DOI: 10.19135/revista.consinter.00021.07
Recebido/Received 31/07/2025 – Aprovado/Approved 12/11/2025
Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos[1] – https://orcid.org/0000-0002-1835-761X
Marilene Araujo[2] – https://orcid.org/0000-0001-5611-3184
Resumo
Os fluxos migratórios e o direito ao deslocamento pelas fronteiras são questões que se impõem como urgentes diante das violações aos direitos humanos de indivíduos e grupos em situação de migração. Os diversos tratados e convenções internacionais parecem não ser suficientes para garantia de direitos. Ao mesmo tempo, o advento das tecnologias de informações fez surgir em cena o homo digital migrante que agora, além das fronteiras físicas, está submetido aos impedimentos da lógica do controle digital. Este estudo se propõe a analisar os impactos da Inteligência Artificial nos fluxos migratórios sob a ótica da proteção dos direitos humanos. A problemática consiste na violação constante de direitos humanos em frente as barreiras impostas pelas fronteiras e pelas tecnologias que desconsideram direitos consagrados em documentos jurídicos internacionais. A hipótese é que o surgimento das novas tecnologias exige uma nova reflexão e ação ética e a necessidade de marcos regulatórios que protejam de forma eficiente os direitos humanos dos migrantes. A metodologia empregada é hibrida, de caráter descritivo-bibliográfico-explicativo, com a aplicação da Tópica aristotélica para o constante questionamento. Como resultado, a constatação da necessidade de uma norma para os direitos humanos dos migrantes, pois o progresso só é possível aliado com a ética, a Tecnoética e a prática jurídica.
Palavras-chave: Inteligência Artificial. Fluxos Migratórios: migrantes e refugiados. Políticas Públicas. Direitos Humanos.
Abstract
Migration flows and the right to cross borders are pressing issues, given the human rights violations of individuals and groups experiencing migration. The various international treaties and conventions appear insufficient to guarantee rights. At the same time, the advent of information technologies has brought to the forefront the homo digital migrant, now subject to the constraints of digital control beyond physical borders. This study aims to analyze the impacts of Artificial Intelligence on migration flows from the perspective of human rights protection. It is based on the hypothesis that new technologies require renewed reflection and action from an ethical and legal perspective, highlighting the need for regulatory frameworks that protect the human rights of migrants. The methodology employed is hybrid, descriptive-bibliographical-explanatory, applying Aristotelian Topics to constantly question them. As a result, the need for a standard for the human rights of migrants was recognized, as progress is only possible in conjunction with ethics, techno-ethics and legal practice.
Keywords: Artificial Intelligence(ies). Migration Flows: Migrants and Refugees. Public Policies. Human Rights.
Sumário: 1. Introdução. 2. O Pêndulo Trágico da História. 3. O Marco Normativo. 3.1 Do direito de asilo. 3.2. Os Refugiados e seus direitos. 4. IA(s) e gestão de fronteiras: navegando pela migração. 5. O Crescente protagonismo da Ética Digital e suas múltiplas manifestações. 6. O Homo digital. 7. A proteção jurídica do migrante digital. 8. Considerações Finais. 9. Referências.
1 INTRODUÇÃO
A encruzilhada nos interpela acerca da forma que adotará a “razão” punitiva, especialmente a carcerária, depois da pandemia, sobretudo quando as retóricas aparecem confrontando com a realidade, nesse hiato próprio entre o que se enuncia e o que sucede. Uma racionalidade teórica do dever ser do poder punitivo se evidencia, em sua potencialidade, insuficiente ante os progressos vertiginosos e dinâmicos das Inteligências Artificiais (IAs). Há uma massiva segregação dos “diferentes”, especialmente dos deslocados, migrantes e refugiados, que se gestiona com uma lógica de população inimiga, através de um padrão discriminatório étnico, sexista, etário e racista.
Por isso, é tempo de criarmos um corpus jurídico distinto e novo, de valor paradigmático evitando a criminologia midiática, tanto social como física, sujeita a um continuum entre democracia e autoritarismo.
Sendo o Direito o modo de regular a coexistência pacífica, será mister evitar enfrentamentos e violências, através de ferramentas próprias dos Direitos Humanos, promovendo uma distribuição minimamente equitativa.
A visão proposta neste artigo tem por objetivo geral nos presentear com uma visão da cultura jurídica de nosso país (Brasil), em que se elabora um conjunto de categorias de utilidade prática, fonte importante de argumentação para a discussão de âmbitos plurais e de finalidades distintas, sem ser alheia as transformações do saber. Por objetivo específico propor políticas públicas para a proteção dos direitos do migrante face aos desafios da inteligência artificial (IA). O problema é a intensificação das violações de direitos humanos dos migrantes em razão do uso das novas tecnologias o que desafia os documentos jurídicos internacionais de proteção a tais direitos. A hipótese consiste na verificação de que o uso da inteligência artificial no controle migratório exige uma ação ética e, consequente regulamentação, para a proteção dos direitos humanos dos migrantes
Os temas aqui propostos não são novos, são as novas batalhas que nos convocam a reparar uma enorme ausência que oculta as múltiplas sub-humanizações e violações dos Direitos. Essa hipótese, no Brasil diferentemente dos países da União Europeia, não encontra ainda uma regulamentação protetiva. A metodologia utilizada é hibrida explicativa, bibliográfica e descritiva com a aplicação da Tópica aristotélica com resolução através do pensamento problemática e método indutivo (caso a caso). Assim, partiu-se da descrição, da análise e explicação do impacto do uso da inteligência artificial no fenômeno da migração, utilizando o pensamento problemático da tópica para produção de questionamentos e reflexões. Por resultado alcançado uma proposta de regulamentação do uso das IAs está em vias de elaboração com o aprofundamento de estudos junto ao Congresso Nacional, visando suprir as lacunas restritivas de garantias existenciais.
2 O Pêndulo Trágico da História
Vivemos em um mundo onde a globalização – independentemente da polissemia que a acompanha e dos diversos conteúdos e fins com que é vista ou analisada- ganhou Carta de Alforria, parece ser uma afirmação que ninguém contesta. O tráfico de seres humanos – com diferentes formas de sujeição, dependência ou até análogo ao estado escravidão – é um dado inafastável. Embora os tempos sejam outros, muitas características de outrora se mantiveram e permanecem semelhantes, adaptadas aos mecanismos do capitalismo global, como se tivessem permanecidas congeladas no tempo sem proteção jurídica (como o caráter transnacional, seja no país de origem ou de destino). Apesar das percepções de que tenha sido abolida, milhões de pessoas continuam sendo exploradas em condições análogas no mundo globalizado.
A “escravidão moderna” não é apenas um diagnóstico da exploração humana contemporânea, mas também um manifesto político e ético contra a indiferença de sociedades e governos. Apesar da escravidão ter sido abolida, milhões de pessoas continuam sendo exploradas em condições análogas ao escravo no mundo, persistindo o fenômeno em diversos países, sendo geralmente associada a migração, trabalho forçado, liberdade sexual, vulnerabilidade, ausência de Direitos Humanos. Difere dos sistemas históricos apenas em seus instrumentos e meios, mas não em essência.(ZIEGLER, 2008).
Define-se a “escravidão moderna” como a condição em que os indivíduos são controlados por meio de violência, ameaça, privadas de liberdade e exploradas economicamente e sem possibilidade de romper com que o explora. Devido a clandestinidade dessas práticas, é muito difícil mensurar vítimas, tidas como “pessoas descartáveis”, intercambiáveis, sem rosto, sem voz e “novos escravos da Economia Global”. Paradoxalmente, as mesmas democracias que assinam tratados antiescravidão implementam políticas migratórias cada vez mais restritivas, facilitando a vulnerabilidade dos migrantes. A maior parte dos processos que chegam aos tribunais atinge apenas intermediários ou traficantes e raramente penalizam grandes empregadores, redes empresariais e plataformas digitais.
A gestão da mobilidade transluz a realidade da “migração forçada” no Brasil, cada vez mais os migrantes são obrigados a deixar suas terras, sua pátria por várias questões políticas, econômicas, ambientais e guerras. Em 2020, segundo a Organização das Nações Unidas mais de 43 milhões de pessoas na América Latina vivem fora de seus países de nascimento, representando 15% da população mundial de migrantes. À medida que a migração interna vai adquirindo papel central no debate público jurídico, a Europa e os Estados Unidos, contrasta com o acolhimento do Outro e a sua integração.
Essa sensação social de busca de melhores condições de vida, seja de pessoas em situação de extrema pobreza, seja por condição de refúgio criam estereótipos diversos entre o desejo e/ou a necessidade de migrar e a possibilidade real de fazê-lo. Muitas vezes a ausência de vias migratórias legais e seguras convertem-se em rotas de acesso ilegais que constituem, ainda que temporária, em irregularidades administrativas.
A perda da soberania efetiva trazida para os Estados – nação com a globalização demonstram que os avanços tecnológicos aplicáveis ao controle de fronteiras – jogam um papel relevante na fiscalização de pessoas e mercadorias na luta contra a criminalidade organizada e na manutenção do poroso conceito de segurança. É urgente repensarmos a estrutura democrática, seja representativa ou participativa, superando suas migrações possui um amplo arcabouço jurídico que abrange os níveis internacional, regional e nacional. No âmbito internacional, tratados e convenções estabelecidos por organizações como as Nações Unidas estabelecem normas de proteção dos direitos dos migrantes. Dentre os sistemas de proteção, pode-se citar o sistema no âmbito da União Europeia, que tem diretivas para a migração, os procedimentos de asilo e a gestão de fronteiras, bem como as demais fragilidades diante de novos desafios.
3 O Marco Normativo
Enquanto um fenômeno complexo, a migração possui um amplo arcabouço jurídico que abrange os níveis internacional, regional e nacional. No âmbito internacional, tratados e convenções estabelecidos por organizações como as Nações Unidas estabelecem normas de proteção dos direitos dos migrantes. Dentre os sistemas de proteção, pode-se citar o sistema no âmbito da União Europeia, que tem diretivas para a migração, os procedimentos de asilo e a gestão de fronteiras, bem como os demais sistemas de proteção dos direitos humanos. A proteção dos direitos humanos dos imigrantes necessita que os Estados tenham gestão sobre o fenômeno, que representa não apenas um movimento de indivíduos em razão de fatores econômicos, políticos ou sociais, mas também um movimento de conexões entre culturas e nações. A regulação desses fluxos necessita, acima de tudo, proteger os direitos humanos, pois ela não diz respeito apenas ao país que acolhe ou ao de origem, mas também a desafios internacionais e globais.
As relações internacionais evoluem no marco do direito consuetudinário, em que se observam os fluxos crescentes de refugiados, migrantes e pessoas que requerem asilo, observando-se outros fatores como guerras civis, conflitos étnicos e comunitários, e violência generalizada, desastres naturais ou fome. No sistema jurídico internacional, o direito internacional vinculativo pode surgir pelo costume, sendo que os tribunais consideram como fonte de direito dois elementos: prática estatal, geralmente definida como uma prática generalizada e consistente seguida pelos estados, e a opinio juris[3], que é um convencimento ou crença subjetiva por parte do estado que se envolve na prática necessária, não meramente opcional[4].
3.1 Do Direito de Asilo
No âmbito internacional, existe um conjunto de diretrizes que regem questões relacionadas aos migrantes, refugiados, requerentes de asilo e pessoas em processo de migração. A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, por exemplo, no artigo 14, reconhece o direito de procurar asilo contra perseguição. O direito ao asilo aparece como o dever do Estado de, ao menos, analisar o pedido, mesmo fora das fronteiras. O asilo pode ser definido como “abrigo” ou “proteção contra uma jurisdição estrangeira” em razão de perseguição[5]. Há também o reconhecimento de atores não estatais como potenciais perseguidores, sendo que a Corte Internacional de Justiça se referiu ao asilo como “um estado de proteção” e o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados definiu “asilo territorial” como “um termo abrangente para a soma total da proteção fornecida por um Estado... aos refugiados em seu território”[6].
Deste modo, toda pessoa tem o direito de buscar asilo em caso de perseguição estrangeira. Esse direito parece existir no direito internacional consuetudinário e é declarado em muitas declarações multilaterais de direitos e no direito internacional consuetudinário. O direito de buscar asilo não está necessariamente associado, em grande parte dos países, a qualquer direito de receber asilo, parecendo uma grande parte vazia de qualquer substância real[7].
Entretanto, pode-se dizer que há duas exceções no sistema de direitos humanos: a África e a América Latina. A Convenção Africana sobre Refugiados afirma que os Estados partes devem “empregar seus melhores esforços ... para receber refugiados e garantir o assentamento daqueles refugiados que... não estejam dispostos a retornar ao seu país de origem ou nacionalidade”.
Já na América Latina, o parecer Consultivo OC-25/18 da Corte Interamericana de Direitos Humanos, solicitado pelo Equador, a Corte considera o asilo e seu reconhecimento como direito humano no sistema interamericano, com base nos artigos 5, 22(7) e 22(8), em relação ao artigo 1(1) da Convenção Americana de Direitos Humanos. A Corte afirma que o direito de buscar e receber asilo é um direito humano que não pode ser relativizado por questões formalísticas; o princípio non-refoulement é obrigatório para todos os Estados. Para a Corte, a tradição latino-americana do asilo é um marco do desenvolvimento jurídico regional, sendo que negar ou limitar o asilo gera responsabilidade internacional do Estado.
Deste modo, a Corte consagra o direito autônomo e individual de buscar e receber asilo, retirando qualquer conotação de que se trata de mera faculdade dos Estados, proibindo o retorno de qualquer pessoa a um território onde sua vida ou integridade pessoal corra risco. A proteção do princípio non-refoulement abrange qualquer pessoa, independentemente de status migratório. Ao reforçar o reconhecimento histórico do asilo, a Corte afirma que é uma instituição legítima e consolidada na proteção de pessoas perseguidas na América Latina[8].
No âmbito do sistema europeu, pelo menos três tratados europeus são relevantes para esta discussão: a Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais (CEDH), a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (“Carta Europeia”), e a Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e à Violência Doméstica (“Convenção de Istambul”).
A CEDH não contém uma disposição explícita de não repulsão, mas foi interpretada como contendo uma disposição implícita de não repulsão de acordo com algumas de suas disposições, incluindo sua proibição contra tortura e tratamento ou punição desumana ou degradante. Tanto o Tribunal Europeu de Direitos Humanos quanto a Comissão Europeia de Direitos Humanos interpretaram essa proibição como aquela que proíbe os Estados membros de enviar alguém para outro país onde haja uma chance real de que ele ou ela possa estar sujeito a tal tratamento.
Não há exceções de segurança nacional ou interesse público a essa disposição implícita de não repulsão. O Tribunal Europeu de Direitos Humanos também interpretou as disposições da CEDH que garantem o direito à vida, o direito à liberdade e segurança, o direito a um julgamento justo e o direito à vida familiar como contendo disposições implícitas de não repulsão. As disposições de não repulsão da CEDH não são apenas implícitas; o Artigo 1 da convenção exige que os Estados-partes “garantam a todos dentro de sua jurisdição” os direitos e liberdades previstos.
Tanto a Carta Europeia quanto a Convenção de Istambul contêm disposições explícitas de não repulsão, mas não incluem a não repulsão na fronteira em seus escopos. A Carta Europeia afirma: “Ninguém pode ser removido, expulso ou extraditado para um Estado onde haja sério risco de ser submetido à pena de morte, tortura ou outros tratamentos ou penas desumanos ou degradantes”. A Convenção de Istambul afirma: “As Partes tomarão as medidas legislativas ou outras necessárias para garantir que as vítimas de violência contra as mulheres que necessitem de proteção, independentemente de seu status ou residência, não sejam devolvidas, em nenhuma circunstância, a nenhum país onde sua vida esteja em risco ou onde possam ser submetidas a tortura ou tratamentos ou penas desumanos ou degradantes”. Ambos os tratados omitem flagrantemente qualquer referência à “não repulsão na fronteira”.
Eles também se abstêm de usar a palavra um tanto ambígua “refouler”. A afirmação de que o princípio da não repulsão faz parte do direito internacional consuetudinário também foi feita, ou pelo menos sugerida, por diversos tribunais. A lista de tribunais inclui a Câmara dos Lordes britânica (na sua qualidade de tribunal de última instância do Reino Unido), o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, o Tribunal de Apelação da Nova Zelândia, e o Tribunal de Primeira Instância de Hong Kong[9].
3.2 Os Refugiados e Seus Direitos
Já a Convenção sobre Refugiados de 1951 e seu Protocolo de 1967 são dois instrumentos de particular importância, que definem o conceito de refugiados, seus direitos e as obrigações dos Estados de protegê-los. Os Estados são obrigados a respeitar os direitos de todos os refugiados em relação ao emprego, garantindo a igualdade com os nacionais, especialmente para aqueles refugiados que entraram em seu território por meio de programas de recrutamento de mão de obra. Uma pessoa se qualifica como refugiada se estiver fora do país de sua nacionalidade ou não tiver nacionalidade e não puder se valer da proteção de seu país devido a perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, filiação a um determinado grupo social ou opinião política.
Em 1999, o caso Islam X Shah, julgado na Câmara dos Lordes do Reino Unido, questionou a interpretação do artigo 1A(2) da Convenção de 1951 sobre o Estatuto dos Refugiados, especialmente a expressão 'membro de um grupo social particular', no contexto do pedido de asilo de duas mulheres paquistanesas que foram obrigadas a deixar suas casas em razão dos maridos. Elas alegavam que, no Paquistão, as mulheres eram subordinadas aos maridos e sofriam perseguição. A questão central seria se as mulheres, enquanto grupo social específico, podem ser reconhecidas como refugiadas e se poderiam ser consideradas refugiadas mesmo se o próprio governo não fosse o perseguidor direto, mas deixasse de oferecer proteção. Com isso, ocorreu uma ampliação no direito consuetudinário sobre o entendimento do que constitui perseguição, ao afirmar que a omissão estatal diante de violências sistemáticas praticadas por terceiros pode ser equiparada à perseguição ativa[10].
Em 1993, a Corte do Canadá, no caso Ward envolvia o refúgio de um ex-integrante de um grupo paramilitar da Irlanda do Norte considerado traidor e que passou a ser ameaçado de morte pelo grupo, sem proteção do estado. A Corte definiu que, para a identificação de um grupo social específico, são necessárias três características: a) imutáveis, que são aquelas que os indivíduos não podem ou não deveriam ser obrigados a mudar; b) vínculo essencial à identidade ou consciência: características ligadas à dignidade, integridade e autodeterminação; c) status voluntário, formas de associação voluntária às quais as pessoas não podem razoavelmente ser forçadas a renunciar (filiação, militância política). A decisão estabeleceu critérios para diversas formas de perseguição, inclusive para atores não estatais[11].
Já o caso C-646/21 foi julgado pelo Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) e envolveu uma criança migrante não acompanhada de seus pais. O Tribunal solicitou ao ACNUR (Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados) informações sobre os critérios para o reconhecimento de um grupo social específico no caso de crianças em situação de risco de perseguição. O parecer destaca que o reconhecimento deve levar em conta a condição da infância como uma característica imutável conforme a Convenção, particularmente quando combinada com contextos de exploração, violência, discriminação institucional ou ausência de proteção estatal. Assim, a condição da infância se tornou desvinculada da associação a fatores como etnia, gênero ou religião[12].
Em relação aos migrantes, o direito internacional, no âmbito da proteção dos direitos humanos, reconhece amplamente direitos básicos, independentemente de sua condição documental. A Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), em seu artigo 13, assegura o direito de livre circulação e residência dentro das fronteiras de cada Estado, bem como o direito de toda pessoa a deixar qualquer país, inclusive o próprio, e a ele regressar. O Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (1966) reafirma esses direitos e veda expulsões arbitrárias (art. 12 e 13).
A Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e Membros de Suas Famílias (1990), adotada pela ONU, estabelece padrões detalhados para garantir igualdade de tratamento, proteção contra exploração e acesso à justiça. No plano regional, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (art. 22) e a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos (art. 12) também asseguram o direito de buscar e obter asilo em caso de perseguição. Esses instrumentos formam um arcabouço normativo que vincula os Estados à proteção da pessoa migrante, especialmente em contextos de vulnerabilidade, reafirmando a primazia dos direitos humanos sobre políticas migratórias restritivas.
A Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) consolidou importantes precedentes em favor dos direitos dos migrantes, como o Parecer Consultivo OC-18/03, que estabeleceu que alguns direitos não podem ser condicionados à situação migratória e que qualquer forma de discriminação baseada nessa condição viola a Convenção Americana sobre Direitos Humanos. No caso Vélez Loor v. Panamá, datado de 2010 a Corte condenou a detenção arbitrária de migrantes em situação irregular, reafirmando que a privação de liberdade deve ser medida excepcional, proporcional e controlada judicialmente. Já em Pacheco Tineo Family v. Bolívia, em 2013, reconheceu a ilegalidade da deportação sumária sem garantia do contraditório. No âmbito do Sistema Europeu de Direitos Humanos, a Convenção Europeia de Direitos Humanos (CEDH) protege os migrantes principalmente por meio dos artigos 3 (proibição da tortura), 8 (direito à vida privada e familiar) e 13 (direito a um recurso efetivo).
A jurisprudência da Corte Europeia de Direitos Humanos (CEDH) consolidou o dever de assegurar proteção mesmo extraterritorialmente. Em Hirsi Jamaa v. Itália, a Corte responsabilizou o Estado italiano por operações de retorno no mar Mediterrâneo, que resultaram na exposição de migrantes a riscos reais de tortura na Líbia. No caso M.S.S. v. Bélgica e Grécia, a Corte condenou a Bélgica por ter transferido um solicitante de asilo ao sistema grego sem garantir condições adequadas de acolhimento e exame do pedido, violando o princípio da não devolução
4 IA(S) e gestão de fronteiras: navegando pela migração
O uso de tecnologias de gestão de fronteiras impulsionadas por inteligência artificial (IA) vem sendo utilizado de forma acentuada por vários países em razão, principalmente, do discurso recente com ênfase na segurança e com o avanço de vários sistemas de IA. De fato, a Inteligência Artificial (IA) na gestão migratória introduziu soluções inovadoras que aumentam a segurança, a eficiência e apoiam os processos de tomada de decisão. Mas o uso da IA também requer uma avaliação cuidadosa de suas implicações éticas, legais e humanitárias[13].
A gestão de fronteiras refere-se ao conjunto de práticas, políticas e tecnologias utilizadas para controlar e monitorar a passagem de pessoas e bens através das fronteiras de um país ou região. A gestão de fronteiras envolve também o controle de fronteiras para monitorar e regular a entrada e saída de mercadorias, com a verificação de documentos, inspeções de segurança e procedimentos de imigração. Deste modo, a gestão de fronteiras inclui: a) Controle de Imigração, a verificação da documentação de entrada e saída de indivíduos, garantindo que apenas aqueles com permissão legal possam entrar ou permanecer no país. b) Segurança Fronteiriça, medidas para prevenir atividades ilegais, como tráfico de drogas, contrabando e imigração irregular, através de vigilância, patrulhamento e uso de tecnologias de segurança. c) Facilitação do Comércio, os processos que permitem a passagem eficiente de mercadorias e serviços, reduzindo barreiras e promovendo o comércio legal. d) Proteção de Direitos Humanos, garantia de que as políticas de gestão de fronteiras respeitem os direitos dos migrantes e refugiados, incluindo o acesso a procedimentos de asilo e proteção contra a deportação para países onde possam enfrentar riscos. e) Cooperação Internacional, a colaboração entre países para gerenciar fronteiras de forma eficaz, compartilhando informações e recursos para enfrentar desafios comuns relacionados à migração e segurança. f) Uso de Tecnologias, a implementação de ferramentas tecnológicas, como sistemas de vigilância, biometria e inteligência artificial, para melhorar a eficiência e a segurança na gestão das fronteiras.
Em resumo, a gestão de fronteiras busca equilibrar a segurança nacional com a facilitação do movimento humano e comercial, ao mesmo tempo em que deve respeitar os direitos humanos e as obrigações internacionais. Os sistemas de IA atualmente agilizam a verificação de identidade, preveem tendências migratórias e automatizam a tomada de decisões no processamento de vistos e remoções. No entanto, esses avanços também representam riscos significativos, incluindo violações de privacidade, tomada de decisões tendenciosas e potenciais violações de direitos humanos. Dentre os sistemas utilizados, citam-se:
a) tomada de decisão algorítmica e suporte à decisão: esses sistemas auxiliam as autoridades de fronteira a tomar decisões informadas sobre o movimento de indivíduos através das fronteiras, melhorando a eficiência e a precisão no processamento de aplicações e na identificação de potenciais riscos.
b) ferramentas de vigilância: tecnologias como drones e sistemas de reconhecimento facial estão sendo cada vez mais utilizadas para monitorar as fronteiras. Os drones fornecem capacidades de vigilância aérea, permitindo o monitoramento em tempo real de áreas fronteiriças, enquanto a tecnologia de reconhecimento facial ajuda a identificar indivíduos que entram ou saem de determinado Estado.
c) ferramentas de previsão: sistemas de IA também são empregados para prever padrões migratórios e potenciais ameaças à segurança, permitindo que as autoridades aloquem recursos de forma eficaz e respondam proativamente a desafios emergentes.
d) biometria: utilização de dados biométricos, como impressões digitais e reconhecimento facial, para identificar e verificar a identidade de viajantes em pontos de entrada.
e) avaliação de risco: análise de dados de viajantes e perfis de risco para identificar potenciais ameaças, como fraudes de identidade ou atividades criminosas.
f) interoperabilidade de sistemas: integração de diferentes bancos de dados e sistemas de informação para facilitar o compartilhamento de dados entre agências governamentais e países, melhorando a eficiência na gestão de fronteiras.
De outra parte, o direito internacional exige a proteção dos direitos dos migrantes, inclusive por meio do princípio de não repulsão, que impede o retorno de indivíduos a países onde possam sofrer danos. Portanto, recorrer a mecanismos de controle de fronteiras baseados em IA, que não sejam devidamente regulamentados por marcos jurídicos internacionais e nacionais, pode levar a violações não intencionais de direitos fundamentais, resultantes do processo de automatização de decisões complexas relacionadas à avaliação de casos individuais e vulnerabilidades, sem supervisão humana adequada.
A migração marítima, por exemplo, representa sérios desafios jurídicos e éticos. Embora os Estados mantenham a soberania sobre suas fronteiras também no contexto marítimo, suas obrigações sob jurisdição extraterritorial exigem que defendam os direitos humanos além de suas águas territoriais[14].
No entanto, a vigilância com tecnologia de IA, incluindo drones, rastreamento por satélite e sistemas automatizados de identificação de embarcações, permite que as autoridades detectem e interceptem migrantes antes que eles cheguem às águas territoriais e acessem um local seguro, frequentemente levando a práticas que violam o princípio de não repulsão e outras normas internacionais aplicáveis, particularmente o dever de prestar serviços de IA, controles de fronteira e a ética da gestão migratória.
Nos termos do artigo 98 da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM), os Estados têm autoridade soberana para regular a entrada e a presença dentro de suas fronteiras, conforme consagrado. Nesse ponto, o caso Hirsi Jamaa v. Itália, de 2012, que se refere às obrigações internacionais de direitos humanos, particularmente o caso perante o Tribunal Europeu de Direitos Humanos (TEDH), estabeleceu a não repulsão, que proíbe o retorno de indivíduos a países onde possam enfrentar perseguição ou danos. Os Estados permanecem responsáveis por indivíduos interceptados fora de seus países territoriais, onde podem enfrentar perseguição ou danos.
Apesar da orientação dessa decisão, o controle de fronteiras baseado em IA tem a integração da IA na vigilância de fronteiras, e o controle de entrada é facilitado por retrocessos que comprometem a oportunidade dos requerentes de asilo de reivindicar proteção, transformando fundamentalmente a governança da migração, terceirizando efetivamente a fiscalização das fronteiras e, ao mesmo tempo, evitando sistemas sofisticados de monitoramento que levantam profundas preocupações éticas e legais[15]. Além disso, os Estados podem depender cada vez mais da vigilância de fronteiras baseada em IA.
A vigilância de fronteiras baseada em IA depende de identificação biométrica, avaliações de risco facial e alertas automatizados para justificar a inação em resposta ao reconhecimento, e da análise de dados em tempo real para rastrear e monitorar sinais de socorro de indivíduos no mar, minando ainda mais as obrigações internacionais de resgate que cruzam fronteiras. Essas tecnologias aumentam a segurança e a eficiência operacional e expandem o escopo da vigilância em massa, levantando preocupações sobre violações de direitos como privacidade, uso indevido de dados e direcionamento desproporcional de determinados grupos. Em muitos casos, a implantação de sistemas de vigilância de IA carece de supervisão suficiente, levando a potenciais abusos, como detenções arbitrárias e discriminação racial.
Semelhante ao direito de buscar proteção internacional contra perseguição, o direito de retorno, consagrado no Artigo 12(4) do PIDCP, pode ser influenciado pelo uso de ferramentas e métodos de IA. Esse direito garante aos indivíduos a capacidade de reentrar em seu país com base na nacionalidade ou outros laços substanciais, incluindo se os indivíduos se beneficiam de residência de longa duração, sendo aplicável também em casos de apatridia. Na governança migratória contemporânea, os sistemas baseados em IA estão influenciando cada vez mais os processos de retorno, desde a vigilância de fronteiras e monitoramento biométrico até avaliações de risco e gerenciamento digitalizado de casos de readmissão. Embora essas tecnologias visem agilizar o gerenciamento da migração, elas levantam preocupações éticas e legais significativas, como o uso de algoritmos e inteligência artificial para processar informações e tomar decisões sobre a elegibilidade de viajantes; o reconhecimento facial pode apresentar desempenho inferior para certas etnias e a falta de transparência, às vezes, nem mesmo os desenvolvedores sabem por que um sistema de ADM chega a certas decisões ou resultados.
A jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) no caso Ligue des Droits Humains v. Conseil des Ministres, processo C-817/19, julgado pela Grande Sala em 21 de junho de 2022, representou um marco na delimitação dos limites jurídicos à aplicação de sistemas automatizados e algoritmos de decisão no contexto da Diretiva (UE) 2016/681, relativa ao registro e análise de dados de passageiros (Passenger Name Record – PNR). A Corte reconheceu a compatibilidade condicional da Diretiva com os direitos fundamentais consagrados na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, notadamente os artigos 7 (vida privada), 8 (proteção de dados), 21 (não discriminação) e 47 (direito a recurso efetivo). Tal compatibilidade, no entanto, exige que os Estados-membros interpretem e apliquem a norma de forma estritamente proporcional e com salvaguardas rigorosas.
Os principais pontos da discussão foram:
1. Avaliação de Risco Automatizada: a Corte analisou se a utilização de algoritmos e sistemas automatizados para avaliar riscos associados a viajantes que entram ou saem da União Europeia é compatível com os direitos fundamentais, especialmente o direito à privacidade e à proteção de dados pessoais.
2. Transparência e Opacidade: a Corte levantou preocupações sobre a falta de transparência nos processos de decisão automatizada, onde os indivíduos podem não ter acesso às razões pelas quais foram identificados como “de risco” ou suspeitos, o que pode dificultar a contestação dessas decisões.
3. Direitos Humanos: a discussão também se concentrou nos riscos para os direitos humanos, incluindo a possibilidade de discriminação e perfis raciais, uma vez que sistemas automatizados podem reproduzir preconceitos existentes nos dados em que são treinados.
4. Legislação da UE: a Corte avaliou se as práticas de coleta e uso de dados de PNR estavam em conformidade com a legislação da União Europeia, incluindo o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (GDPR) e outras normas de proteção de direitos fundamentais.
5. Implicações para a Segurança: embora a segurança seja uma preocupação legítima, a Corte ponderou que a proteção dos direitos individuais não deve ser comprometida em nome da segurança pública.
Um dos principais fundamentos da decisão foi a proibição do uso de sistemas de IA baseados em machine learning autônomo, que alterem seus critérios ou parâmetros de decisão sem supervisão humana direta. O TJUE afirmou que tais sistemas violam o princípio da legalidade, pois dificultam o conhecimento prévio das consequências jurídicas de comportamentos individuais, o que compromete o devido processo legal.O Tribunal também destacou o problema da opacidade algorítmica, advertindo que a falta de transparência na geração de alertas por sistemas automatizados impede que indivíduos compreendam, contestem e revisem decisões que os afetam. Segundo o acórdão: “Um sistema de tratamento automatizado que funcione com base em critérios que não possam ser compreendidos pelas pessoas sujeitas a esse tratamento, ou mesmo pelas autoridades competentes, pode comprometer o exercício do direito a um recurso efetivo, garantido pelo artigo 47 da Carta.” (TJUE, C-817/19, § 173).
O TJUE estabeleceu que a intervenção humana não pode ser meramente formal ou simbólica, sendo exigida uma revisão significativa, crítica e informada dos resultados emitidos por tais sistemas. Em outras palavras, as decisões que impactem direitos fundamentais não podem ser inteiramente delegadas a algoritmos. Assim, a governança algorítmica requer a introdução de “garantias estruturais contra decisões opacas, discriminatórias ou não contestáveis, especialmente quando aplicadas a populações vulneráveis, como migrantes e refugiados”[16]. No plano normativo, a decisão dialoga diretamente com o Regulamento Europeu de Inteligência Artificial (AI Act), que classifica sistemas usados no controle migratório como de alto risco, exigindo elevados padrões de transparência, explicabilidade e supervisão humana (AI Act, art. 6º).
5 O Crescente protagonismo da Ética Digital e suas múltiplas manifestações
Enclausurados numa rede de algoritmos insondáveis regendo nossa vida, remodelando nossa política, nossa cultura e até nossas mentes, não percebemos a magnitude do perigo dos agentes das Inteligências artificiais generativas. Muitas são as implicações do uso das IAg com foco em digitalização, datificação, automação regulação, governança etc. Ainda que os desenvolvimentos mais recentes tenham sido incluídos nos instrumentos jurídicos existentes, isso é feito sem um escrutínio ou impacto prévio de avaliação das implicações para os Refugiados.
Essas ferramentas tecnológicas levam à desumanização por falta de transparência e segurança. Também a vigilância digital” fortalece o autoritarismo digital. A Tecnoética e a aplicação da Justiça dependem da cooperação internacional, políticas públicas e privadas inclusivas, fortalecimento da fiscalização, proteção efetiva dos migrantes e refugiados(inclusive de garantias contra a deportação e ao “capitalismo emocional”, os aliciamentos on-line fraudulentos, o recrutamento em posições de risco, mediação das vulnerabilidades, dor e sofrimento).
6 O Homo Digital
Um sujeito submerso em fluxos informacionais e dispositivos conectivos, plataformas, telas, meios que conectam, comunicam, informam, representa o Marshall McLuhan, em The medium is the message, postulava: o meio redefine os sentidos do humano. Os meios técnicos, longe de serem neutros, reconfiguram a forma de pensar, agir e existir do humano[17]. Este é um ponto central do estudo do homo digital, que além de usuário da tecnologia, representa uma subjetividade reorganizada pelas formas midiáticas. Com o advento da televisão, Sartoni considera o aparecimento de um Home Videns[18] que gerava um novo “anthropos” – “crédulo e ingênuo”, que assiste imagens de coisas reais.
No mundo da cibernética, as imagens são imaginárias. A realidade pode ser apenas virtual, produzindo, na visão de Abat Ninet, pouca apreensão de conhecimento e um mundo de informações que são absorvidas superficialmente. A escrita é substituída pela imagem, mas, para além da imagem, o homo sapiens está cercado e dependente de dispositivos de Tecnologia da Informação, smartphones, GPS, barramento serial universal (USB), inteligência artificial. A realidade é acessada e moldada, cada vez mais, por algoritmos, que substituem o conhecimento individual[19].
Mas, homo eletronicus, em McLuhan, é um ser de massa, habitante eletrônico do globo que está ligado aos outros seres, um espectador em um estágio, um cidadão eletrônico cuja identidade privada foi psiquicamente dissolvida por meio da solicitação excessiva[20]. Em Byung-Chul, homo digitalis [“homem digital”] é tudo, menos um “ninguém”. Ele preserva a sua identidade privada, mesmo quando ele se comporta como parte do enxame. Ele se externa, de fato, de maneira anônima, mas geralmente ele tem um perfil e trabalha ininterruptamente em sua otimização. Em vez de ser “ninguém”, ele é um alguém penetrante. O Homo Sapiens Digitalis é sujeito de direitos e obrigações humanas[21]. Ele apresenta-se como anonimamente, mas, é alguém que sabe que é um anônimo. Nas redes não se reúnem, é apenas um aglomerado sem reunião, isolados para si, singularizados, que se sentam diante da tela[22].
De certo modo, há uma diferenciação entre o digital e o físico, não apenas em relação ao mundo físico, mas também às dimensões culturais da existência humana, o que constitui uma questão ética fundamental. Aqui, há um renascimento, em certo sentido, da clássica questão da parresia – mostra claramente quão profundamente o uso dessa tecnologia pode afetar nossas vidas morais e quão diferente sua interpretação pode ser de acordo com as origens e tradições culturais. Essa ética pode ser considerada o espaço aberto onde um diálogo intercultural sobre essas questões pode e deve ocorrer[23].
O ambiente tecnológico atual é disruptivo e, ao mesmo tempo que é digital, é também pervasivo, com uma alta propagação generalizada que se faz presente em toda parte. Essa combinação coloca em xeque os padrões de avaliação da vida que estavam em uso no passado, necessitando de novos parâmetros para a compreensão da tecnosfera. A crise de civilização contemporânea não é apenas tecnológica: é ética[24]. A existência humana significa, do ponto de vista ético, cuidar de nós mesmos, nós ajudamos mutuamente[25].
O homo digital faz a descrição de um novo estágio antropológico, cuja marca principal é uma interconectividade permanente, a mediação tecnológica da experiência humana e reconfiguração do sujeito na infosfera. Tal situação é potencializada com a nova ordem imposta por algoritmos e conduzida pela tecnologia de inteligência artificial. Este sujeito está em constante exposição a fluxos de dados, imagens, comandos e vigilância, vivendo em um “mundo de zeros e uns”. Uma identidade agora construída e refletida em interação com plataformas digitais, redes sociais e algoritmos.
A migração, que sempre foi considerada como fenômeno territorial, passa a ser também simbólica e tecnológica. As fronteiras do século XXI, são mais que fronteiras geopolíticas; são também barreiras digitais. Muitas vezes esses sujeitos vulnerabilizados estão excluídos sem nenhuma visibilidade digital, mas, ao mesmo tempo hipervisibilizados em banco de dados biométricos, sistemas automatizados de controle migratório, que traçam perfis muitas vezes opacos e discriminatórios.
O homo digital migrante tem como obstáculos um de deslocamento físico, por vezes forçado e o deslocamento na lógica do controle digital. A ética tecnológica é urgente, mas, para efetiva proteção dos migrantes faz-se necessário desenvolver políticas públicas e infraestruturas digitais, com modelos de governança digital baseados no pacto universal dos direitos humanos.
7 Por um marco normativo de proteção ao homo digital migrante
Fui impedido de viajar para este evento [o seminário jurídico da PICUM-Equinox] porque ainda não gozo da liberdade de movimento. É doloroso, quero ser livre. Este já é o cerne da questão. Quem pode se mover depende da cor da pele e da raça, e meu movimento está sendo ilegalizado. Na fronteira – e as fronteiras estão em todos os lugares – me chamam de 'ilegal', não faço perguntas, os documentos não são relevantes e os direitos não têm valor. Já faz seis anos que venho pedindo proteção em diferentes fronteiras. Agora sou reconhecido como refugiado, mas ainda não posso viajar, e a opressão continua. Mas mesmo que eu não possa me mover, eles não conseguem me manter em silêncio. Cheguei à Alemanha em 2020 e vivi muitos anos em um limbo, aguardando a decisão do meu pedido de asilo. Também apresentei uma queixa legal ao Comitê de Direitos Humanos da ONU sobre as resistências que sofri na fronteira entre a Grécia e a Turquia. Com a ONG, o ECCHR e a Forensic Architecture, criamos uma investigação online para rastrear e reconstruir minha rota. Não fomos recebidos de forma humana, por causa da nossa raça. Policiais nos atacaram com cães, atirando munição real e gás lacrimogêneo. Antes de mais nada, exigiram que entregássemos todos os nossos pertences (dinheiro, bolsas, roupas, telefones) e, em seguida, nos mantiveram em detenção secreta[26].
Migrantes, refugiados, vítimas de tráfico humano sofrem diariamente violências. A exemplo:
a) status de migração ou residência – tipo de (ou ausência de) reconhecimento formal da residência de um indivíduo pelo governo do país em que reside. O status de residência ou migração baseia-se na situação administrativa do indivíduo e está vinculado a um visto, autorização de viagem, autorização de residência, suspensão de deportação ou de um procedimento legal em andamento para acessar uma autorização de residência por qualquer motivo (incluindo asilo) ou cidadania[27].
b) status racializados: referem-se a indivíduos e comunidades que foram submetidos ao processo político e social de racialização, no qual são designados como pertencentes a uma “raça” específica. Esse processo frequentemente resulta na percepção desses grupos como distintos de outras categorias raciais e, consequentemente, sujeitos a um tratamento diferenciado e desigual. Embora todas as pessoas possam ser racializadas, o termo enfatiza particularmente aqueles que são racializados negativamente, vistos como “outros” ou marginalizados em comparação com o que é percebido como a categoria racial normativa[28].
c) risco de nacionalidade: uma categoria de discriminação explícita ou implícita com base na nacionalidade utilizada por sistemas de controle migratórios manuais ou por algoritmos para associar de forma automática determinada nacionalidade a algum tipo de risco, como terrorismo.
d) Criminalização da migração: políticas que tratam migrantes (sem documentos) e a migração irregular sob a perspectiva da ameaça. Isso frequentemente envolve o uso de sanções criminais para entrada ou permanência irregular, incluindo o emprego de alguém sem autorização para trabalhar e o aluguel de imóveis para uma pessoa sem documentos. Da mesma forma, a criminalização da migração envolve vigilância, policiamento, caracterização e privação de liberdade (detenção de imigrantes) para impedir ou controlar a movimentação. Inclui o recurso ao direito penal e a abordagens de segurança para lidar com fenômenos como contrabando e tráfico, e o uso frequente dessas disposições criminais contra migrantes e seus familiares.
e) Criminalização da solidariedade: ameaça e ao assédio ou intimidação reais por parte das autoridades, bem como a potenciais sanções criminais ou administrativas de pessoas que agem em solidariedade com pessoas sem documentos. Aqueles que são criminalizados por agirem em solidariedade aos migrantes incluem cidadãos, voluntários, ONGs, jornalistas, autoridades locais, bem como os próprios migrantes[29].
As violências e violações dos direitos humanos podem ser potencializadas quando utilizado sistema de algoritmos. Esses sistemas, são compostos por algoritmo – lista de regras matemáticas que resolvem um problema, que devem estar em uma forma correta. Eles constroem e permitem que as tecnologias de IA e aprendizado de máquina realizem os treinamentos com dados já existentes sobre um problema, permitindo a tomada de decisões. Mas, esse sistema de gerenciamento de informação baseado em dados coletados e algoritmos pode exacerbar desigualdades em relação aos fluxos migratórios, ameaçando direitos como não discriminação e tratamento igualitário. Essas tecnologias podem replicam preconceitos raciais, econômicos e sociais previamente existentes, realizando discriminações com base em etnia, raça, nacionalidade, descendência, religião e outras características reais ou percebidas de um indivíduo. Assim, um marco regulatório deve garantir plena proteção aos migrantes e refugiados, devendo, deste modo:
1. Antes que um sistema de monitoramento de fronteira ser implementado, dever ser avaliado a necessidade e a proporcionalidade da medida, garantindo, minimamente os direitos humanos dos migrantes.
2. Os migrantes devem ter a oportunidade de saber, fornecer, consentir e contestar medidas de coletagem de dados pessoais.
3. As empresas envolvidas no desenvolvimento e fornecimento dessas tecnologias devem agir de forma diligente para cumprimento dos direitos humanos dos migrantes.
4. As empresas devem ser responsabilizadas pelos danos que causarem aos direitos dos migrantes na medida que contribuírem para o dando, quando não realizarem a devida diligência em matéria de direitos humanos.
5. Garantia de proteção de dados dos migrantes, com a garantia de minimização de coleta de dados, segurança de quaisquer dados pessoais coletados e de quaisquer dispositivos, aplicativos, redes ou serviços envolvidos na coleta, transmissão, processamento e armazenamento.
6. Classificar como alto risco sistêmico:
7. os sistemas automatizados de avaliação de risco e criação de perfis no contexto de gestão de migração, asilo e controle de fronteiras.
8. o uso de tecnologias preditivas com ameaça indevida ao direito de buscar asilo.
9. ferramentas de reconhecimento de emoções baseadas em IA, no contexto de migração, asilo e gestão de controle de fronteiras.
10. Garantir o direito de solidariedade aos migrantes.
11. Proibir qualquer tipo de discriminação em razão da nacionalidade, por sistemas automáticos.
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
É preciso conter o “risco de nacionalidade”, forma esta codificada na dinâmica jurídica das plataformas, bem como o discurso e as políticas coloniais de fronteiras. Favorecer o acolhimento, evitando o uso de figuras públicas representando a migração como um problema ou crise. Nenhum progresso será possível sem uma revolução Ética e Tecnoética e prática.
A ideologia que encobre este colonialismo financeiro não é nenhuma das ideias clássicas contrárias aos Direitos Humanos. Apesar de termos vigentes as normas internacionais sobre os fluxos migratórios, estas normas e diretrizes não tem plena eficácia. O colonialismo adotou novas formas tentando perverter a própria ideia de Direitos Humanos para degradar seu discurso de dominação.
Portugal, aprovou um pacote anti-imigração que altera a Lei de Imigração trazendo alterações significativas para mais de 5000 migrantes brasileiros. O decreto 6/XVII realiza uma outra alteração na lei de migração 23/2007. Uma das principais alterações é a reunificação familiar que limita os familiares próximos a reunir com parente já legalizado em Portugal., sendo necessário dois anos para solicitar autorização de reunificação com familiares que estejam no exterior. Ainda, as pessoas terão 120 dias de visto para procura de trabalho qualificado, caso não consiga, terá restrição de reentrada com período de espera de 1 ano.
Uma das questões levantadas seria a afronta aos artigos 13, 18 e 36 da Constituição Portuguesa (direito à unidade familiar, afronta à proporcionalidade e ao tratamento igualitário.
Já a Lei de Nacionalidade está sob análise do Parlamento Português e prevê que o processo passará a ter critérios significativamente mais exigentes: a) residência Legal Prolongada 7 anos para cidadãos dos países lusófonos (CPLP) e 10 anos para cidadãos de outros países, sendo que o prazo começa a contar com a obtenção do título de residência. O tempo passa a ser superior aos atuais 5 anos exigidos pela lei vigente conhecimento da língua e da cultura portuguesa, deveres e direitos dos cidadãos portugueses, organização política do País, a serem comprovados através de testes específicos. Na prática as mudanças representam enrijecimento significativo dos critérios de naturalização e migração, com alinhamento às políticas mais rígidas de migração, com riscos de Separações familiares prolongadas, prejudicando principalmente a crianças que ficarão separadas dos pais por períodos mais longos, aumento da imigração irregular, pois as regras mais restritivas podem levar pessoas a procurar vias ilegais, criança de diferentes “classes” de imigrantes com direitos desiguais.
O movimento de alguns setores da sociedade mundial em restringir o direito a deslocamento de territórios alinhado ao uso de tecnologias e associados com discursos tecnocráticos desconfiguram os direitos humanos, ocorrendo uma lógica vigilância, exclusão e hierarquização dos corpos dos migrantes, o que requer um pensar e agir ético e técnico, com políticas públicas que promovam o acolhimento digno e equitativo em contraponto de uma prática de exceção.
Por isso, indicamos o princípio de Ihering; o Direito é Luta!
9 REFERÊNCIAS
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[1] Professora Livre-Docente em Direito Penal pela USP. Doutora em Filosofia e Teoria Geral do Direito pela PUC-SP. Pós-doutorado em Psicologia pela PUC-SP. Professora do Programa de Pós-Graduação em Direito (Mestrado e Doutorado) da PUC-SP, e da Graduação. Mestre em Direito Penal pela PUC-SP. Doutora em Ciências da Religião da PUC-SP. Líder do Grupo de Pesquisas: “Percepções Cognitivas na Interpretação da Norma”, credenciado pelo CNPq, PUC-SP. Coordenadora e Editora Chefe da Revista digital da PUC-SP: Fronteiras Interdisciplinares do Direito. Vice-presidente do Instituto PROVÍTIMA. Embaixadora do Projeto Humanitas, da OAB/Guarulhos. Membro do IASP, da CAPS pesq. da Fac. de Medicina da USP. Advogada. https://orcid.org/0000-0002-1835-761X. iete73@hotmail.com.
[2] Doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP. Mestra em Direito Constitucional pela PUC-SP. Especialista em Direito Administrativo pela PUC-SP e em Processo Civil pela Escola Superior da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo. Membro do IBDC – Instituto Brasileiro de Direito Constitucional e do Grupo de Pesquisas em Direito e Percepções Cognitivas na Interpretação da Norma da Faculdade de Direito PUC-SP. Editora da Revista digital da PUC-SP: Fronteiras Interdisciplinares do Direito. Advogada. https://orcid.org/0000-0001-5611-3184. marilene13156@gmail.com.
Não utilizamos ferramentas de Inteligência Artificial na produção do texto deste artigo.
[3] Em 2001, a Organização Consultiva Jurídica Asiático-Africana aprovou um conjunto de princípios relativos ao tratamento de refugiados, conhecidos como "Princípios de Bangkok, tais princípios não são vinculativos, mas que podem, no entanto, servir como fonte de opinio juris. Os Princípios de Bangkok definem refugiados essencialmente da mesma forma que a Convenção sobre Refugiados: [T]oda pessoa que, devido a agressão externa, ocupação, dominação estrangeira ou eventos que perturbem gravemente a ordem pública em parte ou na totalidade do seu país de origem ou nacionalidade, seja obrigada a deixar o seu local de residência habitual para procurar refúgio noutro lugar fora do seu país de origem ou nacionalidade. A Declaração de Cartagena de 1984, referente a migrantes forçados na América Central e do Sul, expressa os mesmos princípios dos documentos Mercado Comum do Sul (Mercosul), juntamente com a Bolívia e o Chile, também adotou a Declaração do Rio de Janeiro sobre a Instituição de Refúgio. Esta declaração prevê que “deve ser dada proteção internacional a indivíduos perseguidos por motivos de raça, nacionalidade, religião, pertencimento a um grupo social específico, opinião política ou vítimas de violação grave e generalizada de direitos humanos”. Especificamente, os Estados Partes proclamaram que “estudarão a possibilidade de incluir na definição de refugiado a proteção de vítimas de violações graves e generalizadas de direitos humanos
[4] worster, William Thomas. “The evolving definition of the refugee in contemporary international law”. Berkeley Journal of International Law, v. 30, n. 1, p. 94–120, 2020, Disponível em: <https://lawcat.berkeley.edu/record/1125026/files/fulltext.pdf>. Acesso em: 18 jun. 2025.
[5] lynch, “Timothy E. Refugees, refoulement, and freedom of movement: asylum seekers’ right to admission and territorial asylum. Georgetown Immigration” Law Journal, Washington, D.C., v. 36, n. 2, p. 285–313, 2022. Disponível em: <https://www.law.georgetown.edu/immigration-law-journal/wp-content/uploads/sites/19/2022/01/GT-GILJ210002.pdf>. Acesso em: 21 jun. 2025.
[6] worster, William Thomas. “The evolving definition of the refugee in contemporary international law”. Berkeley Journal of International Law, v. 30, n. 1, p. 94–120, 2020, Disponível em: <https://lawcat.berkeley.edu/record/1125026/files/fulltext.pdf>. Acesso em: 18 jun. 2025.
[7] worster, William Thomas. “The evolving definition of the refugee in contemporary international law”. Berkeley Journal of International Law, v. 30, n. 1, p. 94–120, 2020, Disponível em: <https://lawcat.berkeley.edu/record/1125026/files/fulltext.pdf>. Acesso em: 18 jun. 2025.
[8] Corte Interamericana De Direitos Humanos. Opinião Consultiva OC-25/18 de 30 de maio de 2018. A instituição do asilo e seu reconhecimento como direito humano no sistema interamericano de proteção: interpretação e alcance dos artigos 5, 22(7) e 22(8), em relação ao artigo 1(1) da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. San José, Costa Rica: Corte IDH, 2018., Disponível em: <https://www.corteidh.or.cr/docs/opiniones/seriea_25_esp.pdf>. Acesso em: 24 jun. 2025.
[9] lynch, “Timothy E. Refugees, refoulement, and freedom of movement: asylum seekers’ right to admission and territorial asylum. Georgetown Immigration” Law Journal, Washington, D.C., v. 36, n. 2, p. 285–313, 2022. Disponível em: <https://www.law.georgetown.edu/immigration-law-journal/wp-content/uploads/sites/19/2022/01/GT-GILJ210002.pdf>. Acesso em: 21 jun. 2025.
[10] No mesmo sentido. Austrália. “Minister for Immigration and Multicultural Affairs v. Khawar,” High Court of Australia, 11 abr. 2002. Disponível em: <https://www.austlii.edu.au/cgi-bin/viewdoc/au/cases/cth/HCA/2002/14.html>. Acesso em: 25 jun. 2025.
[11] canada. Canada “Attorney General v. Ward”, Supreme Court of Canada, 30 jun. 1993. Disponível em: <https://scc-csc.lexum.com/scc-csc/scc-csc/en/item/1054/index.do>. Acesso em: 25 jun. 2025.
[12] ACNUR. “Observations on the preliminary ruling request in Case C‑646/21”. Tribunal de Justiça da União Europeia, 2023. Disponível em: <https://www.refworld.org/docid/640f9a274.html>. Acesso em: 25 jun. 2025.
[13] yang, Yiran; zuiderveen Borgesius, Beckers, Pascal; brouwer, Evelien. “Automated decision-making and artificial intelligence at European borders and their risks for human rights”. Working draft, V. 1, Nijmegen, Radboud University, 2023.
[14] Cottone, Linda,” Border Boundaries: Navigating Migration and the Role of AI in Irregular Movements”, Journal of Artificial Intelligence & Cloud Computing”, v. 4, n. 2, p. 1-6, 2025.
[15] Cottone, Linda,” Border Boundaries: Navigating Migration and the Role of AI in Irregular Movements”, Journal of Artificial Intelligence & Cloud Computing”, v. 4, n. 2, p. 1-6, 2025.
[16] mantelero, Alessandro, “Beyond data: human rights, ethical and social impact assessment in AI”. Computer Law & Security Review, v. 42, 2022. Disponível em: <https://doi.org/10.1016/j.clsr.2021.105600>. Acessado: 20 jun. 2025.
[17] mcluhan, Marshall. understanding media: the extensions of man. new york, mcgraw-hill, 1964.
[18] sartori, Giovani, Home videns, televisione e post-pensiero, Bari, Laterza, 2000.
[19] Abat Ninet, Antoni. “Digital constitutionalism: a new architectural framework for the twenty-first century polities”. Nordic Journal of Latin American and Caribbean Studies, v. 48, n. 1, p. 5–28, 2019, Disponível em: https://tidsskrift.dk/nnjlsr/article/view/122156. Acesso em: 05 jul. 2025.
[20] mcluhan, Marshall. understanding media: the extensions of man. new york, mcgraw-hill, 1964, p. 174.
[21] Han, Byung-Chul. No enxame : perspectivas do digital, Petrópolis, RJ, Vozes, 2018.
[22] Han, Byung-Chul. No enxame : perspectivas do digital, Petrópolis, RJ, Vozes, 2018.
[23] capurro, R. “Digital Ethics: Reflections on Concepts and Practices”. The Oxford Handbook of Digital Ethics pp. 55, Oxford University Press, 2024.
[24] puech, Michel. “Beyond digital literacy: technological wisdom for the good life”. In: Kaplan, David; brey, Philip; Grinbaum, Alexei (org.). New perspectives on technology and ethics, Paris, CEPE, 2014. p. 95–102. Disponível em: http://michel.puech.free.fr/docs/2014cepe.pdf. Acesso em: 02 jul. 2025.
[25] capurro, R. “Digital Ethics: Reflections on Concepts and Practices”. The Oxford Handbook of Digital Ethics pp. 55, Oxford University Press, 2024.
[26] Parvin Abkhoudarestani nasceu no Irã e fugiu para a Alemanha. European Network Against Racism (ENAR), “Exclusion by design: Unveiling unequal treatment and racial inequalities in migration policies”, Brussels: ENAR, 2023. Available at: <https://www.enar-eu.org/wp-content/uploads/2023/03/ENAR_Exclusion-by-Design_report_March2023.pdf> . Accessed: 2 July 2025.
[27] European Network Against Racism (ENAR), “Exclusion by design: Unveiling unequal treatment and racial inequalities in migration policies”, Brussels: ENAR, 2023. Available at: <https://www.enar-eu.org/wp-content/uploads/2023/03/ENAR_Exclusion-by-Design_report_March2023.pdf> (Accessed: 2 July 2025).. Disponível em: <https://www.enar-eu.org/wp-content/uploads/2023/03/ENAR_Exclusion-by-Design_report_March2023.pdf>. Acesso em: 02 jul. 2025.
[28] European Network Against Racism (ENAR), Racial discrimination in Europe: ENAR Shadow Report 2016–2021, Brussels, 2022, p. 12. Equinox Initiative for Racial Justice, Towards Racial Justice: How the EU can create lasting change for racialised people, Brussels, 2021, p. 5.
[29] Platform for International Cooperation on Undocumented Migrants (PICUM), Cases of criminalisation of migration and solidarity in the EU in 2023, Brussels, 2024. Available at: <https://picum.org/wp-content/uploads/2024/04/Cases-of-criminalisation-of-migration-and-solidarity-in-the-EU-in-2023.pdf>. Accessed on: 2 July 2025.