A Assistência Social no Brasil: Instrumento de Efetividade dos Direitos Humanos

DOI: 10.19135/revista.consinter.00015.02

Recebido/Received 30/04/2022 – Aprovado/Approved 15/08/2022

Denise Tanaka dos Santos[1] – http://orcid.org/0000-0002-1440-5282

Ester Moreno de Miranda Vieira[2] – https://orcid.org/0000-0003-1049-6903

Roberta Soares da Silva[3] – https://orcid.org/0000-0001-8829-6907

Resumo

A partir do debate sobre pessoas que se encontram em estado de miserabilidade ou doentes, sem condições de garantir a sua própria subsistência e de sua família, o presente artigo tem por objetivo discutir o contexto da construção da seguridade social e da assistência social no Brasil, como instrumento de efetividade dos direitos humanos. Ressalte-se que a carência de produção acadêmica sobre o tema justifica a importância deste artigo. Assim, a partir de pesquisa bibliográfica e documental, o artigo busca problematizar e identificar o que há disponível no ordenamento normativo internacional e brasileiro que fornecem indagações para o debate, no Brasil, sobre a necessidade da construção dos direitos da assistência social para as pessoas necessitadas. Decorre disso a discussão acerca de como essa construção normativa poderia contribuir para a efetivação desse instrumento dos direitos humanos, apesar dos dados coletados no Portal da Transparência brasileiro, cujos resultados indicam especialmente a necessidade de implantação de novos instrumentos de atendimento em situação de vulnerabilidade, na direção dos avanços dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.

Palavras-chave: Assistência Social; Proteção Social; Seguridade Social.

Abstract

From the debate on people who are in a state of misery or sick, unable to guarantee their own subsistence and that of their family, this article aims to discuss the contexto of the construction of social securitu and social assistance in Brazil, as an instrument for the effectiveness of human rights. It should be noted that the lack of academic production on the subject justifies the importance of this article. Thus, based on bibliographic and documentar research, the article seeks to problematize and identify what is available in the international and Brazilian normative order that provide questions for the debate, in Brazil, about the need to build social assistance rights for people in need. This leads to the discussion about how this normative construction could contribute to the effectiveness of this instrument of human rights, despite the data collected in the Brazilian Transparency Portal, whose results especially indicate the need to implemente new instruments of assistance in situations of vulnerability, in the direction of progress towards the Sustainable Development Goals.

Keywords: Social Assistance; Social Protection; Social Security.

Sumário: 1. Introdução; 2. Os contornos constitucionais da assistência social no Brasil e a estrutura descentralizada de atendimento; 2.1. Os contornos constitucionais da Seguridade Social brasileira; 2.2. Os contornos constitucionais da Assistência Social brasileira; 2.3 A estrutura descentralizada de atendimento da Assistência Social brasileira; 3. A proteção social da assistência social e o impacto econômico durante a pandemia de COVID-19; 3.1. A proteção básica e especial no âmbito da Lei Orgânica da Assistência Social; 3.2. Os requisitos de acesso ao Benefício de Prestação Continuada da LOAS (Lei Orgânica da Assistência Social); 3.3. O impacto econômico da Assistência Social durante a pandemia de COVID-19; 4. A assistência social como um direito humano – notas propedêuticas; 4.1. Agenda 2030 – Instrumento de efetividade de direitos humanos; 5. Considerações finais. Referências.

1 Introdução

A relevância e a atualidade do tema proposto neste trabalho sobre a Assistência Social no Brasil: Instrumento de efetividade dos Direitos Humanos são traduzidas pelas autoras por intermédio das seguintes seções: os contornos constitucionais da assistência social no Brasil e a estrutura descentralizada de atendimento, a proteção social da assistência social e o impacto econômico durante a pandemia de COVID-19 e, por fim, a Assistência Social no Brasil como instrumento de efetividade dos objetivos do desenvolvimento sustentável.

No que se refere aos contornos constitucionais da assistência social brasileira, mister contextualizá-la como sendo um subsistema da seguridade social no Brasil, daí a importância da análise histórica inicial desse sistema jurídico, para se caminhar para a compreensão, ainda que breve, da assistência social, à luz da Constituição Federal brasileira de 1988.

A proteção social decorrente da assistência social é analisada por meio dos benefícios, prestações, serviços, programas e projetos previstos na Lei Orgânica da Assistência Social, com destaque para os requisitos de acesso ao BPC – Benefício de Prestação Continuada.

Além dessas considerações, a análise do impacto econômico das medidas de proteção durante a pandemia de COVID-19 parte dos dados coletados no Portal da Transparência, cujos resultados indicam a necessidade de implantação de novos instrumentos de atendimento em situação de vulnerabilidade, mas também apontam avanços em direção aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.

2 Os contornos constitucionais da Assistência Social no Brasil e a estrutura descentralizada de atendimento

Para se analisar, ainda que de forma sucinta, os contornos constitucionais da assistência social brasileira e sua estrutura descentralizada de atendimento, mister contextualizar o tema à luz de uma breve evolução histórica da seguridade social, no Brasil, e do seu subsistema, a assistência social.

2.1 Os contornos constitucionais da Seguridade Social brasileira

Santos[4] desenvolveu uma interpretação histórico-constitucional da seguridade social no Brasil contemporâneo.

Inicialmente, no contexto brasileiro, sublinha-se a Constituição de 1824, cuja denominação foi Constituição Política do Império do Brazil, de 25 de março de 1824.

Convém ressalvar que o estudo do direito constitucional no Brasil inicia-se com a Independência do país como colônia de Portugal, em 1822, até a instituição da República, em 15 de novembro de 1889.

Constava nessa Constituição de 1824, no Título 8º, das Disposições Gerais, e Garantias dos Direitos Civis, e Políticos dos Cidadãos Brasileiros: “A Constituição também garante os socorros públicos”[5].

Bonavides[6] aponta que, com o advento da República, o Brasil ingressou na segunda época constitucional de sua história.

Nesse quadro, modificou-se o eixo dos valores e princípios de organização formal do poder, com a adoção do modelo estadunidense: o federalismo e o presidencialismo.

Noutro giro, a Constituição de 1891, na era republicana, foi promulgada como a Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, de 24 de fevereiro de 1891.

Essa Carta constitucional brasileira tratou basicamente da organização dos Estados, dos direitos de liberdade, com retrocesso dos direitos sociais.

Importante os apontamentos de Balera[7], quando observa que a Constituição de 1891 a desloca do âmbito social para o administrativo.

Importa salientar também que os antecedentes históricos da Constituição de 1934, apresentados por Silva[8], demonstram que, quando Getúlio Vargas subiu ao poder, como líder da revolução, inclinou-se para a questão social.

Além desse aspecto, o decreto de 3/5/1932 marcou eleições à Assembleia Constituinte para 3/5/1933, entretanto, dois meses depois estourou em São Paulo a Revolução Constitucionalista. Vale lembrar que a derrota dos revoltosos não interferiu na Constituinte.

Não se pode perder de vista que essa Carta de 1934 trouxe, no Título IV, o item Da Ordem Econômica e Social, o art. 121, nos seguintes termos:

“A lei promoverá o amparo da produção e estabelecerá as condições do trabalho, na cidade e nos campos, tendo em vista a proteção social do trabalhador e os interesses econômicos do País”[9].

Entretanto, Getúlio Vargas dissolveu a Câmara e o Senado, revogou a Constituição de 1934 e promulgou a Carta Constitucional de 10/11/1937.

Essa Carta, denominada de “polaca”, salientou os pensamentos autoritários vigentes na Europa e fortaleceu, sobremaneira, a ditadura, concentrando todo o Poder Executivo e o Poder Legislativo nas mãos do presidente da República, cuja governança se dava pela legislatura de decretos-leis, aplicáveis pelo próprio chefe do Executivo.

No art. 127 da Constituição de 1937 expressou-se que a infância e a juventude devem ser objeto de cuidados e garantias especiais por parte do Estado, que tomará todas as medidas destinadas a assegurar-lhes condições físicas e morais de vida sã e de harmonioso desenvolvimento das suas faculdades.

Por iguais razões, a Constituição Federal de 1937 responsabilizou a família e o Estado nos cuidados da infância e da juventude.

A Constituição de 1946, vale recordar, trouxe a democratização do Estado brasileiro, com o fim da Segunda Grande Guerra, na qual o Brasil participou enviando tropas para lutar ao lado dos aliados.

Da mesma forma, instalou-se a Assembleia Constituinte em 2/2/1946, com objetivo de, entre outros, revisar o rol dos direitos e garantias individuais e os direitos econômicos e sociais.

Ocorre que, durante a vigência dessa Carta, ocorreram vários conflitos políticos, dentre os quais, o suicídio do presidente Getúlio Vargas.

Assume então o vice-presidente Café Filho e, com sua doença, assume Carlos Luz, que é deposto por militares em 11/11/1955.

Juscelino Kubitschek de Oliveira assume a presidência e, após esse fato histórico, Jânio Quadros é eleito, porém, após sete meses, Jânio renuncia ao poder.

O vice João Goulart, Jango, sofre com movimentos militares e com a restrição de poderes advinda da Emenda Constitucional n. 4 de 2/9/1961, que foi chamada de Ato Adicional.

Jango é deposto em 1/4/1964 com o movimento militar e o país ingressa no regime militar, com restrições e retrocessos aos direitos humanos. É precisamente nesse ambiente que é promulgada a Constituição de 1967 e suas Emendas.

Interessante frisar que a Constituição da República Federativa do Brasil de 1967 delineava no art. 158 que a Constituição assegura aos trabalhadores os seguintes direitos, além de outros que, nos termos da lei, visem à melhoria, de sua condição social: XVI – previdência social, mediante contribuição da União, do empregador e do empregado, para seguro-desemprego, proteção da maternidade e, nos casos de doença, velhice, invalidez e morte[10].

Balera[11] observa que houve inovação em matéria de benefícios, com a redução do tempo de serviço para a aposentadoria da mulher, aos trinta anos, e a criação do salário-família.

Já quanto à proteção dos desempregados, Balera[12] demonstra que na Constituição de 1946, ela tinha natureza assistencial, custeada pelo Estado, enquanto a Carta de 1967 fez surgir o seguro-desemprego, este custeado pelo Estado, empregadores e empregados.

Por fim, destaca-se a Constituição de 1988, vigente e produto da luta pela normalização democrática e pela conquista do Estado Democrático de Direito, que se iniciou com o golpe militar de 1964, e culminou com as manifestações populares na década de 1980, as quais pleiteavam as eleições diretas.

Basicamente, a Constituição vigente difere das Constituições anteriores no que tange à sua estrutura, na medida em que compreende nove títulos e é chamada de Constituição Cidadã, nos termos de Ulysses Guimarães, com a observação da participação popular na sua elaboração, com vistas à implementação da cidadania, cujos valores inseridos em seu bojo estão dispostos nos parâmetros contemporâneos da assistência social brasileira.

Esse breve estudo histórico-constitucional é importante, conclui Santos[13], na medida em que é grande a utilidade do conhecimento das Constituições pretéritas, tendo em vista que o presente se encontra entre o passado e o futuro.

Dessa maneira, o estudo da origem dos institutos pode servir de fundamento para a interpretação do presente e para os reflexos do futuro.

2.2 Os contornos constitucionais da Assistência Social brasileira

Como já verificado anteriormente, e com a finalidade de estudar os contornos constitucionais da Assistência Social no Brasil, à luz de um contexto histórico, Santos[14] aponta que nem sempre a assistência foi um direito.

Balera[15] explica que a primeira manifestação de seguridade social, a assistência privada, animada pela caridade, não pode ser considerada como manifestação jurídica. É na assistência pública que a legislação encontra fórmula para modelar certos direitos sociais.

No que tange ao custeio das prestações do sistema protetivo brasileiro, é importante sublinhar o estudo desse autor sobre a introdução da regra da contrapartida, ainda que implícita durante muito tempo, e existente entre contribuições e prestações.

A regra da contrapartida, como princípio virtual, segundo ele, impõe ao legislador uma regra de conduta, garantindo o equilíbrio econômico-financeiro do sistema protetivo social com o devido planejamento e que será objeto de análise em item posterior.

No trato da assistência social, as Constituições de 1946, 1967 e 1969 se dispuseram a vedar a instituição de impostos em face do patrimônio, renda ou serviços de instituições de assistência social, bem como à previsão de leis especiais sobre maternidade, infância, adolescência e educação para excepcionais.

Com a democratização no Brasil de 1980, surgiu o fortalecimento de movimentos sociais, sindicatos, Igreja, intelectuais e prevaleceu a ideia de direito no lugar de mera benesse, como um direito da pessoa humana, sendo finalmente positivado na Constituição Federal de 1988: os direitos sociais e a assistência foram reconhecidos como direitos.

Assim, atualmente, a assistência social compõe a seguridade social e é meio, estratégia de redistribuição, sem contribuição.

Dessa forma, conclui Santos[16] que, após várias Cartas Políticas, outorgadas ou promulgadas no Brasil, a assistência, de simples favor, evoluiu e passou a ser reconhecida como verdadeiro direito.

Direito que, de maneira diferente da caridade, pode ser exigido judicialmente por quem dela necessitar, nos termos da Constituição Federal brasileira de 1988, consolidando as linhas mestras do critério de necessidade[17].

De acordo com o art. 203 da CF, a assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: V – a garantia de um salário-mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei[18].

Consigne-se que Sposati[19] discorre sobre a assistência social e afirma que, nos termos dos arts. 203 e 6º da Constituição Federal de 1988, é prestada a quem precisar independentemente da contribuição à seguridade.

Contudo, indaga a autora sobre o que isso quer dizer? Quer dizer, responde ela, que só quem a sociedade reconhece como necessitado e desamparado usa a assistência social.

Sposati[20] destaca que a assistência social resulta de resistências estruturais ao modo de produção capitalista, as quais problematizam por dentro a compulsão desse modo de produção para a desigualdade e a injustiça. Consequentemente, nada mais natural que se reconheça a condição de direito de cidadania e de componente da seguridade social.

Por tais motivos, Santos[21] compreende a assistência social como um direito do cidadão e dever do Estado, tutelada para garantir o mínimo existencial da pessoa.

2.3 A estrutura descentralizada de atendimento da Assistência Social brasileira

Por outro enfoque, no que tange à estrutura descentralizada de atendimento, é necessário contextualizar esse tema segundo as diretrizes constitucionais da Assistência Social.

De acordo com o art. 204 da CF/88, as ações governamentais na área da assistência social serão realizadas com recursos do orçamento da seguridade social, previstos no art. 195, além de outras fontes, e organizadas com base nas seguintes diretrizes: I – descentralização político-administrativa, cabendo a coordenação e as normas gerais à esfera federal e a coordenação e a execução dos respectivos programas às esferas estadual e municipal, bem como a entidades beneficentes e de assistência social[22].

Em breve síntese, Santos[23] observa que houve o redesenho da gestão pública, com a diretriz da descentralização, nas três esferas do governo, que é estabelecida no sentido da construção de uma nova organização democrática, sendo um processo especialmente político, com maior participação dos municípios, inclusive com menor ênfase ao quadro de subsidiariedade que desenhava as ações de assistência social.

Nessa linha, indica Santos[24] que a diretriz da descentralização político-adminis-trativa descortinou um novo formato de gestão de políticas públicas, nas três esferas de governo: federal, estadual e municipal e, a partir de então, a descentralização configura um princípio norteador dos processos de implementação de políticas públicas e das ações e de atendimento da assistência social.

Por fim, impende relevar que a descentralização não pode se restringir somente à divisão de responsabilidades, mas também na redefinição das relações entre Estado e sociedade civil, uma vez que ainda há fragmentação do poder e a distribuição de recursos de forma não equânime entre os entes federados, notadamente no que tange ao atendimento da assistência social brasileira.

A partir dos contornos constitucionais da seguridade social e da assistência social brasileira, assinalados pelas autoras, bem como da sua estrutura descentralizada de atendimento, passa-se à análise da proteção social da assistência social no Brasil contemporâneo e o impacto econômico nesse país durante a pandemia de COVID-19.

3 A proteção social da Assistência Social e o impacto econômico durante a pandemia de COVID-19

A efetividade da assistência social nos termos previstos pela Constituição Federal de 1988 se dá com a publicação da Lei 8.742/93 – Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS, que regulamentou a assistência social no Brasil.

O instrumental jurídico da assistência social conferido pela LOAS e seu caráter descentralizado foram fundamentais para o enfrentamento da grave crise econômica gerada pela crise sanitária de COVID-19. Assim considerando os objetivos do presente estudo, será feito um breve resumo da proteção no âmbito da assistência social.

3.1 A proteção básica e especial no âmbito da Lei Orgânica da Assistência Social

A Lei Orgânica da Assistência Social em consonância com a Constituição Federal de 1988 apresenta esta como direito do cidadão e dever do Estado para prover o mínimo social, realizada por meio de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade para atendimento às necessidades básicas.

Os objetivos da assistência social estão estampados no art. 2º da Lei 8.742/1993 – LOAS, com destaque para (i) proteção social, que visa à garantia da vida, à redução de danos e à prevenção da incidência de riscos; (ii) a vigilância socioassistencial; (iii) a defesa de direitos, que visa a garantir o pleno acesso aos direitos no conjunto das provisões socioassistenciais e (iv) o enfrentamento da pobreza de forma integrada às políticas setoriais.

A gestão das ações na área de assistência social se dá por um sistema descentralizado e participativo denominado Sistema Único de Assistência Social (SUAS), integrado pelos entes federativos e respectivos conselhos de assistência social.

A LOAS sofreu inúmeras alterações legislativas, avançando na proteção social, com destaque para as alterações promovidas pela Lei 12.435, de 2011, que passou a prever a organização da assistência social mediante proteção básica e proteção especial.

A proteção básica inclui um conjunto de serviços, programas, projetos e benefícios da assistência social, que visa prevenir situações de vulnerabilidade e risco social, enquanto a proteção especial tem por objetivo contribuir para reconstrução de vínculos familiares e comunitários e a defesa de direitos.

Para dar atendimento à proteção básica, a LOAS traz a regulamentação do benefício de prestação continuada previsto no art. 203 da CF e os benefícios eventuais.

O benefício de prestação continuada previsto nos arts. 20 e 21 da LOAS é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais, que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.

Os benefícios eventuais dão atendimento aos cidadãos e a família em virtude de nascimento, morte, situações de vulnerabilidade temporária e calamidade pública a cargo dos Estados e Municípios.

Para solicitar o benefício eventual, o cidadão deve procurar as unidades da assistência social no município ou no Distrito Federal. A oferta desses benefícios também pode ocorrer por meio de identificação de pessoas e famílias em situação de vulnerabilidade nos atendimentos feitos pelas equipes da assistência social pelo Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro POP), Centro de Referência para Pessoa com Deficiência e suas Famílias (Centro-DIA) e Unidades de Acolhimento.

No âmbito dos serviços, a LOAS delega ao regulamento a instituição de serviços socioassistenciais, estes entendidos como atividades continuadas que visem à melhoria da vida da população voltadas para as necessidades básicas com atenção especial às crianças e aos adolescentes em situação de risco e a pessoas que vivem em situação de rua.

Os programas de assistência social compreendem ações integradas e complementares definidas pelos respectivos Conselhos de Assistência Social com prioridade para inserção profissional e social, destacando-se o PAIF – Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família, o PAEFI – Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos e o PETI – Programa de Erradicação do Trabalho Infantil.

No que se refere aos projetos de enfrentamento da pobreza, a LOAS nos arts. 25 e 26 os qualificam como instituição de investimento econômico-social com a cooperação entre organismos governamentais, não governamentais e da sociedade civil.

Encerrando o capítulo IV voltado para os benefícios, prestações, serviços, programas e projetos, foi incluído na Lei 14.176, de 2021 o auxílio-inclusão, para dar atendimento ao art. 94 da Lei 13.146, de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), possibilitando assim que a pessoa com deficiência, grave ou moderada, possa receber cumulativamente o Auxílio-inclusão, em substituição ao Benefício de Prestação Continuada, com remuneração decorrente do exercício de atividade, desde que a remuneração seja limitada a dois salários-mínimos e mantidas as demais condições que ensejaram a concessão do benefício de prestação continuada.

Dada a importância no âmbito da proteção da assistência social, serão vistos agora de forma mais detalhada os requisitos de acesso ao BPC – Benefício de Prestação Continuada da LOAS.

3.2 Os requisitos de acesso ao Benefício de Prestação Continuada da LOAS (Lei Orgânica da Assistência Social)

A gestão do BPC – Benefício de Prestação Continuada é feita pelo Ministério da Cidadania, por meio da Secretaria Nacional de Assistência Social (SNAS), que é responsável pela implementação, coordenação, regulação, financiamento, monitoramento e avaliação do benefício. A operacionalização é realizada pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

Com previsão constitucional no inc. V do art. 203 e regulamento pela LOAS, o Benefício de Prestação Continuada traz a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais, que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.

Desde a previsão constitucional, o acesso ao benefício é limitado ao idoso e à pessoa com deficiência e são qualificados pelo critério de necessidade, cujo conceito, como leciona Santos vai além do conceito econômico: “Daí por que o critério de necessidade, relativo à assistência social, é melhor desenhado para a sociedade brasileira contemporânea como um critério da pobreza relativa, que considera as necessidades humanas criadas pelas desigualdades socioeconômicas, de exclusão social, à luz do entendimento de que a assistência social é um direito fundamental da pessoa humana e que, como direito fundamental, será prestado a quem dela necessitar[25].

O critério de necessidade está em constante evolução, perceptível na vida social, na doutrina, na jurisprudência[26]/[27] e essa evolução também foi percebida pelo legislador ordinário, que na última alteração promovida na LOAS, não obstante, tenha mantido como critério de necessidade a comprovação da renda familiar per capita igual ou inferior a ¼ (um quatro) do salário-mínimo, conforme a redação do § 3º do art. 20, com a redação dada pela Lei 14.176, de 2021, também trouxe novos elementos para avaliação da condição de miserabilidade e da situação de vulnerabilidade, além da possibilidade do regulamento ampliar o limite da renda per capita familiar para ½ salário-mínimo, desde que observados os critérios do art. 20-B:

Art. 20-B. Na avaliação de outros elementos probatórios da condição de miserabilidade e da situação de vulnerabilidade de que trata o § 11 do art. 20 desta Lei, serão considerados os seguintes aspectos para ampliação do critério de aferição da renda familiar mensal per capita de que trata o § 11-A do referido artigo: I – o grau da deficiência; II – a dependência de terceiros para o desempenho de atividades básicas da vida diária; e, III – o comprometimento do orçamento do núcleo familiar de que trata o § 3º do art. 20 desta Lei exclusivamente com gastos médicos, com tratamentos de saúde, com fraldas, com alimentos especiais e com medicamentos do idoso ou da pessoa com deficiência não disponibilizados gratuitamente pelo SUS, ou com serviços não prestados pelo Suas, desde que comprovadamente necessários à preservação da saúde e da vida[28].

Assim, a Assistência Social vem avançando na proteção social. Um dos exemplos desse avanço é a adequação da LOAS ao Estatuto da Pessoa com Deficiência e aos conceitos de deficiência e grau de impedimento, nos termos da redação dada ao §2º do art. 20, com verificação por meio de instrumento de avaliação biopsicossocial em consonância com o Estatuto da Pessoa com Deficiência, que por sua vez tem como base a Convenção de Nova York, de março de 2007, sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, ratificada pelo Brasil por meio do Decreto Legislativo 6.949, de 25 de agosto de 2009.

Não obstante os avanços, o acesso ao BPC – Benefício de Prestação Continuada ainda é restrito e tal situação ficou ainda mais perceptível com a crise econômica decorrente da pandemia de COVID-19, não só em decorrência da prevalência do critério econômico bastante restrito, mas agravado pelo fato que o critério econômico deve ser conjugado com um conceito amplo de família, como se verifica na redação do § 1º do art. 20, que dispõe:

§ 1o Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto[29].

Outra questão é a exigência como requisito para concessão, manutenção e revisão do benefício de inscrição do cidadão no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) e no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal – Cadastro Único, mediante comparecimento pessoal no CRAS – Centro de Referência de Assistência Social, podendo ainda fazer o pré-cadastro na web ou pelo aplicativo[30].

Na ausência do CPF ou do CadÚnico, o cidadão não consegue ter acesso à proteção, situação que, nos casos de extrema vulnerabilidade, acaba por criar grandes obstáculos para a concessão do benefício, contudo, os dados do Ministério da Cidadania[31] indicam um avanço no âmbito da assistência social, decorrente da estrutura descentralizada.

Segundo dados do Portal da Transparência[32], a lista completa do BPC – Benefício de Prestação Continuada é composta por aproximadamente de 4,7 milhões de beneficiários entre idosos e deficientes, o que representa apenas 2,46% do total da população, partindo dos dados, o Portal da Transparência[33], que indica que no ano de 2019 foram beneficiados 21.073.387 pessoas, o que representa um percentual de 11,07% do total da população e considerados os benefícios e prestações do Bolsa Família, BPC, Garantia-Safra, PETI e Seguro Defeso.

A assistência social enquanto conjunto integrado de ações de proteção social, em especial durante pandemia de COVID-19, foi fundamental para manutenção de condições mínimas de subsistência para milhares de brasileiros, para além da proteção conferida pelo benefício de prestação continuada. Em seguida, será visto agora um panorama do impacto econômico das medidas no âmbito da assistência social para enfrentamento da crise econômica gerada pela pandemia.

3.3 O impacto econômico da Assistência Social durante a Pandemia de COVID-19

Os dados apresentados pelo Portal da Transparência relativos aos Orçamentos para a área de atuação da assistência social apontam um salto de R$ 92,85 bilhões de total de despesas executadas no ano de 2019[34] para R$ 409,94 bilhões em 2020[35], ou seja, um aumento de 340%, deste total das despesas executadas, 76,19% foram gastos relativos ao ano 2020 utilizados com programas de inclusão social, por meio do Bolsa Família e da articulação de políticas públicas e 15,46% em proteção social no âmbito do SUAS, confirmando a importância da estrutura descentralizada como instrumento de efetividade da assistência social.

Em 2019, segundo dados do Portal da Transparência, somente 11,07% da população brasileira receberam benefícios ao cidadão, entre eles, o Bolsa Família, BPC, Garantia-Safra, PETI e Seguro Defeso[36].

Em 2020, em decorrência das medidas de proteção social adotadas durante a Pandemia de COVID-19, entre elas, o Auxílio-Emergencial, representaram um aumento do número de beneficiários em relação aos benefícios aos cidadãos, incluídos nesse rol: Auxílio Emergencial, Bolsa Família, BPC, Garantia-Safra, PETI e Seguro Defeso de 89.135.627 beneficiários, sendo disponibilizado aos cidadãos R$ 388,71 bilhões, representando um percentual de 46,83% do total da população[37].

Embora em termos absolutos os números de 2020 impressionam e causaram impacto econômico em relação à proteção social, amenizando os efeitos da crise econômica decorrente de COVID-19, se proporcionalizados, ou seja, se distribuídos os 388,71 bilhões para 89.135.627 beneficiários e divididos por 365 dias, percebe-se que se está diante de valores de aproximadamente de R$ 11,94 , em torno de US$ 2,00, número que representa uma melhora em relação à pobreza extrema, mas que ainda está longe do mínimo social de um salário-mínimo mensal.

No ano de 2021, o total de despesas foi reduzido para R$ 158,60 bilhões, a inclusão social por meio do Bolsa Família e da articulação de políticas públicas representaram 48,34% e a proteção social no âmbito do SUAS, 40,91% dos valores pagos[38].

Outra importante consequência da percepção e constatação do grande contingente de cidadão que demandam atendimento da assistência social e do impacto econômico sentido em 2020 foi a inclusão da previsão de uma renda básica familiar entre os direitos sociais, nos termos do parágrafo único do art. 6º da Constituição Federal, incluído pela Emenda Constitucional 114, de 2021, cujos limites, condições, normas de acesso e demais requisitos serão determinados, na forma da lei e respectivo regulamento, até 31 de dezembro de 2022, conforme disposto no art. 118 do ADCT.

Da análise dos contornos Constitucionais da assistência social, seu caráter descentralizado, das normas de proteção, com vistas aos benefícios, prestações, serviços, programas e projetos, pode-se identificar um avanço em direção aos objetivos do desenvolvimento sustentável.

Passa-se agora à análise da assistência social sob esse enfoque dos direitos humanos.

4 A Assistência Social como um direito humano

A assistência social é instrumento de transformação e de inclusão social e tem como missão a promoção da integração e a inclusão do assistido na vida comunitária.

A assistência social visa à proteção da pessoa humana que não pode, por si só, ou com a ajuda de seus familiares, obter seu próprio sustento e garantir sua subsistência.

Esta tem como objetivos principais a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência, à velhice (idade avançada), ampara crianças e adolescentes carentes; visa à promoção da integração ao mercado de trabalho; à habilitação e à reabilitação de pessoas portadoras de deficiência e à promoção de sua integração à vida comunitária; à garantia de um salário-mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.

A assistência social é um conjunto de atividades particulares e estatais direcionadas para o atendimento dos hipossuficientes, consistindo nos bens (materiais) oferecidos em pequenos benefícios em dinheiro, assistência à saúde, fornecimento de alimentos e outras pequenas prestações.

A assistência social não só complementa os serviços de previdência social, como os amplia, em razão da natureza das pessoas e das necessidades providas.

O art. XXV da Declaração Universal dos Direitos Humanos traz em seu contexto o direito humano fundamental, no que diz respeito à saúde e ao bem-estar:

Toda pessoa humana tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle. A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças, nascidas dentro ou fora de matrimônio, gozarão da mesma proteção social[39].

A Declaração Universal preconiza que toda pessoa humana tem direito à saúde, a um padrão de vida capaz de assegurar, a si e sua família saúde e bem-estar. Esse dispositivo abrange o direito ao vestuário, à habitação, aos cuidados médicos e aos serviços sociais indispensáveis para a sua promoção, tais como: direito à segurança, em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice, assistência social aos desamparados, idosos e deficientes, entre outros, que levam à perda de meios de subsistência.

A Declaração Universal estabeleceu padrões básicos sociais, indispensáveis a todas as pessoas, de modo a garantir a dignidade, a humanidade, pois abarca os direitos naturais, como a vida, a liberdade e a igualdade de direitos entre os homens, é um dos traços essenciais da chamada civilização ocidental. Trata-se de um fenômeno social – são os valores essenciais do homem em sociedade.

Nesse aspecto, a declaração visa proteger o bem do homem – a vida, de modo que possa viver com dignidade, com os meios necessários a garantir a sua subsistência.

Pois bem. A proteção efetiva dos direitos humanos é fundamental para o desenvolvimento da humanidade, nesse aspecto, a proteção daqueles que não possuem condições de garantir sua própria subsistência, que se encontram em condição de extrema pobreza – doentes – cuja assistência é chamada a atuar, como um direito humano – um direito que exige uma atividade prestacional pelo Estado e por toda a sociedade, no sentido de buscar a superação das carências ou deficiências individuais e sociais, tendo como objetivo o bem-estar e a justiça social.

E não menos, encontram-se entre os direitos constitucionais sociais, na Constituição democrática de 1988, o direito à assistência social aos desemparados.

É importante observar que, atualmente, o maior desafio para os povos e nações do mundo, no plano do direito social, está na minimização dos horrores da fome e da pobreza, ainda mais após o período pandêmico que assolou o mundo pela COVID-19.

Como assinala a Comissão Econômica para a América Latina e Caribe[40], a pobreza extrema alcançou em 2020 na América Latina níveis que não foram observados nos últimos 12 e 20 anos. Os níveis de piora dos índices de desigualdade social são alarmantes, principalmente nas taxas de ocupação e participação no mercado de trabalho, sobretudo, das mulheres, apesar das medidas de proteção social emergencial que os países adotaram para freá-la, entre eles, o Brasil.

Nesse sentido, é o propósito da ambiciosa Agenda 2030 – Objetivo de Desenvolvimento Sustentável – reduzir as desigualdades sociais, a pobreza, a fome e a miséria em nível global.

4.1 Agenda 2030 – Instrumento de efetividade de direitos humanos

Os objetivos de desenvolvimento sustentável é um ambicioso programa de ação que tem por objetivo acabar com a pobreza, proteger o meio ambiente e o clima e garantir que as pessoas, em todos os lugares, possam desfrutar de paz e de prosperidade. Os objetivos 1 – Acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares[41].

De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, no Brasil existem as seguintes proposições em relação ao objetivo 1 – ODS:

Acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares

Meta 1.1

Nações Unidas

Até 2030, erradicar a pobreza extrema para todas as pessoas em todos os lugares, atualmente medida como pessoas vivendo com menos de US$ 1,25 por dia.

Brasil

Até 2030, erradicar a pobreza extrema para todas as pessoas em todos os lugares, medida como pessoas vivendo com menos de PPC$ 3,20 per capita por dia.

Justificativa para a adequação

A adequação da meta teve por objetivos:

mudar a referência de dólar americano (US$) para dólar internacional (PPC$) – isto é, o dólar na unidade monetária expressa pela paridade de poder de compra (PPC), cuja última rodada disponível é de 2011.

alterar o valor da linha de pobreza para refletir o nível de desenvolvimento alcançado pelo Brasil, tomando como referência a linha intermediária de PPC$ 3,20 per capita por dia, que é usada internacionalmente.

Como ilustração, a tabela 1 traz os valores mensais em reais e as taxas de pobreza, em 2016, de acordo com as linhas de pobreza mais usadas internacionalmente.

Com a adoção da linha de PPC$ 3,20 per capita por dia, observa-se que 12,55% dos brasileiros podiam ser considerados como extremamente pobres em 2016. Nesse sentido, a erradicação da pobreza extrema no país vai exigir um esforço significativo, mas plausível. Vale ressaltar que a incidência da pobreza já é muito reduzida nas linhas inferiores e muito elevada na linha superior.

Conceitos importantes mencionados na meta

A erradicação da pobreza deve ser definida em relação a um patamar residual, próximo, mas não idêntico a zero – similar ao que ocorre com a definição de “pleno emprego”, que não significa literalmente a inexistência de desempregados. Isso deriva de erros de mensuração, volatilidade de renda e outras idiossincrasias inevitáveis, o que torna virtualmente impossível reduzir a zero o número de pobres, qualquer que seja a linha de pobreza.

Dessa maneira, em nome da transparência, o Grupo de Trabalho considerou que a erradicação da pobreza extrema será atingida quando o percentual da população nesta condição estiver abaixo de 3%[42].

A implementação da ODS é um grande desafio a ser enfrentado, cujo objetivo é proporcionar melhores condições de vida para todas as pessoas, para todos os povos, para todas as nações do mundo. É um programa na busca da efetividade de direitos humanos. Ninguém pode ser deixado para trás.

O objetivo da minimização da pobreza – da exclusão social é um dado a ser perseguido pelo programa 2030.

É importante destacar que a pobreza não tem como base os indicadores econômicos. O que faz uma pessoa ser pobre não é o nível de sua renda, mas sua exclusão dos bens e serviços sociais essenciais. Pode-se dizer, em outras palavras, que uma pessoa pobre é aquela que está destituída do direito a ter direitos. Nesse sentido, a pobreza significa ausência de direito à saúde, à assistência social, ao saneamento básico – a uma vida digna, enfim.

Para Silva,

“O mundo do qual o homem faz parte na qualidade de vita activa consiste em coisas produzidas pela atividade humana. Assim, pode-se considerar que é a partir das condições com que a vida é dada ao homem na Terra que ele cria suas próprias condições, as quais, a despeito de sua variabilidade e de sua origem humana, possuem a mesma força condicionante das coisas naturais. Dessa forma, o que quer que se refira à vida humana (liberdade, justiça, vida, trabalho, ação) ou esteja em estreita relação com ela assume imediatamente caráter de condição da existência humana. É por isso que os homens, independentemente do que façam, são sempre seres condicionados, são seres sociais”[43].

Nesse sentido, nas coisas produzidas pela atividade humana é que os homens descobrem a importância da participação da vida em sociedade, da cooperação, da solidariedade e da fraternidade. O homem como indivíduo faz parte do todo, e o todo da sociedade, é o homem na civilidade.

A Agenda 2030 com os seus 17 (dezessete) objetivos tem como propósito buscar o bem comum, o bem de todos, o bem da humanidade, o bem da casa comum – o homem na civilidade. É a humanidade a alcançar o pleno desenvolvimento com a valorização da humanidade (o homem como um fim em si mesmo). O valor dignidade deve ser o foco na luta contra a fome e a miséria, uma vez que o futuro dos povos do mundo depende da solução desse grave problema.

Nesse aspecto, a assistência social é um dos instrumentos de redução das desigualdades sociais – de efetividade dos direitos humanos, e para continuar sendo, deverá ocorrer uma mudança na ótica social – a apartação da pobreza e da exclusão social, ou seja, uma mudança no conceito de pobreza, não em uma visão econômica, mas ética e social.

5 Considerações finais

Inicialmente, destaque-se que a assistência social se transformou em direito que, de maneira diferente da caridade, pode ser exigido judicialmente por quem dela necessitar, nos termos da Constituição Federal brasileira de 1988, consolidando as linhas mestras do critério de necessidade.

Assim, a Assistência Social vem avançando na proteção social. Não obstante os avanços, o acesso ao BPC ainda é restrito e tal situação ficou ainda mais perceptível com a crise econômica decorrente da pandemia de COVID-19, não só em decorrência da prevalência do critério econômico bastante restrito, mas agravado pelo fato que o critério econômico deve ser conjugado com um conceito amplo de família.

Foi possível verificar nesse contexto que a assistência social, enquanto conjunto integrado de ações de proteção social, em especial durante pandemia de COVID-19, foi fundamental para manutenção de condições mínimas de subsistência para milhares de brasileiros, para além da proteção conferida pelo benefício de prestação continuada.

Sob outro enfoque, a implementação das ODS é um grande desafio a ser enfrentado, cujo objetivo é proporcionar melhores condições de vida para todas as pessoas, para todos os povos, para todas as nações do mundo. É um programa na busca da efetividade de direitos humanos. Ninguém pode ser deixado para trás.

O objetivo da minimização da pobreza, ou seja, da exclusão social é um dado a ser perseguido pela Agenda 2030.

É importante destacar que a pobreza não tem como base apenas os indicadores econômicos. O que faz uma pessoa ser pobre não é o nível de sua renda, mas sua exclusão dos bens e serviços sociais essenciais.

Nesse sentido, nas coisas produzidas pela atividade humana é que os homens descobrem a importância da participação da vida em sociedade, da cooperação, da solidariedade e da fraternidade. O homem como indivíduo faz parte do todo, e o todo da sociedade, é o homem na civilidade.

A agenda 2030 com os seus 17 (dezessete) objetivos tem como propósito buscar o bem comum, o bem de todos, o bem da humanidade, o bem da casa comum – o homem na civilidade.

Em virtude dessas considerações, foi possível às autoras constatar que notadamente a assistência social é um dos instrumentos de redução das desigualdades sociais – de efetividade dos direitos humanos, e para continuar sendo, deverá ocorrer uma mudança na ótica social – a apartação da pobreza e da exclusão social, ou seja, uma mudança no conceito de pobreza, não apenas em uma visão econômica, mas ética e social.

Referências

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Notas de Rodapé

[1] Pós-doutoranda em Direito, Doutora e Mestra em Direito pela Pontifícia Universidade Católica (PUCSP), São Paulo, Brasil, Editora da Revista da DPU, Defensora Pública Federal, e-mail dsan746@gmail.com, ORCID http://orcid.org/0000-0002-1440-5282.

[2] Doutoranda e Mestre em Direito das Relações Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP), São Paulo, Brasil. Advogada, Professora de Direito Previdenciário, e-mail: professora.estervieira@gmail.com ORCID https://orcid.org/0000-0003-1049-6903.

[3] Doutora em Direito das Relações Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professora Assistente nos cursos de Mestrado e Doutorado em Direito Previdenciário e Direitos Humanos da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Presidente da Academia Brasileira de Direito da Seguridade Social – ABDSS. Advogada, email: professora.robertasilva@gmail.com – https://orcid.org/ 0000-0001-8829-6907.

[4] SANTOS, Denise Tanaka dos, Assistência Social, O critério de necessidade, Florianópolis, Conceito Editorial, 2013, pp. 11-17.

[5] BRASIL, Constituição Política do Império do Brazil (de 25 de março de 1824), Constituição Política do Império do Brasil, elaborada por um Conselho de Estado e outorgada pelo Imperador D. Pedro I, em 25.03.1824, Diário Oficial da União, Rio de janeiro, 22 abr. 1824.

[6] BONAVIDES, Paulo, Curso de direito constitucional, 25. ed., São Paulo, Malheiros, 2010, pp. 364-366.

[7] BALERA, Wagner, A seguridade social na Constituição de 1988, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1989, pp. 19-20.

[8] SILVA, José Afonso, Curso de direito constitucional positivo, 19 ed., São Paulo, Malheiros, 2001, pp. 81.

[9] BRASIL, Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil (de 16 de julho de 1934), Nós, os representantes do povo brasileiro, pondo a nossa confiança em Deus, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para organizar um regime democrático, que assegure à Nação a unidade, a liberdade, a justiça e o bem-estar social e econômico, decretamos e promulgamos a seguinte Constituição, Diário Oficial da União, Rio de Janeiro, 16 jul. 1934.

[10] BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1967, O Congresso Nacional, invocando a proteção de Deus, decreta e promulga a seguinte Constituição, Diário Oficial da União, Brasília, 24 de jan. 1967.

[11] BALERA, Wagner, A seguridade social na Constituição de 1988, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1989, pp. 29.

[12] Ibidem, pp. 29-30.

[13] SANTOS, Denise Tanaka dos, Assistência Social: O critério de necessidade, Florianópolis, Conceito Editorial, 2013, pp. 17.

[14] Ibidem, 2013, pp. 11-17.

[15] BALERA, Wagner, Sistema da seguridade social, 3. ed., São Paulo, LTr, 2003, pp. 106.

[16] SANTOS, Denise Tanaka dos, As ações governamentais de assistência social: O contexto do artigo 204 da Constituição Federal de 1988, Rio de Janeiro, Lúmen Juris, 2018, passim.

[17] SANTOS, Denise Tanaka dos, Assistência Social: O critério de necessidade, Florianópolis, Conceito Editorial, 2013, passim.

[18] BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, Emendas Constitucionais de Revisão, Diário Oficial da União, Brasília, 05 out. 1988.

[19] SPOSATI, Aldaíza, Carta-tema: A assistência social no Brasil, 1983-1990, 2. ed., São Paulo, Cortez, 1995, pp. 45-47.

[20] Ibidem, pp. 45-48.

[21] SANTOS, Denise Tanaka dos, Assistência Social: O critério de necessidade, Florianópolis, Conceito Editorial, 2013, pp. 40-41.

[22] BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, Emendas Constitucionais de Revisão, Diário Oficial da União, Brasília, 05 out. 1988.

[23] SANTOS, Denise Tanaka dos, As ações governamentais de assistência social: O contexto do artigo 204 da Constituição Federal de 1988, Rio de Janeiro, Lúmen Juris, 2018, pp. 278.

[24] Ibidem, pp. 278-279.

[25] SANTOS, Denise Tanaka dos, Assistência Social: O critério de necessidade, Florianópolis, Conceito Editorial, 2013, pp. 48.

[26] STF já decidiu que: “[…] o critério de renda familiar por cabeça nele previsto como parâmetro ordinário de aferição da miserabilidade do indivíduo para fins de deferimento do benefício de prestação continuada. Permitiu, contudo, ao Juiz, no caso concreto, afastá-lo, para assentar a referida vulnerabilidade com base em outros elementos (ARE 937070)

[27] BRASIL, Supremo Tribunal Federal, STF – Recurso Extraordinário com Agravo: ARE 937070 PE – Pernambuco, Relator: Ministro Marco Aurélio, Data de Julgamento, 30/03/2016, Data de Publicação, DJe 07/04/2016.

[28] BRASIL, Lei n. 14.176, de 22 de junho de 2021, Altera a Lei n. 8.742, de 7 de dezembro de 1993, para estabelecer o critério de renda familiar per capita para acesso ao benefício de prestação continuada, estipular parâmetros adicionais de caracterização da situação de miserabilidade e de vulnerabilidade social e dispor sobre o auxílio-inclusão de que trata a Lei n. 13.146, de 6 de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), autoriza, em caráter excepcional, a realização de avaliação social mediada por meio de videoconferência, e dá outras providências, Diário Oficial da União, Brasília, 22 jun. 2021.

[29] BRASIL, Lei n. 12.435, de 6 de julho de 2011, Altera a Lei n. 8.742, de 7 de dezembro de 1993, que dispõe sobre a organização da Assistência Social, Diário Oficial da União, Brasília, 6 jul. 2011.

[30] DATAPREV, Cadastro único, Disponível em: http://cadunico.dataprev.gov.br/#/. Acesso em: 24 abr. 2022.

[31] Centro de Referência de Assistência Social – CRAS está presente em todo o território nacional com 8.360 unidades, conforme dados do Ministério da Cidadania.

[32] BRASIL, Portal da Transparência, Portal da Transparência divulga gastos com Benefício de Prestação Continuada (BPC), 2019ª, Controladoria-Geral da União. Disponível em: https://www.portaltransparencia.gov.br/comunicados/603478-portal-da-transparencia-divulga-gastos-com-beneficio-de-prestacao-continuada–bpc-. Acesso em: 23 abr. 2022.

[33] BRASIL, Portal da Transparência, Benefícios ao Cidadão, Comparativo de benefícios por localidades, 2019b, Disponível em: http://www.portaltransparencia.gov.br/beneficios?ano=2019. Acesso em: 23 abr. 2022.

[34] BRASIL, Portal da Transparência, Assistência Social, Visão geral da distribuição por subárea (subfunção). 2019c, Disponível em: https://www.portaltransparencia.gov.br/funcoes/08-assistencia-social?ano=2019. Acesso em: 23 abr. 2022.

[35] BRASIL, Portal da Transparência, Assistência Social, Visão geral da distribuição por subárea (subfunção), 2020a. Disponível em: https://www.portaltransparencia.gov.br/funcoes/08-assistencia-social?ano2020. Acesso em: 23 abr. 2022.

[36] BRASIL, Portal da Transparência, Benefícios ao Cidadão, Comparativo de benefícios por localidades, 2019b, Disponível em: http://www.portaltransparencia.gov.br/beneficios?ano=2019. Acesso em: 23 abr. 2022.

[37] BRASIL, Portal da Transparência, Benefícios ao Cidadão, Comparativo de benefícios por localidades, 2020b, Disponível em: https://www.portaltransparencia.gov.br/beneficios?ano=2020. Acesso em: 23 abr. 2022.

[38] BRASIL, Portal da Transparência, Assistência Social, Visão geral da distribuição por subárea (subfunção), 2021b, Disponível em: https://www.portaltransparencia.gov.br/funcoes/08-assistencia-social?ano2021. Acesso em: 23 abr. 2022.

[39] DUDH, Declaração Universal dos Direitos Humanos, Preâmbulo, 1948, Disponível em: https://www.ohchr.org/sites/default/files/UDHR/Documents/UDHR_Translations/por.pdf. Acesso em: 23 abr. 2022, pp. 6.

[40] CEPAL, Comissão Econômica para a América Latina e Caribe, Panorama social da América Latina 2020, Disponível em: https://www.cepal.org/es/publicaciones/46687-panorama-social-america-latina-2020. Acesso em: 23 abr. 2022.

[41] BALERA, Wagner, SILVA, Roberta Soares da (orgs.), Comentários aos objetivos de desenvolvimento sustentável, São Paulo, Verbatin, 2018, passim.

[42] IPEA, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Erradicação da pobreza, Disponível em: https://www.ipea.gov.br/ods/ods1.html. Acesso em: 28 abr. 2022.

[43] SILVA, Roberta Soares da, Direito social: Aposentadoria, São Paulo, LTr, 2009, pp. 20.