal. Presidiu o Congresso Continental em 1778. Em 1783, como ministro das Relações Exteriores, foi o principal arquiteto do tratado de paz com a Grã-Bretanha, tornando-se em seguida o primeiro presidente da Suprema Corte dos Estados Unidos. Depois de dois mandatos como governador de Nova York, retirou-se da vida pública (LIMA, 2011).

[6] Cristina M.M. Queiroz (2002, p. 238) afirma que os tribunais constitucionais vêm assumindo, de forma cada vez mais significativa, por meio das sentenças interpretativas (aditivas, substitutivas, constitutivas etc.), funções de legislador positivo, derivadas de razões estruturais, em virtude de mudanças produzidas no conjunto das instituições por força do Estado Democrático e Social. Para essa autora: “Com efeito, entre a atividade legislativa e a adição, oriunda do manuseio da exegese em harmonia com a Constituição, há um límpido e inegável ponto de distanciamento: é que, ao contrário do que acontece com o legislador, não se tem a elaboração de uma norma jurídica, com a discrição àquele peculiar, mas tão-só o complemento da existente, a partir de solução constante do sistema jurídico, cuja descoberta se deve ao labor do intérprete. Há, sem margem de dúvida, atividade de criação jurídica, sem embargo de inexistir típica ação legislativa”.

[7] Sobre política pública, o autor mexicano Parada (2006, p. 67-96), discorre a respeito do perfil de uma política pública de excelência, a partir do qual se torna possível minimamente verificar, por contraste fático, se dada política apresenta em sua arquitetura a perspectiva de primar pela qualidade. Assim, segundo esse autor, deve-se tomar em conta: a um, se sua elaboração se embasa em ampla fundamentação ou somente em fundamentação específica – delimitando-se sobre o que se trata e aonde se espera chegar, quais os objetivos e os fins a alcançar; a dois, a criteriosa estimativa de custos e o levantamento de alternativas ao financiamento da política; a três, o relacionamento dos fatores para a avaliação em termos de custo-benefício social; a quatro, o beneficio social marginal, comparado com o de outras políticas, de modo a identificar o que se faz prioritário; a cinco, a consistência interna da estrutura da política, assim como a agregada; vale dizer, que se possa trazer a título de incremento; a seis, a potencialidade que a política apresenta de conquistar apoios ou de atrair críticas, dos meios políticos, acadêmico e corporativo; a sete, a avaliação em termos políticos do momento/oportunidade de adoção da política em análise; a oito, das prioridades, em termos de medidas a serem tomadas, dando corpo a uma sequência lógica; a nove, a clareza de definição dos objetivos; a dez, a funcionalidade dos instrumentos colocados à sua disposição; e, a onze, o levantamento adequado dos indicadores a servirem de parâmetro, como custos unitários, fatores de economia, medida de eficácia e eficiência.