O Meio Ambiente do Teletrabalho e as Doenças do Teletrabalhador

DOI: 10.19135/revista.consinter.00006.19

Maria de Lourdes C. de Almeida[1] – ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8721-943X

Maria Cristina C. de Almeida[2] – ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1128-1365

Maria Helena de Carvalho[3] – ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8118-2090

Resumo: Uma vez que o trabalho vem ocupando a maior parte do tempo do ser humano, o homem dedica uma parcela cada vez maior de sua vida em seu ambiente de trabalho e às atividades relativas a este. O meio ambiente do trabalho está mais presente na vida cotidiana do que qualquer outra situação. Com isso, as doenças do homem moderno estão mais relacionadas à suas atividades profissionais. Essa intensificação adoece os trabalhadores pelos excessos e pelas más condições oferecidas para a execução do trabalho. O meio ambiente do trabalho influi nas condições físicas, psicológicas e no desempenho do trabalhador. A qualidade de vida do cidadão depende, em grande escala, da qualidade do meio ambiente onde ele trabalha. No teletrabalho fatores do meio ambiente do trabalho estão relacionados às ocorrências de doenças ocupacionais. A forma de organização e execução do teleatendimento traz em si peculiaridades no seu modus operandi que diferenciam o seu local de funcionamento interno, dos postos de trabalho convencionais. Nos chamados Call Centers, a condução da atividade e todas as demais estruturas fazem do meio ambiente do teletrabalho, um campo rico para o desencadeamento de doenças físicas e psicológicas nos trabalhadores, segundo dados estatísticos do Instituto Nacional de Seguridade Social – INSS. Um dos primeiros trabalhos abordando o tema foi o artigo La névrose des téléphonistes[4] de Louis Le Guillant. O Projeto de Lei PL 6.787/2016 que tramita no Senado traz algumas regulamentações sobre a categoria profissional do teletrabalho, sem entretanto abordar questões relativas ao meio ambiente laboral.

Palavras-chave: Direito do Trabalho; Meio ambiente do trabalho; Teletrabalho.

Abstract: Since work is occupying most of the time of the human being, man devotes an increasing portion of his life to his work environment and activities related to it. The working environment is more present in everyday life than any other situation. With this, the diseases of modern man are more related to his professional activities. This intensification sickens the workers for the excesses and the poor conditions offered for the execution of the work. The work environment influences the physical, psychological and performance conditions of the worker. The quality of life of the citizen depends, to a great extent, on the quality of the environment in which he works. In teleworking environmental factors of work are related to the occurrences of occupational diseases. The form of organization and execution of the tele-service has in itself peculiarities in its modus operandi that differentiate its place of internal operation, of the conventional workstations. In the Call Centers, the conduction of the activity and all other structures make the environment of teleworking a rich field for the triggering of physical and psychological illnesses in the workers, according to statistical data of the National Institute of Social Security. One of the earliest works addressing the subject was the article La névrose des téléphonistes[5] by Louis Le Guillant. The Law Bill 6787/2016 that is processed in the Senate brings some regulations on the professional category of telework, without however addressing issues related to the working environment.

Keywords: Labor Law; Work Environment; Telefinery.

INTRODUÇÃO

Propõe-se por meio do presente estudo analisar a relação entre o meio ambiente do teletrabalho e o surgimento das doenças do teletrabalhador, com ênfase no estudo da adequação das Normas de Proteção à Saúde do Trabalhador diante das novas tendências mundiais de organização do Trabalho humano subordinado praticado por intermédio das Tecnologias da Informática e Comunicação, investigando a eficácia da normatização abstrata que reveste o conteúdo do Meio Ambiente do Teletrabalho em sua higidez, sob sua dimensão concreta.

A categoria do Teletrabalhador foi escolhida não só por ser historicamente recente, como também pela peculiaridade de cumular as tarefas inerentes a outras categorias profissionais mais antigas, como as de telefonista, recepcionista, vendedor, técnico e várias outras.

As pesquisas são direcionadas ao teletrabalhador dos chamados Call Centers, ou seja, lugares de prestação de serviços no estabelecimento do empregador. Porque no trabalho realizado no domicílio do Empregado, ainda que estejam presentes os requisitos da relação empregatícia, como subordinação, pessoalidade e habitualidade, para o teletrabalho em domicílio a análise e supervisão das condições do Meio Ambiente laboral do teletrabalhador remoto ficariam demasiadamente prejudicadas pela ínsita privacidade do domicílio, uma conquista civilizatória ocidental.

Mas não só por este motivo, e principalmente pela constatação de que 90% dos Teletrabalhadores do mundo se encontram nos calls centers, conforme demonstram estudos da International Telework Academy[6].

Serão descritas as normas regulamentadoras brasileiras sobre o meio ambiente do trabalho e demais normas de interesse interdisciplinar e observados estudos de autores diversos sobre o meio ambiente do trabalho e o seu impacto na saúde e qualidade de vida do teletrabalhador.

A metodologia utilizada na elaboração deste trabalho será a de consulta às fontes bibliográficas pertinentes ao tema, traduzidas nas obras gerais e específicas de autores brasileiros sobre o tema Direito Ambiental do Trabalho, teletrabalho. Serão analisados os dispositivos legais no que diz respeito ao enfrentamento da questão da higidez do meio ambiente do teletrabalho.

1 O MEIO AMBIENTE DO TRABALHO

O meio ambiente de trabalho adequado e seguro é primordial para o trabalhador enquanto cidadão porque a ele também está condicionada a sua saúde. É assegurado ao trabalhador o direito à “[…] redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança”, ao teor do art. 7°, inc. XXII da nossa Carta Magna.

No comentário de Venosa: “[…] nesse quadro do direito ambiental, despontam os chamados Direitos Difusos, porque a proteção não cabe a um titular exclusivo nem em um interesse individual, mas se estende difusamente sobre a coletividade e cada um de seus integrantes[7].

Na opinião de Melo: “[…] o Direito Ambiental do Trabalho constitui direito difuso fundamental inerente às normas sanitárias e de saúde do trabalhador (CF, art. 196), que, por isso, merece a proteção dos Poderes Públicos e da sociedade organizada, conforme estabelece o art. 225 da Constituição Federal[8].

À observação destes conceitos pode-se extrair a tendência na evolução do conceito de meio ambiente do trabalho, que toma uma conotação transindividual e de interesse difuso, o que permite que se garanta a sua proteção inclusive por meio de ação civil pública. Sob esta ótica, o meio ambiente de trabalho saudável e seguro representa um direito dos trabalhadores e da sociedade.

Antes da década de 1980, o conceito de meio ambiente trazia em si apenas referências sobre o meio físico e natural onde vivemos. No ano de 1981, com a promulgação da Lei 6.938/1981, uma definição de meio ambiente passou a constar em seu art. 3º, a saber: “[…] O conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”.

Entretanto ao longo de algumas décadas este conceito foi se aprimorando, agregando fatores igualmente indispensáveis à sua análise, como o ser humano e o impacto de sua presença e interferência neste meio físico natural. Juntamente com a evolução deste conceito, ocorreu a evolução do ordenamento jurídico no mesmo sentido.

Especificamente em relação ao meio ambiente do trabalho, encontra-se elencada no texto constitucional brasileiro uma referência expressa, ao teor do disposto em seu art. 200, inc. VIII, que atribui ao Sistema Único de Saúde a “[…] ação de colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho”, reconhecendo assim a necessidade de vigilância e proteção ao meio ambiente do trabalho e à saúde do trabalhador.

Desta forma foi sinalizada a preocupação do legislador com a proteção do meio ambiente de trabalho como sendo um direito fundamental a ser assegurado constitucionalmente, e um dever do Estado e da coletividade em preservá-lo, com vista à promoção eficaz da dignidade da pessoa humana. Elevando-o à categoria de direito fundamental, eleva também à categoria de cláusula pétrea a proteção à saúde do trabalhador, bem como de todo e qualquer destinatário das normas constitucionais.

Santos define meio ambiente do trabalho como “[…] O conjunto de fatores físicos, climáticos ou qualquer outro que interligados ou não, estão presentes e envolvem o local de trabalho da pessoa[9].

No mesmo sentido da preocupação com a abrangência do tema, uma definição mais específica de meio ambiente laboral por palavras de Mancuso[10], que reconhece como: “[…] habitat laboral tudo o que envolve e condiciona, direta e indiretamente, o local onde o homem obtém os meios para prover o quanto necessário para a sua sobrevivência e desenvolvimento, em equilíbrio com o ecossistema”.

Machado[11] também enfatiza a amplitude desta expressão, definindo meio ambiente de trabalho como “[…] o conjunto de condições internas e externas do local de trabalho e sua relação com a saúde do trabalhador”.

Para Brandão[12], meio ambiente do trabalho é: “[…] o conjunto de todos os fatores que, direta ou indiretamente, se relacionam com a execução da atividade do empregado, envolvendo os elementos materiais (local de trabalho em sentido amplo, máquinas, móveis, utensílios e ferramentas) e imateriais (rotinas, processos de produção e modo de exercício do poder de comando do empregador)”.

Segundo Brandão[13]: “Trata-se de conceito jurídico indeterminado, propositadamente inserido pelo legislador, com o fim de criar um espaço positivo de incidência da norma, evitando que ficassem fora do alcance do conceito numerosas situações que normalmente seriam nele contempladas, caso houvesse uma definição precisa”.

As definições convergem no sentido de que o meio ambiente do trabalho pertence ao conceito mais amplo de meio ambiente, devendo como tal ser amparado pela legislação, que deve estabelecer as regras e assegurar os meios necessários para garantir a qualidade de vida do cidadão trabalhador.

O meio ambiente do trabalho tem sua importância para a saúde do cidadão e da sociedade, porque nele se projeta grande parte da vida do trabalhador, cuja qualidade de vida está em dependência da qualidade de vida daquele ambiente. Também presente na definição de Canasiro[14] a preocupação com a importância do termo na saúde social, assim “o meio ambiente de trabalho sadio encontra-se inserido entre os valores mais preciosos para o ser humano, a ser preservado pelas diversas instituições sociais”.

O que se extrai de comum nas definições é a preocupação em ressaltar a importância do meio ambiente do trabalho saudável para a vida e saúde do trabalhador enquanto cidadão.

2 TELETRABALHO

O teletrabalho é um setor de expansão recente, no Brasil e no mundo. Vem sendo cada vez mais utilizado nos setores de telefonia, serviços de utilidade pública, bancos, indústrias, comércio e outros, caminhando a passos largos e ganhando crescente importância no aspecto econômico mundial.

Sobre o crescimento do atendimento informatizado sinaliza Carrillo[15]:

[…] Cada día nace un sinnúmero de actividades, en las que en mayor o menor medida se deben utilizar los apoyos informáticos, que generan situaciones de distintos índoles, como: la economía de los costes; rapidez en la ejecución de las prestaciones; cambio en las costumbres laborales; globalización económica; renovación infinita de infraestructuras y programas, y reconversión de empleos.

A crescente demanda atual em inúmeros ramos da economia, sinaliza que esta forma de trabalho tende a crescer e de forma irreversível em todos os setores e em todo o mundo, por diversos motivos, conforme justifica Planterose[16]:

[…] nous entrons dans celle Du numérique permettant aux outils d’interagir avec notre cerveau pour traiter et échanger des informations, manipuler lês médias, rendre lês objets virtuels, créer des robots intelligents et demain, qui sait? Nous marchons vers une nouvelle ére ou pouvoir travailler à distance gracê aux technologies de l’information va modifier em profondeur notre maniére d’appréhender nos conditions de vie[17] .

Segundo dados do Sindicato dos Trabalhadores em Telemarketing – Sintratel[18] houve um crescimento de 550% de postos de teletrabalho somente na última década, empregando mais de um milhão de pessoas.

O teleatendimento passou a ser de grande importância para a manutenção de alguns segmentos de empresas no mercado diante das novas estruturas de produção e de economia. Esta nova forma de organização e de execução de trabalhos surgiu da união de duas tecnologias, a da telefonia e da informática.

Na prática seu processo de produção se baseia em formas de controle exacerbadas não só do tempo em que o trabalhador permanece em seu posto de trabalho, mas também do trabalhado executado em si, quantificação dos atendimentos, produção e número de interações, o que de acordo com a Revista de Saúde Ocupacional[19], “[…] transformou o setor de teleatendimento em emblema do processo mundial de intensificação do trabalho”.

Na legislação brasileira pode-se encontrar o conceito de teletrabalho conforme descrição constante no Código Brasileiro de Ocupações, elaborado pelo Ministério do Trabalho e Emprego. Os teletrabalhadores tem seu enquadramento no referido código sob o n. 4223 – Operadores de Telemarketing. Este Código subdivide os teletrabalhadores de acordo com suas tarefas, classificando-os em quatro categorias[20]: operador ativo, ativo e receptivo, receptivo e técnico.

O teleatendimento também tem definição no Anexo II da Norma Regulamentadora 17[21] nos seguintes termos:

1.1.2. Entende-se como trabalho de teleatendimento/telemarketing aquele cuja comunicação com interlocutores clientes e usuários é realizada à distância por intermédio da voz e/ou mensagens eletrônicas, com a utilização simultânea de equipamentos de audição/escuta e fala telefônica e sistemas informatizados ou manuais de processamento de dados.

Para o escritor francês Philippe Plantherose[22], a atividade de teleatendimento, assim como o profissional teletrabalhador podem ser definidos como:

Le télétravail est une forme d’organisation et/ou de réalisation du travail, utilisant les techonologies de l’information dans le cadre dum contrat de travail et dans laquelle um travail, qui aurait egalement pu é être réalisé dans les locaux de l’employeur, est effctué hors de ces locaux de façon régulière […] Le télétravailleur designe toute personne salarièe de l’entreprise qui effectue soit dès l’embauche,soit ultérieurentemet du télétravail tel que defini au premier alínea[23].

Algumas das doenças do teletrabalhador, ou seja, doenças cujo surgimento possui uma relação de nexo causal com o exercício do teletrabalho, já figuram no rol de doenças ocupacionais do INSS.

De acordo com a Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, estudos sobre as repercussões na saúde dos operadores de teletrabalho tem demonstrado sofrimento mental, DORT[24], entre outras[25].

O sofrimento mental foi documentado primeiramente na França, no ano de 1956 na publicação do artigo Le Nevrose Des Telefonistes[26], e identificado a partir de sintomas como fadiga, insônia, cefaleia, tensão nervosa e violento nervosismo. Neste estudo são destacados dois elementos cruciais ao adoecimento destas trabalhadoras: a exigência do rendimento e o excesso de controle nos postos de trabalho.

As doenças osteomusculares relacionadas ao trabalho e lesões por esforço repetitivo são as de maior ocorrência no meio ambiente do teletrabalho.

A Norma Técnica Sobre Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho – DORT, aprovada pela Instrução Normativa 98, de 05.12.2003 da Diretoria Colegiada do Instituto Nacional do Seguro Social[27] faz referência expressa ao Decreto 3.048/1999, Anexo II e da Portaria 1.339/1999 elaborados pelo Ministério da Previdência Social e o Ministério da Saúde, descreve as Doenças do Sistema Osteomuscular e do Tecido Conjuntivo, inclusive de forma exemplificativa, reconhecendo a tenossinovite, a tendinite, a epicondilite e a bursite como doenças do trabalho. Ao teor desta:

[…] A sobrecarga pode ocorrer seja pela utilização excessiva de determinados grupos musculares em movimentos repetitivos com ou sem exigência de esforço localizado, seja pela permanência de segmentos do corpo em determinadas posições por tempo prolongado, particularmente quando essas posições exigem esforço ou resistência das estruturas músculo-esqueléticas contra a gravidade. A necessidade de concentração e atenção do trabalhador para realizar suas atividades e a tensão imposta pela organização do trabalho são fatores que interferem de forma significativa para a ocorrência das LER/DORT[28].

Estas características fazem do meio ambiente do teletrabalho um lugar de potencial risco de desenvolvimento de doenças relacionadas ao trabalho.

3 LEGISLAÇÃO

A proteção do meio ambiente do trabalho saudável tem amparo em dispositivos legais por todo o mundo, seja por meio da Organização Internacional do Trabalho ou por Tratados e Convenções firmados com outros Organismos Internacionais. No Brasil além dos Tratados e Convenções firmados encontramos também previsão para o tema na Constituição da República Federativa do Brasil e na Consolidação das Leis do Trabalho.

Aguardando apreciação do Senado Federal, está o Projeto de Lei PL 6.787/2016, que entre outros temas, legisla sobre teletrabalho em seu Título II, Capítulo II-A, em seus arts. 75-A ao 75-E.

Estabelece normas principalmente a respeito de previsões contratuais, determinando no art. 75-B que a modalidade de teletrabalho seja definida expressamente no contrato de trabalho, assim como a especificação das atividades a serem realizadas.

Neste artigo, norma faz predominar a categoria de contrato sobre o princípio da primazia da realidade, que impera no direito material do trabalho.

Há uma tentativa de se retroceder à uma conquista civilizatória da predominância do fenômeno do trabalho subordinado, da essência sobre a fórmula, com a submissão ao contrato.

No art. 75-C e seus parágrafos, a norma prevê a possibilidade de alteração de regime entre presencial e teletrabalho, por acordo mútuo ou por determinação do empregador, garantindo prazo mínimo de transição em quinze dias e exigido correspondente registro em aditivo contratual.

Neste ponto, a norma parte do princípio da igualdade entre as partes, o que não se verifica na relação trabalhista, posto que esta relação é reconhecidamente de subordinação, onde não há autonomia da vontade do empregado no mútuo acordo. Demonstração disto é expressa no mesmo artigo, em seu § 2º, onde, a determinação do empregador se faz suficiente para a alteração do regime de trabalho.

É determinado no art. 75-C que sejam previstas em contrato escrito as responsabilidades pela aquisição e manutenção dos equipamentos e da infra-estrutura necessária, bem como reembolso de despesas do empregado.

Novamente a norma conhece somente aquilo que está pactuado. O contrato é uma abstração. Na realidade brasileira existe, não raramente, o contrato tácito que não precisa ser reduzido a termo.

Por fim, o art. 75-E, determina que o empregador deverá instruir os empregados de maneira expressa e ostensiva quanto à sua própria segurança e saúde, estabelecendo que o empregado deverá assinar termo de responsabilidade e compromisso em seguir as instruções recebidas.

Neste artigo, a natureza genérica, abrangente que qualquer lei deve ter, isto é, não casuística e com escopo de alcance público, comum, é obliterada pela redução a um mero regulamento de empresa no qual são instituídas normas minuciosas disciplinares.

No parágrafo único observa-se a propensão ao descomprometimento do empregador com o meio ambiente do trabalho.

Na prática atualmente, é obrigação do empregador assegurar a higidez do meio ambiente do trabalho, pois em sede de relação jurídica material de emprego, o Empregador é aquele que atua “assumindo os riscos da atividade econômica” como expressamente previsto no disposto no caput do art. 2º da Consolidação das Leis do Trabalho. E ao teor de Constituição da República Federativa do Brasil, cabe ao Empregador a manutenção da higidez no Meio Ambiente do Trabalho (CRFB, art. 200, VIII; CLT, art. 157, I e II; e Portaria 3.214, de 08.06.1978).

Com a promulgação desta Lei, a quem caberá a efetiva manutenção da higidez do Meio Ambiente do Trabalho?

A apresentação do PL 6.787/2016 reflete a atenção com o tema e o intuito de regulamentação. Entretanto pontos importantes ainda precisam ser abordados, como o meio ambiente do trabalho, higiene, saúde e segurança do trabalhador, entre outros. No PL 6.787/2016 se observa o engrandecimento do poder disciplinar do empregador.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O meio ambiente do teletrabalho assim entendido como o conjunto de fatores que envolvem direta e indiretamente a execução das atividades, possui potencial risco de desenvolvimento de doenças osteomusculares entre outras. Seja por questões ergonômicas, seja pela execução de várias tarefas sobrepostas ou pela tensão, o meio ambiente de trabalho dos call centers tem contribuído para o adoecimento de teleatendentes, conforme corroboram estatísticas do INSS[29], principalmente ao exame do número de doenças que possuem nexo causal com o teletrabalho em comparação com doenças da mesma origem fisiológica, que não possuam relação com as tarefas inerentes à categoria profissional do teletrabalhador.

A qualidade do meio ambiente de trabalho influi na saúde e na vida do cidadão.

Na construção de um meio ambiente do teletrabalho mais seguro deve-se observar os fatores de risco[30], e também todos os outros enfoques, inclusive econômico, pois as despesas com os trabalhadores doentes, afastados ou por processos e indenizações trabalhistas não são imediatamente relacionados às condições do meio ambiente de trabalho e nem computadas em virtude deste.

O Projeto de Lei 6.787, surge demarcando uma nova fase na regulamentação do teletrabalho, entretanto se inclina ao trabalho remoto, não trazendo mudanças significativas ao meio ambiente de teletrabalho dos chamados call centers.

Apesar da importância que representa a normatização, agora fruto de processo legislativo, posto que antes eram meras normas de natureza administrativa, esta Lei, da forma como se apresenta hoje, consubstancia um retrocesso social na proteção ao trabalhador, que foi uma conquista da sociedade.

Contudo solidificadas como um ponto de partida, também estas regras podem a qualquer tempo ser aperfeiçoadas e complementadas.

As tecnologias da informação e da comunicação quebraram fronteiras e instituíram uma nova era na existência da globalização. O desafio consiste em equilibrar suas vantagens com o limite da segurança deste novo meio ambiente de trabalho para a saúde do teletrabalhador.

REFERÊNCIAS

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VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2013.

Notas de Rodapé

[1] Doutora pela Universidad Del Museo Social Argentino. Advogada graduada pela Universidade Federal Fluminense. Servidora no Departamento de Direito Público – Faculdade de Direito – Universidade Federal Fluminense. Curriculo Lattes disponível em: <http://lattes.cnpq.br/8772650317513258>.

[2] Licenciatura em Enfermagem. Graduada pela Universidade Luiza de Marillac. Pós-graduanda em Enfermagem do Trabalho. Enfermeira no Hospital Santa Martha.

[3] Doutora em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad Del Museo Social Argentino. Graduada em Direito pela Faculdade de Direito do Sul de Minas. Pós-graduada em Direito Empresarial/PUC-MG, Gestão Estratégica de Marketing/PUC-MG e Comércio Exterior. Professora universitária. Curriculo Lattes disponível em: < http://lattes.cnpq.br/9868541618610926>.

[4] LE GUILLANT; ROELENS; BEGOIN; BEQUART; HANSEN; LEBRETON. Le Nevrose Des Telefonistes. Disponível em: <https://pandor.u-bourgogne.fr/img-viewer/PK/03PK0930/iipviewer.html?base=mets&np=03PK0930_001.jpg&nd=03PK0930_024.jpg&monoid=PK-3-7-1-2-3-1&treq=&vcontext=mets&ns=03PK0930_001.jpg>. Acesso em: 26 maio 2017.

[5] LE GUILLANT; ROELENS; BEGOIN; BEQUART; HANSEN; LEBRETON. Le Nevrose Des Telefonistes. Disponível em: <https://pandor.u-bourgogne.fr/img-viewer/PK/03PK0930/iipviewer.html?base=mets&np=03PK0930_001.jpg&nd=03PK0930_024.jpg&monoid=PK-3-7-1-2-3-1&treq=&vcontext=mets&ns=03PK0930_001.jpg>. Acesso em: 26 maio 2017.

[6] ITA-LAC – International Telework Academy – capítulo América Latina y el Caribe. Disponível em: <http://ita-lac.fidt.org/?p=47>. Acesso em: 28 mar. 2015.

[7] VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2013. p. 87.

[8] MELO, Raimundo Simão. Direito ambiental do trabalho e a saúde do trabalhador. São Paulo: LTr, 2004. p. 97.

[9] SANTOS, Antônio Silveira R. Meio Ambiente do Trabalho: Considerações. Juris, set. 2000. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/1202/meio-ambiente-do-trabalho-consideracoes#ixzz2uWRuIiJ1>. Acesso em: 18 out. 2013

[10] MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Ação Civil Pública Trabalhista. 5. ed. São Paulo: RT, 2002. p. 58.

[11] MACHADO, Sidnei. O Direito à Proteção ao Meio Ambiente de Trabalho no Brasil. São Paulo: LTr, 2001. p. 27.

[12] BRANDÃO, Claudio. Acidente do Trabalho e Responsabilidade Civil do Empregador. 2. ed. São Paulo: LTr, 2007. p. 62.

[13] BRANDÃO, Claudio. Acidente do Trabalho e Responsabilidade Civil do Empregador. 2. ed. São Paulo: LTr, 2007. p. 63.

[14] CANASIRO, Soraya. In: GARCIA, Gustavo Felipe Barbosa. Meio Ambiente do Trabalho: direito, segurança e medicina do trabalho. São Paulo: Método, 2006. p. 11-12.

[15] CARRILLO, Djamil Tony Kahale. Las Nuevas Tecnologias en las Relaciones Laborales¿ Avance o Retroceso¿ Revista de Derecho Universidad del Norte, Colômbia, jul. 2006.

[16] PLANTEROSE, Philippe. Télétravail Travailler en Vivant Mieux. Paris: Eyrolles, 2014. p. 13.

[17] Nós entramos em uma era em que ferramentas digitais permitem interagir com nosso cérebro no processo de trocar informações, manipular a mídia, tornar objetos virtuais, permitindo criar robôs inteligentes e amanhã, quem sabe? Caminhamos em direção a uma nova era onde poderemos trabalhar à distância graças às tecnologias da informação, que vai modificar profundamente nossa maneira de aprender e nossas condições de vida (tradução nossa).

[18] SINTRATEL. Disponível em: <http://portalctb.org.br/site/secretarias-da-ctb-nacional/igualdade-racial/181-ctbpelosestados/13718-eleicoes-no-sintratel-sao-marcadas-pela-participacao-dacategoria>. Acesso em: 22 maio 2017.

[19] Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, Trabalho em Teleatendimento e Problemas de Saúde – Ministério do Trabalho e Emprego, São Paulo, dez. 2006, p. 12.

[20] Classificação Brasileira de Ocupações – 4223: Operadores de Telemarketing. Disponível em: <http://www.ocupacoes.com.br/pesquisar/?utf8=%E2%9C%93&q=4223>. Acesso em: 27 maio 2017.

[21] BRASIL. NR 17 – Norma Regulamentadora 17. Aprovada pela Portaria SIT 09-2007. Segurança e medicina do trabalho. 71. ed. São Paulo: Atlas, 2013. p. 324.

[22] PLANTEROSE, Philippe. Télétravail Travailler en Vivant Mieux. Paris: Eyrolles, 2014. p. 17.

[23]O teletrabalho é uma forma de organização e/ou de realização do trabalho, utilizando as tecnologias da informação e no quadro (contexto) de um contrato de trabalho e é também aquele trabalho que igualmente pode ser realizado nas instalações da entidade patronal e exercido fora destas condições de maneira regular (…) O teletrabalhador designa toda pessoa empregada de empresa que efetue suas tarefas utilizando qualquer dos instrumentos do teletrabalho, conforme definido na primeira alínea” (Tradução nossa).

[24] DORT – Doenças Osteomusculares Relacionadas ao Trabalho.

[25] PEREZ, Claudio Cezar. et al. Uma construção social: o anexo da norma brasileira de ergonomia para o trabalho dos operadores de telemarketing. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional. São Paulo, p. 35, 2006.

[26] LE GUILLANT; ROELENS; BEGOIN; BEQUART; HANSEN; LEBRETON. Le Nevrose Des Telefonistes. Disponível em: <https://pandor.u-bourgogne.fr/img-viewer/PK/03PK0930/iipviewer.html?base=mets&np=03PK0930_001.jpg&nd=03PK0930_024.jpg&monoid=PK-3-7-1-2-3-1&treq=&vcontext=mets&ns=03PK0930_001.jpg>. Acesso em: 26 maio 2017.

[27] Atualização clínica das lesões por esforços repetitivos (LER) distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT).

[28] BRASIL. Instrução Normativa 98, de 05.12.2003 da Diretoria Colegiada do Instituto Nacional do Seguro Social.

[29] Anuário Estatístico de Acidentes do Trabalho, 2013. Disponível em: <http://www.previdencia.gov.br/2015/01/estatisticas-anuario-estatistico-de-acidentes-do-trabalho-2013-ja-esta-disponivel-para-consutla/>. Acesso em: 23 nov. 2016.

[30] BRASIL. Instrução Normativa 98 INSS/DC, de 05.12.2003 – DOU 10.12.2003.