DOI: 10.19135/revista.consinter.00021.31

Recebido/Received 15/07/2025 – Aprovado/Approved 20/11/2025

Arlete Inês Aurelli[1] – https://orcid.org/0000-0002-9162-6513

Rita de Cássia Curvo Leite[2]– https://orcid.org/0000-0003-3500-8670

Resumo

Não há novidade em afirmar que as obrigações devem ser cumpridas e que, ante o inadimplemento, permite-se ao credor voltar-se contra o patrimônio do devedor para resguardar-se do crédito. Sabe-se que alguns bens do devedor são protegidos pela impenhorabilidade, fundada no princípio da dignidade da pessoa humana. Mas, será que, efetivamente, todos os bens colocados a salvo da penhora, não poderiam, em alguma medida, ser penhorados? Eis o objetivo geral da presente pesquisa: analisar o regime da (im)penhorabilidade de bens e os fundamentos jurídicos que justificam a flexibilização de atos constritivos de apreensão judicial de bens do devedor. Mas, não se pretende analisar a relativização de todas as hipóteses contidas no regime da (im)penhorabilidade de bens, senão aquelas que incidem sobre o salário e congêneres, e, ainda, sobre o bem de família, objetivo específico desta resenha. Para tanto, valer-se-á a pesquisa da metodologia bibliográfica exploratória a partir dos métodos dedutivo e jurisprudencial partindo-se do exame da legislação em geral, bem assim de jurisprudência selecionada, para se alcançar situações excepcionais que viabilizam a flexibilização da penhora de bens do devedor sem afrontar o princípio da dignidade da pessoa humana e preservar o mínimo existencial. O resultado da pesquisa revela haver dissensos doutrinário e pretoriano no trato da (im)penhorabilidade circunspecta às hipóteses selecionadas neste ensaio o que demonstra a atualidade e a importância da análise. Conclui-se que o assunto se mantém polêmico a demandar persistente exame, carecendo de uniformização, o que se ultima alcançar em nome da segurança jurídica.

Palavras-chave: (Im)penhorabilidade de bens. Salário. Bem de família. Princípio da Dignidade da pessoa humana. Mínimo existencial.

Abstract

It is not new to affirm that obligations must be fulfilled and that, in the event of default, the creditor may seek satisfaction of the debt through the debtor’s assets. Some of the debtor's assets, nonetheless, are protected by non-attachability, based on the principle of human dignity. However, can all the debtor’s assets be seized to fulfill the obligation? This research aims to analyze the legal framework surrounding the (im)seizability of assets and the juridical grounds that justify the flexibility of judicial enforcement measures. Rather than addressing all hypotheses within the general regime of (im)seizability, this study focuses specifically on two categories: wages and equivalent earnings, and the so-called family home. Through an exploratory bibliographical methodology, grounded in deductive reasoning and supported by selected case law, the research seeks to identify exceptional situations in which asset seizure may be allowed without violating the principle of human dignity or undermining the essential minimum needed for a dignified existence. The analysis reveals doctrinal and jurisprudential divergences regarding the applicability of asset protection in these specific cases, underlining the contemporary relevance and legal complexity of the issue. The study concludes that the topic remains contentious and lacks uniformity in both doctrine and jurisprudence. Therefore, continuous scholarly and judicial examination is required to ensure legal certainty and the effective protection of fundamental rights.

Keywords: (Im)seizability of assets. Wages. Family property. Principle of human dignity. Minimum existential standard.

Sumário: 1. Introdução; 2. Da Responsabilidade Patrimonial à Proteção da (im)penhorabilidade de bens; 2.1. Relativização pautada no Princípio da Dignidade da Pessoa Humana; 3. A Sistematização da (im)penhorabilidade do salário e do bem de família na lei processual; 3.1. Relativização da (im)penhorabilidade do bem de família. 3.2. Relativização da (im)penhorabilidade do salário; 3.2.1. Primeira corrente: não pode haver relativização além das hipóteses expressamente previstas em lei; 3.2.2. Segunda corrente: pode haver relativização da (im)penhorabilidade, além das hipóteses expressamente previstas em lei; 3.2.3. Terceira corrente: pode haver relativização além das hipóteses expressamente previstas em lei, desde que respeitado o mínimo existencial do devedor; 3.3. Mínimo Existencial; 4. Considerações Finais; 5. Referências.

1  INTRODUÇÃO

A máxima “dar a cada um o que é seu” corresponde a um autêntico princípio fundamental de justiça. Implica dizer que cada pessoa deve receber o que lhe é devido, seja em termos de direitos ou responsabilidades. Dito axioma encontra raízes na filosofia clássica, com pensadores como Platão e Aristóteles discutindo a importância de dar a cada indivíduo o que lhe é apropriado.

O preceito de “dar a cada um o que é seu” também é frequentemente associado ao Direito Romano, com o famoso brocardo suum cuique tribuere (dar a cada um o que lhe é devido) expressando a importância de respeitar os direitos e obrigações de cada indivíduo, presente em Ulpiano[3] no Digesto, I, 1. 10, § 1. Essa ideia, em essência, expressa a busca por um equilíbrio onde cada indivíduo recebe aquilo que lhe é devido, seja por direito, mérito ou necessidade.

Não se pode olvidar, entretanto, que a ideia de dar a cada um o que é seu é igualmente social e temporal, alterando-se e amoldando-se à sociedade.

Se ao credor deve-se garantir o crédito, ao devedor não se pode, em nome do crédito, suplantar a vida digna. Por outro lado, não se pode acobertar excessivamente o devedor, a ponto de se deixar a míngua o credor.

Nesse sentido, o principal objetivo da presente pesquisa reside em analisar o regime da (im)penhorabilidade de bens e a possibilidade de relativização dessa proteção, vale dizer, perquirir em que medida seria possível penhorar bens que, pela sistematização legal, são impenhoráveis, garantindo-se o direito de crédito sem apequenar exasperadamente a condição patrimonial do devedor.

Mas, não se pretende analisar a relativização de todas as hipóteses contidas no regime da impenhorabilidade de bens, senão aquelas que incidem sobre o salário e congêneres, e, ainda, sobre o assim denominado bem de família. Eis o objetivo específico do estudo.

Para tanto, valer-se-á a pesquisa da metodologia bibliográfica exploratória a partir dos métodos dedutivo e jurisprudencial partindo-se do exame da legislação em geral, bem assim de jurisprudência selecionada, para se chegar nas situações excepcionais que viabilizam a flexibilização da penhora de bens do devedor sem afrontar ao princípio da dignidade da pessoa humana e no intuito de ver preservado o mínimo existencial.

A pesquisa revelou haver dissensos doutrinário e pretoriano no trato da (im)penhorabilidade circunspecta às hipóteses selecionadas neste ensaio a revelar a atualidade e a importância da análise. Realmente, coletaram-se julgados que apontam haver opiniões dissonantes e que colocam em risco a segurança jurídica. Justamente por isso, conclui-se que o assunto se mantém polêmico a demandar persistente exame, carecendo de uniformização.

2  DA RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL À PROTEÇÃO DA (IM)PENHORABILIDADE DE BENS

As obrigações assumidas devem ser fielmente adimplidas, assim já ensinava Agostinho Alvim[4]. De fato, o adimplemento é a regra, o inadimplemento, a exceção. Justamente por isso, o não cumprimento das obrigações é patologia que precisa ser combatida por mecanismos eficientes que conduzam à completude do ciclo obrigacional.

Longe se vai na história do direito das obrigações quando o próprio corpo do devedor servia para responder às dívidas e pagamentos desonrados. Dominava, então, a vindita privada, levada a cabo pelas próprias mãos, genuína forma primitiva, selvagem, talvez, reacionária contra o mal sofrido[5].

Depois, o uso consagrou em regra jurídica o talião, com a Lei das XII Tábuas, época em que, estabelecida judicialmente a insolvência do devedor, podia o credor amarrá-lo ou prendê-lo a ferros, não tendo que lhe fornecer, para sustento, mais de uma libra de farinha por dia. Se, passados três dias de mercado, o devedor não arranjasse meios para saldar suas dívidas, podia ser morto ou vendido além do Tibre, sendo lícito também que, havendo muitos credores, o cadáver fosse esquartejado em tantas partes quanto o número de credores[6].

A execução sobre o próprio corpo do devedor perdeu força com a Lex Poetelia Papira, que proibiu os maus tratos sobre a pessoa do devedor[7]. A esse período sucede o da composição, que repara o prejuízo mediante a prestação de uma pena, pela qual o ofensor adquire o direito ao perdão do ofendido, para passo seguinte, alcançar-se a concepção da responsabilidade, assumindo o Estado a função de punir. É na lei Aquilia que se esboça, afinal, um princípio geral regulador da reparação do dano[8].

A faculdade de exigir o cumprimento da obrigação, de forma coativa, respaldada pela força do Estado, constitui seu núcleo essencial. Traduz a possibilidade de formular uma justa pretensão em face do devedor e reclamar a adoção do comportamento devido[9], o que, no caminhar histórico do direito obrigacional, passou a recair na constrição de bens do devedor suficientes para dar cabo à obrigação inadimplida.

A responsabilidade patrimonial se coloca, pois, em uma perspectiva funcional de tutela de segurança da realização de créditos[10], de sujeição in potentia à sanção. Com efeito, o devedor não pode impedir que a sanção seja realizada. Tendo em vista que o devedor não pode física e corporalmente ser coagido ao cumprimento da obrigação, como em passado longínquo, é seu patrimônio que responde pela satisfação do débito. Conforme esclarece Adriano Ferriani[11], “a responsabilidade patrimonial implica na possibilidade de o credor buscar, no patrimônio do executado (ou de terceiros, em situações excepcionais) bens que serão destinados à alienação”.

A responsabilidade patrimonial é regida tanto pelo Código Civil pátrio, em seus arts. 391 e 942, como também pelo art. 789 do CPC que preconiza que o devedor responde para o cumprimento de suas obrigações com todos os seus bens, presentes e futuros.

Mas, será que tal apreensão sobre os bens do devedor não sofre limitações?

Na realidade, há bens do devedor que não respondem pela dívida, como é o caso de bens que são considerados, por lei, impenhoráveis; por outro lado, há bens de terceiros que respondem por ela.

Isso se dá porque obrigação e responsabilidade são conceitos inconfundíveis. Uma pessoa pode estar obrigada ao pagamento da dívida (devedor) e outra ser o garante de seu cumprimento (fiador). Este não é o devedor, mas o responsável pelo adimplemento da obrigação. Em consequência, o tema da responsabilidade patrimonial envolve duas esferas de análise: (i) selecionar os bens do devedor que estão excluídos da responsabilidade patrimonial, como sói ocorrer com os bens impenhoráveis, e (ii) especificar quais bens de terceiros respondem pela execução ou cumprimento da obrigação.

Nesse sentido, a penhora alcança todos os bens que compõem o patrimônio do devedor, sejam corpóreos ou incorpóreos, inclusive acessórios, e que se acomodam dentro da responsabilidade patrimonial do devedor. Consiste no primeiro ato realmente coercitivo, no procedimento executório, cuja finalidade é individualizar, vincular e conservar os bens que responderão pela dívida, na execução.

No presente estudo, como já se disse, o foco da pesquisa será analisar o regime da (im)penhorabilidade de bens e a possibilidade de relativização dessa proteção, vale dizer em que medida seria possível, penhorar bem que, pela sistematização legal, é impenhorável.

O regime da impenhorabilidade de bens tem previsão legal tanto no Código de Processo Civil (arts. 833 e 834), como também na Lei 8.009/1990. Entre as determinações para a impenhorabilidade, destaquem-se aquelas que são o foco central do presente ensaio, quais sejam, a impenhorabilidade do salário e congêneres, respaldada no art. 833, inciso IV, do Código de Processo Civil, e, ainda, a impenhorabilidade do bem de família, prevista na Lei 8.009/90. Essas específicas proteções, bem como todo o regime de impenhorabilidade têm fundamento principalmente no princípio da dignidade da pessoa humana, consagrado no art. 1º, inciso III, da Constituição Federal de 1988.

De fato, a penhora dos salários pode causar transtornos irreparáveis ao executado e sua família, por suprimir meios necessários mínimos à manutenção de uma vida digna e saudável, causando prejuízos irremediáveis e dificuldades financeiras, muitas vezes intransponíveis. Em razão disso, nesses casos, o princípio da dignidade da pessoa humana restaria inexoravelmente violado.

Ocorre que o Código de Processo Civil de 2015 trouxe relevante alteração às regras da impenhorabilidade de bens, eis que ao não manter o advérbio “absolutamente” na redação do art. 833, como constava no texto anterior do art. 649 do CPC/73, possibilitou, como veremos abaixo, diversas interpretações a partir da edição da nova lei processual, o que, aparentemente, abriu as portas para a relativização da impenhorabilidade[12].

O que, afinal, permitiria dita flexibilização?

É o que será investigado a seguir.

2.1  Relativização Pautada no Princípio da Dignidade da Pessoa Humana

A proteção legal relativa à impenhorabilidade de bens está associada ao princípio da dignidade da pessoa humana por meio do qual almeja-se protegê-la e a quem se deve resguardar o mínimo existencial.

A abordagem em torno do princípio da dignidade de pessoa humana não é tarefa fácil, tampouco recente. Não é, outrossim, reduto do direito interno, muito menos de áreas setorizadas do Direito.

Verdadeiro conceito indeterminado, quando alguém afirma ter sido ofendido em sua dignidade, certamente sabe ao que está se referindo, sente exatamente o núcleo atingido nessa esfera, mas, dificilmente, sabe traduzi-la em uma palavra[13].

Partindo-se dos enfoques comuns, lembra Maria Garcia[14]dignidade corresponde, entre outros significados, a autoridade moral, respeitabilidade, respeito a si mesmo”.

O princípio da dignidade[15] da pessoa humana – que assim como seu núcleo estruturante é plúrimo – está alicerçado no art. 1o, inciso III, da Constituição Federal[16] e entranhou-se no constitucionalismo contemporâneo especialmente nas últimas décadas do século XX fulcrado na queda de dogmas, crenças e estruturas políticas rígidas e discriminadoras.

Está inserido em nosso ordenamento jurídico como princípio fundamental, mas representa verdadeiro metaprincípio de alto conteúdo valorativo tanto que são repudiados os atos de indignidade, seu desvalor.

Giovani Pico Della Mirandola[17] consagrou a dignidade humana, durante o Renascentismo, reverenciando a pessoa humana ao afirmar que a pessoa é a mais feliz de todos os seres animados e por isso é digna de admiração.

A contribuição de Pico Della Mirandola para a construção do conceito de dignidade da pessoa humana foi lembrada por Marques da Silva e Cardia[18] que consideram o seu Discurso sobre a Dignidade Humana um marco no Renascentismo, ao associar a noção de dignidade à de divindade, delineando a concepção antropocêntrica, em que a pessoa humana é digna de admiração por ter sido dotada pelo Criador do arbítrio e da razão. Vejamos:

Uma vez concebido o Universo, Deus teria sentido a necessidade de trazer ao mundo uma criatura capaz de compreender, amar e admirar a grandiosidade da obra divina. Por essa razão, Deus cria o ser humano com características totalmente distintas dos demais seres (mundanos ou celestes), dotando-o, pois, de dignidade. O ser humano, portanto, teria natureza indefinida e estaria situado no meio do mundo (antropocentrismo).

Emmanuel Kant, por seu turno, é reconhecidamente o grande filósofo da dignidade, cujas ideias são lançadas alguns séculos mais tarde.

Para Kant[19], de uma maneira geral, todo o ser racional existe como fim em si mesmo, não só como meio para o uso arbitrário desta ou daquela vontade; a pessoa é um fim, nunca um meio; como tal, sujeito de fins e que é um fim em si deve tratar a si e ao outro. Esse imperativo estabelece que todo homem, aliás, todo ser racional, como fim em si mesmo, possui um valor não relativo (como é, por exemplo, um preço), mas intrínseco, ou seja, a dignidade. Tal dignidade é absoluta e humana, na medida em que identificada com a natureza humana.

Em outras palavras, a dignidade é o valor de que se reveste tudo aquilo que não tem preço, ou seja, tudo o que não é passível de ser substituído por um equivalente, tal qual a própria pessoa humana.

As passagens acima destacadas demonstram que Kant abordou em sua filosofia o conceito de dignidade.

Embora a obra Fundamentos da Metafísica dos Costumes tenha sido dedicada para abordar a problemática de uma ação moral, ao notar que a racionalidade era a diferença específica do homem para os outros seres, acabou Kant concluindo que era em virtude da razão que o ser humano deveria ser considerado um fim em si mesmo. A consequência de ser um fim em si mesmo (elemento finalístico) é a de que o homem não pode servir como meio à consecução de algum objetivo, posto ser dotado de dignidade.

A partir de tais conclusões, o uso da palavra dignidade, referindo-se à pessoa humana, ganhou significado inédito, qual seja, passou a respeitar a integridade, a intangibilidade, a inviolabilidade do ser humano pensada em sua dimensão superior, quer dizer, muito além da mera contingência física.

Acentuou-se como valor supremo e fundamental e, por isso, passou a ser considerada um “superprincípio” ou “sobreprincípio”, como prefere Paulo de Barros Carvalho[20].

Ingo Wolfgang Sarlet[21] defende ser a dignidade

(...) a qualidade intrínseca reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, nesse sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem à pessoa (...) condições existenciais mínimas para a vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos.

Prossegue o autor afirmando que a dignidade da pessoa humana possui dimensões “ontológica, intersubjetiva, histórico-cultural, negativa e prestacional”. Não cabe desprezar a importância da dimensão ontológica, pois, na concepção do autor, existe um consenso em torno do seu reconhecimento como algo intrínseco ao ser humano, na medida em que todos são iguais em dignidade, independente da capacidade de autodeterminação consciente, “são iguais em dignidade, no sentido de serem reconhecidos como pessoa”.

Nesse contexto, a dignidade da pessoa humana está estreitamente associada à ideia do mínimo existencial (ou condições existenciais mínimas, como prefere Sarlet), de onde não se pode pretender, como forma de garantir o cumprimento da obrigação e satisfazer o crédito, depauperar o devedor, exaurindo-o de bens que coloquem em risco sua higidez financeira e até mesmo sua própria subsistência e/ou de sua família.

A relativização da (im)penhorabilidade do salário e congêneres, assim como do bem de família desponta, pois, a partir da subsunção do princípio da dignidade da pessoa humana e do mínimo existencial a partir de uma óptica categórica axiológica aberta tanto que não reúne unanimidade de tratamento nem doutrinário, tão pouco jurisprudencial, como se verá.

3  A SISTEMATIZAÇÃO DA (IM)PENHORABILIDADE DO SALÁRIO E DO BEM DE FAMÍLIA NA LEI PROCESSUAL

O Código de Processo Civil de 2015 deu ao regime da impenhorabilidade de salário um tratamento um pouco diferente comparativamente com o que estava disposto no CPC/73, ao possibilitar a penhora da remuneração em hipóteses expressamente determinadas, sobre ter relativizado, também, as regras de impenhorabilidade relativas ao bem de família (art. 833), com subsídio na Lei 8.009/90.

Vejamos, a começar pelo bem de família.

3.1  Relativização da (Im)Penhorabilidade do Bem de Família

O art. 1º da Lei 8.009/90 prevê a impenhorabilidade do bem de família considerando-o como imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, independentemente de sua estrutura organizacional[22], inclusive, englobando a proteção para a moradia de uma pessoa solteira ou viúva, que resida sozinha. O art. 5º da Lei 8.009/90 dispõe que, para os efeitos de impenhorabilidade, considera-se residência um único imóvel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente. Ademais, o parágrafo único do referido artigo 5º, determina que, na hipótese de o casal, ou entidade familiar, ser possuidor de vários imóveis utilizados como residência, a impenhorabilidade recairá sobre o de menor valor, salvo se outro tiver sido registrado, para esse fim, no Registro de Imóveis, e na forma do artigo 70 do Código Civil[23].

O art. 4º da Lei 8.009/1990 prevê que não se beneficiará da proteção a pessoa que, sabendo-se insolvente, de má-fé, adquirir um imóvel mais valioso para transferir a residência familiar, desfazendo-se ou não da moradia antiga. Conforme o § 1º do art. 4º da lei, o juiz poderá, nesse caso, transferir a impenhorabilidade para a moradia familiar anterior, ou anular a venda, liberando a mais valiosa para execução ou concurso, conforme a hipótese. Por outro lado, o § 2º do art. 4º da Lei 8.009/1990 determina que, na hipótese de a residência familiar constituir-se em imóvel rural, a impenhorabilidade restringir-se-á à sede da moradia, com os respectivos bens móveis, sendo que, nos casos do art. 5º, inciso XXVI, da Constituição Federal, a impenhorabilidade será limitada à área definida como pequena propriedade rural.  Assim, o imóvel considerado bem de família é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo as exceções previstas na própria Lei 8.009/90.

Nesse passo, é preciso diferenciar a impenhorabilidade conferida ao bem de família, por determinação legal, da instituída voluntariamente ao chamado bem de raiz, a que aludem os arts. 1.711 a 1.722 do Código Civil, limitado a 1/3 do patrimônio líquido. Nesse caso, dito bem somente será impenhorável para dívidas contraídas após a constituição da impenhorabilidade do bem de raiz, devidamente registrado em Cartório. Mas, aqui também são estabelecidas exceções à impenhorabilidade, da mesma forma que a Lei 8.009/1990 estabelece para o bem de família legal (ou processual).

As dívidas alimentares, por exemplo, estão excluídas das exceções.

E o que falar das hipóteses voluntárias por aposição de cláusulas limitativas de impenhorabilidade e inalienabilidade instituídas, por exemplo, nos testamentos e daquelas fruto de negócios jurídicos processuais?

Acredita-se que nas hipóteses de realização de negócios jurídicos processuais, nos quais haja imposição consensual de impenhorabilidade de bem imóvel de titularidade do devedor, não se deva estendê-las para usá-las a fim de determinar a impenhorabilidade de referido bem para outras execuções[24].

Não parece justa, outrossim, a impenhorabilidade de bens instituída pela vontade do devedor, que ficará livre da responsabilidade patrimonial, no caso de não cumprimento de suas obrigações.

Nesse sentido, opina Adriano Ferriani[25] que:

(...) Se o objetivo é a proteção de direitos subjetivos, assegurados também, mas não somente, pela Constituição Federal, então não se pode conferir ao individuo uma proteção que decorra da vontade, nos moldes atualmente existentes, em prejuízo de outro indivíduo que, muitas vezes, não se tornou credor por vontade sua.

Em razão disso, no que tange a possibilidade de relativizar a impenhorabilidade de bem de família, nas hipóteses em que a impenhorabilidade é instituída de forma voluntária, acredita-se ser imperioso que o juiz avalie caso a caso e verifique as circunstâncias concretas e as subjetividades envolvidas, a fim de possibilitar (ou não) a relativização da impenhorabilidade e garantir a efetividade da tutela. Notadamente, nos casos em que se evidencia a má fé do devedor, que pretende lesar credores, a impenhorabilidade voluntária, deve ser relativizada[26].

No tocante ao bem de família legal, o Superior Tribunal de Justiça tem relativizado a proteção da impenhorabilidade em casos excepcionais de evidente má fé[27]. Há, ainda, julgados do STJ que permitiram a penhora de parte do imóvel que seria considerado bem de família, nos casos em que há possibilidade de desmembramento, garantindo-se ao devedor a preservação da parte residencial[28].

No entanto, constata-se severa resistência por parte do Supremo Tribunal Federal, bem como do Superior Tribunal de Justiça, em aceitar a relativização da (im)penhorabilidade de bem de família legal, notadamente do imóvel rural[29].

Apesar de os Tribunais Superiores não aceitarem a relativização da (im)penhorabilidade de bem de família, nota-se acirrada polêmica, na doutrina[30]e na jurisprudência[31], nas hipóteses de imóveis de alto valor, forte no fundamento do mínimo existencial, sobre o qual já se acenou en passant, mas cujo conceito será tratado linhas abaixo.

3.2  Relativização da (Im)Penhorabilidade do Salário

O art. 833, inciso IV, do CPC/15 prevê a impenhorabilidade de vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado o disposto no § 2º do mesmo dispositivo.

Referido § 2º do citado art. 833 do CPC/15 determina que a impenhorabilidade dos salários pode ser relativizada nas hipóteses de dívidas de obrigação alimentar, bem como nos casos em que o devedor receber salário superior a 50 salários mínimos. Nesse último caso, a redação truncada da norma pode levar a dúvidas sobre se a relativização poderia ser limitada apenas aos débitos alimentares. No entanto, o correto entendimento é o de que se trata de norma aplicável a todos os créditos em geral[32].

Constata-se assim que a proteção da (im)penhorabilidade de bens, ainda que se deva respeitar a essência do princípio da dignidade da pessoa humana, não é absoluta, havendo permissão para a relativização eis que o CPC/15 admitiu um maior espaço para possíveis mitigações.

É evidente que se trata de questão bastante controvertida na doutrina e na jurisprudência, não havendo ainda uma definição sobre a possibilidade de relativização do salário em outras hipóteses, além daquelas previstas no §2º do artigo 833 do CPC. Assim, por exemplo, discute-se se a (im)penhorabilidade pode ser relativizada no caso de salários abaixo de 50 salários mínimos e créditos em geral. Nessa seara, pôde-se observar, a partir da pesquisa jurisprudencial empreendida, que surgiram as seguintes correntes[33], quais sejam:

3.2.1              Primeira corrente: não pode haver relativização além das hipóteses expressamente previstas em lei

Os adeptos dessa primeira corrente entendem que o art. 833, inciso IV e § 2º, do CPC/15, constitui norma expressa que dispõe sobre a (im)penhorabilidade do salário, tendo por objetivo resguardar a dignidade da pessoa humana, somente reputando válida a penhora quando as quantias excederem 50 (cinquenta) salários mínimos mensais e, ainda, para satisfazer débito referente à prestação alimentícia. Portanto, tal norma expressa e específica, por ser limitadora de direitos, não poderia ser relativizada, devendo ser aplicada de forma restritiva[34]. Entendem que, quando o legislador quis estabelecer exceção, o fez expressamente.

3.2.2              Segunda corrente: pode haver relativização da impenhorabilidade, além das hipóteses expressamente previstas em lei

Os sequazes dessa segunda corrente, forte no entendimento de que a redação do art. 833, inciso IV, bem como a do § 2º, ambos do CPC/15, alteraram, de forma substancial, a norma anterior constante do revogado CPC/73 ao não manter o advérbio “absolutamente”, no que tange à impenhorabilidade de bens, defendem que há perfeita possibilidade de mitigação, além das hipóteses expressamente previstas na norma, desde que não seja atingida a dignidade do devedor[35].

3.2.3              Terceira corrente: pode haver relativização além das hipóteses expressamente previstas em lei, desde que respeitado o mínimo existencial do devedor

Os defensores dessa terceira corrente afirmam que a relativização da regra da impenhorabilidade das verbas de natureza salarial pode ser admitida, independentemente da natureza da dívida a ser paga e do valor recebido pelo devedor, condicionada, apenas, a que a medida constritiva não comprometa a subsistência digna do devedor e de sua família.

Asseveram que as partes têm direito de receber tratamento processual isonômico, de modo a resguardar tanto o direito fundamental do credor à satisfação do crédito executado quanto o direito fundamental do devedor a satisfazer o débito com a preservação de sua dignidade. Além disso, defendem que a relativização do salário estaria liberada sempre que o mínimo existencial seja garantido ao devedor[36]. Afirmam, ainda, que essa relativização se reveste de caráter excepcional e só deve se operar quando restarem inviabilizados outros meios executórios que possam garantir a efetividade da execução e desde que avaliado concretamente o impacto da constrição na subsistência digna do devedor e de seus familiares[37].

Na verdade, constata-se que a questão da relativização da (im)penhorabilidade do salário passou a ser discutida, com mais força, a partir da decisão prolatada nos Embargos de Divergência 1874222/DF[38], da lavra do Relator Ministro Otávio Noronha. No referido processo, verifica-se que o Relator acatou o argumento do credor no sentido de que, embora, nos termos da lei processual, o salário fosse impenhorável, a penhora seria possível, em situações nas quais ficasse garantida a subsistência e dignidade do devedor. De fato, o Ministro João Otávio de Noronha entendeu que a relativização da impenhorabilidade é possível à medida que o juiz deve dar a solução mais adequada a cada caso, em contraponto a uma aplicação rígida, linear e inflexível do conceito de impenhorabilidade. O Relator destacou também que a impossibilidade de penhora até o limite de 50 salários mínimos seria desproporcional à realidade do Brasil, afirmando que o fato de uma parcela muito pequena da população ter um salário superior a 50 salários mínimos, tornaria a norma inserta no art. 833, inciso IV, e § 2º, do CPC/15, praticamente inócua, já que não traduz o verdadeiro objetivo da impenhorabilidade, que é a manutenção de uma reserva de recursos digna para a manutenção do sustento do devedor e dos seus dependentes. Assim, decidiu-se por admitir, de forma excepcional e subsidiária, a “relativização da regra da impenhorabilidade das verbas de natureza salarial, independentemente da natureza da dívida a ser paga e do valor recebido pelo devedor, condicionada, apenas, a que a medida constritiva não comprometa a subsistência digna do devedor e de sua família”.

Em razão desse debate, o STJ afetou, em regime de recurso especial repetitivo, cadastrando como Tema 1230, os recursos 1.894.973, 2.071.335 e 2.071.382 para discutir a fixação de tese sobre a possibilidade e limites da relativização da impenhorabilidade de salário, fora das hipóteses previstas expressamente pelo legislador[39].

Nesse passo, acredita-se ser relevante para o debate, mencionar o voto vencido, constante de referido julgado, da lavra do Ministro Raul Araújo[40], que destacou que, na hipótese, a impenhorabilidade do salário não deveria ser relativizada, eis que o salário do devedor não era uma fortuna, além de ter outras dívidas, que consumiriam tudo que ganhava. Alerta que estabelecer penhora de parte do salário, mensalmente, levaria a eternização da demanda, eis que os juros e correção consumiriam tudo o que fosse pago, o que faria com que o devedor jamais conseguisse honrar a totalidade da dívida.

Esse entendimento deixa claro que cabe ao juiz, analisar, caso a caso, a possibilidade de relativizar a penhora de salário, verificando até que ponto a constrição de parte do salário irá (ou não) comprometer efetivamente a vida digna do devedor e de sua família.

Em decorrência disso, nos casos em que o credor pleitear a mitigação da regra da impenhorabilidade, deve-se permitir ao devedor-executado, que demonstre, de forma detalhada, a impossibilidade de sobrevivência digna, com a constrição injusta em seu salário.

Acredita-se, a partir das reflexões tecidas sobre as ponderações constantes das três correntes acima reportadas e que tratam da relativização da impenhorabilidade, que a terceira corrente seria mais coerente e adequada à sistemática implantada pelo CPC/15.

Justamente por isso, faz-se necessário, compreender o sentido e o alcance do assim lembrado mínimo existencial.

3.3  Mínimo Existencial

O mínimo existencial é conceito fundamental para se admitir a relativização das regras de (im)penhorabilidade. No entanto, a tarefa é árdua, eis que se trata de conceito vago, que, por isso, como já se disse, admite diferentes interpretações, e está associado tanto a doutrina voltada aos direitos fundamentais como também aos quadros do direito internacional dos direitos humanos.

Destaquem-se no presente estudo, as lições de Luis Roberto Barroso, Wagner Balera e Ingo Wolfgang Sarlet.

Luis Roberto Barroso[41] refere-se ao mínimo existencial como um piso mínimo de dignidade, vale dizer, como um conjunto de condições materiais essenciais e elementares cuja presença é pressuposto da dignidade para qualquer pessoa.

Wagner Balera[42], por seu turno, afirma que só há vida digna a quem esteja assegurado um mínimo existencial, ou seja, um mínimo que permita à pessoa agir com liberdade, nas relações sociais, políticas, familiares e de trabalho.

Ingo Wolfgang Sarlet[43], finalmente, considera o mínimo existencial uma garantia de um padrão mínimo de justiça social e de condições materiais para uma vida com qualidade.

Assim, o mínimo existencial está vinculado ao bem estar social, à solidariedade, a sociedade mais justa e igualitária, englobando alimentação, vestuário, moradia, saúde, educação e até lazer[44].

Portanto, acredita-se que a relativização da (im)penhorabilidade somente se torna possível quando não violar o mínimo existencial do devedor e de sua família.

Para apurar o mínimo existencial, contudo, deve-se valer do princípio da proporcionalidade, por meio da técnica da ponderação[45], de modo a aferir e preservar o mínimo de dignidade ao devedor, sem, por outro lado, deixar o credor a descoberto.

Como esclarece Carlos Bernal Pulido[46] o princípio da proporcionalidade é um critério jurídico utilizado ao redor do mundo para a proteção dos direitos fundamentais.

De outra banda, para uma perfeita solução da questão, não se olvidem os princípios do menor sacrifício para o executado e da máxima utilidade da execução.

Com efeito, vale ressaltar que o princípio do menor sacrifício para o executado, previsto no artigo 805 do CPC/2015, decorre de direitos fundamentais, como, por exemplo, o da preservação da integridade patrimonial, da própria propriedade e, por que não dizer, o da higidez à integridade física do executado, pois, não se pode pretender deixá-lo na penúria e ver sacrificados todos os seus bens para honrar o cumprimento da obrigação. De fato, por meio do citado dispositivo deve-se procurar meios de satisfação do credor que sejam menos onerosos para o executado. Assim, se existirem dois modos igualmente satisfatórios, deve-se optar por aquele menos gravoso.

Logo, a relativização de um direito fundamental somente pode ser praticada em benefício da aplicação de um outro preceito de mesma ordem, e/ou para proteger um interesse social, isto é, para garantir a soberania de um bem maior.

Seja como for, dilucida Pulido[47]: “o princípio da proporcionalidade protege a prioridade dos direitos fundamentais em maior grau” que qualquer outro princípio. Além disso, esclarece o autor, possui uma estrutura argumentativa “racional e transparente”, sendo mais “imparcial” do que as análises categóricas e as teorias internas dos direitos fundamentais.

Nessa seara, verifica-se que tanto exequentes como executados têm a seu favor a previsão de direitos fundamentais que protegem seus interesses. Os direitos e garantias individuais não têm, contudo, caráter absoluto. De fato, a própria Carta Magna permite que sobre tais direitos e garantias incidam limitações de ordem pública destinadas, de um lado, a proteger a integridade do interesse social, e, lado outro, a assegurar a coexistência harmoniosa das liberdades, pois nenhum direito ou garantia pode ser exercido em detrimento da ordem pública ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros.

De fato, muitas vezes é preciso colocar em confronto princípios constitucionais de mesma envergadura e hierarquia, e, sopesando-se a partir da técnica da ponderação, mitigar um em detrimento do outro.

De qualquer forma, acredita-se que a relativização da penhora deva ser realizada de forma subsidiária, de modo que, antes de adotar esta solução, o credor deve requerer a penhora sobre outros bens que componham o patrimônio disponível do devedor.

Outro ponto que deve ser observado é o de que o juiz jamais poderá determinar de ofício a relativização da penhora sobre o salário ou bem de família, eis que, pelo princípio da demanda, há necessidade de requerimento pela parte exequente.

Entende-se, também, deva ser observado o contraditório, antes da determinação da relativização, abrindo-se ao devedor-executado a oportunidade de se defender, influindo na decisão judicial, ao demonstrar e comprovar que poderá haver comprometimento do mínimo existencial, na hipótese de flexibilização da (im)penhorabilidade do salário ou do bem de família, eis que não poderia ele sobreviver sem o salário ou que, caso o bem de família seja penhorado e levado a leilão, não haveria como adquirir outro imóvel, acarretando a falta de moradia.

4  CONSIDERAÇÕES FINAIS

Não há dúvida no sentido de que as obrigações devam ser fielmente cumpridas, nem que os bens do devedor sirvam para honrá-las quando inadimplidas. Foi-se o tempo em que a integridade física do devedor, com sacrifício corporal, servia para satisfazer a dívida ao credor.

Deve-se a Lex Poetelia Papira a proibição aos maus tratos sobre a pessoa do devedor, sucedendo-se a ela a composição para reparar o prejuízo mediante a prestação de uma pena, até alcançar-se a concepção de responsabilidade, assumindo o Estado a função de punir.

A faculdade de exigir o cumprimento da obrigação, de forma coativa, respaldada pela força do Estado, constitui o núcleo essencial das obrigações propriamente ditas. Traduz a possibilidade de formular uma justa pretensão em face do devedor e reclamar a adoção do comportamento devido, mediante a constrição de bens do devedor suficientes para dar cabo à obrigação impaga.

A responsabilidade patrimonial se coloca, pois, em uma perspectiva funcional de tutela de segurança da realização de créditos, de sujeição in potentia à sanção.

Mas estarão todos os bens do devedor suscetíveis de constrição como forma de assegurar o cumprimento da obrigação?

Pretendeu-se neste ensaio identificar, com respaldo na doutrina e na legislação e mediante a análise de jurisprudência selecionada, aqueles bens ditos impenhoráveis, que, apesar da proteção legal veem sendo penhorados, por exceção, desde que não se aniquile a dignidade da pessoa do devedor, ou de sua família, a quem se deve resguardar o mínimo existencial.

O foco principal da pesquisa elegeu para o estudo o salário e congêneres e o assim denominado bem de família.        Dentre os resultados alcançados, observou-se que a (im)penhorabilidade do salário e congêneres e do bem de família reúne posições divergentes.

No que diz respeito ao bem de família derivado da Lei 8.009/90, há decisões no sentido de se permitir a penhora caso o devedor, insolvente, tenha de má-fé adquirido um imóvel mais valioso para transferir a residência familiar, desfazendo-se ou não da moradia antiga ou, ainda, nos casos que há um único imóvel, mas, assaz valioso, podendo ser absorvido pela penhora e, mesmo assim, não inviabilizando ao devedor se restabelecer, transferindo-se, por exemplo, para imóvel mais modesto, mas que continue acomodando perfeitamente a ele, devedor, e sua família. As divergências subsistem, também, quando se trata de imóvel rural, hipótese em que se constata severa resistência por parte do Supremo Tribunal Federal, bem como do Superior Tribunal de Justiça, em aceitar a relativização da (im)penhorabilidade de bem de família legal.

Já no que concerne ao bem de família material, tem se consagrado a impenhorabilidade somente para as dívidas contraídas após a constituição da impenhorabilidade do bem de raiz, devidamente registrado em Cartório, estando excluídas da penhora as dívidas alimentares, assim como também a dos bens clausulados restritivamente em testamentos ou negócios jurídicos processuais.

No que tange à (im)penhorabilidade do salário e congêneres revelou-se a presença de 3 (três) diferentes correntes, a saber: (i) não pode haver relativização além das hipóteses expressamente previstas em lei; (ii) pode haver relativização da (im)penhorabilidade além das hipóteses expressamente previstas em lei, e (iii) pode haver relativização além das hipóteses expressamente previstas em lei, desde que respeitado o mínimo existencial que preserve a dignidade do devedor.

As reflexões tecidas sobre as ponderações constantes das três correntes reportadas e que tratam da relativização da impenhorabilidade, permitiu aferir que a terceira corrente seria mais coerente e adequada à sistemática implantada pelo CPC/15.

É seguro que se deve, realmente, preservar a dignidade humana do devedor a quem se garante o mínimo existencial; por outro lado, não se olvide dar guarida ao crédito.

Estando diante desse impasse se propõe aplicar o princípio da proporcionalidade, por meio da utilização da técnica da ponderação, sem prejuízo, ainda, de se observar o contraditório e apoiar-se, para uma perfeita solução da questão, nos princípios do menor sacrifício para o executado e da máxima utilidade da execução.

Os resultados revelam, portanto, a contemporaneidade da matéria a demandar exame persistente e atento.

Justamente por isso, não se pretende, neste ensaio, esgotar as reflexões em torno do assunto que, a observar pela orientação jurisprudencial, ainda exige uniformização em nome da segurança jurídica, o que será definido pelo julgamento do Tema 1230, pelo menos, no que tange à relativização da impenhorabilidade dos salários. Da pesquisa empreendida, constatamos que a inclinação do STJ será no sentido de admitir a dita mitigação, desde que respeitado o mínimo existencial do devedor.

5  REFERÊNCIAS

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Tsuruda, Juliana Melo, Do Mínimo Existencial ao Direito ao Desenvolvimento, Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2023.

Notas de Rodapé

[1]     Doutora e Mestre em Direito Processual Civil pela PUC/SP; Professora de Direito Processual Civil nos cursos de Graduação e Pós-graduação stricto sensu e lato sensu da PUC/SP; Professora nos cursos ESA/SP. Membro do IBDP e CEAPRO; Autora de livros e artigos jurídicos nas áreas de Direito Processual Civil; Advogada em São Paulo; CEP 05414-901, São Paulo, SP, Brasil, PUC/SP. aaurelli@pucsp.br; https://orcid.org/0000-0002-9162-6513.

[2]     Doutora em Direitos Difusos e Mestre em Direito Civil Comparado (PUC/SP); Professora na cadeira de Direito Civil na mesma instituição; Professora nos cursos de extensão e especialização da PUC/COGEAE; Professora nos cursos ESA/SP; Autora de livros e artigos jurídicos nas áreas de Direito Civil e Biodireito; Advogada em São Paulo; CEP 05414-901, São Paulo, SP, Brasil, PUC/SP. rccleite@pucsp.br; https://orcid.org/0000-0003-3500-8670.

Foi utilizada a Inteligência Artificial Generativa para aprimorar o resumo em idioma estrangeiro.

[3]     Gneu Domício Ânio Ulpiano (c. 170-223), advogado de Tiro, na Síria fenícia (hoje Líbano) é um dos juristas citados no Digesto de Justiniano e influenciador dos direitos romano e bizantino, disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Ulpiano, acesso em: 03-07-2025.

[4]     Alvim, Agostinho, Da Inexecução das Obrigações e Suas Conseqüências, 2ª edição, São Paulo, Edição Saraiva, 1955, p. 17.

[5]     Lima, Alvino, Da culpa ao risco, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1938, p. 11.

[6]     Bevilaqua, Clóvis, Direito das obrigações, 8ª edição, Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1954, p. 37.

[7]     Costa, Emilio, Corso di storia del diritto romano dalle origini alle compilazioni Giustinianee, Bologna, Ripi Nicola Zanichelli, 1903, p. 404.

[8]     Dias, José de Aguiar, Da Responsabilidade Civil, 3ª edição, Rio de Janeiro, Edição Revista Forense, 1954, Tomo I, pp. 26-30.

[9]     Díez-Picazo, Luís, Fundamentos del derecho civil patrimonial: las relaciones obligatorias, 6ª edição, Madrid, Civitas, 2008, v. 2, p. 126.

[10]    Nanni, Giovanni Ettore, “Responsabilidade Patrimonial do Devedor: Conceito e Evolução Histórica” in Nunes Junior, Vidal Serrano, Ribeiro, José Horácio Halfed Rezende, coord., Horizontes da História do Direito: Reflexões em Homenagem a Dom Odilo Pedro Scherer, São Paulo, Editora Noeses, 2024, p. 648.

[11]    Ferriani, Adriano, Responsabilidade patrimonial e mínimo existencial, São Paulo, Editora IASP, 2017, p. 84.

[12]    Nesse sentido, obtemperam Rodrigo Mazzei e Sarah Merçon-Vargas que “Essa alteração tem caráter didático para afastar a noção de direito absoluto, não mais admitida no direito pátrio e que é, inclusive, repudiada expressamente pelo artigo 187 do CC/02, que trata do abuso de direito. Não se pode considerar como lícito o exercício de direito que excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes, premissa essa que se aplica também no âmbito da impenhorabilidade”. (Mazzei, Rodrigo, Merçon-Vargas, Sarah, “Breves notas sobre a dignidade da pessoa humana e a função social da propriedade como bases para a compreensão das regras de impenhorabilidade do Código de Processo Civil de 2015”, Revista Juridica, ano 64, n. 466, agosto, 2016, p. 74).

[13]    Leite, Rita de Cássia Curvo, “Direito à Prevenção Especial da Criança na Classificação Indicativa”, 268 páginas, Tese (Direitos Difusos), PUC/SP, São Paulo, 2016, pp. 42-44, disponível em: https://sapientia.pucsp.br/, acesso em: 02-09-2025.

[14]    Garcia, Maria, Limites da Ciência. A dignidade da pessoa humana. A ética da responsabilidade, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2004, p. 196.

[15]    Etimologicamente, dignidade vem do latim dignitas significando cargo, honra ou honraria, título, podendo, ainda, ser considerado o seu sentido de postura socialmente conveniente diante de determinada pessoa ou situação. Ver Abbagnano, Nicola, Dicionário de Filosofia, São Paulo, Editora Martins Fontes, 2007, Trad. Alfredo Bosi e Ivone Castilho Benedetti, pp. 276-277.

[16]    “Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

(...) III – a dignidade da pessoa humana;”.

[17]    Pico Della Mirandola, Giovani, Discurso sobre a dignidade do homem, Edição bilingue, Tradução e apresentação de Ganho, Maria de Lourdes Sigardo, Estudo Pedagógico Introdutório, Luis Loia, Lisboa, Edições 70, 2006, p. 55.

[18]    Silva, Marco Antônio Marques da, Cardia, Regina Helena Picollo, “O Princípio da dignidade humana: a influência de Pico Della Mirandola para a construção de um conceito contemporâneo de dignidade”, Revista Internacional Consinter de Direito, ano X, número XVIII, 1º semestre, 2024, pp. 368-369. Nesse sentido, ainda, Tsuruda, Juliana Melo, Do Mínimo Existencial ao Direito ao Desenvolvimento, Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2023, p. 28.

[19]    Kant, Emmanuel, Fundamentos da metafísica dos costumes, São Paulo, Edições e Publicações Brasil, 1936, p. 113. Nesse sentido, enuncia Kant: “Age de tal forma que trates a humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de qualquer outro, sempre também como um fim e nunca unicamente como um meio”.

[20]    Carvalho, Paulo de Barros, Direito Tributário, Linguagem e Método, São Paulo, Editora Noeses, 3a edição, 2009, pp. 268-284.

[21]    Sarlet, Ingo Wolfgang, “As dimensões da Dignidade da Pessoa Humana: construindo uma compreensão jurídico-constitucional necessária e possível”, Revista Brasileira de Direito Constitucional (RBDC), n. 09, jan/jun, 2007, p. 366.

[22]    Lembrem-se dos vários modelos familiares reunidos pelo afeto independentemente dos mecanismos formais de sua constituição, como as famílias homo e heteroafetivas, as monoparentais e anaparentais, biologizadas e ectogenéticas, socioafetivas, civis, plúrimas, paralelas e poliafetivas, multiespécie. Nesse sentido, Santos, Lucineia Rosa e Leite, Rita de Cássia Curvo, “A Convivência Familiar como Direito Fundamental da Criança no Ordenamento Jurídico Brasileiro”, Revista Internacional Consinter de Direito, ano VI, número X, 1º semestre, 2020, pp. 84-86.

[23]    O STJ já considerou impenhorável o imóvel de propriedade do devedor, mas utilizado pelos seus genitores idosos, e não para moradia própria, dele, devedor. Confira-se: “Recurso Especial. Cumprimento de Sentença. Penhora. Bem de Família. Imóvel cedido aos sogros da proprietária. Impenhorabilidade. Reconhecimento. Recurso Especial Provido. 1. Para efeitos da proteção da Lei n. 8.009/1990, de forma geral, é suficiente que o imóvel sirva de residência para a família do devedor, apenas podendo ser afastada quando verificada alguma das hipóteses do art. 3º da referida lei. 2. A linha hermenêutica traçada pelo Superior Tribunal de Justiça acerca da extensão do bem de família legal segue o movimento da despatrimonialização do Direito Civil, em observância aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da solidariedade social, buscando sempre verificar a finalidade verdadeiramente dada ao imóvel. 3. O imóvel cedido aos sogros da proprietária, que, por sua vez, reside de aluguel em outro imóvel, não pode ser penhorado por se tratar de bem de família. 4. Recurso Especial provido”. (STJ, Terceira Turma, RESP 1.851.893, MG, Rel. Ministro Marco Aurélio Belizze, j. 23-11-2021).

[24]    Na mesma direção está o Enunciado 152 do Conselho da Justiça Federal, “O pacto de impenhorabilidade (arts. 190, 200 e 833, I) produz efeitos entre as partes, não alcançando terceiros”.

[25]    Ferriani, Adriano, Responsabilidade patrimonial e mínimo existencial, São Paulo, Editora IASP, 2017, p. 141.

[26]    No REsp 123.495/MG, o Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira afirmou, respaldado na lição de Clóvis Beviláqua: “não é ao lado do que anda de má-fé que se deve colocar o direito; sua função é proteger a atividade humana orientada pela moral ou, pelo menos, a ela não oposta”. (STJ, Quarta Turma, REsp 123.495/MG, 1997/0017943-5, Rel. Ministro Salvio de Figueiredo Teixeira, j. 23-09-1998, data de publicação, DJe 18-12-1998).

[27]    “Civil e Processo Civil. Ação de Cobrança de Aluguéis. Doação de Imóvel em Fraude de Execução. Bem de Família, Afastamento da Proteção. Possibilidade. Fraude que indica abuso de direito. Art. Analisado: 1º, Lei 8.009/90. 1. Embargos de terceiro distribuídos em 12/04/2010, do qual foi extraído o presente recurso especial, concluso ao Gabinete em 22/04/2013. 2. Discute-se se a doação realizada ao menor impúbere, do único imóvel onde reside a família, dias depois de intimados os devedores para pagar quantia certa, em cumprimento de sentença, configura fraude de execução e afasta a natureza impenhorável do bem transferido. 3. A exegese sistemática da Lei nº 8 .009/90 evidencia nítida preocupação do legislador no sentido de impedir a deturpação do benefício legal, vindo a ser utilizado como artifício para viabilizar a aquisição, melhoramento, uso, gozo e/ou disposição do bem de família sem nenhuma contrapartida, à custa de terceiros. 4. Sob essa ótica, é preciso considerar que, em regra, o devedor que aliena, gratuita ou onerosamente, o único imóvel, onde reside com a família, está, ao mesmo tempo, dispondo daquela proteção legal, na medida em que seu comportamento evidencia que o bem não lhe serve mais à moradia ou subsistência. 5. Na espécie, as circunstâncias em que realizada a doação do imóvel estão a revelar que os devedores, a todo custo, tentam ocultar o bem e proteger o seu patrimônio, sacrificando o direito do credor, assim, portanto, obrando, não apenas em fraude de execução, mas também - e sobretudo - com fraude aos dispositivos da própria Lei 8.009/90. 6. Nessas hipóteses, é possível, com fundamento em abuso de direito, reconhecer a fraude de execução e afastar a proteção conferida pela Lei 8 .009/90. 7. Recurso especial conhecido e desprovido”. (STJ, Terceira Turma, REsp 1.364.509/RS, 2012/0265894-9, Rel. Ministra Nancy Andrighi, j. 10-06-2014, data de publicação, DJe 17-06-2014).

[28]    Nesse sentido: “Processual Civil. Agravo interno no Recurso Especial. Execução Fiscal. Bem de Família. Desmembramento de bem imóvel para fins de penhora. Possibilidade de preservação da parte residencial. 1. Não há violação do art. 535 do CPC/1973 quando o tribunal de origem se manifesta de forma clara, coerente e fundamentada sobre as teses relevantes à solução do litígio. 2. Esta Corte Superior tem entendimento firmado de ser adequada a penhora de parte do bem imóvel não utilizada para fins residenciais, ainda que, no registro imobiliário, haja somente uma matrícula, quando o desmembramento não prejudicar a garantia de moradia da família. 3. Constatada a possibilidade de desmembramento do imóvel pelas instâncias ordinárias, o recurso especial não serve ao propósito de revisão dessa constatação, porquanto seria necessário o reexame de fatos e provas para concluir em sentido contrário. 4. Hipótese em que o recurso especial encontra óbice nas Súmulas 7 e 83 do STJ, visto que a situação fático-probatória delineada no acórdão a quo revelou a possibilidade de desmembramento do bem imóvel em partes distintas. 5. Agravo interno desprovido”. (STJ, Primeira Turma, AgInt no REsp 1.456.845/PR, Rel. Ministro Gurgel de Faria, j. 13-09-2016, data de publicação, DJe 19-10-2016). 

[29]    O STF ao analisar a impenhorabilidade de propriedade familiar, localizada na zona rural, que não é o único bem imóvel dessa natureza pertencente à família admitiu o Tema 961 de Repercussão Geral, assentando o entendimento de que: “Pequena propriedade rural. Bem de família. Impenhorabilidade. Art. 5º, XXVI, da Constituição Federal. 1. As regras de impenhorabilidade do bem de família, assim como da propriedade rural, amparam-se no princípio da dignidade humana e visam garantir a preservação de um patrimônio jurídico mínimo. 2. A pequena propriedade rural consubstancia-se no imóvel com área entre 01 (um) e 04 (quatro) módulos fiscais, ainda que constituída de mais de 01 (um) imóvel, e que não pode ser objeto de penhora. 3. A garantia da impenhorabilidade é indisponível, assegurada como direito fundamental do grupo familiar, e não cede ante gravação do bem com hipoteca. 4. Recurso extraordinário não provido, com fixação da seguinte tese: “É impenhorável a pequena propriedade rural familiar constituída de mais de 01 (um) terreno, desde que contínuos e com área total inferior a 04 (quatro) módulos fiscais do município de localização” (STF, Tribunal Pleno, ARE 1.038.507/PR, Rel. Ministro Edson Fachin, j. 21-12-2020, Processo Eletrônico Repercussão Geral - Mérito – data da publicação, DJE 15-03-2021). No mesmo sentido, o STJ fixou entendimento no sentido de que: “A pequena propriedade rural é impenhorável, ainda que tenha sido ofertada em garantia, visto que é protegida por norma de ordem pública, inarredável por vontade das partes. 3. Ainda que os precedentes mencionados não aludam expressamente ao comportamento contraditório e ao princípio da boa-fé, são imperativos quanto à impenhorabilidade da pequena propriedade rural mesmo que o imóvel seja oferecido em garantia pelo proprietário, porquanto se trata de norma de ordem pública, insuscetível de renúncia pelas partes”. (STJ, Terceira Turma, AgInt no AREsp 2.182.241/RS, Rel. Ministro Moura Ribeiro, j. 12-12-2022, data da publicação, DJe14-12-2022). E, ainda, "Consoante jurisprudência pacificada nesta Corte Superior, a pequena propriedade rural trabalhada pela família, mesmo que oferecida em garantia hipotecária, é alcançada pela impenhorabilidade. Precedentes” (STJ, Terceira Turma, AgInt no AREsp 2.260.265/RS, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, j. 22-5-2023, data da publicação, DJe 24-5-2023).

[30]    Nessa mesma linha, Sergio Cruz Arenhart opina que: “(...) Ademais, a proteção de verbas de caráter alimentar ou do imóvel que serve de residência da família não pode servir como escudo para a desmesurada preservação de bens e direitos de forma manifestamente abusiva. Não há dúvida de que deve haver diferença no tratamento da casa usada pela família para sua residência e da mansão, de vários metros quadrados, que também se destina a tal fim, embora exceda a dimensão necessária para o exercício do estrito direito de habitação. É inquestionável que a perda da residência familiar gera elevado risco de que a família fique desalojada, o mesmo não se podendo dizer da arrecadação do imóvel suntuoso, que pode bem ser substituído por outro, de menores proporções [...]”, Arenhart, Sérgio Cruz, “A Penhorabilidade de Imóvel de Família de Elevado Valor e de Altos Salários”, disponível em <https://www.paginasdedireito.com.br/artigos/todos-os-artigos/a-penhorabilidade-de-imovel-de-familia-de-elevado-valor-e-de-altos-salarios.html#google_vignette>, acesso em 25-05-2025.  Essa, também, é a opinião de Adriano Ferriani que evidencia, por meio de exemplos, que muitas vezes, com a expropriação e alienação, em leilão, de imóvel de alto valor, o executado teria um abalo ínfimo em seu patrimônio, enquanto o devedor, muitas vezes, poderia sofrer grave abalo em seu patrimônio. Ferriani, Adriano, Responsabilidade patrimonial e mínimo existencial, São Paulo, Editora IASP, 2017, p. 147.

[31]    O STJ tem negado a relativização da impenhorabilidade de imóvel de alto valor, conforme se observa do seguinte julgado: “os imóveis residenciais de alto padrão ou de luxo não estão excluídos, em razão do seu valor econômico, da proteção conferida aos bens de família consoante os ditames da Lei nº 8.009/90”. (STJ, Terceira Turma, AgInt no AREsp 2.107.604/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, j. 17-10-2022, data da publicação, DJe 19-10-2022). No entanto, em sentido contrário, o TJSP vem admitindo a relativização há algum tempo, como se vê do seguinte excerto: “Execução de Título Extrajudicial – Desconsideração da Personalidade da Empresa Devedora já decretada – Imóvel do Sócio –Bem de Família – Apartamento de Luxo. Muito embora o devedor comprove residir no imóvel cujos direitos foram penhorados, não havendo indício de que tenha outro bem disponível para constrição, a impenhorabilidade legal deve ser mitigada. Imóvel de luxo e alto padrão, cujo valor de mercado é consideravelmente superior ao valor da dívida. Penhora que deve ser mantida levando-se o imóvel à hasta pública, devendo, contudo, metade do produto alcançado ser revertida em proveito do devedor, a fim de que possa adquirir outro imóvel para albergar a si e a sua família. A outra metade deve permanecer retida nos autos, para fins de quitação do débito perseguido. Recurso provido em parte (TJSP, 30ª Câmara de Direito Privado, 2074639-28.2018.8.26.0000, Rel. Des. Maria Lúcia Pizzotti, j. 20-06-2018, data de publicação, DJe 26-06-2018). Também assim decidiu o TJPR, “Agravo de Instrumento. Cumprimento de Sentença. decisão em exame, pela qual se indeferira pedido de indisponibilidade, Penhora e Avaliação de Imóvel, vez que Bem de Família. insurgência da parte exequente. Imóvel de vultoso valor. Relativização da Impenhorabilidade, desde que haja valor remanescente suficiente à aquisição de outro imóvel. Preservação do Patrimônio Mínimo e da Dignidade Humana do devedor. executado que reside em imóvel de luxo em condomínio de alto padrão. manutenção da moradia, que se assemelha ao valor da dívida, representando, aproximadamente, 0,34% do valor do imóvel. produto da venda suficiente a quitar a dívida e a adquirir outro imóvel à residência. proteção legal que não pode ser usada para favorecer a parte devedora, que mora em imóvel luxuoso, enquanto a dívida, bem inferior, continua inadimplida. ausência de violação ao direito de moradia. recurso conhecido e provido”. (TJPR, 13ª Câmara Cível, 0097707-44.2023.8.16.0000, Londrina, Rel. Des. José Camacho Santos, j. 03-04-2024, data de publicação, DJe 04-04-2024). Ainda, em igual sentir, há julgado do TRT2: “Bem de Família. imóvel de elevado valor. Penhora. Possibilidade. A Lei 8.009/90 tem por finalidade garantir a moradia da família, em atenção aos princípios da dignidade da pessoa humana e ao direito fundamental à moradia, ambos insculpidos nos artigos 1º, III e 6º, da Constituição Federal. Contudo, quando não há notícia nos autos acerca de outro bem passível de penhora, apto a satisfazer o crédito exequendo, após exaustivas tentativas do credor em vê-lo adimplido e tratando-se de imóvel de alto valor utilizado como moradia pelos executados, deve ser aplicado o método da ponderação de princípios constitucionais, devendo ser preservado o direito da exequente ao crédito trabalhista, de natureza alimentar, especialmente diante da possibilidade de satisfação de seu crédito sem prejuízo da sobra de montante suficiente para que os executados adquiram imóvel de padrão similar. Agravo de Petição dos executados a que se nega provimento”. (TRT-2, 17ª Turma, Cadeira 5, 02286004720075020058/SP, Rel. Des. Maria de Fátima da Silva, data de publicação, 31-03-2022).

[32]    Referentemente ao assunto, dilucidam Rodrigo Mazzei e Sarah Merçon-Vargas que: “...a redação do §2º não é das mais felizes e pode levar o intérprete à conclusão de que o procedimento previsto nos arts. 528, §7º, e 529, §3º, que é próprio das execuções de créditos alimentares, deveria ser observado também nessa segunda exceção, o que não faria sentido. Assim, a despeito da redação do §2º, o procedimento dos arts. 528, §7º, e 529, §3º, não se aplica à hipótese de penhorabilidade da remuneração que exceder cinquenta salários mínimos”. (Mazzei, Rodrigo, Merçon-Vargas, Sarah, “Breves notas sobre a dignidade da pessoa humana e a função social da propriedade como bases para a compreensão das regras de impenhorabilidade do Código de Processo Civil de 2015”, Revista Juridica, ano 64, n. 466, agosto, 2016, p. 78).

[33]    Correntes de entendimento constantes dos acórdãos indicados pelo portal do TJDFT, disponíveis em: <https://www.tjdft.jus.br/consultas/jurisprudencia/jurisprudencia-em-temas/jurisprudencia-em-perguntas/direito-civil-e-processual-civil/penhora/e-possivel-a-relativizacao-da-regra-de-impenhorabilidade-de-salario>, acesso em: 01-09-2025.

[34]    TJDF, Oitava Turma Cível, 1321728, 0744978-54.2020.8.07.0000, Relator Designado, Des. Eustáquio de Castro, j. 25-2-2021, data da publicação,  DJe 09-03-2021.

[35]    A Corte Especial do STJ tem entendimento de que há possibilidade de mitigação da impenhorabilidade absoluta da verba salarial, desde que preservada a dignidade do devedor e observada a garantia de seu mínimo existencial (AgInt no REsp 1847503/PR, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, j. 30-03-2020, data da publicação, DJe 06-0-2020). Na mesma linha, STJ, EREsp 1582475/MG, REsp 1820477/DF, AgInt no REsp 1847503/PR, REsp 1705872/RJ, EREsp 1.582.475/MG).

[36]    A regra da impenhorabilidade de vencimentos incide apenas quanto à fração do patrimônio pecuniário do devedor que se revele efetivamente necessária à manutenção de seu mínimo existencial, bem como à preservação de sua dignidade e da de seus dependentes (...)”. (STJ, Primeira Turma, AgInt nos EDcl no AREsp 1389818/MS,  Rel. Ministro Sérgio Kukina, j. 04/06/2019, data da publicação, DJe 07/06/2019).

[37]    “Ao permitir, como regra geral, a mitigação da impenhorabilidade quando o devedor receber valores que excedam a 50 salários mínimos, o § 2º do art. 833 do CPC não proíbe que haja ponderação da regra nas hipóteses de não excederem”. (STJ, Corte Especial, EDcl nos EREsp 1.518.169/DF, Rel. Ministra Nancy Andrighi, j. 21-05-2019, data da publicação, DJe de 24-5-2019).

[38]    “Processual Civil. Embargos de Divergência em Recurso Especial. Execução de Título Extrajudicial. Penhora. Percentual de Verba Salarial. Impenhorabilidade (art. 833, iv e § 2º, cpc/2015). Relativização. Possibilidade. Caráter Excepcional. 1. O CPC de 2015 trata a impenhorabilidade como relativa, podendo ser mitigada à luz de um julgamento principiológico, mediante a ponderação dos princípios da menor onerosidade para o devedor e da efetividade da execução para o credor, ambos informados pela dignidade da pessoa humana. 2. Admite-se a relativização da regra da impenhorabilidade das verbas de natureza salarial, independentemente da natureza da dívida a ser paga e do valor recebido pelo devedor, condicionada, apenas, a que a medida constritiva não comprometa a subsistência digna do devedor e de sua família. 3. Essa relativização reveste-se de caráter excepcional e só deve ser feita quando restarem inviabilizados outros meios executórios que possam garantir a efetividade da execução e desde que avaliado concretamente o impacto da constrição na subsistência digna do devedor e de seus familiares. 4. Ao permitir, como regra geral, a mitigação da impenhorabilidade quando o devedor receber valores que excedam a 50 salários mínimos, o § 2º do art. 833 do CPC não proíbe que haja ponderação da regra nas hipóteses de não excederem (EDcl nos EREsp n. 1.518.169/DF, relatora Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, DJe de 24.5.2019). 5. Embargos de divergência conhecidos e providos”. (STJ, Embargos de Divergência em REsp 1.874.222/DF, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, j. 19-04-2023, data da publicação, DJe 24-05-2023).

[39]    Decisão de afetação de Relatoria do Ministro Raul Araújo, sem julgamento até a data da elaboração do presente artigo, disponível em: <https://processo.stj.jus.br/processo/julgamento/eletronico/documento/mediado/?documento_tipo=integra&documento_sequencial=222693995&registro_numero=202002358023&peticao_numero=202300IJ2368&publicacao_data=20231220&formato=PDF>, acesso em: 01-09-2025.

[40]    Transcreve-se trecho do voto vencido do Ministro Raul Araújo proferido nos autos dos Embargos de Divergência em REsp 1.874.222/DF: “Qual a situação examinada na instância de origem, que confirmamos no acórdão, ora embargado, com a devida vênia? Alguém que ganha R$8.500,00 (oito mil e quinhentos reais), quer dizer, não é uma fortuna, e está devendo mais de R$100.000,00 (cem mil reais). Pois bem, para pagar mais de R$100.000,00 (cem mil reais), admite-se que possa haver um desconto de até 30% de R$ 8.500,00 (oito mil e quinhentos reais), o que vai representar dois mil e poucos reais. Jamais a parte vai conseguir pagar mais de R$100.000,00 (cem mil reais), descontando mensalmente dois mil e poucos reais. Ora, serão anos e anos desse desconto perenizado, eternizado, o que já demonstra que a instância de origem, ao contrário do que entende o eminente Relator, examinou, sim, o caso concreto e entendeu que não era razoável penhorar, sacrificar uma família, em que o devedor ganha R$ 8.500,00 (oito mil e quinhentos reais), tirando dessa família, todo mês, dois mil e poucos reais para tentar pagar uma dívida de mais de R$100.000,00 (cem mil reais) a qual nunca vai ser alcançada, porque a dívida estará sempre crescendo em algum valor referente a juros de mora e correção monetária. Então, é algo que, parece-me, contraria a própria regra, que é a impenhorabilidade dos salários".

[41]    Barroso, Luiz Roberto, Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo, 4ª edição, São Paulo, Saraiva, 2013, pp 202-203.

[42]    Balera, Wagner, “A dignidade da pessoa humana e o mínimo existencial”, in Miranda, Jorge, Silva, Marco Antônio Marques da, coord., Tratado Luso-Brasileiro da Dignidade Humana, São Paulo, Quartier Latin, 2009, p. 474.

[43]    Sarlet, Ingo Wolfgang, “Os direitos fundamentais sociais, o direito a uma vida digna (mínimo existencial) e o direito privado: apontamentos sobre a possível eficácia dos direitos sociais nas relações entre particulares in Almeida Filho, Agassiz, Melgaré, Plínio, org., Dignidade da Pessoa Humana – fundamentos e critérios interpretativos, São Paulo, Malheiros Editores, 2010, p. 376.

[44]    Nesse sentido, Ingo Wolfgang Sarlet afirma que o mínimo existencial não se reduz a uma mera garantia de sobrevivência física, mas engloba também a garantia mínima de acesso aos bens culturais, a inserção na vida social e a participação política. “O direito ao mínimo existencial não é uma mera garantia de sobrevivência”, disponível em: <https://www.conjur.com.br/2015-mai-08/direitos-fundamentais-assim-chamado-direito-minimo-existencial/>, acesso em: 25-05-2025.

[45]    Assim, também, Arlete Inês Aurelli e Rita de Cássia Curvo Leite esclarecem que “por meio da ponderação entre princípios é possível avaliar a adequação de uma decisão judicial aquilatando-a proporcional quando a justificativa pela opção por um princípio em detrimento do outro gerar mais benefícios que malefícios revelando-se a melhor solução possível de maneira que o julgador não seja um ditador, mas um democrata”, Aurelli, Arlete Inês e Leite, Rita de Cássia Curvo, “O Princípio da Proporcionalidade ante a árdua ‘escolha de Sofia´ nas decisões judiciais”, Revista Internacional Consinter de Direito, ano XI, número XX, 1º semestre, 2025, p. 504.

[46]    Pulido, Carlos Bernal, “La migración del principio de proporcionalidad a través de Europa”, Revista Libertas, vol. 1, n. 2, julho-dezembro, 2014, Trad. Lays Gomes Martins, p. 220.

[47]    Pulido, Carlos Bernal, “La migración del principio de proporcionalidad a través de Europa”, Revista Libertas, vol. 1, n. 2, julho-dezembro, 2014, Trad. Lays Gomes Martins, pp. 255-257.