A EXTRADIÇÃO À LUZ DOS PRINCÍPIOS DE COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL PREVISTOS NO NOVO CPC

EXTRADITION IN THE LIGHT OF THE PRINCIPLES OF INTERNATIONAL LEGAL COOPERATION PROVIDED FOR IN THE NEW CPC

DOI: 10.19135/revista.consinter.00009.38

Inês da Trindade Chaves de Melo[1] – https://orcid.org/0000-0002-6849-3097

Nilton Cesar da Silva Flores[2] – https://orcid.org/0000-0003-2673-8233

Resumo: O presente artigo objetiva analisar a extradição à luz dos princípios de cooperação jurídica internacional previstos no Novo Código de Processo Civil. Para tanto, inicialmente, faz-se necessária a abordagem do conceito de extradição, vislumbrada como medida de cooperação internacional, bem como as exigências legais da Lei 13.445/2017 (Lei de Migração). Aliás, a abordagem da lei de migração é de suma importância por ter revogado o Estatuto do Estrangeiro, até então norma responsável por ditar as regras a serem observadas nos casos em concreto sobre a extradição. Na verdade, muito antes da abordagem do assunto principal, mister analisar os requisitos legais da nova lei que aborda a extradição, uma vez que sua análise é primordial para a chegada do tema sobre princípios, que são bases primordiais de análise de qualquer decisão sobre extradição. Em seguida, o artigo enumera os princípios próprios da cooperação internacional previstos no Novo Código de Processo Civil, diretamente ligados ao instituto da extradição, e também os compara ao Código Modelo de Cooperação Interjurisdicional para Ibero- -América, proposto como norte de adequação dos Estados-Membros quando o assunto é cooperação internacional, como o próprio nome diz. Por fim, o artigo estabelece um paralelo entre os princípios diretrizes da Lei de Migração, vislumbrando-se tudo isso em um caso em concreto, utilizando o método lógico-dedutivo.

Palavras-chave: Extradição. Código de Processo Civil. Lei Migração. Cooperação Interjurisdicional Ibero-América.

Abstract: The purpose of this paper is to analyze extradition in the light of the principles of international legal cooperation provided for in the New Code of Civil Procedure. To do so, it is initially necessary to approach the concept of extradition, viewed as a measure of international cooperation, as well as the legal requirements set forth in Law No. 13.445/2017 (Migration Law). As a matter of fact, the approach of the Migration Law is of the utmost importance, since it revoked the Statute of the Foreigner, which until then was the law responsible for dictating the rules to be observed in the specific cases of extradition. In fact, before we discuss the main subject, we must analyze the legal requirements of the new law that deals with this matter. This analysis is paramount for the subsequent topic of principles, which are significant bases for the analysis of any decision on extradition. Next, the paper describes the principles of international cooperation provided for in the New Code of Civil Procedure, as they are directly connected to the institute of extradition. These principles are then compared with the Model Code of Interjurisdictional Cooperation for Ibero-America, which is proposed as the guide for adequacy of the member states when the subject is international cooperation, as its name says. Lastly, the paper draws a parallel between the guiding principles of the Migration Law, illustrating all these aspects in a concrete case using the deductive logic.

Keywords: Extradition. Code of Civil Procedure. Migration Law. Interjurisdictional Cooperation Ibero-America.

1 INTRODUÇÃO

Denominações como “aldeia global”, “economia global”, “política global”, “governança global” e “mundo sem fronteiras” são apenas algumas das formas que têm sido empregadas para designar um dos mais impressionantes fenômenos intensificados no plano internacional nos últimos tempos: a “globalização[3].

Em decorrência dessa transnacionalidade, percebe-se que atualmente são inúmeros os fatos, atos e negócios jurídicos de caráter transnacional, seja pela ação dos Estados, seja por obra dos particulares, tornando-se impossível não voltar a atenção para as situações e os conflitos transnacionais oriundos desses relacionamentos.

Seguindo essa dinâmica internacional de aproximação dos Estados, é nesse contexto que a cooperação jurídica internacional tem ganhado destaque pelo mundo. Além dos tratados internacionais já conhecidos por sua lógica de acordo entre os Estados, hoje se reconhece a importância de um Estado cooperativo, capaz de colaborar com a ordem de outro país, não necessariamente através de um tratado.

Nesse sentido, nasce no nosso ordenamento jurídico a previsão sobre a cooperação jurídica internacional na novel legislação processual. Através dela, as novas decisões sobre extradição serão baseadas, já que o instituto estudado é uma modalidade de cooperação jurídica, conforme determina a Lei 13.445/2017 (Lei de Migração), responsável pela revogação do antigo Estatuto do Estrangeiro.

Após a discussão dos requisitos da extradição na Lei de Migração, é necessário não só estabelecer um paralelo com o Código Modelo de Cooperação Interjurisdicional para Ibero-América, modelo a ser seguido pelos Estados como forma de convergência do rito a ser seguido pela extradição, mas, sobretudo, realizar um comparativo dos princípios vetores que regem a extradição como uma das formas de cooperação jurídica internacional.

A partir disso, a metodologia de análise utilizada neste trabalho baseou-se na leitura e interpretação da doutrina, de onde se extraíram os fundamentos teóricos para a discussão do tema, por meio do método lógico-dedutivo. O objetivo foi o de trazer a técnica de hermenêutica para a concretização de tais direitos, colocando em prática a extradição como modelo de cooperação internacional, através dos ditames do Novo Código de Processo Civil (CPC).

2 NOÇÕES GERAIS SOBRE A EXTRADIÇÃO

A extradição é conceituada como o ato pelo qual um Estado entrega um indivíduo acusado de fato delituoso ou já condenado como criminoso à justiça de outro Estado, competente para julgamento e punição[4].

Formalmente, a definição de extradição está ligada ao processo pelo qual um Estado atende ao requerimento de outro Estado, enviando a pessoa processada no país solicitante por crime punido na legislação de ambos os países, não se extraditando, em regra, nacional do país solicitado[5].

Dessa forma, levando em consideração a extradição como um atributo de soberania (aspecto material) ou como um procedimento em observação ao interesse de outro Estado (aspecto formal), o instituto é o mecanismo da denominada cooperação internacional, possibilitando que as fronteiras políticas do Estado não funcionem como fator de impunidade e de não reparação da lesão provocada[6].

Nesse sentido, a extradição tem como meta a viabilização do processo, bem como o julgamento do autor do delito na forma da prescrição legal, além de possibilitar a execução da pena imposta na sentença condenatória. Em igual sentido, é necessária a existência de uma lei interna com a previsão dos requisitos de admissibilidade do pedido, além do rito a ser seguido até a decisão de mérito da pretensão de retirada do extraditando, na forma do princípio do nulla traditio sine lege[7].

Assim, a extradição é um ato de soberania estatal recorrente ao longo da história, tomando força nos tempos atuais devido à integração de certos lugares, o que facilitou a livre circulação de pessoas. É um instituto que tem como objetivo principal evitar, mediante cooperação internacional, que um indivíduo deixe de sofrer as consequências jurídico-penais de um crime cometido.

No entanto, para que o instituto da extradição se concretize, é necessário que esteja baseado em tratado, costume ou na promessa de reciprocidade de tratamento.

No Brasil, a extradição está prevista no art. 5º, incs. LI e LII da Constituição de 1988, sendo detalhada no Título IX da Lei 6.815/1980, chamada de “Lei dos Estrangeiros”, depois revogada pela Lei 13.445/2017 (Lei de Migração).

O objetivo do presente trabalho não é diferenciar a Lei dos Estrangeiros, revogada, da atual Lei de Migração. Vale tão somente consignar que a nova lei de migração foi uma tentativa do legislador de humanizar mais a relação entre o Estado brasileiro e o imigrante, já que a legislação anterior (Estatuto do Estrangeiro) tratava a pessoa que vinha de fora do Brasil como um potencial risco à segurança nacional. O resultado prático disso era uma grande dificuldade para o estrangeiro conseguir se estabelecer no país.

Com isso, fica sedimentado que podem ser extraditados todos os estrangeiros e brasileiros naturalizados com comprovado envolvimento em tráfico de drogas ou que sejam acusados de crimes comuns (nos naturalizados, o crime deve ter ocorrido antes da naturalização). Todavia, brasileiros natos não podem ser extraditados.

O jurista Francisco Rezek, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), em sua obra Direito Internacional Público: curso elementar, avalia a extradição como: “[…] a entrega, por um Estado a outro, e a pedido deste, de pessoa que em seu território deva responder a processo penal ou cumprir pena (…). A extradição pressupõe sempre um processo penal: ela não serve para a recuperação forçada do devedor relapso ou do chefe de família que emigra para desertar dos seus deveres de sustento da prole[8].

Nas lições do Professor Hildebrando Accioly: “Extradição é o ato mediante o qual um Estado entrega a outro Estado indivíduo acusado de haver cometido crime de certa gravidade ou que já se ache condenado por aquele, após haver-se certificado de que os direitos humanos do extraditando serão garantidos[9].

3 EXTRADIÇÃO NA CONSTITUIÇÃO E NA LEI DE MIGRAÇÃO: CONCEITO, DISPOSIÇÕES GERAIS, COMPETÊNCIA E PROCEDIMENTO

Definido o conceito de extradição pela doutrina, faz-se necessária a abordagem do aspecto do instituto pela Constituição e pela legislação aplicável, uma vez que os doutrinadores se apoiam tanto na Carta Magna quanto na Lei de Migração para a conceituação do instituto.

O § 2º do art. 12 da Constituição[10], em conformidade com o princípio da igualdade, veda o estabelecimento legal de qualquer distinção entre brasileiros natos e naturalizados, salvo casos previstos na própria Constituição. Um desses casos está relacionado ao ato de extradição, por meio do qual um Estado entrega a outro indivíduo acusado ou condenado pelo cometimento de crime grave, como já visto.

Como mencionado anteriormente e também previsto na Lei de Migração, conceitua-se a extradição como a medida de cooperação internacional entre o Estado brasileiro e outro Estado pela qual se concede ou solicita a entrega de pessoa sobre quem recaia condenação criminal definitiva ou para fins de instrução de processo penal em curso.

O instituto está previsto na referida lei e deverá ser requerido por via diplomática ou pelas autoridades centrais designadas para esse fim. A extradição e sua rotina de comunicação serão realizadas pelo órgão competente do Poder Executivo em coordenação com as autoridades judiciárias e policiais competentes, conforme previsão do art. 81 da Lei de Migração[11].

O art. 82[12] traz em seus incisos alguns requisitos que devem ser observados para que se verifique a possibilidade de extradição do indivíduo solicitada pelo Estado requerente.

Em primeiro lugar, deve-se verificar se a pessoa sobre quem recai pedido de extradição é brasileiro nato (art. 82, inc. II, da Lei 13.445/2017), cuja extradição é absolutamente vedada pela Constituição Federal (art. 5º, LI, CF/1988). O conceito de brasileiro nato está previsto no art. 12, I, da CF/1988, o qual dispõe também sobre as hipóteses de perda da nacionalidade do brasileiro (§ 4º)[13].

O segundo requisito norteador da extradição é a verificação da “dupla tipicidade”, tendo em vista que o fato imputado ao indivíduo deve estar previsto como crime tanto na lei brasileira quanto na lei do Estado requerente, consoante comando normativo do art. 82, II, da Lei 13.445/2017.

Em seguida, verifica-se se o Brasil possui jurisdição para julgar o crime imputado ao extraditando (art. 82, inc. III, da Lei 13.445/2017), ou seja, se ele é competente para processá-lo pelo delito em questão. Tal previsão decorre da possibilidade de extraterritorialidade da lei penal brasileira, como previsto nos casos do art. 7º do Código Penal[14], em que a lei brasileira seria aplicada a crimes cometidos no exterior.

Entretanto, não basta o mero concurso de jurisdições para que seja vedada a extradição do indivíduo. Deve-se tratar de caso de competência cumulativa em que tenha havido a deflagração da persecução penal no território nacional. Caso contrário, competência concorrente, sem o procedimento penal no Brasil – haverá a possibilidade de extradição, consoante já sedimentado pelo Supremo Tribunal Federal:

Concurso de Jurisdição e Inexistência, no Brasil, de Procedimento Penal-Persecutório Contra o Extraditando: Possibilidade de Deferimento do Pleito Extradicional. -Mesmo em ocorrendo concurso de jurisdições penais entre o Brasil e o Estado requerente, torna-se lícito deferir a extradição naquelas hipóteses em que o fato delituoso, ainda que pertencendo, cumulativamente, ao domínio das leis brasileiras, não haja originado procedimento penal-persecutório, contra o extraditando, perante órgãos competentes do Estado brasileiro. Precedentes[15].

Além disso, é vedada a extradição de indivíduo que comete crime cuja pena imposta pela lei brasileira seja inferior a 02 (dois) anos (art. 82, inc. IV, da Lei 13.445/2017). Esse requisito objetivo “tem como escopo aferir um mínimo grau de gravidade da conduta delituosa, evitando-se que a máquina estatal seja movimentada inutilmente[16].

Neste sentido, ressalta-se que a pena prevista pelo ordenamento jurídico do Estado requerente é irrelevante para aferição desse requisito, sendo que o critério objetivo deve ter como base a pena máxima cominada em abstrato para o delito, conforme previsto pela lei brasileira.

Ato contínuo, tem-se a positivação do princípio do non bis in idem (art. 82, inc. V, da Lei 13.445/2017), diante do qual se revela impossibilitada a extradição do indivíduo que responde ou já tenha sido processado (condenado ou absolvido) no Brasil, pelos mesmos fatos em que se fundam o pedido de extradição.

Na verdade, trata-se da hipótese do parágrafo anterior, pois tem-se a competência concorrente, com a deflagração da persecutio criminis no território brasileiro, impossibilitando a extradição.

Adiante, tem-se o requisito da “dupla punibilidade”, o qual exige a inocorrência da extinção da punibilidade estatal, seja pela lei brasileira ou pela estrangeira. O art. 82, VI, da Lei de Migração repetiu a omissão do revogado Estatuto do Estrangeiro, ao se referir apenas à prescrição como forma de extinção da punibilidade apta a vedar a extradição. Destaca-se que o Supremo Tribunal Federal já entendeu pelo alargamento das hipóteses ensejadoras da extinção da punibilidade, afirmando que “não se concederá a extradição, quando estiver extinta, em decorrência de qualquer causa legal, a punibilidade do extraditando[17].

Ademais, deve também ser observada a vedação à extradição de quem comete crime político ou de opinião, tendo o art. 82, VII, da Lei de Migração repetido a previsão do art. 5º, LII, da CF/1988.

O inc. VIII do art. 82 da Lei 13.445/2017, por sua vez, prevê a impossibilidade de extradição de pessoa que deva responder, no Estado requerente, perante tribunal ou juízo de exceção, devendo o Supremo Tribunal Federal verificar a competência constitucional do Tribunal processante, em vista dos princípios do Estado Democrático de Direito e da vedação constitucional ao juízo ou tribunal de exceção (art. 5º, XXVII, da CF/1988). Por derradeiro, não poderá ser extraditado o indivíduo beneficiário de refúgio ou de asilo territorial, sendo que a solicitação de refúgio suspende o processo de extradição que estiver pendente (art. 34 da Lei 9.474/1997). Deve-se sempre lembrar que tais requisitos serão aplicados, na existência de tratado de extradição, de maneira subsidiária, de forma que a análise deverá sem feita, em primeiro plano, com as disposições do tratado.

Além de conceituar e prever os casos em que a extradição não poderá ser concedida, a Lei de Migração também estipula em seu art. 83[18] as condições para a concessão do instituto, quais sejam ter sido o crime cometido no território do Estado requerente ou serem aplicáveis ao extraditando as leis penais desse Estado; e estar o extraditando respondendo a processo investigatório ou a processo penal ou ter sido condenado pelas autoridades judiciárias do Estado requerente a pena privativa de liberdade.

Assim, vislumbram-se os principais pontos sobre a extradição na Lei de Migração que, em conjunto com o Novo CPC, servirão para fundamentar as decisões sobre extradição.

4 A EXTRADIÇÃO COMO MEIO DE COOPERAÇÃO E OS PRINCÍPIOS NORTEADORES DA EXTRADIÇÃO: UMA ANÁLISE COM O NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Após as previsões de índole legal sobre o procedimento que norteia o instituto da extradição, cabe abordar seus princípios norteadores, uma vez que as decisões de autorização da extradição são calcadas nos princípios.

Sabe-se que o Novo CPC inovou com a previsão sobre a cooperação internacional, sendo também de fundamental importância para o processo de extradição, pois trouxe novos princípios capazes de auxiliar no teor fundamental do instituto ora estudado, demonstrando a importância dos princípios no ordenamento jurídico.

A importância fica demonstrada, pois, no Livro I, são abordados princípios constitucionais, bem como regras gerais, que dizem respeito a todos os demais Livros. A Parte Geral desempenha o papel de chamar para si a solução de questões difíceis relativas às demais partes do Código, já que contém regras e princípios gerais a respeito do funcionamento do sistema.

Segundo Egas Moniz de Aragão[19], a ausência de uma parte geral no Código de 1973, ao tempo em que promulgado, era compatível com a ausência de sistematização, no plano doutrinário, de uma teoria geral do processo. Afirmou o autor: “não se recomendaria que o legislador precedesse aos doutrinadores, aconselhando a prudência que se aguarde o desenvolvimento do assunto por estes para, colhendo-lhes os frutos, atuar aquele”.

Assim, além dos princípios próprios de cooperação jurídica internacional a serem observados no processo de extradição, por ser esse instituto uma modalidade de cooperação jurídica internacional, os princípios gerais do Novo CPC, previstos do art. 1º ao art. 12, também são aplicáveis à cooperação, naquilo que não afrontar a legislação do Estado participante.

Não cabe aqui destrinchar os princípios gerais previstos na legislação processual civil, mas tão somente consignar os princípios próprios da extradição, bem como aqueles previstos no art. 26, ou seja, próprios do sistema de cooperação jurídica. Por ora, o objetivo do presente trabalho é ressaltar os mais importantes, pois o foco é a conjuntura do Novo CPC quando o assunto é extradição.

O princípio fundamental da extradição é o princípio da especialidade, segundo o qual o extraditando não poderá ser processado e/ou julgado por crimes que não embasem o pedido de cooperação e que tiverem sido cometidos antes da extradição.

Aliás, presume-se também a importância desse princípio, pela previsão do art. 83 da Lei 13.445/2017. Tal disposição é considerada como condição para a concessão da extradição, como já mencionado. Além disso, também é disposição expressa no art. 31, inc. II, do Código Modelo de Cooperação Interjurisdicional para Ibero-América[20].

Cabe observar que o Código Modelo de Cooperação é uma importante ferramenta de padronização para os Estados seguirem no que tange ao tema, sendo complementar ao estipulado no Novo CPC.

Outro princípio norteador é a Dupla Incriminação do Fato ou Princípio da Identidade ou da Incriminação Recíproca, atestado pela necessidade de que o ato seja considerado crime tanto no país requerente quanto no país requerido, previsão constante no art. 82, inc. II, da Lei de Migração, bem como no art. 30, inc. II, do Código Modelo de Cooperação. Segundo Romeu Tuna Júnior:

Sua interpretação traduz-se na garantia de não infringência ao princípio da legalidade, ou seja, de que não pode haver um crime se não houver previsão legal assim o definindo. No caso dos pedidos de extradição, estes não se restringem, porém, à existência de previsão de tipos legais idênticos, mas também se a ação é típica e antijurídica nos dois ordenamentos jurídicos, excluindo-se, daí os delitos de natureza militar ou política[21].

Por fim, porém não menos importante, deve-se observar o princípio do non bis in idem, anteriormente já citado, uma vez que, se houver sentença condenatória transitada em julgado pelo crime que originou o pedido de extradição, esta não será concedida. Logo, a extradição de um indivíduo com pendências na justiça, em âmbito penal, traduz-se na cooperação entre dois Estados e nos esforços conjuntos dos Poderes Executivo e Judiciário, previsão expressa do art. 82, inc. V, da Lei de Migração.

Ultrapassados os princípios próprios da extradição, cumpre consignar que o Código Modelo de Cooperação também previu princípios inerentes ao dever de cooperação entre os Estados. Isso porque, conforme já mencionado, o tratamento diferente dado por cada Estado à cooperação interjurisdicional acaba sendo empecilho à efetividade da tutela judicial.

As regras de cada país ou as interpretações dadas a elas dificultam a aplicabilidade da extradição, o que seria solucionado com um código modelo, capaz de reunir uma maneira única de se concretizar a extradição, orientando o legislador de cada país[22].

Aliás, o Projeto de Código Modelo de Cooperação Interjurisdicional para Ibero-América previu, no art. 2º, princípios gerais de cooperação interjurisdicional, claramente aplicáveis ao instituto da extradição, como: cláusula de ordem pública internacional; garantia do devido processo legal; igualdade de tratamento entre nacionais e estrangeiros; não dependência da reciprocidade de tratamento, salvo previsão expressa no código; publicidade processual; existência de uma autoridade central; e espontaneidade na transmissão de informações[23].

Observados os princípios próprios da extradição, bem como os princípios gerais do Código Modelo, que não são específicos da extradição, mas, como mencionado, aplicáveis ao instituto, passa-se à análise da cooperação internacional prevista no Novo CPC, por ser a extradição um instituto considerado um instrumento destinado à cooperação internacional.

Em um mundo globalizado, caracterizado pelo aprofundamento e pela dinamização das relações transnacionais, observa-se nos últimos tempos o fortalecimento e a intensificação da cooperação jurídica internacional, o que pode ser confirmado pela proliferação de tratados sobre a matéria visando ao auxílio recíproco, inclusive com o estabelecimento de novos mecanismos de cooperação e aprimoramento daqueles já existentes. O Brasil se encontra plenamente inserido nesse ambiente, haja vista o grande número de tratados sobre a matéria dos quais o país é signatário[24].

Em virtude do estímulo da cooperação internacional e também da diretriz constitucional, o Novo CPC reservou um espaço específico e bastante significativo para o tratamento da cooperação jurídica internacional, especificadamente nos arts. 26 a 41, conferindo-lhe destaque no cenário nacional. Daí a importância da análise dos principais aspectos que envolvem a cooperação jurídica internacional, na forma disciplinada pelo Novo CPC, inclusive porque a extradição é uma forma de cooperação.

A nova legislação processual civil prevê que a cooperação jurídica internacional será regida por tratado de que o Brasil faz parte, conforme o caput do art. 26[25]. Na ausência de tratado internacional, poderá realizar-se com base em reciprocidade, manifestada por via diplomática, diante da previsão do art. 26, § 1º[26].

Ressalta-se que a previsão do art. 26, e seus incisos, do Novo CPC é muito similar aos princípios gerais previstos no Projeto de Código Modelo de Cooperação Interjurisdicional, o que acaba por ressaltar a importância deste último como norte a ser seguido pelos países signatários.

Alguns doutrinadores[27] afirmam que a previsão da reciprocidade como condição para a cooperação jurídica internacional quando ausente um tratado internacional entre dois Estados, estabelecida pelo Novo CPC no art. 26, § 1º, constitui um retrocesso nessa matéria. Embora o § 2º do mesmo artigo tenha estabelecido que não se exigirá a reciprocidade nos casos de homologação de sentença estrangeira, a exigência da reciprocidade para a cooperação em geral está na contramão dos sistemas mais avançados em cooperação jurídica internacional do mundo.

Nos dias de hoje, o que ocorre é justamente o contrário. Isso porque o princípio da não dependência da reciprocidade de tratamento, a exemplo do que consta na proposta de um Código Modelo de Cooperação Interjurisdicional para Ibero-América, em seu art. 2º, inc. IV, dispõe exatamente em sentido oposto a legislação processual brasileira, prevendo a não dependência da reciprocidade de tratamento, salvo previsão expressa no próprio Código.

Dessa forma, a não exigência de reciprocidade deveria ser a regra estabelecida pela novel legislação processual, pois tem como objetivo assegurar, em um contexto transnacional, o pleno exercício de direitos pertencentes a pessoas privadas, de modo a não sacrificá-las por culpa do Estado, que se omite em não oferecer reciprocidade. Evita-se com isso limitar indevidamente o acesso à tutela judicial transnacional. Da omissão em não firmar tratados ou oferecer reciprocidade devem resultar restrições de interesses tão somente do próprio Estado inerte e não aos particulares.

O art. 26 da legislação processual civil estabeleceu em seus incisos a base principiológica da cooperação jurídica internacional em que esteja envolvido o Estado brasileiro. O primeiro princípio abordado no artigo é o devido processo legal no Estado requerente, como se verifica no art. 26, inc. I, bem como no art. 5º, LIV, da Constituição Federal. Com isso, o pedido de cooperação ao Brasil que se inicia no país estrangeiro deverá observar os subprincípios que conformam o devido processo legal, como o contraditório, a ampla defesa, a produção de uma prova lícita e a vedação das provas ilícitas, e a publicidade dos atos processuais como regra.

O princípio do respeito às garantias do devido processo legal no Estado requerente constitui um desdobramento da cláusula de ordem pública internacional, previsto no art. 2º, inc. I, do Código Modelo de Cooperação, sendo que o desrespeito a esse princípio implica a negação do direito à tutela efetiva e verdadeira ofensa aos princípios fundamentais de um Estado[28].

O segundo princípio abordado pelo Novo CPC é o da igualdade de tratamento entre nacionais e estrangeiros, sejam estes últimos residentes ou não no Brasil, conforme menciona o art. 26, inc. II, bem como o art. 5º, caput. Assim, segundo esse princípio, todos deverão ter o mesmo tratamento e as mesmas oportunidades em relação ao acesso à justiça e à tramitação dos processos, assegurando-se ainda a assistência judiciária aos necessitados, que inclui as despesas processuais, notadamente aquelas realizadas com tradutores de documentos para a língua dos demandantes.

Dessa forma, o princípio da igualdade de tratamento está diretamente ligado e previsto também no art. 2º, inc. III, do Código Modelo de Cooperação e, com isso, mais uma vez a nova legislação processual civil prestigia o modelo adotado para cooperação internacional.

O terceiro princípio adotado pelo Novo CPC na parte específica de cooperação internacional é o princípio da publicidade processual, previsto no art. 26, inc. III, e no art. 5º, inc. LX, da Constituição Federal, exceto nas hipóteses de sigilo previstas na legislação brasileira ou do Estado requerente.

Observa-se que a regra é a publicidade dos atos que envolvem os pleitos de cooperação, que só será excepcionada pelas hipóteses constitucionais de imposição de sigilo previstas no ordenamento jurídico brasileiro e no estrangeiro. Cumpre consignar que a publicidade no Código Modelo atua como uma garantia complementar do devido processo legal e da ordem pública internacional, estando também prevista no art. 2º, inc. V, do referido código.

Outra observação tratada no Novo CPC é existência de uma autoridade central para recepção e transmissão dos pedidos de cooperação, prevista no art. 26, inc. IV. Trata-se de um órgão de comunicação estabelecido por cada Estado, previsto nos tratados internacionais, e que será o grande responsável pelo atendimento dos pedidos realizados, devendo facilitar a troca de informações e a prática dos atos processuais entre os países envolvidos na cooperação.

Estabelece o NCPC, no § 4º do art. 26, que o Ministério da Justiça exercerá as funções de Autoridade Central na ausência de designação específica em tratados internacionais. Ressalta-se que a previsão de uma autoridade central para recepção e transmissão dos pedidos de cooperação também é prevista no art. 2º, inc. VII, do Código Modelo de Cooperação. Este acrescenta, ainda, que a existência de uma autoridade central está ressalvada nos casos de convalidação da recepção ou na transmissão que não tenham sido perante essa autoridade.

Por último, o art. 26, inc. V, do Novo CPC prevê o princípio da espontaneidade (art. 2º, inc. VIII, do Código Modelo) na transmissão de informações a autoridades estrangeiras. Portanto, as informações na cooperação jurídica internacional poderão ser transmitidas independentemente do pedido, sendo esse o sentido que o código quis expressar com o vocábulo “espontaneidade”, isto é, para significar “espontaneamente”, por decisão unilateral do Estado que a presta.

Ressalta-se, por fim, que a observância do Novo CPC dá-se em caráter suplementar, uma vez que, no caso da extradição, deve ser observada a Lei de Migração. Ainda assim, verifica-se que na parte dos princípios, a legislação processual nada mais é que a complementariedade ideal para o processo do instituto ora estudado.

5 APLICABILIDADE DOS PRINCÍPIOS DA COOPERAÇÃO INTERNACIONAL DA LEGISLAÇÃO PROCESSUAL EM CASOS CONCRETOS DE EXTRADIÇÃO

Como já mencionado, os princípios desempenham papel fundamental no ordenamento jurídico, ainda mais no instituto da extradição, modalidade de cooperação jurídica internacional, capítulo previsto no Novo CPC. Com isso, é quase que certo que em qualquer decisão sobre extradição tenha-se a previsão dos princípios orientadores da cooperação jurídica internacional.

No dia 28.03.2017, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal[29] deferiu, por maioria de votos, a extradição da brasileira naturalizada americana Cláudia Cristina Sobral, requerida pelos Estados Unidos da América, a qual é acusada de ter atentado contra a vida de seu marido americano, Karl Hoering.

De acordo com a Nota Verbal 436/2016 – instrumento diplomático através do qual é requerida, dentre outras, a extradição e que possui presumida autenticidade –, Cláudia teria comprado um revólver calibre 357, marca Smith and Wesson, no dia 10.03.2007, e praticado tiro ao alvo, tendo adquirido munição no mesmo dia, após se informar sobre os diferentes tipos existentes no estande de tiro.

Em 12.03.2007, um dos vizinhos avistou Cláudia sair de sua residência e não retornou. Após três dias, parentes preocupados com a ausência de Karl Hoering entraram em contato com a polícia, sendo o corpo encontrado no dia 15 do referido mês.

A perícia realizada no corpo da vítima revelou que ela havia sido atingida por três disparos de arma de fogo – dois nas costas e um na cabeça –, existindo elementos que indicavam que a arma do crime fora a mesma adquirida por Cláudia poucos dias antes.

Por fim, Cláudia teria transferido a quantia de US$10.000,00 (dez mil dólares) para uma conta em nome de seu pai, no Brasil, para onde se evadiu pouco tempo depois. O Ministro Luís Roberto Barroso, relator da Extradição 1.462, asseverou que no ano de 2011 foi aberto, de ofício, Procedimento Administrativo perante o Ministério da Justiça que acabou por determinar a perda da nacionalidade brasileira de Cláudia, conforme Portaria Ministerial 2.465/2013.

No entanto, inconformada com a referida decisão, Cláudia impetrou o Mandado de Segurança 33.864, julgado pelo Supremo Tribunal Federal de 2016, o qual entendeu pela regularidade do procedimento administrativo, tendo denegado a ordem.

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, ao decidir pela possibilidade de extradição de Cláudia, deixou assentada algumas premissas, que devem ser analisadas à luz dos já citados requisitos presentes na Constituição Federal e na legislação infraconstitucional. Por óbvio, também será analisada a decisão com os preceitos do Novo CPC, o Código Modelo, bem como a Lei de Migração.

Primeiramente, os ministros partiram da premissa de que Cláudia não seria mais brasileira, como analisado e confirmado no julgamento do Mandado de Segurança 33.864, impetrado contra a Portaria Ministerial que decretou a perda da nacionalidade brasileira, como já informado.

Dentre outras questões abordadas na decisão, inclusive com relação aos tratados, destaca-se que o Brasil não seria competente para julgamento do crime, uma vez que o art. 7º, II, “b”, c.c., § 2º, do Código Penal requer a condição de brasileiro do sujeito ativo que pratica crime em território estrangeiro, também uma das exigências previstas no art. 77 do Estatuto do Estrangeiro (atual art. 82 da Lei de Migração).

Além disso, afirmou o Relator que não haveria que se falar na vedação de extradição para julgamento perante Tribunal ou Juízo de exceção, proibido tanto pelo art. 5º, XXXVII, da CF/1988, como pelo art. 82, inc. VIII, da Lei de Migração, eis que no caso da Extradição 1.462 tem-se o processamento por Juízo regularmente constituído.

Diante da verificação do preenchimento de todos os requisitos para a extradição, votou a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal no sentido de deferir a extradição, sob as seguintes condicionantes: não executar pena vedada pelo ordenamento brasileiro, pena de morte ou de prisão perpétua (previsão constante no próprio art. 26, inc. II, do Novo CPC); observar o tempo máximo de cumprimento de pena possível no Brasil, o que remete à previsão do art. 2º, inc. I, do Código Modelo; e detrair do cumprimento de pena eventualmente imposta o tempo de prisão para fins de extradição por força deste processo, em homenagem ao atual art. 26, inc. II, da novel legislação processual[30].

Dessa forma, como já mencionado, o primeiro requisito analisado pelo Supremo Tribunal Federal para a extradição de Cláudia Cristina foi a verificação da sua nacionalidade. A importância de se estabelecer a nacionalidade da extraditanda parte da vedação constitucional de extradição de brasileiro nato (art. 5º, LI, CF/1988), replicada não só na Lei de Migração (art. 82 da Lei 13.445/2017) como também no art. VII do Tratado de Extradição Brasil-Estados Unidos, de janeiro de 1961, internalizado pelo Decreto 55.750/1965, o qual é a fonte primária para análise dos requisitos da extradição, estando em consonância ao disposto no caput do art. 26 do Novo CPC.

No que tange à cláusula que veda a extradição de brasileiro nato presente no art. 5º, LI, da CF/1988, o Supremo Tribunal Federal[31] já decidiu que:

O brasileiro nato, quaisquer que sejam as circunstâncias e a natureza do delito, não pode ser extraditado, pelo Brasil, a pedido de governo estrangeiro, pois a CR, em cláusula que não comporta exceção, impede, em caráter absoluto, a efetivação da entrega extradicional daquele que é titular, seja pelo critério do jus soli, seja pelo critério do jus sanguinis, de nacionalidade brasileira primária ou originária. Esse privilégio constitucional, que beneficia, sem exceção, o brasileiro nato (CF, art. 5º, LI), não se descaracteriza pelo fato de o Estado estrangeiro, por lei própria, haver-lhe reconhecido a condição de titular de nacionalidade originária pertinente a esse mesmo Estado. (CF, art. 12, § 4º, II, a)

Como já mencionado, em virtude do julgamento do Mandado de Segurança 33.864, impetrado contra a Portaria Ministerial que decretou a perda da nacionalidade brasileira de Cláudia, os ministros observaram que ela não possuía mais a condição de brasileira nata, sendo, portanto, passível de extradição.

Dessa forma, verifica-se que o Supremo Tribunal Federal não decidiu pela extradição de brasileira nata, absolutamente vedado pela Constituição Federal de 1988, mas, sim, pela extradição de brasileira que perdeu sua nacionalidade originária ao adquirir, voluntariamente, nacionalidade norte-americana secundária.

Trata-se de um caso de extradição emblemático, no qual, por mais que se tenha aqui feito um paralelo com o determinado no Novo Código de Processo Civil, a decisão em si do Supremo Tribunal Federal não mencionou previsões da legislação processual civil, no intuito de prestigiar a inovação trazida pelo código sobre cooperação jurídica internacional.

Outro caso ocorrido foi o de Cesare Battisti. O Supremo Tribunal Federal[32] negou a extradição do italiano, em caráter liminar, diante da decisão anterior do Presidente da República em negar a extradição, tendo como fundamento o caráter de soberania nacional.

O Presidente da República eleito em 2018 afirmou a possibilidade de extradição do italiano, diante de novo pedido. A questão que fica é sobre a possibilidade de um Presidente da República rever ordem de um anterior. No caso, sabe-se que, na Itália, Cesare Battisti respondeu processo com todo o procedimento legal sendo respeitado.

No entanto, em 2011, o então presidente negou a extradição do italiano sob o argumento de que a prisão estaria fundamentada em crimes políticos. Diferentemente do alegado, percebe-se pelo Novo CPC que se deve respeito às garantias do devido processo legal do Estado requerente, conforme o art. 26, inc. I.

Além disso, não há proibição legal ou constitucional de revisão do Presidente da República responsável pelo novo pedido de extradição da decisão do Presidente anterior que negou a extradição, justamente pelo critério de soberania.

6 CONCLUSÃO

Por todo o exposto, o objetivo do texto foi abordar a influência do Novo CPC no instituto da extradição. Como se observou, a extradição é um instituto denominado como uma modalidade de cooperação jurídica internacional, como bem ressaltado pela Lei de Migração e pelo Código Modelo de Cooperação Interjurisdicional para Ibero-América.

Dessa forma, tratando-se a extradição de um modo de cooperação jurídica, nada mais lógico do que afirmar que os princípios insculpidos no art. 26 da novel legislação processual civil é aplicável ao instituto abordado.

No entanto, observou-se que apenas o Novo CPC é pouco para fundamentar as decisões sobre extradição, sendo necessário estabelecer um paralelo com a Lei de Migração e com o Código Modelo. Aliás, verifica-se que os princípios mencionados no art. 26 da legislação processual tem total relação com os princípios previstos nas outras duas normas mencionadas.

Além disso, concluiu-se também que os princípios gerais apresentados nos artigos sobre normas fundamentais no Novo CPC também devem ser observados pelo processo de extradição desenvolvido no Brasil, haja vista serem conteúdo de norma geral do código.

Dessa forma, a tendência que deve estar presente nas próximas decisões sobre o assunto é a abordagem dos princípios norteadores da cooperação jurídica internacional, até como forma de prestigiar o Novo CPC de 2015, uma vez que esse tema não era previsto no antigo Código de 1973.

REFERÊNCIAS

ACCIOLY, H. Tratado de Direito Internacional Público. São Paulo: Saraiva, 1956. v. 1.

_______; NASCIMENTO E SILVA, G. E. do; CASELLA, P. B. Manual de direito internacional público. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

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ARAÚJO, Nadia. A importância da cooperação jurídica internacional para a atuação do Estado brasileiro no plano interno e internacional. In: BRASIL. Secretaria Nacional de Justiça, Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI). Manual de cooperação jurídica internacional e recuperação de ativos: cooperação em matéria penal. 3. ed. Brasília: Ministério da Justiça, 2017.

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JIMÉNEZ DE ASÚA, L. Tratado de derecho penal. 3. ed. Buenos Aires: Losada, 1964. t. II.

MARQUES, J. F. Tratado de direito penal. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1964. v. 1.

MUZZI, T. Os mecanismos de cooperação jurídica internacional na nova lei de migração: extradição, transferência de execução da pena (TEP) e transferência de pessoas condenadas (TPC). Cooperação em pauta: informações sobre cooperação jurídica internacional em matéria civil e penal. Brasília, n. 30, ago. 2017 (2017e). Mensal. p.1-17. Disponível em: <http://www.justica.gov.br/sua-protecao/lavagem-de-dinheiro/institucional-2/publicacoes/cooperacao-em-pauta/cooperacao-em-pauta-n30>. Acesso em: 13 nov. 2018.

Revista CEJ. Brasília, a. XIX, n. 67, p. 18-34, set./dez. 2015.

REZEK, F. Direito internacional público: curso elementar. 10. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005.

Notas de Rodapé

[1] Desembargadora no Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro – TJRJ, Mestra e doutoranda do PPGD Estácio RJ, Coordenadora e professora do Curso de formação de magistrados da EMERJ.

[2] Doutor pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC, Professor Titular PPGD Estácio, Professor Associado da Universidade Federal Fluminense – UFF, Professor da Escola da Magistratura do RJ – EMERJ, Advogado e Árbitro internacional.

[3] Revista CEJ. Brasília, a. XIX, n. 67, p. 18-34, set./dez. 2015.

[4] ACCIOLY, H. Tratado de direito internacional público. São Paulo: Saraiva, 1956. v. 1, p. 422.

[5] DOLINGER, J. Direito internacional privado. Parte geral. 9. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 244-245.

[6] MARQUES, J. F. Tratado de direito penal. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1964. v. 1, p. 318.

[7] JIMÉNEZ DE ASÚA, L. Tratado de derecho penal. 3. ed. Buenos Aires: Losada, 1964. t. II, p. 887 e ss.

[8] REZEK, F. Direito internacional público: curso elementar. 10 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 240.

[9] ACCIOLY, H.; NASCIMENTO E SILVA, G. E. do; CASELLA, P. B. Manual de direito internacional público. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 126.

[10]§ 2º A lei não poderá estabelecer distinção entre brasileiros natos e naturalizados, salvo nos casos previstos nesta Constituição”.

[11]Art. 81. A extradição é a medida de cooperação internacional entre o Estado brasileiro e outro Estado pela qual se concede ou solicita a entrega de pessoa sobre quem recaia condenação criminal definitiva ou para fins de instrução de processo penal em curso.

§ 1º A extradição será requerida por via diplomática ou pelas autoridades centrais designadas para esse fim.

§ 2º A extradição e sua rotina de comunicação serão realizadas pelo órgão competente do Poder Executivo em coordenação com as autoridades judiciárias e policiais competentes” (BRASIL, 2017).

[12]Art. 82. Não se concederá a extradição quando:

I – o indivíduo cuja extradição é solicitada ao Brasil for brasileiro nato;

II – o fato que motivar o pedido não for considerado crime no Brasil ou no Estado requerente;

III – o Brasil for competente, segundo suas leis, para julgar o crime imputado ao extraditando;

IV – a lei brasileira impuser ao crime pena de prisão inferior a 2 (dois) anos;

V – o extraditando estiver respondendo a processo ou já houver sido condenado ou absolvido no Brasil pelo mesmo fato em que se fundar o pedido;

VI – a punibilidade estiver extinta pela prescrição, segundo a lei brasileira ou a do Estado requerente;

VII – o fato constituir crime político ou de opinião;

VIII – o extraditando tiver de responder, no Estado requerente, perante tribunal ou juízo de exceção; ou

IX – o extraditando for beneficiário de refúgio, nos termos da Lei nº 9.474, de 22 de julho de 1997, ou de asilo territorial.

§ 1º A previsão constante do inciso VII do caput não impedirá a extradição quando o fato constituir, principalmente, infração à lei penal comum ou quando o crime comum, conexo ao delito político, constituir o fato principal.

§ 2º Caberá à autoridade judiciária competente a apreciação do caráter da infração.

§ 3º Para determinação da incidência do disposto no inciso I, será observada, nos casos de aquisição de outra nacionalidade por naturalização, a anterioridade do fato gerador da extradição.

§ 4º O Supremo Tribunal Federal poderá deixar de considerar crime político o atentado contra chefe de Estado ou quaisquer autoridades, bem como crime contra a humanidade, crime de guerra, crime de genocídio e terrorismo.

§ 5º Admite-se a extradição de brasileiro naturalizado, nas hipóteses previstas na Constituição Federal”.

[13]§ 4º Será declarada a perda da nacionalidade do brasileiro que:

I – tiver cancelada sua naturalização, por sentença judicial, em virtude de atividade nociva ao interesse nacional;

II – adquirir outra nacionalidade, salvo nos casos:

a) de reconhecimento de nacionalidade originária pela lei estrangeira;

b) de imposição de naturalização, pela norma estrangeira, ao brasileiro residente em Estado estrangeiro, como condição para permanência em seu território ou para o exercício de direitos civis”.

[14]Art. 7º. Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro: (Redação dada pela Lei 7.209, de 1984)

I – os crimes: (Redação dada pela Lei 7.209, de 11.07.1984)

a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da República; (Incluído pela Lei 7.209, de 1984)

b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público; (Incluído pela Lei 7.209, de 1984)

c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço; (Incluído pela Lei 7.209, de 1984)

d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil; (Incluído pela Lei 7.209, de 1984)

II – os crimes: (Redação dada pela Lei 7.209, de 11.07.1984)

a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir; (Incluído pela Lei 7.209, de 1984)

b) praticados por brasileiro; (Incluído pela Lei 7.209, de 1984)

c) praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, quando em território estrangeiro e aí não sejam julgados. (Incluído pela Lei 7.209, de 1984)

§ 1º Nos casos do inciso I, o agente é punido segundo a lei brasileira, ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro. (Incluído pela Lei 7.209, de 1984)

§ 2º Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do concurso das seguintes condições: (Incluído pela Lei 7.209, de 1984)

a) entrar o agente no território nacional; (Incluído pela Lei 7.209, de 1984)

b) ser o fato punível também no país em que foi praticado; (Incluído pela Lei 7.209, de 1984)

c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição; (Incluído pela Lei 7.209, de 1984)

d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena; (Incluído pela Lei 7.209, de 1984)

e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável. (Incluído pela Lei 7.209, de 1984)

§ 3º A lei brasileira aplica-se também ao crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil, se, reunidas as condições previstas no parágrafo anterior: (Incluído pela Lei 7.209, de 1984)

a) não foi pedida ou foi negada a extradição; (Incluído pela Lei 7.209, de 1984)

b) houve requisição do Ministro da Justiça. (Incluído pela Lei 7.209, de 1984)

Pena cumprida no estrangeiro (Redação dada pela Lei 7.209, de 11.07.1984)”.

[15] Ext 683 – Tribunal Pleno – Rel. Min. Celso de Mello – j. em 20.11.1996 – DJe-222 20.11.2008 – Publicado em 21.11.2008 EMENT v. 02342-01, p. 00030.

[16] MUZZI, T. Os mecanismos de cooperação jurídica internacional na nova lei de migração: Extradição, transferência de execução da pena (TEP) e transferência de pessoas condenadas (TPC). Cooperação em pauta: informações sobre cooperação jurídica internacional em matéria civil e penal. Brasília, n. 30, ago. 2017 (2017e). Mensal. p.1-17. Disponível em: <http://www.justica.gov.br/sua-protecao/lavagem-de-dinheiro/institucional-2/publicacoes/cooperacao-em-pauta/cooperacao-em-pauta-n30>. Acesso em: 13 nov. 2018.

[17] Extradição 953 – Tribunal Pleno – Rel. Min. Celso de Mello. – DJe 11.11.2005. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/visualizarEmenta.asp?>. Acesso em: 22 nov. 2018.

[18]Art. 83. São condições para concessão da extradição:

I – ter sido o crime cometido no território do Estado requerente ou serem aplicáveis ao extraditando as leis penais desse Estado; e

II – estar o extraditando respondendo a processo investigatório ou a processo penal ou ter sido condenado pelas autoridades judiciárias do Estado requerente a pena privativa de liberdade”.

[19] ARAGÃO, E. M. Comentários ao Código de Processo Civil. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1991. v. 2, p. 8.

[20]Art. 31. Compromissos do Estado requerente.

A execução da decisão de extradição depende de compromisso do Estado requerente de que:

II – não será extraditado preso nem processado”.

[21] TUMA JUNIOR, R. Extradição: conceito, extensão, princípios e acordos internacionais. Revista Consultor Jurídico. São Paulo, 2008. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2008-set 15/conceitos_principios_acordos_extradicao>. Acesso em: 15 nov. 2018.

[22] Revista da EMARF, Rio de Janeiro, v. 11, p. 1-304, mar. 2009.

[23]Art. 2º. Princípios gerais. A cooperação interjurisdicional de que trata este Código está sujeita aos seguintes princípios: I. cláusula da ordem pública internacional: não será admitida a cooperação que se refira a atos contrários aos princípios fundamentais do Estado requerido ou que seja suscetível de conduzir a um resultado incompatível com esses princípios; II. respeito às garantias do devido processo legal no Estado requerente; III. igualdade de tratamento entre nacionais e estrangeiros, residentes ou não, tanto no acesso aos tribunais quanto na tramitação dos processos nos Estados requerente e requerido, assegurando-se a gratuidade de justiça aos necessitados; IV. não-dependência da reciprocidade de tratamento, salvo previsão expressa neste Código; V. publicidade processual, exceto nos casos de sigilo previstos na lei do Estado requerente ou do Estado requerido; VI. tradução e forma livres para os atos e documentos necessários à prestação jurisdicional transnacional, incluindo-se os meios eletrônicos e videoconferência; VII. existência de uma autoridade central para a recepção e transmissão dos pedidos de cooperação, ressalvada a convalidação da recepção ou transmissão que não tenham sido perante essa autoridade; VIII. espontaneidade na transmissão de informações a autoridades do Estado requerente”.

[24] Os tratados em matéria de CJI dos quais o Brasil é signatário podem ser consultados no sítio do Ministério da Justiça, no campo destinado aos assuntos relativos à Cooperação Internacional. Acesso em: 22 nov. 2018.

[25]Art. 26. A cooperação jurídica internacional será regida por tratado de que o Brasil faz parte e observará:

I – o respeito às garantias do devido processo legal no Estado requerente; II – a igualdade de tratamento entre nacionais e estrangeiros, residentes ou não no Brasil, em relação ao acesso à justiça e à tramitação dos processos, assegurando-se assistência judiciária aos necessitados; III – a publicidade processual, exceto nas hipóteses de sigilo previstas na legislação brasileira ou na do Estado requerente; IV – a existência de autoridade central para recepção e transmissão dos pedidos de cooperação; V – a espontaneidade na transmissão de informações a autoridades estrangeiras”.

[26]§ 1o Na ausência de tratado, a cooperação jurídica internacional poderá realizar-se com base em reciprocidade, manifestada por via diplomática”.

[27] ARAÚJO, Nadia. A importância da cooperação jurídica internacional para a atuação do Estado brasileiro no plano interno e internacional. In: BRASIL. Secretaria Nacional de Justiça, Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI). Manual de cooperação jurídica internacional e recuperação de ativos: cooperação em matéria penal. 3. ed. Brasília: Ministério da Justiça, 2017. p. 34.

[28] ALVIM, J. E. Carreira. Comentários ao novo Código de Processo Civil: Lei 13.105, de 16 de março de 2015. arts. 1º ao 81. Curitiba: Juruá, 2015. v. 1, p. 58.

[29] Notícias STF. Concedida extradição de brasileira naturalizada americana, acusada de assassinato, 28.03.2017. Disponível em: <http://stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=339354>. Acesso em: 15 nov. 2018.

[30] Extradição 1.462 – 1ª T. – Rel. Min. Roberto Barroso – DJe 29.06.2017. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/visualizarEmenta.asp?s1=000327385&base=baseAcordaos>. Acesso em: 22 nov. 2017.

[31] HC 83.113-QO – Rel. Min. Celso de Mello – j. em 26.06.2003 – Plenário – DJ 29.08.2003.

[32] Notícias STF. STF concede liberdade a Cesare Battisti. 28.03.2017. Disponível em: <http://stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=339354>. Acesso em: 22 nov. 2018.