ONDA NEOCONSERVADORA: UMA AMEAÇA À DEMOCRACIA

NEOCONSERVING WAVE: A THREAT TO DEMOCRACY

DOI: 10.19135/revista.consinter.00009.25

Rogério Medeiros Garcia de Lima[1] – https://orcid.org/0000-0001-5490-5102

Laís Alves Camargos[2] – https://orcid.org/0000-0001-5726-5075

Resumo: O objetivo deste trabalho é demonstrar a propagação do neoconservadorismo no mundo e sua relação com o abalo das democracias. Para tanto será feita uma análise da forma como as modernas tecnologias de comunicação em massa contribuem para que isso ocorra e, ainda, como as eleições no Brasil de 2018 foram afetadas pela transformação digital da vida. Examinar-se-á, por fim, como a onda neoconservadora pode atingir o Poder Judiciário e qual a solução para o desenvolvimento econômico, político e social de um país. Para tanto, a partir do método dedutivo, foi realizada uma pesquisa teórica na vertente jurídico-sociológica, com foco na teoria do declínio democrático no mundo de Steven Levitsky e Daniel Ziblatt como marco teórico.

Palavras-chave: Modernas tecnologias. Democracia. Constituição. Neoconservadorismo. Ameaças à Democracia.

Abstract: The purpose of this paper is to demonstrate the spread of neoconservatism around the world and its relation to threats to democracies. In order to do so, an analysis will be made of how the modern mass communication technologies have contributed to this, and also how the Brazilian elections of 2018 were affected by the digital transformation of life. Finally, it will be examined how the neoconservative wave can reach the Judiciary and what is the solution for the economic, political and social development of a country. For that, based on the deductive method, a theoretical research was carried out in the juridical-sociological field, focusing on the theory of democratic decline in the world of Steven Levitsky and Daniel Ziblatt as theoretical framework.

Keywords: Modern technologies. Democracy. Constitution. Neoconservatism. Threats to Democracy.

1 INTRODUÇÃO

O objetivo desta pesquisa é fazer um estudo acerca da propagação do neoconservadorismo no mundo e como as modernas tecnologias de comunicação em massa, desenvolvidas na denominada “quarta revolução industrial”, incrementando a comunicação digital, contribuem para que isso ocorra.

Para tanto, o estudo tem início com a análise do conceito de democracia e de Estado Democrático de Direito, culminando no exame da forma como ocorre o abalo da democracia, não apenas o Brasil.

Em seguida, serão abordadas as eleições de 2018 no Brasil e a razão de se tratar de um pleito disruptivo, no qual a população brasileira presenciou os efeitos da transformação digital da vida. A partir de então, adentrar-se-á no estudo das potencialidades transformadoras da inteligência artificial e da robótica e seu impacto nas atividades privadas e na Administração Pública.

Passar-se-á, então, por uma análise do papel dos partidos políticos neste cenário, e, em especial, da imprensa, para, enfim, examinar o neoconstitucionalismo e sua correlação com o ativismo judicial.

Por fim, será feito o exame de como a onda neoconservadora poderá atingir o Poder Judiciário e qual a solução para o desenvolvimento econômico, político e social de um país.

A técnica metodológica adotada foi a de pesquisa teórica, em livros, artigos e jurisprudência, a partir do método dedutivo na vertente jurídico-sociológica, com foco na teoria do declínio democrático no mundo de Steven Levitsky e Daniel Ziblatt como marco teórico.

Trata-se de questão com importância teórico-acadêmico-científica e prática, uma vez que existe uma real ameaça à democracia e, assim, há necessidade do estudo das suas origens, bem como, das possíveis soluções para esse problema.

2 DEMOCRACIA E ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

Em 1989, com a derrubada do Muro de Berlim e a subsequente extinção da União Soviética, Francis Fukuyama concebeu a tese do “fim da história”. Ingressaríamos em uma era de conjunção entre democracia e livre mercado.

Incrementou-se a globalização, conceito mais amplo do que contínuos avanços tecnológicos nos transportes e nas comunicações. Identifica-se, sobretudo, com comércio e investimento internacionais crescentes, melhor coordenação macroeconômica, circulação mais livre de bens, capitais e pessoas e formas comuns de ver e sentir o mundo.

No entanto, após a grave crise econômica mundial de 2008, todas essas frentes foram postas em xeque e surgiram vários vetores ‘desglobalizantes’: “Está posta à prova, sobretudo, a globalização dos valores, aquela ideia dos anos 1990 de que democracia representativa e economia de mercado eram os melhores parâmetros para a organização da sociedade” (TROYJO, 2016).

Especialmente nos países ibero-americanos, a democracia tem sido uma quimera. Somos legatários da cultura ibérica, conforme a lição de Octavio Paz (1983, p. 23-47):

Descendemos da cultura espanhola e portuguesa, que se apartara da corrente geral europeia precisamente quando a modernidade se iniciava. Durante os séculos XIX e XX, o continente latino-americano adotou sucessivos projetos de modernização, todos eles inspirados no exemplo norte-americano e europeu, sem que até agora nenhum de nossos países se possa dizer com inteira propriedade moderno. […]

Durante a dominação hispano-portuguesa, nossos países viveram à margem do mundo, num isolamento que, como assinalou o historiador O’Gorman, foi fatal para nossa educação política. […]

Para nós, latino-americanos, a evolução da Espanha e de Portugal é um fato de grande significação histórica. Muitas vezes se disse que o fracasso da democracia na Espanha e em Portugal, assim como em suas antigas colônias, era consequência de seu passado. Nossos povos não viveram a Reforma protestante e quase não conheceram o Iluminismo, isto é, não participaram dos grandes movimentos espirituais que prepararam a instauração das democracias modernas. (grifo no original)

2.1 Democracia

Aristóteles definia a pessoa humana como animal racional e político, seus dois traços fundamentais:

Nós nos distinguimos pela razão, porque somos capazes de pensar e refletir sobre o que fazemos e, acima de tudo, para nos surpreender, para nos perguntarmos por que eles são o princípio da filosofia. E então, somos animais políticos, isto é, temos que viver em uma polis, com os outros. Não há indivíduos que possam viver sozinhos porque todos temos linguagem, somos seres simbólicos e, portanto, um ser que tenha uma linguagem que ele não inventou, precisa de outros seres para compartilhar esse mundo de símbolos com eles[3]. (ARISTÓTELES Apud SAVATER, 2012, p. 38, tradução nossa).

Entre as formas de governo concebidas para a convivência das pessoas em sociedade, a que se demonstrou superior é a democracia.

Abraham Lincoln concebia a democracia como “o governo do povo, pelo povo e para o povo” (LINCOLN Apud SCHROEDER).

Na mesma esteira, tornaram-se célebres outras citações: “Se houvesse um povo de deuses, esse povo se governaria democraticamente (Jean Jacques Rousseau, O Contrato Social)” (ROUSSEAU Apud BONAVIDES, 1983, p. 319) e “A democracia é a pior de todas as formas imagináveis de governo, com exceção de todas as demais que já se experimentaram (Winston Churchill)” (CHURCHILL Apud BONAVIDES, 1983, p. 320).

O político brasileiro Otávio Mangabeira dizia que “a democracia é uma plantinha tenra, que deve ser regada todos os dias” (MANGABEIRA Apud CHAGAS, 2016).

Democracia é conceito histórico, explana o constitucionalista brasileiro José Afonso da Silva: “A democracia não é um mero conceito político abstrato e estático, mas é um processo de afirmação do povo e de garantia dos direitos fundamentais que o povo vai conquistando no correr da história (SILVA, 1997, p. 126).

Por definição, democracia é o regime onde não podem deixar de existir o desacordo, o protesto e o questionamento de situações consolidadas (GAUCHET, 2008).

Conforme Norberto Bobbio, a democracia tem um aspecto procedimental para a tomada de decisões:

Os ensinamentos de (Hans) Kelsen, jurista, estudioso em particular do direito público e do direito internacional, que escrevera uma obra de grande difusão sobre a essência da democracia, serviram-me também para considerar os problemas do governo democrático do ponto de vista de suas regras constitutivas que permitem dar uma definição processual ou metodológica, segundo a qual o que caracteriza os governos democráticos é um conjunto de regras de organização que permitem aos cidadãos tomarem decisões coletivas vinculadoras para todos através de mecanismos de formação de um livre convencimento e de manifestação direta ou indireta desse convencimento. (BOBBIO, 1999, p. 155-156)

Importante característica dos regimes democráticos – também apontava Bobbio – é a adoção do caráter público como regra e do segredo como exceção:

Que todas as decisões e mais em geral os atos dos governantes devam ser conhecidos pelo povo soberano foi considerado um dos eixos do regime democrático, definido como o governo direto do povo ou controlado pelo povo (e como poderia ser controlado se se mantivesse escondido?). Mesmo quando o ideal da democracia direta foi abandonado como anacrônico, com o nascimento do grande estado territorial moderno (mas também o pequeno estado territorial não é mais um estado-cidade), e foi substituído pelo ideal da democracia representativa – já perfeitamente delineado, exatamente em polêmica com a democracia dos antigos, numa carta de Madison a seus interlocutores –, o caráter público do poder, entendido não como secreto, como aberto ao ‘público’, permaneceu como um dos critérios fundamentais para distinguir o estado constitucional do estado absoluto e, assim, para assinalar o nascimento ou renascimento do poder público, em público. (BOBBIO, 1989, p. 86-87)

2.2 Estado Democrático de Direito

Ao longo da História das sociedades, existiram três paradigmas básicos de organização política: o Estado de Direito, o Estado de Bem-Estar Social e o Estado Democrático de Direito.

O primeiro paradigma, também chamado Estado Liberal, tem como princípio basilar o da legalidade. A teoria dos três poderes, consolidada por Montesquieu, fundamenta o Estado Liberal, coibindo o arbítrio dos governantes e oferecendo segurança jurídica para os governados. É o Estado legalmente contido, também chamado, por isso, Estado de Direito (SARAIVA, 1983).

Com o advento da Revolução Industrial, surgem necessidades sociais, as quais ficam mais evidenciadas, posteriormente, pelos sucessivos movimentos socialistas. Demonstram, com clareza, que não basta ao ser humano o atributo da liberdade. Há um imperativo maior, que é a própria condição de usufruir dessa liberdade, ou seja, a condição socioeconômica capaz de admiti-lo como pessoa humana (SARAIVA, 1983).

Diante da crise econômica do primeiro pós-guerra, o Estado foi premido, pela sociedade, a assumir papel ativo, seja como agente econômico (instalando indústrias, ampliando serviços, gerando empregos, financiando atividades), seja como intermediário na disputa entre poder econômico e miséria (defendendo trabalhadores em face de patrões, consumidores em face de empresários).

A partir das Constituições do México (1917) e de Weimar (1919), os modernos textos constitucionais incorporaram as novas preocupações: desenvolvimento da sociedade e valorização dos indivíduos socialmente inferiorizados. O Estado abandonou o papel não intervencionista para assumir postura de agente do desenvolvimento e da justiça social. Eis o Estado Social (SUNDFELD, 1997).

Superada a fase inicial, o Estado de Direito incorporou, paulatinamente, instrumentos democráticos, permitindo a participação do povo no exercício do poder e guardando coerência com o projeto inicial de controlar o Estado. A evolução culmina no Estado Democrático de Direito, com as seguintes características: a) criado e regulado por uma Constituição; b) onde os agentes públicos fundamentais são eleitos periodicamente pelo povo e respondem pelo cumprimento de deus deveres; c) onde o poder político é exercido, em parte diretamente pelo povo, em parte por órgãos estatais independentes e harmônicos, que controlam uns aos outros; d) onde a lei produzida pelo Legislativo é necessariamente observada pelos demais Poderes; e e) onde os cidadãos, sendo titulares de direitos, inclusive políticos, podem opô-los ao próprio Estado (SUNDFELD, 1997).

2.3 Colapso da Democracia

O economista espanhol Luis Garicano (2019, p. 29-30) sustenta que – independentemente de ser liberal ou marxista – deve-se aceitar que fatores econômicos geram ansiedade nas sociedades democráticas contemporâneas. Menciona vários deles:

O surgimento da China no comércio mundial e a redução do emprego industrial nos países ocidentais (empregos que “vão” para a China).

A estagnação do crescimento da renda de grande parte da população devido a causas tecnológicas relacionadas ao impacto diferido da automação e da inteligência artificial.

O progressivo desaparecimento do emprego rotineiro, também como consequência da automação e inteligência artificial.

A concentração de renda nos “superstars” de cada profissão, como resultado dos enormes avanços na tecnologia de comunicação.

A concentração do poder de mercado em um número decrescente de empresas devido às novas tecnologias.

O desaparecimento de parte das bases tributárias de nossas economias, tanto pela crescente mobilidade do capital como pela concorrência fiscal entre países[4]. (Tradução nossa)

As classes médias – prossegue – temem que o futuro não seja tão bom como previam.

Diminui a capacidade das políticas tradicionais para redistribuir e reduzir os custos da transição que sofrem os “perdedores da globalização”.

Os cidadãos percebem a situação como perda de controle sobre as suas vidas e o seu futuro. Observam que a Apple ou a Amazon não pagam impostos, mas os governos lhes dizem que não podem fazer nada a respeito.

Observam o crescimento da incerteza, porém a resposta é a mesma: “Isso é o que temos”.

Observam que as sucessivas crises migratórias, mas os governos também respondem que não podem controlar as fronteiras.

Observam que, após uma grande crise financeira, muitos dos seus responsáveis não suportam custo algum. Em muitos casos, nem os governos e nem a Justiça cobram responsabilidades pelos volumosos resgates.

E observam como permanecem impunes escândalos de corrupção, o que mina sua confiança no sistema.

Nessa conjuntura – conclui Garicano (2019) – os eleitores são seduzidos pelas falácias do Brexit, de Donald Trump, Viktor Orbán e outros políticos. Os líderes nacional-populistas prometem dar respostas simples à sua ansiedade. Oferecem uma nova política tribal. Prometem restabelecer o controle das fronteiras, recuperar o controle da globalização e restringir a redistribuição de benesses apenas aos membros da tribo (“Espanha nos rouba”). Em oposição à razão da ordem liberal baseada no direito, volta a emergir o nacionalismo, que se acreditava haver enterrado para sempre.

Até um passado recente – lembram Steven Levitsky e Daniel Ziblatt (2018, p. 11-14) – golpes de Estado militares derrubavam governos. Hoje, democracias morrem nas mãos de líderes eleitos:

Derrubaram o presidente egípicio Mohamed Morsi 2013 e a primeira-ministra tailandesa Yingluck Shinawatra em 2014. Em todos estes casos, a democracia foi dissolvida uma forma espetacular através da coação e poder militar.

No entanto, há outra maneira de romper uma democracia, uma maneira menos dramática, mas igualmente destrutiva. As democracias podem falhar nas mãos não mais de generais, mas de líderes eleitos, de presidentes ou primeiros-ministros que subvertem o próprio processo que os levou ao poder. Alguns desses líderes desmantelam a democracia rapidamente, como Hitler fez na esteira do incêndio do Reichstag em 1933 na Alemanha. Mas, em geral, as democracias são corroídas lentamente, em passos pouco significativos. […]

É assim que as democracias morrem hoje. As ditaduras flagrantes, na forma de fascismo, comunismo e governo militar, praticamente desapareceram do panorama. Golpes militares e outras invasões de poder por meios violentos são raros. Na maioria dos países, as eleições são realizadas regularmente. E embora as democracias continuem a falhar, elas o fazem de outras maneiras. Desde o fim da Guerra Fria, a maioria dos fracassos democráticos não foi causada por generais e soldados, mas pelos próprios governos eleitos. Como Chávez na Venezuela, líderes eleitos pela população subverteram instituições democráticas na Geórgia, no Sri Lanka, na Turquia e na Ucrânia. Atualmente, o retrocesso democrático começa nas urnas. […]

Muitas medidas governamentais que subvertem a democracia são “legais”, no sentido de serem aprovadas pela assembleia legislativa ou pelos tribunais. É possível que eles sejam vendidos às urnas como medidas para “melhorar” a democracia: fortalecer a eficácia do judiciário, combater a corrupção ou até mesmo sanear o processo eleitoral. A imprensa continua a ser publicada, embora esteja subordinada e a serviço do poder, ou então está sujeita a pressões que praticam a autocensura[5]. (Tradução nossa)

Em suma, no caso do Brasil, assinalou o cientista político Bolívar Lamounier (2017):

A democracia brasileira é uma construção paulatina, um processo que remonta ao século 19, que ainda se depara com obstáculos portentosos. Deixando de lado, por óbvias, as questões sociais, o obstáculo mais importante parece-me ser o ideológico. Ideológico, filosófico ou que outro nome se lhe queira dar. Parcelas consideráveis de nossa sociedade se recusam a entender que estamos ‘condenados’ à democracia; que a democracia, necessariamente representativa, tem como fundamento a filosofia política liberal; e que um dos componentes centrais do liberalismo político é o comedimento.

3 BRASIL 2018: UMA ELEIÇÃO DISRUPTIVA

Numa célebre entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, o político e escritor mexicano Jorge Castañeda (2016) comentou o fracasso da esquerda em países latino-americanos, como Brasil, Venezuela e outros:

Há lições a aprender. A primeira é poupar dinheiro. A segunda é a questão da corrupção, algo que a esquerda negligenciou. Pareciam acreditar que a corrupção era algo totalmente alheia a ela. A esquerda não seria corrompida porque era pobre, era honesta porque veio do povo, e o povo é honesto. Era transparente porque veio de lutas contra a ditadura, e ditaduras são o contrário disso. A esquerda acreditou que corrupção não era com ela, era um problema para as elites latino-americanas. Não é verdade. Corrupção é algo tão enraizado no continente que todos somos vulneráveis.

Foram tumultuadas as eleições gerais do Brasil, em 2018. Na adequada expressão do jornalista e escritor Pedro Doria (2018, p. 18), ocorreu, em 2018, uma “eleição disruptiva”:

Esta eleição de 2018 é disruptiva em muitos sentidos. Ouvi a expressão, tão utilizada no Vale do Silício, do cientista político Sergio Abranches em uma conversa na semana passada. Quando aplicada à indústria, disrupção é o processo pelo qual uma inovação vira o modelo de negócios de cabeça para baixo, tinge de vermelho as planilhas, provoca demissões em massa e, no fim, reinventa por completo a maneira como a coisa era feita.

A eleição que alçou Bolsonaro ao poder não é disruptiva apenas porque mudou a maneira de eleger um político, tornando o horário eleitoral inútil, e o tamanho do partido idem. Ela é disruptiva por ser o primeiro sinal claro de que a população brasileira está sentindo na pele os efeitos da transformação digital da vida. […]

Para uma população perdida, realmente desorientada perante as mudanças do mundo, nada como um candidato que representa o pai rigoroso que porá tudo em ordem. Tudo enquanto fala a língua do momento, em favor do empreendedorismo e via WhatsApp.

Em editorial, o jornal O Estado de S. Paulo (2019) acentuou:

O mais recente relatório da instituição americana Freedom House sobre o estado da democracia no mundo coloca o Brasil entre os dez países em que houve ‘importantes acontecimentos em 2018 que afetaram sua trajetória democrática’, demandando, assim, ‘um especial escrutínio’ em 2019.

‘O candidato de direita Jair Bolsonaro capturou a Presidência com uma retórica baseada no desdém pelos princípios democráticos’, diz o texto, para justificar a atenção especial dada ao Brasil.

4 NOVAS TECNOLOGIAS

Para o historiador israelense Yuval Noah Harari (2018, p. 14-15), o abalo da democracia ocorre em meio à revolução tecnológica:

No final do século XX tudo levava a crer que as grandes batalhas ideológicas entre fascismo, comunismo e liberalismo tinham resultado na vitória arrasadora do liberalismo. Democracia política, direitos humanos e capitalismo de livre mercado pareciam destinados a conquistar o mundo inteiro. Mas, como de costume, a história dá voltas inesperadas, e após o colapso do fascismo e do comunismo, agora o liberalismo está emperrado. Para onde caminhamos? […]

O liberalismo está perdendo credibilidade justo quando as revoluções gêmeas na tecnologia da informação e na biotecnologia enfrentam os maiores desafios com que nossa espécie já deparou. A fusão das duas áreas pode em breve expulsar bilhões de seres humanos do mercado de trabalho e solapar a liberdade e a igualdade. Algoritmos de Big Data poderiam criar ditaduras digitais nas quais todo o poder se concentra nas mãos de uma minúscula elite, enquanto a maior parte das pessoas sofre não em virtude de exploração, mas de algo muito pior: irrelevância.

Verifica-se na literatura acadêmica atual a fascinação pelo discurso tecnológico. As potencialidades transformadoras da inteligência artificial e da robótica são enormes. A “smartificação” e “robotização” impactam as atividades privadas e a Administração Pública. Opera-se a chamada “disrupção”, nas palavras de Carles Ramió (2019, p. 7-9, tradução nossa):

Quando dizemos que o digital é disruptivo, não estamos nos referindo à sua capacidade de levar inovação tecnológica a processos ou negócios, mas à sua capacidade de transformar a sociedade. A tecnologia digital está seguindo o mesmo caminho das tecnologias anteriores, como vapor ou eletricidade, e depois de alguns estágios iniciais de descoberta e engenharia, está agora em fase de transformação, o que é evidente porque não falamos mais de novos produtos. ou serviços, mas mudanças de hábitos nas pessoas e até mudanças nas escalas de valores[6].

O professor português António Covas (2017) comenta sobre a “smartificação”, o movimento geral de digitalização dos objetos (naturais e culturais) e a “indústria dos objetos conectados”: “Doravante […] tudo será smart, mais tarde ou mais cedo: a cidade, a habitação, a fábrica, o hospital, o aeroporto, a universidade, o centro comercial, mas, também, o campo agrícola, a empresa pecuária, a floresta, o parque natural etc.”.

O surgimento acelerado dos robôs nos meios de comunicação e nos lugares mais insuspeitos, sinaliza uma nova e vigorosa revolução industrial (VIDE, 2018).

Mais que isso, a inteligência artificial, a cibernética e a tecnologia robótica operam uma autêntica revolução social (MANTECÓN, 2018, p. 26-27).

As mudanças associadas à chamada “Quarta Revolução Industrial”, nas palavras de Klaus Schwab – criador da expressão – “afetam todos os aspectos da vida, desde a natureza do trabalho até o que significa ser humano, e podem ser esmagadores se não trabalharmos juntos para compreendê-los e gerenciá-los[7] (SEOANE, 2018, p. 82, tradução nossa).

4.1 Lado Nocivo das Tecnologias Digitais

As mesmas tecnologias que conferem as benesses da “smartificação” e da “robotização”, trazem também efeitos negativos.

Por exemplo, em 15.03.2019, um “supremacista” branco atacou duas mesquitas na cidade de Christchurch, Nova Zelândia, e matou a tiros dezenas de pessoas. Transmitiu parte do ataque ao vivo, pelo Facebook (HANCOCK; HIDALGO, 2019).

As redes sociais, na internet, são invadidas pelos haters:

Os haters, como são chamados em inglês os promotores da intolerância virtual, ameaçam tragar a internet. A saída: vigiá-los, puni-los e, por meio de processos na Justiça, tirá-los de circulação […]

Soa preciso o que disse Umberto Eco (1932-2016), para quem as redes sociais dão direito de palavra a ‘uma legião de imbecis’ que antes falavam apenas ‘em um bar e depois de uma taça de vinho’ […]

O psicólogo americano John Suler cunhou o termo ‘desinibição on-line’. A invisibilidade atrás de uma tela tem a força de mudar posturas – para o bem, multiplicando generosidade, mas também para o mal. (THOMAS, 2017, p. 78)

O escritor português João Pereira Coutinho (2018) fala sobre esse novo tribalismo virtual:

A submissão ao pensamento de grupo não é um exclusivo de ‘esquerdistas radicais’.

Basta escutar a ‘direita radical’ e as suas proclamações contra ‘os estrangeiros’ – e em defesa dos ‘nacionais’, claro – para compreender a grande ironia do debate político atual: esquerda e direita estão contaminadas pelo vírus do pensamento de grupo.

Pelo meio, perde-se a importância (e a primazia) do indivíduo – essa ficção pequeno-burguesa, como diziam nazistas ou comunistas, e que as mentes autoritárias sempre tentaram calar ou destruir.

E como se chegou até aqui?

Em artigo recente para o ‘The Millions’, Sarah LaBrie acusa a internet (e as ‘redes sociais’) de produzir as manadas que esmagam a ‘soberania do ser’. É um bom ponto de partida – mas não de chegada: a internet deu voz e potenciou as manadas; mas elas sempre existiram no longo cortejo da história.

Como dizia David Hume, onde existe vaidade e ignorância, existe entusiasmo. E a alma dos homens sempre foi fraca: entre a solidão do individualismo e a pertença aos entusiasmos da tribo, o macaco eterno não hesita.

No Brasil atual, os adeptos e os opositores do Presidente Jair Bolsonaro engalfinham-se pela internet. Esse clima beligerante envolve todos os Poderes constituídos:

Hoje, os bolsonaristas atacam pelas redes sociais quem critica o governo ou discorda de decisões tomadas e de atitudes que consideram indecorosas. São todos comunistas. O ambiente político não comporta distensão nas duas pontas, e o embate ideológico abrange também os poderes da República.

É sinal de nossa decadência como sociedade a impossibilidade de políticos e autoridades andarem nas ruas, ou entrarem em aviões. As redes sociais mudaram o patamar da participação dos cidadãos no debate político, o que pode ser bom e mau ao mesmo tempo.

Bom porque amplia a capacidade de influir dos cidadãos, em nome de quem o poder é exercido. Mas mau, como acontece com mais frequência do que seria de se desejar num país civilizado, quando essas mesmas redes são utilizadas para vilipendiar políticos e autoridades de maneira geral. (PEREIRA, 2019, p. 2)

No campo eleitoral, assinalou Giovanni Sartori (2009, p. 31-34) que as eleições devem ser livres. Sem dúvida, mas também as opiniões devem ser livres, ou seja, livremente formadas. Se as opiniões são impostas, as eleições não são livres.

Todavia, com o advento da internet, são disseminadas as fake news – notícias falsas que se espalham pelo mundo virtual (LIMA, 2018).

O escritor colombiano Gabriel García Márquez escreveu o famoso romance Cem anos de solidão e foi laureado com o prêmio Nobel de Literatura. Publicou O veneno da madrugada (1994), livro no qual descreveu a circulação de panfletos anônimos, durante a madrugada, em um fictício povoado colombiano. Os impressos atacavam a reputação de autoridades, religiosos, casais e outros habitantes da comunidade.

Há noticias de que, anos atrás, em pequenas cidades do interior do Estado de Minas Gerais, havia distribuição de panfletos semelhantes nas madrugadas antecedentes às eleições municipais.

Ofendiam a honra de candidatos a prefeito e – não raramente – interferiam de maneira ilícita nos resultados dos pleitos.

Era difícil identificar os autores da panfletagem. Isso poderia ser chamado de “crime perfeito”.

Portanto, sempre foram veiculadas inverdades para influenciar no resultado das eleições.

No pleito presidencial brasileiro de 1945, atribuiu-se falsamente ao Brigadeiro Eduardo Gomes – até então candidato favorito – a declaração de que não precisava dos votos dos “marmiteiros” para ser eleito. Gomes perdeu a eleição para o General Eurico Dutra (FGV, 2018).

A Justiça Eleitoral não tem como prevenir de modo eficaz esse tipo de veiculação.

Coibi-la implica o risco de censurar a liberdade de expressão. Qual o remédio?

O Ministro Luiz Fux, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, convocou a imprensa brasileira a colaborar na contraofensiva às fake news.

Jornalismo confiável e de qualidade é o melhor antídoto contra a disseminação de notícias falsas.

5 DESPRESTÍGIO DOS PARTIDOS POLÍTICOS

O comentarista político Merval Pereira (2018) resumiu o ocorrido na eleição brasileira de 2018: O povo fez valer a sua opinião contra as cúpulas partidárias, que tentaram controlar a eleição”.

Segundo Manuel Castells (2013), os “indignados” de 2011, na Espanha, externaram forte rejeição aos partidos políticos constituídos, símbolos da “velha política”: “Existe um abismo tão grande entre o que os manifestantes pensam e o sistema político real, que não há uma expressão política capaz de representá-los”.

Desde o final do século passado, Alain Touraine (1996, p. 266-267) já apontava o enfraquecimento do Estado e o fortalecimento da sociedade civil, mediante atuação de organizações não governamentais em nível global: “A ação democrática […] refugia-se à margem das instituições oficiais, nas associações voluntárias que, tendo surgido a partir de objetivos humanitários, tornaram-se as principais defensoras dos direitos das minorias e das nações e categorias sociais oprimidas ou excluídas”.

Os partidos somente serão instrumentos da democracia se contarem com a participação e controle direto das massas (BOBBIO, 2000).

Todavia, criticava Maurice Duverger (1970, p. 455):

A organização dos partidos políticos, certamente, não se conforma à ortodoxia democrática. A respectiva estrutura interna é, essencialmente, autocrática e oligárquica; os chefes não são, de fato, designados pelos adeptos, apesar da aparência, mas cooptados ou nomeados pelo centro; tendem a formar uma classe dirigente, isolada dos militantes, casta mais ou menos fechada sobre si mesma. Na medida em que eles são eleitos, a oligarquia partidária amplia-se, mas não se transforma em democracia, pois a eleição é feita pelos adeptos, que são uma minoria em relação aos que dão seus votos ao partido quando das eleições gerais.

Igualmente, censurava Norberto Bobbio (1995, p. 193) ao avaliar os partidos políticos italianos: “Em vez de subordinarem os interesses partidários e pessoais aos interesses gerais, grandes e pequenos partidos disputam para ver quem consegue desfrutar com maior astúcia todas as oportunidades para ampliar a própria esfera de poder”.

No Brasil, analisava Edgard Costa (1964, p. 334-335) – ex-ministro do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral:

O papel e a função reservados aos partidos políticos na política de regímen democrático, como órgãos de opinião pública, exigem deles alguma coisa mais que a busca e captação de votos nos pleitos eleitorais.

Como, com procedência, ressaltou RUY BLOEM (A crise da democracia e a reforma eleitoral), – eles ‘só dão sinal de vida nas vésperas das eleições. Não exercem, portanto, a função permanente, que lhes cabe, de contacto com o eleitorado, de orientação deste, de divulgação, entre os correligionários, do programa partidário; da consolidação, enfim, das suas verdadeiras bases como correntes de opinião que todos eles devem representar. Limitam-se a exercer o privilégio, que lhes foi conferido pelo Código Eleitoral, de indicar candidatos aos cargos eletivos e de trabalhar, durante as campanhas, pelo fortalecimento das suas legendas. E, depois de cada pleito, voltam à inércia.

6 IMPRENSA EM APUROS

A liberdade de imprensa é atributo indispensável do Estado Democrático de Direito e está consagrada pela Constituição da República de 1988:

Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

§ 1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.

§ 2º É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística. (BRASIL, 1988)

John Stuart Mill (2006, p. 30) definia a liberdade humana: “Ela compreende, primeiro, o domínio interno da consciência; liberdade de pensamento e sentimento; absoluta liberdade de opinião e sentimento sobre todos os assuntos, práticos ou especulativos, científicos, morais ou teológicos”.

Tornou-se célebre a frase de Thomas Jefferson: “A base de nossos governos sendo a opinião do povo, o primeiro objetivo deve ser mantê-la exata; fosse deixado a mim decidir se deveriam ter um governo sem jornais ou jornais sem um governo, não hesitaria um momento em preferir este último” (JEFFERSON apud LIMA, 2019).

No Brasil, o Supremo Tribunal Federal (2015) prestigia a liberdade de imprensa:

A liberdade de imprensa, qualificada por sua natureza essencialmente constitucional, assegura aos profissionais de comunicação social o direito de buscar, de receber e de transmitir informações e ideias por quaisquer meios, inclusive digitais, ressalvada, no entanto, a possibilidade de intervenção judicial – necessariamente “a posteriori” – nos casos em que se registrar prática abusiva dessa prerrogativa de ordem jurídica, resguardado, sempre, o sigilo da fonte quando, a critério do próprio jornalista, este assim o julgar necessário ao seu exercício profissional. (Rcl 21504 AgR – 2ª T. – Rel. Min. Celso de Mello – j. em 17.11.2015 – DJe-249 10.12.2015 – Publicado em 11.12.2015)

No entanto, a imprensa brasileira falhou na cobertura do pleito de 2018, como aponta o jornalista J. R. Guzzo (2018):

A diminuição do público interessado em acompanhar o que a mídia lhe diz não começou agora, é claro. Há dez ou quinze anos a migração passou a ganhar volume – e não parou mais, por motivos que já foram explicados em milhões de palavras, a maioria delas, aliás, lida por bem pouca gente. Mas, pelo menos no caso do Brasil, provavelmente não tinha havido até esta última campanha eleitoral uma oportunidade tão clara de medir o tamanho da distância, a cada dia maior, que separa hoje o que a imprensa imprime ou põe no ar daquilo que existe nos corações, mentes e sentimentos da audiência. É um abismo. A mídia diz uma coisa. O público acha o contrário. A mídia anuncia que vão acontecer os fatos A, B e C. Não acontece nenhum dos três. A mídia quer que as pessoas façam isso ou aquilo. As pessoas fazem exatamente o oposto.

Alguns jornalistas permanecem insensíveis à desconfiança que passaram a despertar na opinião pública e mantêm visão distorcida da sua atividade: “A imprensa não está contra esse ou aquele presidente. ‘Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados’, já dizia Millôr Fernandes. Ao menos é assim que deveria ser. E, ao fazer oposição, vamos apanhar sempre” (JORGE, 2018).

7 NEOCONSTITUCIONALISMO

Encerrada a Segunda Guerra Mundial, a Europa foi remodelada e sobreveio duradoura paz. Surgiu um novo constitucionalismo, centrado no valor pessoa humana e de cunho internacional. Tornou-se impensável outra guerra no continente (JUDT, 1945).

O constitucionalismo contemporâneo nasce com vocação universal. Todos os seres humanos, onde quer que vivam e se organizem em sociedade, são igualmente dotados de dignidade e de direitos inalienáveis. A dignidade da pessoa humana constitui núcleo forte do constitucionalismo contemporâneo (ONIDA, 2008, p. 13-52).

Nesse contexto, surgiu o neoconstitucionalismo, assim caracterizado pela doutrina: a) superação da supremacia do Parlamento, b) superioridade da Constituição, c) subordinação à Constituição de todos os poderes por ela constituídos, garantida por mecanismos jurisdicionais de controle de constitucionalidade, d) absorção, pela Constituição de valores morais e políticos (materialização da Constituição), e e) sistema de direitos fundamentais autoaplicáveis (MENDES; BRANCO, p. 53-54).

O novo direito constitucional ou neoconstitucionalismo desenvolveu-se na Europa, ao longo da segunda metade do século XX, e, no Brasil, após a Constituição de 1988. O ambiente filosófico em que floresceu foi o do pós-positivismo, tendo como principais mudanças de paradigma, no plano teórico, o reconhecimento de força normativa à Constituição, a expansão da jurisdição constitucional e a elaboração das diferentes categorias da nova interpretação constitucional.

Fruto desse processo, a constitucionalização do Direito importa na irradiação dos valores abrigados nos princípios e regras da Constituição por todo o ordenamento jurídico, notadamente por via da jurisdição constitucional, em seus diferentes níveis. Dela resulta a aplicabilidade direta da Constituição a diversas situações, a inconstitucionalidade das normas incompatíveis com a Carta Constitucional e, sobretudo, a interpretação das normas infraconstitucionais conforme a Constituição, circunstância que irá conformar-lhes o sentido e o alcance. A constitucionalização, o aumento da demanda por justiça por parte da sociedade brasileira e a ascensão institucional do Poder Judiciário provocaram, no Brasil, uma intensa judicialização das relações políticas e sociais[8]. (BARROSO, 2018)

7.1 Ativismo Judicial

Fenômeno correlacionado ao neoconstitucionalismo[9] é o denominado ativismo judicial.

Seus adeptos consideram superado o dogma da completude do sistema jurídico pelo legislador. É preciso conferir eficácia à Constituição. O legislador não é o único responsável pela tarefa:

O Judiciário não é um mero carimbador de decisões políticas das demais funções. […]

O legislador não é o único responsável por viabilizar a Constituição. O juiz tem a missão constitucional de impedir ações ou omissões contrárias ao texto, sem que com essa atitude esteja violando a Constituição. O juiz não é mais a simples boca da lei, mas intérprete constitucional qualificado, que vai permitir que a Constituição não soçobre numa realidade instável como a que vivemos. […]

Para o cumprimento desse mister, é indispensável vislumbrar, no princípio da separação de funções, não um fim em si mesmo, mas um meio para a efetivação da Constituição, devendo o Judiciário, portanto, nesse novo momento, atuar diretamente na preservação da supremacia da Constituição. (FREIRE JÚNIOR, 2005, p. 42-45)

Nos países institucionalmente mais frágeis, sustenta-se a importância da postura ativa do Judiciário, em face da baixa legitimação dos demais poderes e de seus grandes papéis: resguardar os valores fundamentais e os procedimentos democráticos, assim como assegurar a estabilidade institucional[10] (BARROSO, 2018).

Nos Estados Unidos, vigora antiga polêmica entre os que defendem o ativismo da Corte Suprema e os adeptos da sua contenção.

Entre 1935 e 1936, a Corte revogou medidas do governo do Presidente Franklin D. Roosevelt, para combater a Grande Depressão. Adveio histórico conflito entre os Poderes Executivo e Judiciário[11] (BAUM, 1987).

Pari passu ao ativismo judicial, o Brasil experimenta intensa judicialização da política e da vida social em geral (LIMA, 2012).

No Estado Democrático de Direito “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição” (BRASIL, 1988).

A Revolução Francesa (1789) fortaleceu o denominado “sistema representativo”, o qual substituiu o direito divino dos reis pela soberania popular. Entre a impossibilidade da democracia direta e o horror ao absolutismo monárquico, os revolucionários pretenderam criar um governo livre e natural (AZAMBUJA, 1982).

Presidente da República, governadores e prefeitos são eleitos para governar. Senadores, deputados federais, deputados estaduais e vereadores são eleitos para legislar. Magistrados prestam concurso – ou são nomeados – para julgar conflitos de interesses, à luz da Constituição Federal e demais textos legais. Simples assim, parece; mas não é.

O controle crescente da Justiça sobre a vida coletiva é um dos maiores fatos políticos contemporâneos. Juízes são chamados a manifestar em número cada vez mais extenso de setores da vida social (GARAPON, 1999).

Minorias derrotadas em votações do Congresso costumam recorrer aos tribunais para obter as mudanças frustradas na via legislativa (FERREYRA, 2013).

Nessa quadra, após experiência como ministro da Suprema Corte brasileira, Eros Roberto (2013, p. 21) publicou a obra Por que tenho medo dos juízes (a interpretação/aplicação do direito e os princípios). Sustenta que a invasão da competência do Poder Legislativo pelo Judiciário é alarmante. Não se vive mais Estado de Direito, porém submissos a um “Estado de juízes”. Destaca o autor que “[…] é necessário afirmar bem alto: os juízes aplicam o direito, os juízes não fazem justiça! Vamos à Faculdade de Direito aprender direito, não justiça. Justiça é com a religião, a filosofia, a história. […] Assim é o juiz: interpreta o direito cumprindo o papel que a Constituição lhe atribui”.

E revelou o “medo de que a Constituição seja corroída pelo Supremo Tribunal Federal”:

O STF, de alguns anos para cá, tem-se excedido, tem ido muito além do que a Constituição e a prudência permitem, passando a exercer não apenas o controle da constitucionalidade, mas também o controle da razoabilidade das leis. Não somente ministros do STF, mas juízes de qualquer instância julgam-se no direito de decidir se determinada lei é, ou não, razoável. O que prevalece, em cada decisão, é a preferência, o subjetivismo de cada um desses ministros.

No Estado democrático de direito o poder é uno e indivisível, embora as funções estatais sejam distribuídas entre Legislativo, Executivo e Judiciário. Todos eles exercitam a função normativa – função legislativa, função regulamentar e função regimental – mas a parcela mais relevante dessa função, a legislativa, é própria do Legislativo. Ao Poder Judiciário é vedado o exercício da função legislativa, ainda que lhe caiba o da função regimental. Essa regra essencial ao Estado democrático de direito é rompida sempre que os juízes passam a exercer o controle da razoabilidade – ou proporcionalidade – das leis.

O que então prevalece na decisão judicial já não é a Constituição, porém a preferência, o valor que cada juiz adota subjetivamente, como critério de aferição da razoabilidade ou proporcionalidade de cada lei. Em outros termos, o juiz avalia não a sua constitucionalidade, mas se a lei é boa (razoável) ou má (irrazoável), segundo suas preferências pessoais. Cada qual – repito – decide conforme o seu gosto pessoal. Ainda que os juízes devam considerar as pautas da razoabilidade e da proporcionalidade na Constituição, não estão autorizados a decidir cada caso discricionariamente, segundo os valores que adotam, tomando como sem valor, como se não valesse nada, tudo quanto não corresponda aos seus valores. Como se tivessem legitimidade para exercer função legislativa. Perde-se, assim, a referência da Constituição e a harmonia entre os poderes é sacrificada. No caso do Supremo Tribunal Federal, tudo se torna ainda mais grave na medida em que o tribunal sai do seu recato e, voluntariamente, submete-se às pressões sociedade, pressões às quais tipicamente, caracteristicamente, deve estar sujeito o Legislativo. O que a um Poder dá legitimidade – o decidir do Legislativo sob pressão social – a outro desnatura. (GRAU, 2013)

8 Constitucionalismo Democrático

O constitucionalista alemão Peter Häberle (2002, p. 9-10) defendeu a adoção de hermenêutica constitucional “adequada à sociedade pluralista ou à chamada sociedade aberta”:

A ampliação do círculo dos intérpretes aqui sustentada é apenas a consequência da necessidade, por todos defendida, de integração da realidade no processo de interpretação. É que os intérpretes em sentido amplo compõem essa realidade pluralista. Se se reconhece que a norma não é uma decisão prévia, simples e acabada, há de se indagar sobre os participantes no seu desenvolvimento funcional, sobre as forças ativas da ‘law in public action’ (personalização, pluralização da interpretação constitucional). […]

A vinculação judicial à lei e a independência pessoal e funcional dos juízes não podem escamotear o fato de que o juiz interpreta a Constituição na esfera pública e na realidade […]. Seria errôneo reconhecer as influências, as expectativas, as obrigações sociais a que estão submetidos os juízes apenas sob o aspecto de uma ameaça à sua independência. Essas influências contêm também uma parte de legitimação e evitam o livre arbítrio da interpretação judicial. A garantia da independência dos juízes somente é tolerável, porque outras funções estatais e a esfera pública pluralista […] fornecem material para a lei […].

Tem-se aqui uma derivação da tese segundo a qual todos estão inseridos no processo de interpretação constitucional, até mesmo aqueles que não são diretamente por ela afetados. Quanto mais ampla for, do ponto de vista objetivo e metodológico, a interpretação constitucional, mais amplo há de ser o círculo dos que dela devem participar. É que se cuida de Constituição enquanto processo público […]. Diante da objeção de que a unidade da Constituição se perderia com a adoção desse entendimento, deve-se observar que as regras básicas de interpretação remetem ao ‘concerto’ que resulta da conjugação desses diferentes intérpretes da Constituição no exercício de suas funções específicas. A própria abertura da Constituição demonstra que não apenas o constitucionalista participa desse processo de interpretação! A unidade da Constituição surge da conjugação do processo e das funções de diferentes intérpretes. Aqui devem ser desenvolvidas reflexões sob a perspectiva da Teoria da Constituição e da Teoria de Democracia. (grifos nossos)

Os professores norte-americanos Robert Post e Reva Siegel (2013), da Faculdade de Direito da Universidade de Yale, defendem tese similar: o constitucionalismo democrático fornece instrumentos para a compreensão das maneiras pelas quais a Constituição inspira lealdade, apesar do intenso desacordo sobre o seu significado.

O pluralismo, como um dos valores próprios e distintivos das sociedades democráticas contemporâneas, implica em se considerar permanentemente aberto o pacto constitucional (Jürgen HABERMAS).

Os defensores do constitucionalismo democrático subscreveriam a metáfora sobre democracia, proposta pelo ex-presidente dos Estados Unidos Barack Obama: não é uma casa que se deve construir, mas uma conversação a ser mantida.

Os consensos locais, a percepção da opinião pública, as tendências dos movimentos políticos e das organizações civis devem também ser considerados, quando se ponderam os princípios na interpretação dos casos difíceis.

8.1 Suprema Corte na Alça de Mira

Ainda conforme Post e Siegel (2013), os liberais, defensores de uma concepção progressista do Direito Constitucional, precisam aprofundar a defesa do importante papel desempenhado pelos tribunais nas democracias constitucionais.

Devem, sobretudo, tomar consciência da influência que podem exercer na configuração do Direito Constitucional. A exemplo dos republicanos, que se envolveram na ação política, durante o governo de Ronald Reagan (1981-1989), para conter os avanços da Corte Warren (1953-1969) nos campos da igualdade, justiça social e ações afirmativas (POST; SIEGEL, 2013, p. 12-13).

No Brasil, deputados federais ligados ao presidente Jair Bolsonaro pregam a adoção de medidas para conferir perfil conservador ao Supremo Tribunal Federal, em detrimento do neoconstitucionalismo e ativismo judicial adotados nas últimas duas décadas:

Segundo o jornal Valor Econômico, a ideia é aprovar, já início da legislatura, uma PEC tornando a fixar em 70 anos a idade para aposentadoria de ministros de tribunais superiores. Com a medida, Bolsonaro ampliaria sua influência no STF, conseguindo nomear quatro dos 11 membros da corte, e não apenas dois, como previsto. […]

Durante a campanha presidencial, Bolsonaro já tinha ventilado que uma de suas propostas era aumentar o número de ministros do Supremo de 11 para 21 para, assim, conseguir teoricamente assegurar maioria em votações de interesse do governo. (Deputados…, 2018).

9 IMPORTÂNCIA DA EDUCAÇÃO

Maquiavel, no século XVI, já vislumbrava a importância da educação para conter a propensão dos homens para o mal e redirecionar suas tendências egoístas e ambiciosas. Dessa forma, criam-se condições para a convivência de desejos conflitantes (RODRIGO, 2002).

O sociólogo francês Gaston Bouthoul (1976, p. 97) escrevia: “O funcionamento da democracia está vinculado à educação política das massas, à sua informação e ao seu grau de bem-estar econômico. Ela vinga à medida em que se forme uma opinião livre e bem informada”.

No Brasil, dois grandes vultos, em diferentes épocas, D. Pedro II e San Tiago Dantas respectivamente, proclamaram: “Eu não tenho confiança senão na educação do povo. […] Sem bastante educação popular não haverá eleições como todos devemos querer. […] A instrução primária deve ser obrigatória e generalizada por todos os modos” (D. Pedro II apud CARVALHO, 2007, p. 184-185).

O desenvolvimento não é um processo econômico, mas um processo econômico-cultural” (DUTRA, 2007, p. 19).

A educação em alto nível de todos os cidadãos e cidadãs de um país é imprescindível ao exercício da cidadania e atuação nas esferas pública e privada.

Somente assim uma nação se desenvolverá econômica, política e socialmente.

10 CONCLUSÃO

A partir de 1989, com a queda do Muro de Berlim, cogitou-se o triunfo global das democracias liberais, em detrimento dos regimes autoritários de esquerda ou de direita. Todavia, neste início do século XXI o mundo experimenta uma onda neoconservadora e o abalo das democracias constitucionais.

Verificou-se que o neoconservadorismo propaga-se com o impulso das modernas tecnologias de comunicação em massa.

Após exame de como as potencialidades transformadoras da inteligência artificial e da robótica são enormes e impactam as atividades privadas e a Administração Pública, verificou-se que as mesmas tecnologias que conferem as benesses da “smartificação” e da “robotização”, trazem também efeitos negativos, a exemplo da propagação do ódio, violência e fake news nas redes sociais.

As eleições gerais brasileiras, em 2018, foram bastante tumultuadas e desruptivas. Derrubaram velhos paradigmas e assinalaram a importância das redes sociais na campanha eleitoral; o desprestígio dos partidos políticos, despidos de representatividade popular; e os apuros da imprensa, dissociada do mundo real.

Assim, foi possível demonstrar que a rápida propagação de fake news, nas campanhas de candidatos e partidos políticos, pode macular a legitimidade das eleições.

A onda neoconservadora poderá atingir o Poder Judiciário. A exemplo do que ocorreu nos Estados Unidos durante o governo de Ronald Reagan (1981-1989), aliados do presidente brasileiro Jair Bolsonaro pregam a adoção de medidas para conferir perfil conservador ao Supremo Tribunal Federal, em detrimento do neoconstitucionalismo e ativismo judicial adotados nas últimas duas décadas.

Conclui-se, assim, pela necessidade de que o Estado Democrático de Direito seja preservado, por permitir a participação do povo no exercício do poder, além de guardar coerência com o projeto de controlar o Estado.

Ademais, a educação em alto nível de todos os cidadãos e cidadãs é imprescindível ao desenvolvimento econômico, político e social de um país.

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Notas de Rodapé

[1] Doutor em Direito Administrativo pela Universidade Federal de Minas Gerais. Desembargador do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Professor da Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais e do Centro Universitário Newton Paiva em Belo Horizonte/MG, Brasil.

[2] Mestranda em Direito pela Universidade FUMEC, Belo Horizonte/MG. Especialista em Processo Civil pela Universidade de Coimbra (Portugal) e em Direito Público pela Faculdade Milton Campos. Assessora de desembargador no Tribunal de Justiça de Minas Gerais.

[3] Texto original: “Nos distinguimos por la razón, porque somos capaces de pensar y de reflexionar acerca de lo que hacemos y sobre todo de asombrarnos, perguntarnos ‘por qué’ son el principio de la filosofia. Y luego, somos animales políticos, es decir, tenemos que habitar en una polis, con los demás. No hay indivíduos que puedan vivir solos porque todos tenemos lenguaje, somos seres simbólicos y por tanto, un ser que tiene un lenguaje que él no ha inventado, necesita de los otros seres para compartir ese mundo de símbolos con ellos”.

[4] Texto original: “La irrupción de China en el comercio mundial y la reducción del empleo industrial en los países occidentales (los empleos que ‘se van’ a China).

El estancamiento del crecimiento de los ingresos de una gran parte de la población por causas tecnológicas relacionadas con el impacto diferido de la automatización y la inteligencia artificial.

La progresiva desaparición del empleo rutinario, también como consecuencia de la automatización y la inteligencia artificial.

La concentración de los ingresos en las ‘superestrellas’ de cada profesión como consecuencia de los enormes avances en tecnología de la comunicación.

La concentración del poder de mercado en un número cada vez menor de empresas a causa de las nuevas tecnologías.

La desaparición de parte de las bases tributarias de nuestras economias, tanto por la cresciente movilidad de capitales como por la competencia fiscal entre países”.

[5] Texto original: “Derrocaron al presidente egipicio Mohamed Morsi em 2013 y a la primera ministra tailandesa Yingluck Shinawatra en 2014. En todos estos casos, la democracia se disolvió de un modo espetacular, mediante la coacción y el poder militar.Sin embargo, existe outra manera de hacer quebrar una democracia, un modo menos dramático pero igual de destructivo. Las democracias pueden fracasar en manos no ya de generales, sino de líderes electos, de presidentes o primeros ministros que subvierten el proceso mismo que los condujo ao poder. Algunos de esos dirigentes desmantelan la democracia con rapidez, como hizo Hitler en la estela del incendio del Reichstag en 1933 en Alemania. Pero, en general las democracias se erosionan lentamente, en pasos apenas apreciables. […]Así es como mueren las democracias hoy en día. Las dictaduras flagrantes, en forma de fascismo, comunismo y gobierno militar, prácticamente han desaparecido del panorama. Los golpes militares y otras usurpaciones del poder por medios violentos son poco frequentes. En la mayoría de los países se celebran elecciones con regularidad. Y aunque las democracias siguen fracasando, lo hacen de otras formas. Desde el final de la Guerra Fría, la mayoría de las quiebras democráticas no las han provocado generales y soldados, sino los propios gobiernos electos. Como Chávez en Venezuela, dirigentes elegidos por la población han subvertido las instituciones democráticas en Geórgia, Sri Lanka, Turquia y Ucrânia. En la actualidad, el retroceso democrático empieza en las urnas. […]Muchas medidas gubernamentales que subvierten la democracia son ‘legales’, en el sentido de que las aprueban la asemblea legislativa o los tribunales. Es posible que incluso se vendan a la plobación como medidas para ‘mejorar’ la democracia: para reforzar la eficacia del poder judicial, combatir la corrupción o incluso sanear el proceso electoral. Se sigue publicando prensa, si bien esta está subornada y al servicio del poder, o bien tan sometida a presión que practica la autocensura”.

[6] Texto original: “Cuando décimos que lo digital es disruptivo no nos referimos a sua capacidad de aportar innovación tecnológica a los procesos o a los negocios, sino a su capacidade de transformar la sociedad. La tecnología digital está siguiendo el mismo caminho que otras tecnologías anteriores como el vapor o la electricidad y, tras unas primeras etapas de descubrimiento e ingeniería, ahora ya se encuentra en una fase de transformación, que se evidencia en que ya no hablamos de nuevos produtos o servicios, sino de cambios de hábitos en las personas e incluso en cambios en las escalas de valores”.

[7] Texto original: “afectan todos los aspectos de la vida, desde la naturaleza del trabajo hasta lo que significa ser humano, y pueden resultarnos abrumadores si no trabajamos juntos para comprenderlos y manejarlos.

[8] Sobre o tema, ver também Ingo Wolfgang Sarlet no livro escrito em 2012 sobre o Neoconstitucionalismo e influência dos direitos fundamentais no direito privado: algumas notas sobre a evolução brasileira.

[9] Há os críticos do neoconstitucionalismo, entre os quais destaca-se Humberto Ávila (Neoconstitucionalismo: Entre a “Ciência do Direito” e o “Direito da Ciência”, 2017) e Lenio Luiz Streck (E o professor me disse: “Isso é assim mesmo!”, 2012). Este último, ao criticar a fragmentação das interpretações judiciais, aponta a existência, no Brasil atual, de uma espécie de “estado de natureza hermenêutico”.

[10] Estabelece o art. 37 do Código Iberoamericano de Ética Judicial: “El juez equitativo es el que, sin transgredir el Derecho vigente, toma en cuenta las peculiaridades del caso y lo resuelve basándose en criterios coherentes con los valores del ordenamiento y que puedan extenderse a todos los casos sustancialmente semejantes”.

[11] Falava-se, então, no “governo dos juízes” (ver o livro: Direito constitucional americano de Bernard Schwartz).