DOI: 10.19135/revista.consinter.00021.03
Recebido/Received 27/05/2025 – Aprovado/Approved 01/08/2025
Renan Melo[1] – https://orcid.org/0000-0003-4751-9830
Resumo
Por meio do presente artigo pretende-se investigar a questão da hermenêutica jurídica, mas detidamente sob o prisma da proposta trazida por Ronald Dworkin consistente no Direito como integridade. A problemática consiste em verificar se e como ocorre a aplicação da teoria dowrikiana às decisões judiciais. O objetivo central diz respeito à validade e emprego da metanarrativa dworkiana quanto à interpretação / aplicação do direito. Para tanto serão analisados os contornos do pensamento jurídico e político de Dworkin, bem como sua possível aproximação à teoria jurisprudencialista trazida pelo jurista Antonio Castanheira Neves. Outrossim, será investigada a questão do acolhimento da mencionada proposta nas decisões judiciais exaradas pelos principais tribunais dos poderes judiciais de Portugal e do Brasil. Os resultados obtidos apontam à larga utilização do entendimento do direito como integridade às decisões judiciais nos contextos estudados, mormente em casos envolvendo direitos fundamentais. A metodologia a ser observada neste artigo será pautada pela análise em uma revisão bibliográfica, ademais de pesquisa qualitativa a respeito de decisões judiciais.
Palavras-chave: Integridade; Hermenêutica; Aplicação do direito; Decisão judicial.
Abstract
This article aims to investigate the issue of legal hermeneutics, with particular focus on the perspective proposed by Ronald Dworkin, namely the concept of law as integrity. The central question lies in assessing whether, and how, Dworkin’s theory is applied to judicial decisions. The core objective concerns the validity and applicability of Dworkin’s metanarrative regarding the interpretation and application of law. To this end, the article will examine the contours of Dworkin's legal and political thought, as well as its potential connection with the jurisprudential theory advanced by the legal scholar Antonio Castanheira Neves. Furthermore, the study will explore the reception of Dworkin's theory in judicial decisions issued by the highest courts in Portugal and Brazil. The findings indicate a broad use of the concept of law as integrity in judicial rulings within the studied contexts, particularly in cases involving fundamental rights. The methodology adopted in this article will be based on bibliographic review, in addition to qualitative research on judicial decisions.
Keywords: Integrity; Hermeneutics; Application of Law; Judicial Decision.
Sumário: Introdução; 1. Notas sobre o pensamento jurídico político de Ronald Dworkin; 1.1. Ética e moral; 1.2. Igualdade como valor objetivo e concepção de liberdade; 1.3. Noção de justiça; 1.4. A questão da dignidade da pessoa humana; 2. Integridade como método interpretativo; 2.1. Tarefa hercúlea e romance em cadeia; 2.2. Interpretação jurídica a partir da integridade; 2.3. Aproximações ao jurisprudencialismo; 3. Perspectivas de aplicação judicial; 4. Considerações finais; 5. Referências.
Introdução
Por mais que evolua o Direito – ou quiçá justamente por tal fato – segue em propalada voga a questão da sua interpretação e aplicação. Buscam-se caminhos interpretativos que apresentem formas mais acertadas de analisar casos e encontrar respostas jurídicas. Assim, cuidaremos de investigar a questão da hermenêutica jurídica, mas detidamente sob o prisma da proposta consistente no Direito como integridade.
Para tanto, de início trataremos de situar a discussão e a proposta nos contornos dos vieses jusfilóficos, mais especificamente os jusnaturalismos e os juspositivismos. Em seguida abordaremos os contornos do pensamento jurídico e político de Ronald Dworkin.
Cuida-se de tratar também do pensamento político do Autor haja vista que este guarda estreita relação com sua concepção de Direito. Na abordaremos ainda os possíveis diálogos com a proposta jurisprudencialista de Castanheira Neves.
Por derradeiro, trataremos de verificar a incidência da mencionada proposta interpretativa em decisões judiciais nos contextos dos tribunais brasileiros. Nesse ponto não se tem a pretensão de proceder a uma análise exaustiva ou ainda quantitativa, mas sim uma verificação qualitativa visando detectar os usos das ideias próximas ao Direito como integridade nas resoluções de casos jurídicos.
O presente artigo tem como problemática central a análise da aplicação – em termos de ocorrência e forma – da teoria dworkiniana nas decisões proferidas pelo Judiciário. O objetivo principal consiste em avaliar a validade e a efetividade da metanarrativa proposta por Dworkin no que tange à interpretação e aplicação do Direito.
Os resultados obtidos indicam uma presença significativa da concepção de Direito como integridade nas decisões analisadas, sobretudo naquelas que envolvem direitos fundamentais.
A metodologia preponderante a ser utilizada é a lógico-dedutiva com base na bibliografia relacionada ao tema, bem como análise qualitativa de decisões judiciais.
1 Notas sobre o pensamento jurídico político de Ronald Dworkin
Ronald Dworkin é tido como um dos mais propalados nomes da teoria jurídica e política da segunda metade do século XX, tendo proposto um modelo original de epistemologia e aplicação do Direito que se pode denominar como pós-positivista.
Não se trata aqui de concordarmos com o pensamento dworkiano em todas as suas propostas – que em dados aspectos políticos e socioeconômicos difere em muito do que entendemos –, mas sim de trazer suas bases para então extrair os pontos que entendemos importantes para a formação de uma melhor compreensão, interpretação e aplicação do Direito[2].
1.1 Ética e Moral
Dworkin traz em sua obra um caminho lógico que principia pela definição e pelo estudo da ética, passa à moral, em seus aspectos pessoal e político, e chega ao Direito. Acreditamos ser acertado seguir, então, a trilha disposta pelo próprio autor. Nesse passo, compete, primeiramente, analisar em linhas gerais as questões alusivas ao agir humano, ou seja, as questões alusivas à ética e à moral que tratam justamente da conduta, do comportamento dirigido.
A ética é entendida pelo autor por meio do estudo de como as pessoas devem administrar sua responsabilidade de viver bem[3]. Assim, um juízo ético corresponde à proposição sobre o que as pessoas devem fazer para viver bem; relaciona-se com a responsabilidade ética de cada indivíduo.
Nesse sentido, cabe esclarecer que “viver bem” significa lutar para criar uma “vida boa”, respeitando certos limites essenciais à dignidade humana[4]. Trata-se de considerar que a própria vida possui um valor próprio, investigar suas potencialidades e buscar os projetos que se pretende. Assim, viver bem pressupõe respeitar os “princípios de dignidade”, quais sejam, o do “respeito próprio” e o da “autenticidade”, cujos teores serão vistos mais detidamente adiante.
A “vida boa”, de outra banda, corresponderia àquela que logrou seu propósito com êxito, tendo atingido momentos de felicidade, e dependerá de viver bem e também de fatores externos, ou seja, de toda a circunstância do indivíduo. Desta feita, “viver bem” difere e não necessariamente implicará ter uma “boa vida”[5].
Noutro eixo, ao trabalhar a questão da moral, o Dworkin faz uma distinção entre moral pessoal e moral política. A moral pessoal concentra-se naquilo que cada indivíduo deve aos outros por sua igual condição. Está, portanto, ligada à consideração que os indivíduos guardam uns quanto aos outros, reconhecendo o valor intrínseco da vida de cada um. Seguindo a mesma linha, a moral política, segundo Dworkin, “estuda o que todos nós, juntos, devemos uns aos outros enquanto indivíduos quando agimos em nome dessa pessoa coletiva artificial”[6], ou seja, o Estado. Trata-se, pois, das “obrigações políticas”. Os deveres de civilidades, cumprimento do dever legal, obediência às leis, fraternidade e defesa dos direitos individuais dos demais despontam nesse âmbito.
1.2 Igualdade como Valor Objetivo e Concepção de Liberdade
A igualdade, segundo Dworkin, teria lugar no reconhecimento da importância ou valor da vida de cada pessoa. Na explanação a respeito desses conceitos, o autor aponta que o mencionado “valor” pode ser tratado como algo objetivo, aceito de forma ampla e irrestrita, ou subjetivo, decorrente da visão de cada um.
O valor subjetivo é especial por natureza. Algo tem importância para dados sujeitos por determinada característica, podendo não se dar o mesmo quanto outras pessoas. Selos para cartas, por exemplo, possuem um valor especial para aqueles que os colecionam; entretanto não se pode dizer o mesmo quanto às demais pessoas que sequer se valem de correspondências. De outra banda, a importância objetiva é independente de gostos, crenças e desejos, e é, assim, independente de qualquer relação emocional específica, inclusive das relações baseadas na identidade[7].
Se o valor da vida decorresse tão somente de elementos específicos, com efeito, a continuidade da existência de muitos de nós (vale dizer talvez da maioria) restaria prejudicada[8]. Assim é que podemos reconhecer, subjetivamente, em nós e em alguns outros, razões que confiram à vida importância especial; entretanto, há que se ponderar que, como ser humano, cada indivíduo possui um valor objetivo e universal. Ora, “todo curador tem a responsabilidade específica de proteger certas pinturas, mas admite que outras pinturas, em outros museus, são igualmente dotadas de valor objetivo”[9].
Quanto à liberdade, o Autor trabalha com duas dimensões distintas e complementares. A primeira delas é positiva e diz respeito à “autonomia”, ou freedom (também designada “autonomia total”), que corresponde à livre possibilidade de agir das pessoas, da forma que melhor lhes aprouver. “É simplesmente a faculdade que cada pessoa tem de fazer o que bem quiser sem ser constrangida pelo Estado”[10]. Por outro lado, coloca-se a dimensão negativa da liberdade (liberty), parcela da autonomia de cada indivíduo que a comunidade política não pode restringir sem impingir-lhe um tipo especial de dano, ou seja, sem comprometer sua dignidade, negando-lhe a igual consideração ou algum traço essencial da sua responsabilidade pela própria vida[11].
Dos conceitos postos, podemos ainda inferir que a autonomia (freedom) é uma potencialidade de se agir do modo que se deseja. Entretanto, para que tal possibilidade não se esgote chocando-se com a autonomia de outrem, há que se realizar nos moldes da sociedade democrática, haja vista que esta assegura as condições mínimas para que cada indivíduo possa agir de forma livre sem interferir na esfera de autonomia dos demais. Inobstante, a liberdade (liberty) também é garantida no seio da sociedade e do Estado Democrático de Direito, com o estabelecimento de medidas que assegurem ao indivíduo a possibilidade de determinar sua vida. Nesse sentido é que se pode dizer que a autonomia (freedom) e a liberdade (liberty) são direitos fundamentais.
1.3 Noção de Justiça
A justiça seria a conjugação dos princípios da igualdade e da liberdade. Podemos afirmar que Dworkin toma por base a teoria da justiça de John Rawls, que trata a justiça como equidade (justice as fairness). A equidade se dá no chamado “momento inicial” proposto por Rawls, quando os indivíduos, cobertos pelo “véu da ignorância”[12], definem as premissas a partir das quais se construirão as estruturas institucionais da sociedade[13].
A teoria rawlsiana se assenta em dois princípios. O primeiro, da “igual liberdade”, aponta que cada pessoa deve ter um direito igual ao mais abrangente sistema de liberdades básicas iguais, que seja compatível com um sistema semelhante de liberdades para as outras; já o segundo, o da “diferença”, dispõe que as desigualdades sociais e econômicas devem ser ordenadas de tal modo que sejam ao mesmo tempo (a) consideradas como vantajosas para todos dentro dos limites do razoável, e (b) vinculadas a posição e cargos acessíveis a todos[14].
Ainda quanto à justiça, o autor refuta duas correntes de pensamento usualmente aventadas e utilizadas. Uma corresponderia à de plena neutralidade do Estado para promover a igualdade. Para refutar tal teoria, Dworkin lança mão da analogia da “corrida”. Numa corrida para alcançar objetivos (muitas vezes comuns a muitos e finitos por sua característica, como atingir determinado posto ou possuir dado bem) e ter uma “boa vida”, os indivíduos partem de posições diferentes, haja vista advirem de famílias distintas, condições financeiras diferentes e características pessoais também desiguais (conforme a chamada “loteria das aptidões naturais”, como define Rawls).
Nega-se a rasa pretensão de alguns de que todos têm as mesmas possibilidades, devendo o Estado e a sociedade se pautarem por uma pura meritocracia. Quando se tem indivíduos “partindo” de posições diferentes, falar-se numa simples meritocracia é tão somente propor a continuidade do status quo, restringindo o acesso a postos e riqueza a uma determinada camada da sociedade. Bem assim, “a analogia da corrida revela a debilidade da tese de que o governo pode ser neutro diante da distribuição de recursos”[15].
Não haveria como se propor a neutralidade quanto à distribuição de recursos. Entretanto, o mote do governo deve ser a busca pela igualdade de recursos ex ante, ou seja, possibilitando aos indivíduos mínimas condições para “viver bem” e buscar seus objetivos. De outro lado, veja-se que, ao contrário de certas posições igualitárias de justiça, Dworkin não propõe uma igualdade de recursos ex post, uma divisão plena das riquezas aos indivíduos sem qualquer diferenciação durante e após o empreendimento de sua jornada pessoal e laboral[16].
1.4 A Questão da Dignidade da Pessoa Humana
Dworkin, coloca ainda no centro de suas teorias, política e jurídica, a dignidade da pessoa humana. O Autor aponta que a dignidade da pessoa humana se encontraria encerrada em dois princípios, aos quais denomina princípios de dignidade. Trata-se de uma derivação do que foi visto como “viver bem”. Os princípios de dignidade possibilitariam aos indivíduos buscarem seus objetivos e uma “boa vida”.
O primeiro dos princípios de dignidade apresentado por Dworkin é o respeito próprio (self respect). Segundo o Autor, “cada pessoa deve levar a sério sua própria vida: deve aceitar que é importante que sua vida seja uma execução bem-sucedida, e não uma oportunidade perdida”[17]. Podemos afirmar que princípio do respeito próprio advém do fato de se considerar a importância ou valor objetivo da vida.
Como foi apresentado, o ser humano é um fim em si mesmo, aos moldes kantianos, e a vida humana possui uma importância objetiva e universal. Possui um valor que deve ser considerado, independentemente de atributos pessoais (especiais) ou visões subjetivas. Tal importância deve ser reconhecida por cada indivíduo. Incumbe à pessoa “a responsabilidade ética soberana de transformar sua vida em algo de valor, assim como o pintor transforma sua tela em algo de valor”[18].
O segundo dos princípios de dignidade trazidos por Dworkin é o princípio da autenticidade[19]. A autenticidade exige observarmos nossas próprias aptidões e o que conta como sucesso para nossas vidas; é agir de acordo com os projetos que identificamos para nós mesmos. Tal axioma assinala que os indivíduos devem buscar o desenvolvimento das suas potencialidades.
2 Integridade como método interpretativo
Dworkin, como vimos, propõe uma metanarrativa, um discurso sobre o qual se apoia seu pensamento acerca do Direito. E justamente nesse sentido, o Autor manifesta sua “teoria da integridade”.
A “integridade” apresentaria duas facetas, uma legislativa e outra jurisdicional. Quanto ao aspecto legislativo, tem-se que a atividade legiferante deveria visar a construção de um conjunto de leis moralmente coerentes para um dado Estado. Em contrapartida, impõe-se aos intérpretes e aplicadores do Direito que considerem como pilar hermenêutico a coerência moral, que deve permear o ordenamento jurídico[20].
Como consequências do entendimento do Direito como integridade, Dworkin assevera a contribuição para a eficiência do Direito, já que, quando as pessoas são governadas por princípios, há menos necessidade de regras explícitas, bem como a moral, visto que possibilita que cada cidadão aceite as exigências que lhe são feitas e faça exigências aos demais, compartilhando e ampliando a dimensão moral de quaisquer decisões políticas explícitas[21]. Em última instância, afirma Dworkin, que “a integridade, portanto, promove a união da vida moral e política dos cidadãos”[22].
Voltando-se mais à integridade no campo do Direito, o Autor assinala:
O Direito como integridade nega que as manifestações do Direito sejam relatos factuais do convencionalismo, voltados para o passado, ou programas instrumentais do pragmatismo jurídico, voltados para o futuro. (...) o Direito como integridade rejeita, por considerar inútil, a questão de se os juízes descobrem ou inventam o Direito; sugere que só entendemos o raciocínio jurídico tendo em vista que os juízes fazem as duas coisas e nenhuma delas[23].
Dworkin acredita que a interpretação do Direito é construtivista, assinalando à criatividade dos intérpretes/aplicadores do Direito, no sentido de atualização do próprio ordenamento.
2.1 Tarefa Hercúlea e Romance em Cadeia
Temos, neste ponto, a investigação da proposto dworkiana acerca da interpretação e aplicação do Direito. Dworkin indica a existência de três formas básicas de “interpretações abstratas da prática jurídica”, ou seja, modelos interpretativos aplicados ao Direito.
O primeiro modelo corresponderia ao “convencionalismo”, que aponta para um método adstrito ao conjunto de normas bem como ao espectro de decisões políticas anteriores. O convencionalismo, nesse sentido, ofereceria uma resposta aparentemente atraente e segura. As decisões políticas do passado fundamentam a coerção do Direito no presente, de forma que os juízes sempre tomam suas decisões pautadas nessa segurança das decisões políticas do passado que se tornam convenções de direitos; ou seja, decide-se dessa maneira, ainda que injusta no caso concreto, porque assim foi decidida no passado em casos semelhantes[24].
Entretanto, nos casos difíceis (hard cases), sem apontamentos anteriores, a atividade jurisdicional ficará pendente à discricionariedade, como mostra Dworkin:
Portanto, a decisão que um juiz deve tomar nos casos difíceis é discricionária no sentido forte do termo: é deixada em aberto, via correto entendimento de decisões passadas. O juiz deve encontrar algum outro tipo de justificativa além da garantia do Direito, além de qualquer exigência de consistência com decisões tomadas no passado, que venha apoiar o que fará em seguida[25].
De outra banda, o “pragmatismo” corresponde a um método de interpretação de viés teleológico, voltando-se ao impacto social das decisões e não à analítica reducionista que busca fundamentos legais às decisões judiciais. Trata-se de uma retomada do chamado “realismo jurídico”, preconizado mormente nos julgados de dois importantes juízes da Suprema Corte dos Estados Unidos, Oliver Wendell Holmes Jr. e Benjamin Cardozo, na primeira metade do século XX.
Seriam três as características fundamentais do pragmatismo jurídico, quais sejam: (i) o contextualismo, que implica toda e qualquer proposição ser julgada a partir de sua conformidade com as necessidades humanas e sociais; (ii) o consequencialismo, que requer toda proposição seja testada por meio da antecipação de suas consequências e resultados possíveis na sociedade; e (iii) o antifundacionalismo, consistente na rejeição de entidades metafísicas, conceitos abstratos, categorias apriorísticas, princípios perpétuos ou qualquer outro tipo de fundação possível ao pensamento[26].
O pragmatismo confere ao aplicador das normas elevado grau de discricionariedade, conquanto sua decisão deve apontar o caminho que o julgador entende como finalisticamente melhor à sociedade. Em contrapartida, o que se pretende alcançar com a integridade, conforme visto anteriormente, é uma coerência de princípios. Significa analisar o conjunto decisório pretérito, bem como os valores socialmente manados, para identificar os princípios que fundamentam as decisões judiciais. Essa quista coerência de princípios permite que os cidadãos governados pelo império do Direito possuam pretensões juridicamente tuteladas, mesmo que não declaradas explicitamente na legislação e nos precedentes das decisões políticas do passado, posto encontrarem-se implicitamente reconhecidas por meio dos princípios que justificaram as decisões políticas do passado[27].
A integridade no âmbito jurisdicional não implica tão somente que os casos semelhantes recebam tratamento igual, ou decisão similar. Pretende-se um padrão de coerência que possibilita ao juiz abrangência e criatividade quando da decisão de casos complexos (envolvendo conceitos interpretativos, por exemplo).
Para expor cartesianamente seu método de interpretação, Dworkin lança mão da figura do “juiz Hércules”, o qual aceita o Direito como integridade[28]. O juiz Hércules deve conhecer os casos antecedentes e verificar se tais vereditos poderiam ser dados caso o julgador estivesse coerente e consistente, aplicando princípios subjacentes a cada interpretação[29]. Após, ao receber o caso concreto, o juiz verifica o enquadramento legal; realiza investigação fática e, por fim, procede o sopesamento ético e jurídico-consuetudinário para proferir a decisão. O juiz deve,
[...] assim como um romancista em cadeia, deve encontrar, se puder, alguma maneira coerente de ver um personagem e um tema, tal que um autor hipotético com o mesmo ponto de vista pudesse ter escrito pelo menos a parte principal do romance até o momento em que este lhe foi entregue[30].
Numa sociedade de princípios, como sugere Dworkin, a interpretação do Direito deve levar em conta não somente a substância das decisões tomadas por autoridades anteriores, mas também o modo como essas decisões foram tomadas, ou seja, por quais autoridades e em que circunstância[31].
Surge, pois, a analogia do romance em cadeia, no qual cada autor fica responsável por um capítulo que deve ser novo, guardando, porém, relação com o disposto anteriormente. Na explicação de Dworkin:
Em tal projeto, um grupo de romancistas escreve um romance em série; cada romancista da cadeia interpreta os capítulos que recebeu para escrever um novo capítulo, que é então acrescentado ao que recebe o romancista seguinte, e assim por diante. Cada um deve escrever seu capítulo de modo a criar da melhor maneira possível o romance em elaboração, e a complexidade dessa tarefa reproduz a complexidade de decidir um caso difícil de direito como integridade.
O juiz então coloca suas conclusões à prova. Dworkin explica:
[O julgador, o juiz Hércules] utiliza seu próprio juízo para determinar que direitos têm as partes que a ele se apresentam. Quando esse juízo é emitido, nada resta que se possa submeter a suas convicções ou à opinião pública. [...] Contudo, quando Hércules fixa direitos jurídicos, já levou em consideração as tradições morais da comunidade, pelo menos de modo como estas são capturadas no conjunto do registro institucional que é sua função interpretar[32].
As decisões judiciais devem, até onde seja possível, tratar o sistema de normas públicas como se este expressasse e respeitasse um conjunto coerente de princípios, interpretando de modo a descobrir as normas implícitas entre e sob as explícitas[33].
Nesse diapasão, o Direito como integridade exige que o intérprete/julgador ponha à prova sua “interpretação de qualquer parte da vasta rede de estruturas e decisões políticas de sua comunidade, perguntando-se se ela poderia fazer parte de uma teoria que justificasse a rede como um todo”[34]. Logo, não caberia ao juiz adotar a postura de um legislador e tampouco incorrer em decisionismo[35].
A “criação” de direitos e deveres por parte dos juízes deve obedecer à regra de observância do plexo decisório anterior e sua fundamentação, ademais das normas postas; não há a possibilidade de, sob o pretexto de solucionar determinada contenda, o juiz se investir das competências do legislador e inovar na ordem jurídica de modo primário.
2.2 Interpretação Jurídica a Partir da Integridade
A interpretação com base na integridade não busca uma “resposta certa” por entender ser ela possível e de incontestável validade. Quer-se, antes, ter um norte, um guia para a tarefa hermenêutica e a construção de decisões fundamentas e situadas.
Buscando a manutenção da ordem institucional, bem como a coerência do Direito, há de se ter em conta a construção dworkiana de Direito como integridade com vistas a sua constante, porquanto relacionado à razão legal, institucional e ético-social; apartando-se, inobstante, a possibilidade de criacionismo judicial aludida.
Conforme visto, a perspectiva do Direito como integridade pressupõe considerar a carga normativa dos princípios, que não atuam como mandatos de otimização, mas como normas balizadoras e aplicáveis aos casos concretos. Ademais, exige por parte do intérprete/aplicador do Direito uma mirada ao arcabouço decisório constituído, bem como uma verificação acerca do caso concreto, suas especificidades e a adequação aos valores sociais correntes. Veja-se a esse respeito que a perspectiva dworkiana contempla, ademais de uma coesão quanto às posições judiciais exaradas, a visão de que a sociedade e seus valores cambiam, e com isso a interpretação e a aplicação do Direito.
Inobstante, tal perspectiva não corresponde a deixar a definição das normas ou dos institutos jurídicos ao mero talante dos julgadores. A esse respeito vale trazer os dizeres de Dworkin:
O direito como integridade pressupõe, conduto, que os juízes se encontram em situação muito diversa daquela dos legisladores. Não se adapta à natureza de uma comunidade de princípio o fato de que um juiz tenha autoridade para responsabilizar por danos as pessoas que agem de modo que, como ele próprio admite, nenhum dever legal as proíbe de agir. Assim, quando os juízes elaboram regras de responsabilidade não reconhecidas anteriormente, não têm a liberdade que há pouco afirmei ser uma prerrogativa dos legisladores[36].
Corroborando com o pensamento esposado de que cabe aos operadores do Direito aurir os valores sociais sem, entretanto, criar conceitos e atuar como se legislador fosse, pode-se colacionar valioso ensinamento de J. J. Gomes Canotilho:
[...] o processo de concretização constitucional assenta, em larga medida, nas densificações dos princípios e regras constitucionais feitas pelo legislador (concretização legislativa) e pelos órgãos de aplicação do direito, designadamente os tribunais (concretização judicial), a problemas concretos. Qualquer que seja a indeterminabilidade dos princípios jurídicos, isso não significa que eles sejam impredictíveis. Os princípios não permitem opções livres aos órgãos ou agentes concretizadores da constituição (impredictibilidade dos princípios); permitem, sim, projeções ou irradiações normativas com um certo grau de discricionariedade (indeterminabilidade), mas sempre limitadas pela juridicidade objetiva dos princípios. Como diz Dworkin, “o direito – e, desde logo, o direito constitucional – descobre-se, mas não se inventa”[37].
Entendemos que os conceitos e institutos jurídicos não devem ser tidos como estanques e imutáveis. Pelo contrário. Cambiam, formam-se e conformam-se segundo as nuances histórico-culturais de determinada comunidade inserida numa realidade espaço-temporal. Nesses termos é que cabe aqui falar em um direito projetado, para adiante, em constante construção. Conquanto se alteram as circunstâncias da comunidade e de sua cultura – e assim da própria humanidade –, remodela-se também o conjunto de condições para a existência humana e, por conseguinte, o próprio direito. Assim, o conteúdo do Direito e a forma de sua hermenêutica devem ser objeto de contínua discussão.
A atividade jurisdicional deve, portanto, trazer os devidos fundamentos de seu indicativo. No caso de uma colisão principiológica, haveria de prevalecer a posição cuja fundamentação se encontre mais bem acabada e desenvolvida[38]. Trata-se de “escrever novos capítulos” da história jurídica a cada decisão, entretanto buscando a manutenção da coerência do plexo decisório e dos valores socialmente construídos. Desta maneira, busca-se chegar à “melhor interpretação da prática jurídica da comunidade”[39].
2.3 Aproximações ao Jurisprudencialismo
Para traçar o paralelo pretendido cabe antes trazer alguns dos apontamentos basilares do pensamento jurisprudencialista encampado por António Castanheira Neves. De plano cabe mencionar que não se tem a pretensão de analisar de forma exauriente a complexa teoria formulada por Castanheira Neves, já que sequer haveria espaço para tanto no presente trabalho e nem é este nosso objetivo. Pensa-se, antes em levantar, ainda que de modo suscinto, alguns dos principais pontos do pensamento do mencionado autor para verificarmos possíveis pontos de tangencia com os apontamentos hermenêuticos traçados neste trabalho.
Segundo a proposta jurisprudencialista o Direito seria constituído por quatro estratos, quais sejam: (i) os princípios, que podem ser positivos, transpositivos ou suprapositivos, caracterizando-se como axiomas transjurídicos, que tem sua materialidade conferida por normas; (ii) as normas, que constituem os prevalentes critérios hipotéticos de resolução de casos concretos; (iii) a jurisprudência, casuística constituída pelos atores legais; e (iv) a doutrina, constituída pelas reflexões dos cientistas do Direito.
Nota-se, aqui, uma diferenciação quanto aos pensamentos de fundo juspositivista, que identificam o Direito com a norma. Também se tem uma divergência quanto aos pensamentos jusnaturalista que assinalam os fundamentos do Direito fora do escopo do ordenamento jurídico.
Castanheira Neves vai além e identifica o Direito como uma tarefa, um constituendo permanente. Isto porque o sistema jurídico é problematicamente aberto, não pleno (ou seja, não autossuficiente) e autopoiético (regido por uma racionalidade prático-normativa).
O sistema jurídico é constituído pela interlocução com os casos jurídicos. Dá-se uma relação dialética entre o sistema jurídico e as hipóteses problemáticas, entre sistema e problema. Os casos-problema são o ponto de partida para a construção do Direito, por meio de questionamentos únicos e irrepetíveis aos quais o sistema deve responder. De se ressaltar que a intencionalidade problemática dos casos é de facto única; pode haver similaridade ou analogia entre casos, mas não igualdade.
O caso concreto construí o prius metodológico[40]. Diante de um caso concreto há que se buscar a identificação – mormente, mas não exclusivamente, no estrato das normas – um critério hipotético de resolução para o caso concreto. Diz-se que o critério hipotético de resolução do caso não é exclusivo do estrato das normas, pois se podem buscar nos demais estratos a solução a problemas que demandem, inclusive, a adoção de axiomas translegais. Ainda identificado critério hipotético, as respostas não estão dadas, mas constam do horizonte do sistema. Em se verificando a adequação e justeza do critério hipotético à solução de determinado problema, tem-se a resposta ao caso.
E dessa resposta emerge uma das riquezas do Direito. Conforme mencionado, há uma relação dialética entre sistema e problema. Veja-se que, ao se chegar a uma resposta concreta, o problema é modificado pelo sistema, vez que encontra uma solução jurídica. Outrossim, o sistema também é modificado neste processo. Isso porque são abarcados novos significados e novas possibilidades de aplicação de um critério jurídico hipotético, com a elaboração de um novo sentido sistemático.
Assim, o sistema jurídico não seria um dado, um pressuposto, mas sim uma tarefa, um objetivo, assimilando novas experiências problemáticas numa totalização congruente às novas intenções normativas[41]. Dessa forma o Direito se renova e se constitui pela interação com os casos problemáticos.
Castanheira Neves assinala a distinção de sua proposta em relação a outras. Aponta que o “normativismo legalista” (identificado com a figura do legislador, com o pensamento do normativismo lógico reducionista e ideia de sistema) possui como referencial o indivíduo; já o “funcionalismo jurídico” referência a sociedade, numa proposta próxima à do estrutural-funcionalismo; já sua proposta jurisprudencialista identifica o Direito como problema (tomando problema como uma questão que apresenta mais de uma solução possível), tendo por referencial o “homem-pessoa”, o ser humano situado, em um normativismo (posto não abdicar dos limitas normativos) axiologicamente fundado[42].
O fundamento último da posição do Direito como uma tarefa encontra amparo na própria natureza humana. Parte-se da ideia de que o ser humano se molda a si e ao seu entorno. O ser humano possui uma condição de indeterminação e abertura ao mundo. Constitui-se a si e ao próprio entorno por meio de acção e cultura “perante o seu mundo circundante, em ruptura daquela continuidade ou assimilação própria da conduta animal com o meio e numa específica transcensão”[43].
Tais apontamentos remontam a uma ideia de liberdade que nos parece bastante sartriana, na medida em que o ser humano se vai constituindo a si ontologicamente com o passar do tempo, não guardando relação de continuidade necessária com seu passado e tendo incerto e projetado seu futuro.
Inobstante, de se notar o aspecto relacional entre o indivíduo e a sociedade. A existência humana é situada em uma intersubjetividade. Ademais, a coexistência e o convívio humanos “não se verificam nunca sem o commune (e enquanto simultaneamente pressuposição e resultado) que uma certa comunidade (histórica) determina – o que o individualismo radical, seja o moderno, seja o do nosso tempo (...) recusa ou de todo ignora”[44].
Não há, todavia, que se elidir a ideia de liberdade e individualidade em vista da comunidade. Permanecem sempre o “eu social”, um “ser-com-os-outros”, e o “eu pessoal”, “que consiste no núcleo pessoal da nossa individualidade”[45]. A integração e a coexistência de liberdades no sei da comunidade trazem as bases antropológicas para o florescer do Direito. As raízes do Direito estão na comunidade que pretende manter seus laços, mas que reconhece livres as pessoas. Nesse ponto, o autor traz uma aproximação também entre Direito e ética:
Não é assim o direito uma qualquer institucionalização, mas uma institucionalização de uma certa índole, a exigir por essa sua índole específica uma outra condição, para a sua emergência e constituição como direito. É ainda necessária, como condição de possibilidade do direito e como condição mesmo de o podermos pensar com o sentido de direito, uma condição ética[46].
A condição de validade do sistema é mesmo ética, já que “o direito só o temos verdadeiramente, ou autenticamente como tal, com a instituição de uma validade e não como mero instrumento social, de institucionalização e de organização”[47].
Aos atores do Direito (legisladores, juízes, promotores, advogados, professores) inseridos na sociedade cabe a tarefa de constituir, permanentemente, o sistema jurídico por meio da dialética traçada. A ideia de tarefa pode ser aproximada ao projeto de se ter o Direito como uma prática interpretativa que constitui um sistema aberto e íntegro em permanente construção.
Ademais, o Direito enquanto norma, para Castanheira Neves, não seria suficiente para abarcar a historicidade, à existência humana e à realidade social. Se assim fosse haveria um estancamento da sociedade.
De outra banda, o Direito deve conhecer da realidade metanormativa para manter-se válido, numa perspectiva permanentemente constitutiva. Em síntese o Direito traduz-se numa “normatividade axiológica de uma validade como jus que intenciona sua realização histórico- concreta mediante um juízo pratico sobre a inter-acção pessoalmente titulada e comunitariamente responsável”[48]. Ou seja, um campo normativo e axiológico, historicamente situado e com respeito à realidade social e às relações humanas.
Assim como a proposta que conjuga o Direito como integridade e o cosntrucionismo, o jurisprudencialismo não aponta a um caminho naturalista ou positivista; assinala que “a alternativa jusnaturalismo/positivismo jurídico não tem de considerar-se hoje uma alternativa absoluta”[49].
3 Perspectivas de aplicação judicial
Cumpre verificar o modo pelo qual a proposta trazida pode ser observada em decisões judiciais. Para tanto não se pretende promover uma análise exaustiva de decisões e tampouco ter um enfoque quantitativo. Quer-se, antes disso, ter em conta eventuais usos de algumas das formulações trazidas neste trabalho em decisões de casos práticos. Quanto ao Brasil nos ateremos ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), o maior do país; já no contexto internacional português trataremos do Tribunal Europeu de Direitos Humanos (TEDH). Outrossim, em dadas análises considerar-se-ão despiciendas as contextualizações de obter dictium, das matérias de fundo tratadas, guardando nosso enfoque à temática da hermenêutica jurídica quanto à formulação das decisões em apreço.
De início, quanto à compreensão do Direito como “integridade”, podemos observar decisão do Supremo Tribunal Federal do Brasil, em que se assinala que “a aplicação do Direito pressupõe a prática interpretativa”, tal qual a proposta dworkiana[50].
Ainda quanto à concepção de Direito o Tribunal de Justiça de São Paulo, o maior do Brasil (e um dos maiores do mundo em volume de demandas processadas), apontou aos ensinamentos de Dworkin quanto ao “princípio legislativo, que pede aos legisladores que tentem tornar o conjunto de leis moralmente coerente” e ao “princípio jurisdicional, que demanda que a lei, tanto quanto o possível, seja vista como coerente nesse sentido”[51].
Ponto decisivo em que o conceito de Direito como integridade empresta seus ensinamentos diz respeito à questão da interpretação e do preenchimento de possíveis “omissões”. Podemos aqui tratar de eventuais “omissões” apenas com fins didáticos pois assentimos com a perspectiva de que, no viés do Direito como integridade o sistema jurídico não contempla tais incompletudes, sendo eventuais vacâncias normativas preenchidas à aplicação dos princípios.
Ao adotar o Direito como uma prática interpretativa, ou, como quer Castanheira Neves, como uma tarefa, Dworkin assinala a possibilidade de exercício autónomo por parte dos juízes no empreendimento de produção de normas aos casos concretos.
De se notar que o espaço de atuação do intérprete-aplicador do Direito é limitado. A noção de Direito não prescinde do aspecto normativo. Pelo contrário, encontra nele uma das mais altas expressões da moral política que deve servir de baliza à atuação dos juristas. Bem assim, em julgamento o STF, observando os apontamentos de Dworkin, assinalou que “exige-se do intérprete um grau mais elevado de respeito às opções legislativas democraticamente alcançadas”[52].
Em demanda em que se discutia a possível parcialidade do magistrado de piso que apreciou demanda criminal, o STF lembrou a metáfora “empregada por Dworkin, ao se referir ao espaço vazio no centro de uma rosca, que corresponderia a uma faixa de restrições ou limite de atuação do intérprete”[53]. Na mesma decisão repisou que “a interpretação do juiz é um ato de conhecimento e também de vontade”.
As opções do interprete-aplicador do Direito devem informar o sistema por meio dos princípios e da coerência decisória, mas sem se afastar daquilo que foi trazido pelo legislador democrático.
Desta feita, conforme bem observa o Tribunal Constitucional Português ao tratar da competência de órgãos jurisdicionais, “a discricionariedade judicial na interpretação e aplicação das normas (...) deve ser tida por limitada”[54]. Assim, ressalta-se a impossibilidade de que “a propósito de interpretar, a instância julgadora afaste a incidência de leis ou atos normativos”[55].
Neste ponto a integridade do sistema jurídico coloca-se mesmo como óbice a que a discricionaridade se converta em arbitrariedade por parte das instâncias aplicadoras do Direito. Tal entendimento vigora, inclusive, quando não se encontra uma saída primeira no campo das regras a determinado caso. Referenciando Dworkin, o Tribunal de Justiça de São Paulo aponta que “segundo o filósofo norte-americano mesmo quando nenhuma regra regula o caso, uma das partes pode, ainda assim, ter o direito de ganhar a causa”. Arremata que, em tais hipóteses, “o juiz continua tendo o dever, mesmo nos casos difíceis, de descobrir quais são os direitos das partes, e não de inventar novos direitos retroativamente”[56].
Ainda nas hipóteses em que se informa o sistema por meio da observância de princípios e também do arcabouço decisório pretérito, não há que se falar em uma liberdade sem escalas da atividade criativa no do intérprete.
Pois bem. Emprestando os motes da integridade jurídica, quando do momento interpretativo, sobretudo para casos difíceis, há que se relembrar a aplicação dos princípios, como água que flui e informa o tecido normativo permeável. Nessa senda, rememora-se que “regras incidem sob a forma do 'tudo ou nada' (Dworkin), ao passo que os princípios precisam ser sopesados”[57].
Ademais de se observar os princípios, há que se manter o respeito e a coerência ao histórico jurídico emanado pelas instituições jurídicas acerca de determinado tema. Assim é que “o juiz continua tendo o dever, mesmo nos casos difíceis, de descobrir quais são os direitos das partes, e não de inventar novos direitos retroativamente” [58].
A esse respeito de se observar os câmbios cultural-civilizacionais que possuem interferência nos mandatos de optimização das normas. Nesse sentido o STF já por vezes optou por ajustar entendimentos encampados por súmulas à novas realidades sociais:
[...] Tem por objeto a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas. Assim, a vinculação repercute somente em relação ao Poder Executivo e aos demais órgãos do Poder Judiciário, não atingindo o Legislativo, nem o próprio STF, já que, em relação a este, mostra-se necessário viabilizar a possibilidade de revisão e cancelamento de ofício pela Corte Constitucional e, assim, adequar a súmula à evolução social[59].
Vale trazer, ainda, a experiência do Tribunal Europeu de Direitos Humanos, que, observando as novas tendencias sociais, entendeu, a dada altura, não caber mais o critério biológico para a configuração do casamento e de outros direitos, assegurando garantias aos transexuais:
[...] uma tendência internacional continua não apenas no sentido de uma crescente aceitação social dos transsexuais, mas igualmente no sentido do reconhecimento jurídico da nova identidade sexual dos transsexuais operado. [...] não pode ser considerada uma questão controversa a faculdade dos transsexuais gozarem plenamente, nos mesmos termos dos seus concidadãos, do direito ao desenvolvimento pessoal e a integridade física e moral [...] a situação insatisfatória dos transsexuais operados, que vivem entre dois mundos, dado que não pertencem verdadeiramente a um sexo, nem a outro, não pode mais ser sustentada[60].
Assim, o Direito – aqui entendido como prática interpretativa situada – cumpre “uma função dinamizadora e modeladora, capaz de ajustar a ordem estabelecida à evolução social e de promover mesmo esta evolução num determinado sentido”[61].
Importante exemplo quanto à observância da proposta do Direito como integridade em alusão também a uma visão de construção constante do direito se deu quanto do julgamento do Supremo Tribunal Federal da equiparação da condição materna de mães biológicas às mães adotivas para efeitos de concessão de licença maternidade[62].
No bojo da mencionada decisão assinala-se à uma “evolução, com a cadeia de normas antes descrita e à luz dos compromissos e dos valores que elas expressam”. Referencia-se, ainda, “todos os capítulos desta história avançaram, paulatinamente, para majorar a proteção dada à criança adotada e igualar seus direitos aos direitos fruídos pelos filhos biológicos”, podendo-se, aqui, identificar uma nova abrangência linguística aos valores sociais de proteção da maternidade, dada por uma construção social.
De se notar, todavia, que a licença a mães adotantes não estava prevista nas regras os no escopo decisório prévio de forma clara. Nesse ponto o STF lança mão da metáfora do romance em cadeia à justificar sua posição de trazer um novo entendimento à luz dos novos sentidos axiomáticos verificados:
O direito é um sistema, um conjunto coerente de princípios que orienta a solução de novos casos. Os princípios não são como as regras. A interpretação que os implementa não vem previamente descrita por um comando preciso. O que um determinado princípio requer, em dada situação concreta, deve ser avaliado como um “romance em cadeia”. Cada capítulo de um romance parte e é compatível com o capítulo que o antecede, mas inova e faz a história evoluir. Da mesma maneira, a decisão de cada caso que coloque em discussão um determinado princípio deve ser coerente com as decisões anteriores, com as indicações do legislador e, ao mesmo tempo, deve fazer o direito avançar. Essa formulação é denominada ‘direito como integridade’ do autor.
Arremata a decisão apontando que “no caso em exame, todos os capítulos desta história avançam paulatinamente no sentido de majorar a proteção dada à criança adotada e de igualar seus direitos aos direitos fruídos pelos filhos biológicos”.
Outros exemplos podem ser observados dizem respeito à aplicação do conceito de Dworkin quanto à dignidade da pessoa humana, tal qual visto algures. Vale colacionar apontamento feito pelo STF no RE n. 646721 em que se discutia a questão sucessória em uniões homoafetivas, mormente equiparação entre cônjuges e companheiros em questões sucessórias:
Aqui, pode-se citar Ronald Dworkin, que, em síntese, reconhece a essencialidade de uma liberdade positiva que se realiza no âmbito de uma comunidade política ‘verdadeira’, assim entendida como aquela que i) detém as condições estruturais que permitam ao indivíduo reputar-se, efetivamente, seu membro moral, bem como ii) expresse alguma “concepção de igualdade de consideração para com os interesses de todos os membros da comunidade” e iii) “seja feita de agentes morais independentes”, não podendo, por exemplo, impor concepções unitárias de bem aos seus integrantes[63].
Vê-se, na mencionada decisão, menção expressa aos aludidos princípios de dignidade quando se trata das questões da igualdade (respeito próprio) e da independência (autenticidade). Noutras palavras, “pretende-se uma leitura do sentido ideal desenvolvido por Dworkin, a partir da dignidade da pessoa humana como princípio constitucional”[64].
Por derradeiro, vale repisar que as opções do interprete-aplicador do Direito devem sempre ser fundamentados, tendo lugar os discursos mais bem justificados. E não é outro o sentido da jurisprudência mais abalizada, ainda em consonância com as perspectivas jusfilosóficas trazidas:
A interpretação judicial da lei, nesse sentido, ‘deve refletir não apenas suas convicções sobre justiça [...] – embora estas também tenham um papel a desempenhar –, mas também suas convicções sobre os ideais de integridade e equidade políticas e de devido processo legal, na medida em que estes se aplicam especificamente à legislação em uma democracia’. A decisão a ser tomada deve levar em conta justificação racional, do ponto de vista lógico-argumentativo, como método de interpretação jurídica necessária e suficiente para o cumprimento do dever de fundamentação das decisões judiciais[65].
Nesse sentido a integridade assinala que os juízes construam efetivos argumentos às suas decisões, estabelece freios a atitudes solipsistas-voluntaristas, constituindo uma forma de virtude política contra a arbitrariedade na aplicação do Direito[66].
4 Considerações finais
Cuidou-se de apontar a complementariedade das mencionadas teorias em busca de um caminho mais consentâneo para a interpretação e aplicação do Direito. Outrossim, trouxemos as aproximações quanto a outras corrente jusfilosófica encampadas Castanheira Neves. Por derradeiro, apontamos a uma presença da forma de interpretação proposta por tribunais, sobretudo no Brasil.
A proposta consiste em tomar o Direito como prática interpretativa, e, quando da decisão de questões concretas, caminhar para além do convencionalismo do normativismo-lógico reducionista, investigando os princípios sociais e os impactos aos princípios jurídicos, bem como mantendo-se a coerência e harmonia, tanto quanto possível, dos entendimentos judiciais. Trata-se de assinalar a possibilidade do exercício de um poder discricionário por parte dos interpretes-aplicadores do Direito sem, entretanto, incorrer em ativismo ou decisionismo.
Outra questão que se põe é a possibilidade de se perseguir uma resposta ideal aos casos concretos, não como uma utopia de possibilidade de atingimento, mas como um guia ao trabalho do jurista. Nesse passo pensa-se no exercício mais assertivo da discricionariedade pelo interprete-aplicador do Direito, com o pleno exercício do arbítrio, que não se deve converter em arbitrariedade, nos moldes do entendimento conjugado das decisões trazidas[67].
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[1] Bacharel em Direito pela PUC/SP. Pós-Graduado em Direito Civil–Contratos pela PUC/SP. Pós-Graduado em Direito Internacional pela Escola Paulista de Direito. Mestre e Doutor em Filosofia do Direito pela PUC/SP. Professor da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Advogado. Lattes: http://lattes.cnpq.br/3000366852251498, renanub@hotmail.com. https://orcid.org/0000-0003-4751-9830.
Declaro, para os devidos fins, que não utilizei inteligência artificial generativa na elaboração do artigo submetido para publicação.
[2] Seguimos aqui o percurso traçado em MELO, Renan. (Re)construindo a dignidade. Dialética: São Paulo, 2021, cap. 4.
[3] DWORKIN, Ronald. A raposa e o porco-espinho: justiça e valor. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2014. p. 500.
[4] DWORKIN, Ronald. What is a good life? (O que é uma boa vida?). Trad. Emilio Peluso Meyer. Rev. Direito GV, São Paulo, v. 7, n. 2, jul.-dez. 2011.
[5] DWORKIN, Ronald. A raposa e o porco-espinho: justiça e valor. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2014. p. 500.
[6] DWORKIN, Ronald. A raposa e o porco-espinho: justiça e valor. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2014. p. 500.
[7] DWORKIN, Ronald. A raposa e o porco-espinho: justiça e valor. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2014. p. 390.
[8] Um seguidor da doutrina nazista, por exemplo, poderia defender que apenas a vida dos “arianos”, por características próprias, possui valor, em nome do qual haveria que se dizimar os demais seres humanos, para a defesa do mencionado valor.
[9] DWORKIN, Ronald. A raposa e o porco-espinho: justiça e valor. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2014, p. 391.
[10] DWORKIN, Ronald. A raposa e o porco-espinho: justiça e valor. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2014. p. 7.
[11] DWORKIN, Ronald. A raposa e o porco-espinho: justiça e valor. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2014. p. 561.
[12] Os indivíduos se encontraram despidos de qualquer aparto material, distinção ou ciência quanto à suas vidas para além deste momento. Trata-se de uma espécie de “neocontratualismo” que funda a teoria da justiça rawlsiana.
[13] BITTAR, Eduardo Carlos Bianca. Curso de Filosofia do Direito. São Paulo: Atlas, 2001. p. 200.
[14] RAWLS, John. Uma teoria da Justiça. Trad. Almiro Pisetta; Lenita M. R. Esteves. São Paulo: Martins Fontes, 1997. p. 286.
[15] DWORKIN, Ronald. A raposa e o porco-espinho: justiça e valor. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2014. p. 541.
[16] DWORKIN, Ronald. A raposa e o porco-espinho: justiça e valor. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2014. p. 547-548.
[17] DWORKIN, Ronald. A raposa e o porco-espinho: justiça e valor. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2014, p. 311.
[18] DWORKIN, Roland. A raposa e o porco-espinho: justiça e valor. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2014. p. 22.
[19] O filósofo assim aborda o valor desse conceito: “Cada um tem a responsabilidade pessoal e especial de identificar quais devem ser os critérios de sucesso em sua própria vida; tem a responsabilidade pessoal de criar essa vida por meio de uma narrativa ou de um estilo coerentes com os quais ele mesmo concorde”. (DWORKIN, Roland. A raposa e o porco-espinho: justiça e valor. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2014, p. 311).
[20] DWORKIN, Ronald. O império do Direito. Trad. Jefferson Ruiz Camargo. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007. p. 213.
[21] DWORKIN, Ronald. O império do Direito. Trad. Jefferson Ruiz Camargo. 2a ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007. p. 229-30.
[22] DWORKIN, Ronald. O império do Direito. Trad. Jefferson Ruiz Camargo. 2a ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 230.
[23] DWORKIN, Ronald. O império do Direito. Trad. Jefferson Ruiz Camargo. 2a ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 271.
[24] DWORKIN, Ronald. O império do Direito. Trad. Jefferson Ruiz Camargo. 2a ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 145.
[25] DWORKIN, Ronald. O império do Direito. Trad. Jefferson Ruiz Camargo. 2a ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007. p. 143.
[26] POGREBINSCHI, Thamy. O que é o pragmatismo. Disponível em: <http://www.cis.puc-rio.br/cis/cedes/PDF/paginateoria/pragmatismo.pdf>. Acesso em: 13 Jan 2023.
[27] PRADO, Esther Regina Corrêa Leite. Os métodos interpretativos de Ronald Dworkin e o Direito como Integridade. Conteúdo Jurídico, Brasília, 8 dez. 2012. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.41027>. Acesso em 13 Mai 2023.
[28] DWORKIN, Ronald. O império do Direito. Trad. Jefferson Ruiz Camargo. 2a ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 287.
[29] DWORKIN, Ronald. O império do Direito. Trad. Jefferson Ruiz Camargo. 2a ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007. p. 287.
[30] DWORKIN, Ronald. O império do Direito. Trad. Jefferson Ruiz Camargo. 2a ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 287.
[31] DWORKIN, Ronald. O império do Direito. Trad. Jefferson Ruiz Camargo. 2a ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 261.
[32] DWORKIN, Ronald. O império do Direito. Trad. Jefferson Ruiz Camargo. 2a ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 117.
[33] DWORKIN, Ronald. O império do Direito. Trad. Jefferson Ruiz Camargo. 2a ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007. p. 286.
[34] DWORKIN, Ronald. O império do Direito. Trad. Jefferson Ruiz Camargo. 2a ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 294.
[35] “Os juízes devem tomar suas decisões sobre common law com base em princípios, não em política: devem apresentar argumentos que digam por que as partes realmente teriam direitos e deveres legais novos que eles aplicaram na época em que essas partes agiram, ou em algum outro momento pertinente do passado.” (DWORKIN, Ronald. O império do Direito. Trad. Jefferson Ruiz Camargo. 2a ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007. p. 286).
[36] DWORKIN, Ronald. O império do Direito. Trad. de Jefferson Ruiz Camargo. 2a ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003. p. 292-3.
[37] CANOTILHO, José J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 2ª ed. Coimbra: Almedina, 2000. p. 1183.
[38] Nesse viés: “[...] o sistema interpretativo monofásico de Dworkin se sobrepõe ao de Hart. Ao permitir a escolha, pelo juiz, entre critérios “que um homem razoável poderia interpretar de diferentes maneiras”, propondo, ao mesmo tempo, a existência de um dever legal do juiz de analisar de modo mais abrangente as fontes da lei, inclusive no que toca a princípios não convencionais; torna a lei capaz de alcançar mesmo casos difíceis, fornecendo a esses casos critérios mais objetivos do que o mero recurso à discricionariedade em sentido forte. Torna, ainda, a lei capaz de alcançar casos difíceis, sem retirar do juiz a discricionariedade em sentido fraco.” (IKAWA, Daniela R. Dworkin e discricionariedade. Lua Nova, São Paulo, n. 61, 2004. Disponível em <www.scielo.br/pdf/ln/n61/a06n61.pdf>. Acesso em: 21 Jun 2023).
[39] DWORKIN, Ronald. O império do Direito. Trad. de Jefferson Ruiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 2003. p. 272.
[40] Conforme NEVES, António Castanheira, O Actual Problema Metodológico da Interpretação Jurídica, pp. 81 s. e 334; “O Sentido Actual da Metodologia Jurídica”, in Digesta, 3.º Vol., p. 392, e Metodologia Jurídica, p. 159.
[41] NEVES, António Castanheira. Metodologia Jurídica: problemas fundamentais. Coimbra: Coimbra Editora, 1993, p. 158.
[42] NEVES, António Castanheira. Entre o legislador, a sociedade e o juiz; ou entre sistema, função e problema – os modelos actualmente alternativos da realização jurisdicional do direito. Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, v. LXXIV, Coimbra: 1998, p. 1-44.
[43] NEVES, António Castanheira. Coordenadas de uma reflexão sobre o problema universal do direito – ou as condições de emergência do direito como direito. In Estudos em Homenagem à Professora Doutora Isabel de Magalhães Collaço. Coimbra: Coimbra Editora, 2002, vol. II, p. 845.
[44] NEVES, António Castanheira. Coordenadas de uma reflexão sobre o problema universal do direito – ou as condições de emergência do direito como direito. In Estudos em Homenagem à Professora Doutora Isabel de Magalhães Collaço. Coimbra: Coimbra Editora, 2002, vol. II, p. 849.
[45] NEVES, António Castanheira. O papel do jurista no nosso tempo. In NEVES, António Castanheira. Digesta: escritos acerca do direito, do pensamento jurídico, da sua metodologia e outros. Volume 1. Coimbra: Coimbra Editora, 1995, p. 40.
[46] NEVES, António Castanheira. Coordenadas de uma reflexão sobre o problema universal do direito – ou as condições de emergência do direito como direito. In Estudos em Homenagem à Professora Doutora Isabel de Magalhães Collaço. Coimbra: Coimbra Editora, 2002, vol. II, p. 861.
[47] NEVES, António Castanheira. Coordenadas de uma reflexão sobre o problema universal do direito – ou as condições de emergência do direito como direito. In Estudos em Homenagem à Professora Doutora Isabel de Magalhães Collaço. Coimbra: Coimbra Editora, 2002, vol. II, p. 861.
[48] NEVES, António Castanheira. Entre o legislador, a sociedade e o juiz; ou entre sistema, função e problema – os modelos actualmente alternativos da realização jurisdicional do direito. Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, v. LXXIV, Coimbra: 1998, p. 18.
[49] NEVES, António Castanheira. Metodologia Jurídica: problemas fundamentais. Coimbra: Coimbra Editora, 1993, p. 47.
[50] STF, ARE n. 1340958, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, julgamento em 01/10/2021. Disponível em <https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=15348176652&ext=.pdf>. Acesso em 01 Mai 2023. No trecho destacado o STF trata do papel do próprio Tribunal quando da interpretação de normas emanadas por outros poderes. No caso em apreço debateu-se a necessidade de apreciação pelo plenário do STF quanto à ação que tratava da cobrança de reajustes salarias a servidora pública.
[51] TJSP, Apel. n. 1068954-87.2021.8.26.0053, Rel. Min. Marcos Pimentel Tamassia, julgamento em 04/07/2022. Disponível em <https://esaj.tjsp.jus.br/cposg/search.do?conversationId=&paginaConsulta=0&cbPesquisa=NUMPROC&numeroDigitoAnoUnificado=1068954-87.2021&foroNumeroUnificado=0053&dePesquisaNuUnificado=1068954-87.2021.8.26.0053&dePesquisaNuUnificado=UNIFICADO&dePesquisa=&tipoNuProcesso=UNIFICADO>. Acesso em 20 Mai 2023. No caso discutiu-se pedido para a concessão de medicamento de alto custo a paciente do sistema público de saúde.
[52] STF, ADI n. 3854, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 07/12/2020. Disponível em <https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=2489702>. Acesso em 25 Jun 2023. No trecho destacado o Tribunal aborda a constitucionalidade da regra de teto salarial à magistratura estadual.
[53] STF, RHC n. 131544, Rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 21/06/2016. Disponível em <https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4886105>. Acesso em 20 Mai 2023.
[54] TC, Acórdão 41/2016, Cons. João Pedro Caupers. Disponível em <http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20160041.html>. Acesso em 01 jun. 2023.
[55] STF, ARE 1340958, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, julgamento em 01/10/2021. Disponível em <https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search?base=decisoes&pesquisa_inteiro_teor=false&sinonimo=true&plural=true&radicais=false&buscaExata=true&page=1&pageSize=10&queryString=%22pr%C3%A1tica%20interpretativa%22&sort=_score&sortBy=desc>. Acesso em 01 Jul 2023. No caso em apreço, já mencionado, debateu-se a necessidade de apreciação pelo plenário do STF quanto à ação que tratava da cobrança de reajustes salarias a servidora pública.
[56] TJSP, AI. n. 2168655-32.2022.8.26.0000, Rel. Des. Spencer Ferreira, julgamento em 01/08/2022. Disponível em: <https://esaj.tjsp.jus.br/cposg/search.do?conversationId=&paginaConsulta=0&cbPesquisa=NUMPROC&numeroDigitoAnoUnificado=2168655-32.2022&foroNumeroUnificado=0000&dePesquisaNuUnificado=2168655-32.2022.8.26.0000&dePesquisaNuUnificado=UNIFICADO&dePesquisa=&tipoNuProcesso=UNIFICADO>. No caso o TJSP esteve diante de discussão de contrato de prestação de ensino em que as regras não estavam todas claras e contratualmente posta.
[57] TJSP, Apel. n. 1020131-48.2022.8.26.0053, Des. Rel. Ferreira Rodrigues, julgamento em 20/09/2022. Disponível em <https://esaj.tjsp.jus.br/cposg/search.do?conversationId=&paginaConsulta=0&cbPesq/uisa=NUMPROC&numeroDigitoAnoUnificado=1020131-48.2022&foroNumeroUnificado=0053&dePesquisaNuUnificado=1020131-48.2022.8.26.0053&dePesquisaNuUnificado=UNIFICADO&dePesquisa=&tipoNuProcesso=UNIFICADO>. Acesso em 15 Abr 2023.
[58] STF, ADPF n. 444, Rel. Min. Gilmar mandes, julgamento em 05/10/2018. Disponível em <https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5149497>. Acesso em 18 Abr 2023. Discutiu-se na ação a constitucionalidade da condução coercitiva no âmbito penal.
[59] STF, Rcl n. 11805, Rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 08/10/2012. Disponível em <https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4086311>. Acesso em 17 Jun 2023.
[60] Acórdãos Christine Goodwin e I. c. Reino Unido, de 11 de Julho, de 2002, R02-VI, § 90; I.c. Reino Unido, de 11 de Julho de 2002. Acesso em 02 Jun 2023.
[61] BAPTISTA, Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Coimbra: Almedina, 1989, p. 223.
[62] STF, RE 778889, Rel. Min. Luis Roberto Barroso, julgamento em 10/03/2016. Disponível em <https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=11338347>. Acesso em 12 Fev 2023.
[63] STF, RE n. 646721, Rel. Min. Roberto Barroso, julgamento em 17/09/2017. Disponível em <https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=312692442&ext=.pdf>>. Acesso em 13 fev. 2023.
[64] MIRANDA, Lorena, BONIFÁCIO, Artur, Discriminação inversa pelo contributo de Dworkin In Revista Internacional Consinter de Direito, 2021. Disponível em ttps://revistaconsinter.com/index.php/ojs/1302. Acesso em 26 mai 2025.
[65] STF, ADI n. 5383, Rel. Min. Rosa Weber, julgamento em 16/11/2021. Disponível em: <https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4847492>. Acesso em: 18 Mai 2023.
[66] TJSP, Apel. n. 1068954-87.2021.8.26.0053, Rel. Min. Marcos Pimentel Tamassia, julgamento em 04/07/2022. Disponível em: <https://esaj.tjsp.jus.br/cposg/search.do?conversationId=&paginaConsulta=0&cbPesquisa=NUMPROC&numeroDigitoAnoUnificado=1068954-87.2021&foroNumeroUnificado=0053&dePesquisaNuUnificado=1068954-87.2021.8.26.0053&dePesquisaNuUnificado=UNIFICADO&dePesquisa=&tipoNuProcesso=UNIFICADO>. Acesso em: 05 Jan 2023.
[67] Destacam-se as decisões trazidas pelo TC que possui posição que nos parece mais coerente e menos expansiva quanto à interpretação normativa.